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As marcas do poder

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Agenda 22/08/2011 às 14:22

5. O titular do exercício poder

Podendo, embora, parecer repetição, o exercício do poder tem evidentemente a marca do seu titular. É este aspecto que nos propusemos abordar nesta parte da nossa dissertação. Aliás clarifique-se desde logo que nos cingiremos aos titulares singulares começando, como é evidente, pela sua escolha.

A escolha do titular do poder não se resume à simples indicação de uma entidade que reúna os requisitos técnicos, porquanto este, tem de possuir sobretudo um conjunto de virtudes, muitas vezes, intuita persona.

Mas olhemos, ainda que brevemente, para o verdadeiro alcance destes requisitos.

Uma escolha é, a todos os títulos, discriminatória. Significa que se está perante uma universalidade na qual se deve destacar apenas um ou um grupo que reúna melhor que os outros, os aspectos considerados básicos para o preenchimento das vagas em causa.

O ingresso, por exemplo, numa escola para aí ser considerado aluno, exige o preenchimento de requisitos como a idade, ou a entrega de formulário devidamente preenchido e, até o pagamento de uma taxa que mesmo sendo simbólica, tem de ser paga. Ora, se a idade de ingresso nesta escola, por exemplo, for X, então, o candidato que tiver X+Y, fica automaticamente impedido de poder se candidatar. Se, por alguma razão que até pode não lhe ser imputada, este último não pôde ingressar num momento anterior e, tendo o direito à educação formal constitucionalmente consagrado, quid juris?.

Por semelhança se pode dizer que escolher, por eleição ou por nomeação, os titulares do exercício do poder, é preterir uns, a maioria que se compõe de todo o universo de um país. Repare-se que a lei civil, só para citar um exemplo, prevê a possibilidade de excluir cidadãos por alguma incapacidade de exercício [18]. Trata-se neste caso e sem dúvidas de uma forma legal e até moral de defesa dos mesmos. Mas em geral, escolher é um exercício discriminatório que sendo necessário, é pernicioso precisamente por afrontar a universalidade do exercício do poder. Em muitos casos, a maioria, os requisitos discriminatórios não são negociados e nem negociáveis. Isto é, os titulares de um certo poder decisório, definem-nos e os tornam obrigatórios com aquiescência quase geral. Há uma submissão total e sem que mesmo se compreenda o seu real significado. Tem se em geral e em perspectiva o resultado final e, preferivelmente favorável na perspectiva de quem escolhe.

O lado positivo das escolhas situa-se quase sempre num futurismo da melhoria da prestação dos escolhidos. Ou seja, a expectativa da satisfação dos anseios dos que fazem as escolhas é imensa e, bastas vezes, traz ao de cima as verdadeiras e insuspeitáveis capacidades das pessoas. Há uma espécie de verdadeira concorrência não só no aspecto formal mas igualmente na verdadeira demonstração do orgulho sui generis do ser humano. E isto é tão verdade quanto ao facto de que todo o candidato à escolha deve demonstrar todo o seu potencial despindo-se da mesquinhez no relacionamento com os demais, falta de transparência e falsidade como bem se refere P. Giustiniani. [19]

Consiste, pois, na personificação de uma boa liderança a disponibilidade de ser titular do exercício de poder. Esta personificação não se resume ao saber gerir o seu âmbito de exercício, mas principalmente na forma de o fazer tendo em conta que é um acto de gerir relacionamentos em todas as suas vertentes.

Um verdadeiro líder, porque liderar é quanto a nós um exercício de poder, preocupa-se sobretudo com a perfomance de todos quantos ele se vê na contingência de liderar, conquistando a sua confiança e impondo a sua autoridade. Quer dizer o tecnicismo que lhe confere primazia na escolha deve ser combinado com a inseparável autoridade e nisto, vai consistir a sua real competência.

Não sugerimos que o líder seja um troféu, ou seja, que a todos os títulos mereça que lhe seja erigida uma estátua, mas unicamente que os seus actos sejam motivo de orgulho dos que o assessoram.

A figura do titular do exercício tem de ser a luz que ilumina o caminho dos demais; é a projecção da imagem e do bom nome que todos almejam principalmente as colectividades.

É por isso que defendemos que para além de tecnicamente competente tem de ser o aglutinador, o verdadeiro porto de partida e de chegada dos seus colaboradores, sem precisar de ser o super homem.

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6. Conclusão

Desde os primórdios que o Homem se vestiu de poder porque compreendeu que ele é próprio dos seres vivos e, particularmente do ser humano. Na verdade desde as comunidades primitivas até aos dias de hoje, o poder tem fascinado o Homem levando-o mesmo a procurar meios pouco ortodoxos para a sua conquista.

O poder, por um lado produto da imaginação humana e por outro, necessidade de existência, não pode simplesmente ser refém dos seus estados emocionais.

Se bem que esses estados emocionais acabam provocando a multipartição das formas de aquisição das várias formas de poder, podem não conferir a necessária autoridade.

Recorre-se então às escolhas que, pese embora a sua importância, não são infalíveis e nem por isso deixarão de ser o único meio legítimo de se titular o exercício de poder.

É por isso que aos titulares do exercício do poder se exige esforço quase sobre humano e, particularmente rectidão de carácter para amealhar confiança e autoridade por ser ele a personificação real de poder que ele exerce.

O titular é a face viva do poder e só ele impõe os verdadeiros limites que na prática representam os limites da sua própria personalidade sendo por isso, de maior ou menor aceitação onde exerce o poder e quiçá, na sociedade.


Referências

Giustiniani, P., O Homen: Fascínio e Desafio, Edições Paulistas, Lisboa,1993

Manfred, A. Z., História do Mundo, V. I, Edições Sociais, Lisboa, 1977

Almeida, J. e Sampaio e Melo, A., Dicionário da Língua Portuguesa, 5ª Edição

Mandlate, Filipe, Código Civil, 1ª Edição, Plural Editores, Maputo, 2003

Maquiavel, Nicolau, O Príncipe, 2ª Edição, Livros de Bolso – Europa América, 1976

http//pt.wikipedia.wiki/poder....


Notas

  1. J. Almeida e A. Sampaio e Melo, Dicionário da Língua Portuguesa, 5ª Edição
  2. http//pt.wikipedia.wiki/
  3. Karl Marx, pensador alemão, estudou as diferentes formas de manifestação do poder e as relações que este tinha com a sociedade.
  4. Nicolau Maquiavel, O Príncipe, 1972
  5. Idem
  6. Idem
  7. http//pt.wikipedia.wiki/
  8. Líder da Revolução Soviética de Outubro de 1917. A sua obra foi depois popularizada e expandida para outras latitudes.
  9. Ditador nazi de orientação nacionalista, mas que se tornou célebre pela sua aversão a raças não arianas, eespecialmente os judeus e, pela invasão de países vizinhos. Esta invasão, para além dos diversos motivos que a sustentam, destaque-se a necessidade de fazer esquecer os problemas internos, alegando haver uma pretensa ameaça externa.
  10. Na sociedade feudal, os senhorios eram os donos do exército e, o Estado, em caso de precisão, solicitava-o em troca de benefícios materiais incluindo a atribuição de mais terras. É a este poder que a igreja cristã apelou nas cruzadas para o combate aos ‘profanadores muçulmanos. A primeira cruzada foi decretada pelo Papa Urbano em 1095 com a promessa de absolvição dos pecados dos que participassem; Manfred, A. Z., História do Mundo, V. I, Edições Sociais, Lisboa, 1977, Pág. 215.
  11. Max Weber, 1884 – 1920, alemão, economista, jurista, historiador, sociólogo e grande adepto do antipositivismo e, por isso mesmo defendeu, no seu livro A ética protestante e o espírito do capitalismo que "a religião foi um dos aspectos mais importantes que influenciaram o desenvolvimento das culturas ocidentais e oriental".
  12. São exemplos mais que evidentes as recentes intervenções das forças internacionais no Afeganistão e no Iraque e, porque não, na Somália, para não citar os casos do Líbano e nos territórios da antiga Jugoslávia.
  13. Gistiuniani, P., O Homem׃ Fascínio e Desafio, Ed. Paulistas, Lisboa, pp. 35
  14. Solón, legislador de Atenas, viveu entre os anos 640 e 550 a.C., foi poeta e político para além de ter sido comerciante, actividade que o fez enriquecer.
  15. Pisístrato, se tornou em 580 a.C. primeiro tirano ateniense, contornando com alguma facilidade as reformas de Solón.
  16. Aquiles, herói da mitologia grega que o seu ponto fraco era um dos calcanhares, porque em tudo o resto, foi imbatível embora enfim, tenha sido morto.
  17. Em Moçambique, timidamente esta experiência vai se alargando. Trata-se de entidades adminstrativas que reúnem os principais serviços numa mesma ‘sala’ para reduzir distâncias de deslocação e de decisão.
  18. Artigos 122 e ss do Código Civil
  19. P. Giustiniani, O Homen: Fascínio e Desafio, pp. 46
Sobre o autor
Reginaldo Rogério Chelene

Mestre em Direito Eclesiástico Licenciado em Direito Docente na Universidade São Tomás de Moçambique Advogado

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CHELENE, Reginaldo Rogério. As marcas do poder. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2973, 22 ago. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/19818. Acesso em: 23 dez. 2024.

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