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Hedge e derivativos: aspectos jurídicos da internalização do risco

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Agenda 19/10/2011 às 13:30

6. Síntese, recomendações e conclusões

Os derivativos são contratos idôneos para a transferência de riscos, seja com a intenção de especular ou de produzir proteção contingencial quanto a variações futuras (hedge) de ativos ou valores de ativos. Estes contratos são tecnologias financeiras necessárias para o financiamento de atividades produtivas propiciando liquidez e reduzindo risco e, conseqüentemente, o custo – quando empregados no momento e quantidade apropriados. Assim como, teoricamente, podem ocasionar perdas ilimitadas, quando os ativos não são de titularidade ou interesse das partes.

Com o crescente ingresso de pequenos investidores ao mercado de derivativos, atraídos muitas vezes por ofertas públicas fundadas em campanhas publicitárias significativas, a aplicação de disposições do Código Civil e do CDC são crescentes nesse ambiente, considerando as peculiaridades destas relações.

Os prejuízos financeiros, simultâneos a lucros operacionais significativos, apresentados por empresas brasileiras de capital aberto, graças à celebração do contrato estudado não revelam atos propriamente ilícitos, violando apenas as regras de governança corporativa e demonstrando a necessidade de aprimoramento da lex mercatoria mesmo que através da soft law, em casos análogos, não para proibir tais operações, mas sim, para informar os verdadeiros donos da sociedade, acionistas, dos riscos assumidos pelos gestores. Não estará caracterizada desobediência do dever de diligência (LSA artigo 153) desde que os atos sejam fundamentados e transparentes, por mais arriscados que sejam, exatamente porque quem elege a administração representa o capital dos proprietários que são os beneficiários principais, caso haja sucesso na gestão. A solução para esse problema não estará nas leis, mas sim, na cultura da governança corporativa.

A História demonstra que os mecanismos de alavancagem, como os contratos de derivativos, foram usados desde tempo remotos com no exemplo de Aristóteles e com significativo reflexo global desde a tulipomania de 1636. Essa tecnologia, como a maioria dos conhecimentos humanos, pode ser usada de diversas maneiras – entre a extrema cautela até a total falta de responsabilidade.

Quando aqueles que assumirem altos riscos não tiverem problemas serão festejados como gênios e administradores competentes, por outro lado, quando houver outra crise especulativa – e certamente haverá dada a natureza cíclica dos mercados – e os administradores sofrerem revezes, serão execrados como vilões, responsabilizados por todos os males da economia [20] e até taxados como criminosos. Só esquecem os acusadores, quando se consideram vítimas, que o poder de administração e as regras para a atuação destes gestores foi emitida por eles, como investidores.


REFERÊNCIAS:

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Notas

  1. A Psicologia é necessária até para o entendimento dos termos próprios do mercado de capitais – onde ficam claros os mitos e os arquétipos nas figuras metafóricas do bear (ou bearing); ou do bull (ou bullish – dentre outras polissemias, como go-go boys referenciada até mesmo por Galbraith (1992). É importante citar, ainda nessa seara, que há termos que não podem ser confundidos como o problema do golden shower com a questão do golden share nem o wife swap com os contratos de swap devidamente detalhados a seguir.
  2. Essa definição é repetida em diversas obras diferenciadas como em Requião (2002) e em Galbraith (1992).
  3. O Teorema da internalização das externalidades de Coase (1990) é o fundamento de muitas tutelas e tecnologias jurídicas contemporâneas como demonstrou Rodrigues (2008), esse conceito de <<internalidade>> também é desenvolvido como base da análise econômica nas obras de Posner (2002) e Becker (1997).
  4. Hedge é uma expressão inglesa que significa originalmente sebes, barreira, cerca, muro, limite – proteção; no mercado de capitais são assim denominados os dispositivos de proteção, através de operações financeiras, contra o risco de grandes variações de preço de determinado ativo. Ou seja, fazer hedge significa usar contratos de derivativos para internalizar o risco.
  5. Paracelso, pseudônimo de Phillipus Aureolus Theophrastus Bombastus von Hohenheim, foi um famoso médico, alquimista, físico e astrólogo suíço.
  6. Robert Merton e Myron Scholes desenvolveram um método de precificação dos derivativos conhecido como modelo ou equação de Black-Scholes – motivo que fundamentou expressamente a atribuição do referido prêmio.
  7. O Prêmio de Ciências Econômicas, oficialmente denominado Prêmio Sveriges Riksbank de Ciências Econômicas em Memória de Alfred Nobel (em sueco Sveriges riksbanks pris i ekonomisk vetenskap till Alfred Nobels minne), foi instituído em 1968 pelo Sveriges Riksbank, o Banco Central da Suécia. Devido à inclusão da dedicatória a Alfred Nobel é vulgarmente referido como Prêmio Nobel de Economia, mas não é concedido pela Fundação Nobel, nem reconhecido pelos seus descendentes, mas sim pago com dinheiro público.
  8. Para uma fonte segura sobre os aspectos financeiros das sociedades por ações, dos mercados monetários e de capitais, inclusive explicando o modelo citado sobre derivativos, aconselha-se a leitura da obra do catedrático do Massachusetts Institute of Technology – MIT Stephen A. Ross (2008): "Administração Financeira: corporate finance".
  9. Também houve casos análogos em outras sociedades abertas como a Aracruz Celulose (ARCZ) em que as perdas com derivativos cambiais de R$2,9 bilhões – produziram um resultado negativo de mais de 4 bilhões; mas, as conseqüências foram mais complicadas e menos previsíveis neste caso do que no da Sadia, incluindo operações societárias com severos prejuízos a preferencialistas.
  10. São pressupostos dos mercados eficientes – como simplificação da realidade cheia de imperfeições – a pulverização dos agentes a ponto que o comportamento de um não afeta de maneira significante os preços (mercado atomizado); a uniformidade e amplo acesso à toda informação existente; a ausência de impostos e de custos de transação.
  11. Uma tradução literal expressa "não existe essa coisa de almoço grátis", mas esse jargão em português costuma ser expresso como "não existe lanche grátis" com variantes até mesmo em inglês como o "no pain no gain" muito aplicado nos esportes e ambientes competitivos. Essa frase foi popularizada por Milton Friedman que, inclusive publicou um livro utilizando-a como título, embora existam referências anteriores de seu uso. A idéia expressa é simples – uma vez que os recursos são limitados e as demandas ilimitadas; assim como, os serem humanos comportam-se como maximizadores de suas satisfações pessoais, mesmo sob condicionamentos – alguém sempre tem que pagar a conta. Essa verdade singela e concreta é o grande obstáculo naturalístico para a prática do Estado Social, dos Estados Socialistas e das construções teóricas homologas que prevêem maior distribuição que produção de riquezas.
  12. Em uma noção mais ampla que os shareholders (acionistas) a expressão stakeholders inclui todos os interessados na empresa – que além dos sócios abarca empregados, fornecedores, consumidores e outros.
  13. Segundo este relato, o filósofo Tales usou seus conhecimentos da natureza, baseado na filosofia clássica, para prever uma safra recorde de azeitonas em sua cidade natal na Ásia Menor, Mileto. Feito isto, comprou opção de usar com exclusividade os moinhos que as processavam, opção esta que alienou por significativa remuneração quando a safra favorável se verificou.
  14. Na transação de derivativos é possível perda de todo o montante investido e, em certos casos, é possível perda maior que o investimento inicial. Assim como, nesta modalidade de contrato é possível lucros acima de 1000% em curto prazo (e sem deixar de ser lícito).
  15. A conseqüência jurídica deste entendimento seria a obrigatoriedade para toda e quaisquer operação de derivativos de registro em mercado de balcão organizado ou em sistema administrado por bolsa de valores, bolsa de mercadorias e de futuros ou por entidade de registro e de liquidação financeira de ativos, devidamente autorizado pelo Banco Central ou pela CVM.
  16. Stuber (2009) ainda considera as operações de swap como o instrumento mais eficaz para proteção contra flutuação indesejada de taxas, pela possibilidade, em um só contrato, de realizar o hedge (proteção)de duas posições, cada uma com um indexador diferente. Os principais fatores que dão origem ao contrato de swap são: (i) diferença entre ativo e passivo dos contratantes, ocasionando algum tipo de risco; e (ii) diferença nos dias de vencimentos de obrigações a pagar. Os tipos mais comuns de swap são: (a) swap de vencimento; (b) swap de taxa; e (c) swap de qualidade (quando se buscam garantias mais eficazes). A operação pode ainda ser estimulada por variações nos impostos incidentes sobre a obrigação, gerando vantagens fiscais ou perdas dedutíveis pela mudança de posição. A modalidade mais comum de swap é denominada plain vanilla, que é a troca de uma taxa pré-fixada por uma taxa flutuante, e vice-versa. Operações com swap são utilizadas nos mercados de ouro ativo financeiro, taxas de câmbio, taxas de juros, ações, mercadorias e índices de preços e de ações, além de opções não padronizadas referenciadas em debêntures simples ou conversíveis em ações, em notas promissórias e em ações de companhias abertas.
  17. Para um aprofundamento na doutrina sobre causa (ou função) dos contratos uma referência segura é a Dissertação do Prof. Dr. Antônio Augusto Brandão de Aras "A causa e os contratos".
  18. As opções de compra e venda também são denominadas de call e put – quando, mais uma vez, a terminologia técnica adota o idioma inglês. Ainda comparando padrões estrangeiros e nacionais, sobre o exercício da opção, pode-se detalhar que existe o sistema americano (exercer a qualquer tempo) e o europeu (exercer apenas em data pré-estabelecida). No Brasil co-existem os dois sistemas; no caso das opções sobre ações i.e. – por determinação da Bovespa – há opções disciplinadas pelos diferentes sistemas e o vencimento ocorre na terceira segunda-feira do mês.
  19. Na época da Livre Docência em Economia Política de J.J. Calmon de Passos, Edivaldo M. Boaventura e do próprio professor Washington Trindade (1964) o grade desafio do Estado e do Direito era modificar a realidade – superando as metas de crescimento ou progresso – promovendo o desenvolvimento através do Direito Econômico. Hoje o desafio que a realidade impõe ao Estado e ao Direito é ainda mais complexo: promover o desenvolvimento sustentável – uma mudança de paradigmas que satisfaça as necessidades presentes sem privar as gerações futuras – sob pena de extinção da raça humana, ou pelo menos, do fim do progresso material da civilização. Outro argumento definitivo em prol da teoria da justiça como eficiência e que demonstra a seriedade do atual desperdício de recursos no assistencialismo estatal a que muitos denominam Estado Social Brasileiro.
  20. Essa visão aparentemente ingênua e ignorante foi repetida até mesmo pelo Presidente da República Federativa do Brasil a fazer afirmação pública e notória – uma maneira reprovável – que os responsáveis pelos problemas nacionais eram "os banqueiros brancos e com olhos azuis" que teriam, segundo ele, provocado uma crise mundial vitimando, mais uma vez, "negros e índios". O Professor Walter Williams ensina exatamente o contrário: que a crise de 2008 é devido a políticas compensatórias e a excesso de intervenção estatal.
Sobre o autor
Renato Amoedo Nadier Rodrigues

Graduado em Direito (UFBA) e Engenharia de Produção Civil (UNEB); Mestre em Direito Privado e Econômico (UFBA); e doutorando do Programa de Pós Graduação em Administração (Finanças Estratégicas) da Universidade Presbiteriana Mackenzie.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

RODRIGUES, Renato Amoedo Nadier. Hedge e derivativos: aspectos jurídicos da internalização do risco. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 3031, 19 out. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/20250. Acesso em: 23 dez. 2024.

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