5 AS GARANTIAS DO CONSUMIDOR BRASILEIRO NO COMÉRCIO ELETRÔNICO INTERNACIONAL
No direito brasileiro, a princípio, as relações de consumo, quando são enquadradas nas definições do CDC, ou seja, nas definições de consumidor, fornecedor e produto ou serviço, será esta Lei especial que regerá a questão consumerista.
É notório que as relações de consumo, em função das características das relações contemporâneas e pela facilidade trazida pela rede mundial de computadores, têm ocorrido cada vez mais entre consumidores e fornecedores de diferentes países, estabelecendo uma relação internacional entre pessoas, físicas e jurídicas, sendo denominada pela doutrina como, relação de Direito Internacional Privado, com suas normas conflituais ou de solução de conflitos.
Segundo Amílcar de Castro, "encontram-se fatos e relações que, pelas suas características, superam os limites da vida real interna de determinado Estado" ,portanto, podemos afirmar que existe um elemento externo a um dos pólos, ou seja, ao sistema legal da nação, havendo o surgimento de um fato anormal a este direito. Sem a existência do elemento externo, não há fato anormal ao direito do respectivo país e a questão deverá ser tratada exclusivamente pelo ordenamento nacional.
A apresentação do elemento de estraneidade faz com que dois ou mais ordenamentos jurídicos possam estar relacionados com a tutela sobre os interesses conflitantes entre as partes.
Cada Estado pode avocar para si a jurisdição sobre a matéria, além de possuir regras materiais diferentes, e como dificilmente haverá um direito uniforme ou uniformizado entre os países, estes se preocuparam em resolver tais conflitos, denominados "conflitos de 1º grau".
Para tanto, os Estados criaram normas internas, normas de Direito Internacional Privado, tidas como normas indicativas, que determinarão e sistematizarão o direito aplicável ao caso concreto com elemento de estraneidade. Neste caso, a competência internacional daquele país já estará fixada e um possível conflito jurisdicional persistirá.
Os Estados estão sujeitos à limitações sobre os poderes de jurisdição em casos que tratem de interesses ou atividades estrangeiras. Ainda que disponha de certa discricionariedade na determinação dos critérios da matéria pertinente à jurisdição nacional, cada Estado é obrigado a exercer com moderação a tarefa de invocar jurisdição em casos que envolvam algum elemento estrangeiro.
Sob a perspectiva jurídico-internacional, o termo jurisdição compreende três categorias de poderes:
a) jurisdição legislativa, que se constitui na "jurisdição para prescrever" um princípio ou norma legal, seja por lei, decreto executivo, regulamentação administrativa ou por jurisprudência;
b) jurisdição judicial, que nada mais é do que a "jurisdição para adjudicar" demandas judiciais;
c) jurisdição executiva, determinada pela "jurisdição para fazer cumprir" leis e regulamentos, bem como ordens e decisões judiciais.
A noção tradicional da extensão dos poderes de jurisdição exprimia que um país deteria poderes absolutos para regular pessoas e coisas que se encontrassem dentro de suas fronteiras, bem como condutas que nele ocorressem. Como a eficácia da lei no espaço se confundia com os limites territoriais de uma nação, tentativas de exercícios de poderes fora dos respectivos limites territoriais não eram legitimadas pelo direito dos povos e, eventualmente, ocasionavam conflitos armados entre as soberanias envolvidas.
No entanto, graças a mudanças econômicas e a avanços na tecnologia, as relações entre pessoas de diferentes territórios tornaram-se cada vez mais comuns. A aproximação entre as nações e o crescimento das transações internacionais dificultava a aplicação de uma concepção estrita de territorialidade. A solução veio com a criação de um sistema reconhecido pela comunidade internacional, que enumerava circunstâncias em que se justificaria a sujeição de cidadãos e residentes de um país à autoridade de outro. Assim, com o intuito de solucionar conflitos de jurisdição, desenvolveram-se os seguintes critérios básicos:
1) o princípio da nacionalidade;
2) o princípio da nacionalidade passiva;
3) o princípio protetor;
4) o princípio universal.
No contrato de consumo realizado por meios eletrônicos o consumidor continua com a mesma proteção antes conferida pelas leis precedentes. Mesmo regras de conteúdo processual também se mostram aplicáveis na instrumentalização de obrigações oriundas de transações realizadas em meio eletrônico, mas a realidade das redes eletrônicas abertas e a disseminação do comércio eletrônico trouxeram fatalmente uma constatação: a de que as leis em vigor não são suficientes a oferecer respostas a todas as necessidades do consumidor nesses novos ambientes virtuais. A novidade das relações nesse tipo de ambiente sugere a existência de certas inadequações e lacunas na lei vigente que necessitam serem reparadas.
Por fim, podemos dizer que as regras de competência internacional do Estado emanam, em primeiro lugar, de seu próprio ordenamento. São regras de direito processual compostas por um sistema dinâmico que pode ser chamado de Direito Processual Internacional. Este sistema, como parte do Direito Internacional Privado, terá ainda como fonte regras a partir do Direito Internacional Público, normas costumeiras e acordos internacionais, os Tratados, visando à solução dos conflitos de jurisdição que se instalem nas relações multiconectadas.
Portanto, a competência internacional da Justiça brasileira está fixada, sendo exclusiva, segundo nossa posição em razão do art. 101 inciso I do CDC, ou concorrente conforme o inciso II do art. 88 do CPC, local de cumprimento da obrigação, o magistrado deverá socorrer-se de nossas normas indicativas em relação à presente demanda.
6 CONCLUSÃO
O Direito Internacional Privado e Processual diverso e próprio de cada país produziria freqüentemente resultados insatisfatórios, tornando cada vez mais urgente à necessidade da internacionalização nas zonas de integração econômica com o objetivo da harmonização do Direito Internacional Privado e Processual.
Observando o Direito interno podemos deduzir pelo conflito internacional entre ordenamentos jurídicos e concluir pela necessidade de uniformização das normas indicativas e harmonização dos direitos do consumidor.
Enquanto o apelo de uma sociedade global interligada pela Internet nos parece vantajoso, a sua viabilidade depende em muito da superação de desafios relacionados a diferenças culturais, políticas, econômicas e, principalmente, legais.
A criação da Internet gerou um fundamental debate acerca de sua regulamentação. Para muitos, seus primeiros desenvolvimentos representavam uma terra sem lei onde a liberdade de expressão reinava suprema, a partir dessa concepção surgiram grupos representados por vários setores da sociedade, que advogam contra qualquer forma de censura e regulamentação de conteúdo na rede mundial de computadores.
Apesar dos fortes argumentos e dos discursos por vezes eloqüentes em defesa de uma Internet livre, fato é que a maioria dos governos criou medidas para reafirmar sua presença também no mundo virtual. Adotou-se um posicionamento contrário à auto-regulamentação da Internet. Novas leis foram editadas em áreas como propriedade industrial, contratos, privacidade e crime, com o objetivo de regular praticamente todas as formas possíveis de atividade na Rede.
Com a crescente freqüência de negócios e outras relações sociais conduzidas on-line, aumentou a expectativa de aplicação extraterritorial das leis. Pessoas físicas e jurídicas devem analisar cautelosamente o lugar a que dirigem suas relações via web, qual o público atingido por sua mensagem e estar preparadas para enfrentar litígios de acordo com as leis daquela jurisdição.
Diante da problemática exposta, nos posicionamos a favor de um esforço multilateral que vise à criação de um entendimento comum para questões ocorridas a partir do ciberespaço. É evidente que quanto maior o grau de consenso sobre determinada matéria de direito internacional, mais apropriado ao judiciário de cada país proferir julgados sobre tal área. O órgão julgador pode concentrar seus esforços na aplicação de um princípio em concordância aos interesses da comunidade internacional, ao invés de se empenhar na tarefa por vezes subjetiva de estabelecer um princípio inconsistente com a justiça das nações.
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