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O poder de veto no ordenamento jurídico brasileiro

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Agenda 02/03/2012 às 15:17

 

5. Conclusão

Com a intenção de caracterizar o poder de veto em sentido amplo, com vistas a evidenciar a sua natureza dual (misto de jurídico e político) e o seu regramento atualmente vigente no Brasil, o presente artigo apresentou seus conceitos e enfatizou o papel por ele desempenhado como um dos elementos do sistema de freios e contrapesos no Estado moderno, o qual tem como função precípua a estabilidade dos sistemas de governo fundados nos princípios da teoria da separação dos poderes concebida por Montesquieu em meados do século XVIII.

 Na mesma medida, indicou alguns elementos relativos à trajetória histórica do veto e distinguiu os seus tipos, ainda que não existentes no modelo brasileiro. Fundamentalmente, a complexificação das relações sociais ao longo do tempo promoveu o aperfeiçoamento do instituto conforme as necessidades e os interesses particulares de cada Estado, o que gerou a multiplicação das maneiras pelas quais o seu detentor poderia fazer uso dessa prerrogativa institucional. Ademais, o trabalho buscou detalhar o modo como o poder de veto está presentemente disciplinado no ordenamento jurídico nacional, amparando-se na CF de 1988. Basicamente, a forma prevista é a expressa, nos tipos total ou parcial, por razões de inconstitucionalidade e/ou contrariedade ao interesse público. Em relação aos termos, os prazos do Executivo são de 15 dias úteis para a análise do projeto de lei e 48 horas para a comunicação do veto ao Legislativo. Da parte do Legislativo, por sua vez, o prazo para reflexão sobre razões de veto advindas do Executivo é de 30 dias, sendo que a sua apreciação ocorre sob a forma secreta, na qual o quórum para a derrubada é a maioria absoluta.


 

Referências

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Notas

[1] Artigo extraído da Dissertação intitulada Os Significados político-institucionais do uso do veto na relação Executivo-Legislativo em Pelotas (RS) no período 2001-2008, apresentada no ano de 2011 ao Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais (PPGCS) do Instituto de Sociologia e Política da Universidade Federal de Pelotas (ISP/UFPel), como requisito parcial à obtenção do titulo de Mestre em Ciências Sociais.

[2] Instituto porque ele constitui-se como “um conjunto de regras institucionalizadas, as quais regulam a relação entre o Executivo e o Legislativo no campo da produção de leis e, como tal, impõem constrangimentos e limites à ação dos atores em questão” (GROHMANN, 2003, p. 4).

[3] Embora já tenha ficado claro que o artigo versa sobre o veto do Executivo apresentado a projeto de lei, é importante registrar que a expressão poder de veto aqui utilizada não se confunde com aquela formulada por Tsebellis (1997, 2009), a qual se refere a atores que precisam necessariamente manifestar a sua concordância (ou deixar de indicar a discordância) para que uma política pública possa ser implementada e os desdobramentos decorrentes dessa condição. Há, evidentemente, relação entre elas, pois o poder que o trabalho se propõe a estudar está contemplado pela concepção elaborada por aquele autor. No entanto, a expressão é aqui considerada em um sentido mais delimitado, a partir da concepção geral de check and balances inserida na teoria dos três poderes. Para dirimir a eventual ambiguidade, oriunda das diferenças de amplitudes entre os dois enfoques, talvez fosse recomendada a utilização da nomenclatura veto legislativo, tal como aplicada por Britto (1966). Contudo, neste trabalho a sugestão do autor se mostra redundante em função da consolidação do instituto como elemento incidental próprio do processo legislativo tendente à criação de leis. Sem embargo, Rodrigues (1981) e Vasconcelos (1994) empregam o termo em acepções diferentes da utilizada por Britto (1966): o primeiro usa-o para fazer referência à rejeição legislativa ao veto oposto pelo Executivo; e o segundo para se referir à resolução parlamentar sobre a conformidade da norma produzida pelo Executivo, quando do exercício da delegação de competência legislativa pelo parlamento no sistema inglês (o chamado laying system). Enfim, sem desconhecer um sentido mais amplo da expressão, o trabalho entende por poder de veto a prerrogativa do poder Executivo de negar sanção aos projetos de lei aprovados pelo Legislativo.

[4] Publicada pela primeira vez no ano de 1748.

[5] Montesquieu não foi o primeiro a pregar a separação de poderes; antes dele Locke (1978) já havia proposto semelhante arranjo em sua obra intitulada Segundo Tratado sobre o Governo Civil. O que de fato distingue e coloca Montesquieu em posição superior a seu antecessor é precisamente a ideia de especificação funcional das atribuições de cada um desses poderes, bem como a auto-limitação estatal por meio de um controle recíproco entre os três poderes, com o objetivo de manter o Estado moderado.

[6] Sobre esse mote Moraes (2006, p. 389) destaca que a Constituição Federal “atribuiu diversas funções a todos os Poderes, sem, contudo caracterizá-la com a exclusividade absoluta. Assim, cada um dos Poderes possui uma função predominante, que o caracteriza como detentor de parcela da soberania estatal, além de outras previstas no texto constitucional. São as chamadas funções típicas e atípicas” (destacado no original).

[7] Moreira Neto (1989) não afasta a possibilidade de existência de formas combinadas de controle.

[8] A título de informação, seguem abaixo exemplos de peças da engrenagem do sistema de freios e contrapesos presentes na CF de 1988.

Controle do Executivo sobre o Legislativo (art. 84, V): “Compete privativamente ao Presidente da República: [...] V - vetar projetos de lei, total ou parcialmente”;

Controle do Executivo sobre o Judiciário (art. 101, parágrafo único): “Os Ministros do Supremo Tribunal Federal serão nomeados pelo Presidente da República, depois de aprovada a escolha pela maioria absoluta do Senado Federal”;

Controle do Legislativo sobre o Executivo (art. 49, V): “É da competência exclusiva do Congresso Nacional: [...] V - sustar os atos normativos do Poder Executivo que exorbitem do poder regulamentar ou dos limites de delegação legislativa”;

Controle do Legislativo sobre o Executivo e o Judiciário (art. 58, § 3º): “As comissões parlamentares de inquérito, que terão poderes de investigação próprios das autoridades judiciais, além de outros previstos nos regimentos das respectivas Casas, serão criadas pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal, em conjunto ou separadamente, mediante requerimento de um terço de seus membros, para a apuração de fato determinado e por prazo certo, sendo suas conclusões, se for o caso, encaminhadas ao Ministério Público, para que promova a responsabilidade civil ou criminal dos infratores”;

Controle do Judiciário sobre o Legislativo (art. 102, I, a): “Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe: I - processar e julgar, originariamente: a) a ação direta de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo federal ou estadual e a ação declaratória de constitucionalidade de lei ou ato normativo federal”;

Controle do Judiciário sobre o Executivo (art. 103, § 2º, in fine): “As decisões definitivas de mérito, proferidas pelo Supremo Tribunal Federal, nas ações diretas de inconstitucionalidade e nas ações declaratórias de constitucionalidade produzirão eficácia contra todos e efeito vinculante, relativamente aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal”.

[9] Latu sensu uma vez que engloba tanto leis ordinárias e complementares, quanto leis de conversão.

[10] É o caso do veto parcial, estabelecido primeiramente na Constituição da Pensilvânia, em 1873.

[11] Rodrigues (1993) ainda vai além. Valendo-se dos estudos arqueológicos de C. W. Ceram, identifica na civilização hitita, império situado à Ásia Menor, por volta de três milênios atrás, as mais longínquas raízes do poder de veto.

[12] Como restou explicitado em nota anterior, esta caracterização está correta, mas é um pouco ampla, assemelhada àquela formulada por Tsebellis (1997, 2009), razão pela qual o artigo circunscreve o poder de veto a um atributo do Executivo.

[13] Outro traço marcante do histórico do veto evidenciado por Britto (1966) é a sua transposição de detenção de um ator político-social para outro: na Grécia passa das Assembleias para o povo; na Roma da plebe para o Senado; já na Inglaterra do povo para o monarca.

[14] Guardadas as devidas preferências terminológicas dos autores.

[15] É o arquétipo que molda o poder de veto brasileiro, como será detalhado na sequência.

[16] Na maioria das vezes não mais sob um quórum simples, mas sim sob um quórum qualificado.

[17] Neste ponto Britto (1966) é mais detalhista do que Rodrigues (1993), visto que desdobra o veto denominado limitado de sua classificação em três outras formas: suspensivo, qualificado e reenvio. Aqui, porém, preferiu-se não aprofundar tais formas, por considerá-las espécies do gênero limitado.

[18] Exemplificativamente, se por um lado a Emenda Constitucional nº 17 de 1965 aprimorou o veto parcial ao especificar os elementos textuais passíveis de sua incidência; por outro, a Emenda Constitucional nº 1 de 1969 suprimiu, até a superveniência da CF de 1988, essas mesmas limitações formais que o cingiam a frações individuais da lei.

[19] Conforme preceitua o art. 59 da CF de 1988, a terminologia processo legislativo abrange os processos de elaboração de: “I - emendas à Constituição; II - leis complementares; III - leis ordinárias; IV - leis delegadas; V - medidas provisórias; VI - decretos legislativos; VII – resoluções”.

[20] Malgrado ainda haver uma discussão nos meios jurídicos e acadêmicos em torno da definição da natureza jurídica do veto, se executiva ou legislativa, optou-se pela corrente que o considera como uma atribuição legislativa. Dentre outros, podem ser agrupados: Britto (1966) e Cunha (1981) do lado partidário do caráter legislativo do veto; e Rodrigues (1981) e Isern (2002) do lado defensor do caráter executivo do instituto.

[21] A etapa de controle de constitucionalidade preventivo das leis, ou, melhor dizendo, “o método pelo qual se previne a introdução de uma norma inconstitucional no ordenamento, [o qual] ocorre antes ou durante o processo legislativo” (ISERN, 2002, p. 65), comporta duas fases: primeiramente através das Comissões de Constituição e Justiça das casas legislativas, quando da instrução processual; e, secundariamente, como supracitadamente referido, por meio do veto do Executivo.

[22] Depois de emitido o veto, não há possibilidade de retratação.

[23] Por revestir-se de característica política, o veto é insuscetível de apreciação judicial.

[24] Art. 66, § 6º, da CF de 1988: “Esgotado sem deliberação o prazo estabelecido no § 4º, o veto será colocado na ordem do dia da sessão imediata, sobrestadas as demais proposições, até sua votação final”.

[25] Na situação atual: 257 votos de deputados federais e 41 de senadores.

[26] Isern (2002) diz ser equivocado o emprego da expressão projeto de lei no § 5º, do art. 66, do texto constitucional. Seu argumento é de que “o que se promulga é a lei e não o seu projeto, como pretende o dispositivo referido” (Idem, p. 83).

[27] No art. 66, § 5º, verifica-se que “se o veto não for mantido, será o projeto enviado, para promulgação, ao Presidente da República”. Na mesma medida, no § 7º, que “se a lei não for promulgada dentro de quarenta e oito horas pelo Presidente da República, nos casos dos § 3º e § 5º, o Presidente do Senado a promulgará, e, se este não o fizer em igual prazo, caberá ao Vice-Presidente do Senado fazê-lo”.

 

Sobre o autor
Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

HETSPER, Rafael Vargas. O poder de veto no ordenamento jurídico brasileiro. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3166, 2 mar. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/21211. Acesso em: 22 dez. 2024.

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