É com grande entusiasmo que todos que militam na área da Execução Penal recebem a Lei 12.433/11 que altera substancialmente um dos institutos mais importantes e mais discutidos nessa seara.
De plano percebe-se pela alteração no art. 126 da Lei de Execuções Penais pelo qual a remição foi estendida ao preso que estuda. Tal posicionamento já vinha sendo aplicado pelos tribunais superiores (Súmula 341 do STJ) com certa notoriedade em que pese ainda existirem vozes contrárias [01]. Nada mais produtivo do que dar oportunidade aqueles que cometeram crimes de estudar, qualificar-se e, quem sabe assim, efetivamente promover uma reinserção social do custodiado.
Não há como negar a importância de oferecer ao apenado uma luz no fim do túnel, uma ocupação, seja um trabalho interno ou externo ou um curso profissionalizante, parece ser uma das poucas soluções para que após cumprir sua reprimenda (sim, um dia ele vai sair da prisão) não se torne mais um reincidente.
Ao positivar a possibilidade de remição pelo estudo, o legislador também definiu em que termos o fará, acabando com uma longa discussão a respeito da quantidade de horas estudadas para cada dia remido. No parágrafo 1º do art. 126, em seu inciso I ficou consignado que a remissão obedecerá a cada 12 horas de frequência escolar, ao longo de pelos menos 3 dias, remir-se-á 1 dia de pena.
De igual modo também não deixou margem a dúvidas o legislador ao definir as atividades que são consideradas frequência escolar: atividade de ensino fundamental, médio, inclusive profissionalizante, ou superior, ou ainda de requalificação profissional.
Prosseguindo na análise das mudanças, a fim de não dar margem a dúvidas, no parágrafo 2º do art. 126 detalhou a lei que a forma pode ser presencial ou telepresencial desde que certificadas pelas autoridades educacionais competentes. A lei 12.433 vai mais além, permite a cumulação de remição por estudo e trabalho (126 § 3º) desde que compatíveis e continua beneficiando com a remição o apenado que por acidente de trabalho que fique impossibilitado de trabalhar e agora estudar.
Nesse sentido, a lei traz uma espécie de bonificação extremamente pertinente. Caso o condenado conclua o ensino fundamental, médio ou superior, o tempo a remir será acrescido de 1/3, consoante a nova redação do art. 126, § 5º. Uma inovação que certamente estimulará o preso a não abandonar os estudos vez que é reconhecidamente alta a evasão escolar no âmbito do sistema prisional.
Como o trabalho era pressuposto para o ingresso no regime aberto, não havia remissão para aqueles que se encontravam nesse regime, todavia, com o reconhecimento do estudo abre-se a possibilidade para aquele que cumpre em regime aberto continuar remindo a pena se estiver frequentando curso de educação regular ou profissionalizante (art. 126, § 6º).
De outra banda, possibilitou, expressamente, que todo o instituto da Remição fosse aplicado à prisão cautelar assim como definiu que, antes de ser declarada pelo juiz da execução, além do Ministério Público a defesa também deve ser ouvida (art. 126, § 8º). E, com todas as mudanças advindas da Lei 12.403, inúmeras questões surgirão a respeito da aplicação da remição face ao novo regramento das cautelares. Todas as cautelares serão objeto de remição? Como proceder a contagem? Questões para outro debate.
Com efeito, o teor art. 127 da LEP foi revogado, não obstante a constitucionalidade do mesmo (súmula vinculante nº 09), declarada pelo Supremo Tribunal Federal para o qual a sentença que declarava a remissão dos dias trabalhados constituía apenas uma mera expectativa de direitos que, em caso de falta grave, caía por terra posto que a decisão que concedia a remissão não faz coisa julgada e direito adquirido.
Ora, caso o condenado cometesse uma falta grave perderia todo o tempo remido, trabalhado ou estudado, chegava-se a absurdos como o citado pelo Professor e Defensor Público do Rio de Janeiro Fellipe Borring Rocha:
"O preso J. C. M. M., interno de um presídio no Rio de Janeiro, exercia trabalho intra-muros há vários anos, desde a Delegacia de Polícia, quando foi preso, até a data que se envolveu numa briga por causa de cigarro. Em decorrência deste evento, J. C. M. M. foi punido com falta grave e perdeu dois anos e três meses de remição que tinha obtido. Ao ser comunicado desta situação o preso indagou: "Doutor, eles sabem o que estão fazendo comigo?"
Enfim, tal situação não se repetirá, andou muito bem o legislador ao definir na nova redação do art. 127 da Lei de execuções Penais que, em caso de falta grave, o juiz poderá revogar até 1/3 dos dias remidos observada a natureza da falta, os motivos, as circunstâncias e as consequências do fato (art. 57). De modo que chegou-se a uma posição intermediária, que apesar de punir o preso que comente falta grave permite-se ao juiz uma avaliação pormenorizada e discricionária em cada caso.
Outro aspecto a se denotar, consiste na definição de que os dias remidos devem ser computados como dias efetivamente cumpridos, e, agora para todos os efeitos. Na antiga redação do art. 128 restringia-se o efeito para a concessão de livramento condicional e indulto, resolvendo, portanto os inúmeros debates que eram lançados sob a possibilidade de contagem para a progressão de regime [02].
Não é descabido mencionar a importância da contagem como dias efetivamente cumpridos, e, não como usualmente é feito abatendo-se os dias remidos do fim da pena. Exemplifiquemos para demonstrar o caráter mais benéfico daquela:
Imaginemos por exemplo, um sentenciado reincidente que foi condenado a 10 anos, cumpriu e trabalhou três anos, logo, terá direito a remir 1 ano de pena e pretende obter o livramento condicional, o qual somente terá direito quando cumprir metade da pena. Nesta situação, se subtrairmos do fim da pena ele terá cumprido 3 anos de um total de 9 e se contabilizarmos como efetivamente cumpridos 4 anos de 10.
A primeira vista parece não haver diferença uma vez que em ambas as situações faltam 6 anos para o fim da pena, todavia, para a concessão do referido benefício, na primeira o preso terá que cumprir 1 ano e 6 meses para alcançar a metade de 9 anos (4 anos e 6 meses) ao passo que na segunda com apenas 1 ano (5 anos) poderá requerer o livramento condicional.
Por fim, o art. 129 da Lei 12.433 atribui a função à autoridade administrativa de encaminhar mensalmente ao juízo da execução cópia do registro de todos os condenados que estejam trabalhando ou estudando, com informação dos dias de trabalho ou das horas de frequência escolar ou de atividades de ensino de cada um deles. Impõe também que o condenado autorizado a estudar fora do estabelecimento penal comprove mensalmente, por meio de declaração da respectiva unidade de ensino, a frequência e o aproveitamento escolar. Neste artigo e seus parágrafos o legislador tem por escopo apenas adequar a LEP à remição pelo estudo.
Outro ponto deveras importante é a retroatividade desta Lei, certo de que a doutrina diverge sobre a natureza deste instituto se material ou processual, me filio aos partidários da primeira, vez que trata de regra que incide diretamente sobre o quantum da pena, e, por conseguinte, entendo que seja possível Revisão Criminal para todos os condenados que foram prejudicados com entendimento diferente.
Preleciona nesse sentido o professor Renato Marcão, citando decisão do extinto Tribunal de Alçada de São Paulo:
"A remição da pena se traduz numa inequívoca redução punitiva, e tudo quanto se refira ao preceito sancionatório é de Direito Penal Material. Pouco importa que a norma sobre remição tenha sido inserida na fase de execução da pena. Esta circunstância não lhe retira a condição de regra penal favorecedora do condenado e que terá forçosamente de retroagir, se preenchidos os demais requisitos" (TACrim, Ag. 596377/1, 12ª Câm. , rel. Juiz Gonzaga Franceschini, j. Em 2.2.90, v.u., RT, 652/300)
Para arrematar, as mudanças trazidas para o ordenamento jurídico pela lei 12.433/11 em uma primeira análise promovem uma adequação entre o direito positivado e a jurisprudência dominante. Ademais, ressaltam o caráter ressocializador como fim das penas privativas de liberdade de sorte que propõem uma maior preocupação com a função social e constitucional da pena. Não se negue que há muito a prisão vem sendo tratada como depósito humano, que cumpre uma função social inegável: tirar da sociedade o delinquente, entretanto, como já mencionei acima, o criminoso um dia irá retornará ao convívio da sociedade, ressocializado ou não.
Nessa ótica não existe outro caminho senão o de, ao menos, tentar dar oportunidade ao criminoso de cumprir sua reprimenda e ao fim ter uma escolha. E assim, se ele reincidir ao sair da prisão, o sistema não haverá falhado totalmente porque outorgou àquele bandido a oportunidade, que talvez ele nunca tenha tido em sua vida, ofereceu-lhe o poder de escolha. Já é um bom começo.
Fontes:
MARCÃO, Renato. Curso de Execução Penal – 7ª ed. rev. e atual. - São Paulo: Saraiva, 2009.
ROCHA, Felippe Borring. Remição: reflexões acerca da interpretação jurisprudencial prevalente do art. 127 da Lei de Execuções Penais. Jus Navigandi, Teresina, ano 5, n. 44, 1 ago. 2000. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/1094>. Acesso em: 18 mar. 2011.
LEIRIA, Cláudio da Silva. Remição da pena. Jus Navigandi, Teresina, ano 12, n. 1564, 13 out. 2007. Disponível em:<http://jus.com.br/revista/texto/10501>. Acesso em: 19 mar. 2011.
MESQUITA Júnior, Sidio Rosa . Execução Criminal: teoria e prática: doutrina, jurisprudência, modelos. 6ª ed. - São Paulo: Atlas, 2010
Notas
01"A Lei de Execução Penal também não prevê remição pelo estudo. No entanto, muitos juízes, em interpretação claramente afrontosa à Lei, concedem abatimento de pena (remição) pelo fato de o preso estar estudando, sem qualquer parâmetro legal de equiparação com o trabalho. Por exemplo, cada juiz adota um critério subjetivo e variável de número de horas de estudo para efetuar o desconto de um dia de pena". (LEIRIA, Cláudio da Silva. Remição da pena. Jus Navigandi, Teresina, ano 12, n. 1564, 13 out. 2007. Disponível em:<http://jus.com.br/revista/texto/10501>. Acesso em:19 mar. 2011).
02 "Com base no preceito do art. 11 da LEP, Mirabete ensinava que os dias remidos deveriam ser considerados no momento da progressão de regime (…)
Discordo do posicionamento do referido mestre porque a lei é expressa em dizer que a remição da pena, pelo trabalho, só será computada, além de seu efeito natural sobre a antecipação do final da execução, para a concessão de indulto e do livramento condicional. (...)" ( MESQUITA Júnior, Sidio Rosa . Execução Criminal: teoria e prática: doutrina, jurisprudência, modelos. 6ª ed. - São Paulo: Atlas, 2010)