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Da (im)possibilidade de responsabilização do advogado em indenização por perdas e danos na litigância de má-fé

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Agenda 25/05/2012 às 15:07

3. DA (IM)POSSIBILIDADE DE RESPONSABILIZAÇÃO DO ADVOGADO EM INDENIZAÇÃO POR PERDAS E DANOS NA LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ

3.1. Noções gerais

Dispõe a Constituição da República Federativa do Brasil, no seu artigo 133, ser o advogado “indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei”, razão pela qual cabe, ainda, destacar que é por intermédio dele que se exerce o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ele inerentes. Referida disposição constitucional é complementada pelo artigo 2º da Lei nº 8.906, de 04 de Julho de 1994, no sentido de que o advogado, no seu ministério privado, presta serviço público, exerce função social e seus atos são múnus público.

O advogado, no exercício profissional, ao atuar como patrono da parte, ainda que seja sujeito parcial do Processo, não poderá postular sem observar e fazer cumprir os limites a ele impostos no exercício de seu mister e devidamente estabelecidos no Código de Processo Civil, no Estatuto da Advocacia e no Código de Ética e Disciplina da Ordem dos Advogados do Brasil.

Sendo assim, no Código de Processo Civil, os artigos 14 e 15, os quais disciplinam os deveres das partes e de todos aqueles que, de qualquer forma, participam do processo, são aplicáveis aos advogados. Ainda no Código de Processo Civil, é possível constatar outros deveres que são impostos aos advogados, tais como, o de declarar, na petição inicial ou na contestação, o endereço em que receberá intimação (art. 39, I), o de continuar representando o mandante nos dez dias seguintes à renúncia ao mandato (art. 45) e o de restituir os autos em cartório no prazo legal (art. 195).

Já no Estatuto da Advocacia (Lei nº 8.906, de 04-07-1994), constatam-se regras de ordem técnica e ética, as quais devem ser observadas pelo advogado. A título de exemplificação, deve-se dar ênfase ao disposto no art. 31, do referido estatuto, o qual dispõe que “o advogado deve proceder de forma que o torne merecedor de respeito e que contribua para o prestígio da classe e da advocacia”. Desta forma, como dito alhures, deve o patrono da parte, no exercício de sua profissão, postular em conformidade com os princípios da boa-fé, lealdade e probidade processuais.

Além disso, deve-se destacar, por oportuno, que o advogado, de acordo com o art. 32, do Estatuto de Advocacia, é responsável pelos atos que, no exercício profissional, praticar com dolo ou culpa e, em caso de lide temerária, será solidariamente responsável com seu cliente, desde que coligado com este para lesar a parte contrária, o que deverá ser devidamente apurado em ação própria para essa finalidade.

Já no que tange ao Código de Ética e Disciplina da Ordem dos Advogados do Brasil, há de se destacar inicialmente que:

O Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, ao instituir o Código de Ética e Disciplina, norteou-se por princípios que formam a consciência profissional do advogado e representam imperativos de sua conduta, tais como: os de lutar sem receio pelo primado da Justiça; pugnar pelo cumprimento da Constituição e pelo respeito à Lei, fazendo com que esta seja interpretada com retidão, em perfeita sintonia com os fins sociais a que se dirige e as exigências do bem comum; ser fiel à verdade para poder servir à Justiça como um de seus elementos essenciais; proceder com lealdade e boa-fé em suas relações profissionais e em todos os atos do seu ofício; empenhar-se na defesa das causas confiadas ao seu patrocínio, dando ao constituinte o amparo do Direito, e proporcionando-lhe a realização prática de seus legítimos interesses.[39]

Desta forma, percebe-se que citado Código serve como modelo de conduta a ser seguida pelos profissionais do Direito, em especial, o advogado, o qual atua nas diferentes instâncias do Poder Judiciário, ao defender os interesses de seu cliente, em quaisquer que sejam as situações alcançadas pelo Direito.

Também estão presentes, no Código de Ética e Disciplina, normas que regulam os deveres específicos dos advogados. Assim, de acordo com o parágrafo único do artigo 2º, do mencionado Código, são deveres do advogado, por exemplo, o de preservar, em sua conduta, a honra, a nobreza e a dignidade da profissão; o de atuar com honestidade, decoro, veracidade, lealdade, dignidade e boa-fé; o de aconselhar o cliente a não ingressar em aventura judicial, bem como o de pugnar pela solução dos problemas da cidadania e pela efetivação dos seus direitos individuais, coletivos e difusos, no âmbito da comunidade.

O Código de Ética e Disciplina também destaca, no seu art. 6º, ser defeso ao advogado “expor os fatos em Juízo falseando deliberadamente a verdade ou estribando-se na má-fé”. Assim, como se vê, há a finalidade do Código em zelar pela conduta processual proba do advogado que, no exercício profissional, deverá proceder com veracidade, lealdade, dignidade e boa-fé.

Neste contexto, cabe ressaltar o artigo 33, do Estatuto da Advocacia, o qual, enfatizando a importância e obrigatoriedade no cumprimento dos deveres impostos ao advogado, prescreve que este se obriga a cumprir rigorosamente os deveres consignados no Código de Ética e Disciplina.

Desta forma, agindo em desconformidade com os deveres regulados no Estatuto da Advocacia e no respectivo Código de Ética, são aplicáveis aos advogados sanções disciplinares, sem prejuízo de eventual punição na esfera criminal, em virtude de o Código Penal Brasileiro prever, no capítulo destinado aos crimes contra a administração da justiça, crimes próprios do advogado ou procurador judicial, tais como o crime de patrocínio infiel previsto no art. 355 e o de sonegação de papel ou objeto de valor probatório previsto no art. 356.

Por outro lado, caso o advogado pratique, no processo, uma das condutas tidas como caracterizadoras de litigância de má-fé, fica sujeito a determinadas sanções previstas no art. 18, do Código de Processo Civil, dentre elas a condenação em indenização por perdas e danos.

Tecidos estes comentários, passa-se a analisar, mais restritamente, a responsabilidade por dano processual do advogado por litigância de má-fé e a (im)possibilidade de sua condenação pessoal. Num primeiro momento, referida análise será feita sob a óptica doutrinária e, posteriormente, sob a óptica jurisprudencial.

3.2. Responsabilidade por dano processual do advogado decorrente da litigância de má-fé e a (im)possibilidade de sua condenação pessoal sob a óptica doutrinária

Inicialmente, cabe destacar a polêmica existente a respeito da aplicação ou não ao procurador judicial da parte da disposição contida no art. 16, do Código de Processo Civil, o qual dispõe sobre a responsabilidade por perdas e danos do autor, réu ou interveniente.

Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery defendem que a norma ora em comento não sanciona o advogado da parte, razão pela qual, caso esta seja reputada como litigante de má-fé em virtude de conduta de seu advogado, poderá exercer o direito de regresso contra o advogado[40]. Acompanha este posicionamento Anne Joyce Angher, ao apontar que, embora aos advogados sejam impostos os deveres processuais previstos nos artigos 14 e 15, do Código de Processo Civil, a estes não se aplicam os artigos 16 a 18 do mesmo Código, que versam sobre a responsabilidade das partes por dano processual.[41]

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Compartilha do mesmo entendimento José Manoel Arruda Alvim, que, em suas anotações ao artigo em comento, enfatiza ser evidente que a lei processual não se refere ao procurador das partes, mas sim aos sujeitos do processo, motivo pelo qual se a parte for reputada litigante de má-fé, por atividade de seu procurador, terá o direito regressivo contra o mesmo.[42]

Nesse mesmo sentido, ainda, destaca Alcides de Mendonça Lima que, caso o causídico, por seu comportamento, causar prejuízos ao seu constituinte, o qual ficou responsável perante o contendor, a parte poderá ingressar com ação regressiva contra seu procurador constituído com a finalidade de ser ressarcida.[43] Compartilha deste entendimento, também, Valentino Aparecido de Andrade[44] e Lúcio Grassi de Gouveia[45].

Comentando sobre esta discussão, Antônio Cláudio da Costa Machado tece uma crítica sobre a limitação da aplicação do art. 16, do Código de Processo Civil, apenas àqueles que atuam como autor, réu ou interveniente: “um dos grandes problemas para aplicação da litigância de má-fé é que a responsabilidade só alcança as partes e não os advogados.”[46]

Por outro lado, em sentido oposto aos mencionados doutrinadores, J.E.Carreira Alvim, defende a possibilidade de responsabilização direta do advogado que, no exercício profissional, conduziu-se de maneira ímproba, apontando que:

O princípio da lealdade processual passa, pois, pela pessoa do procurador da parte, pois, no fundo, seja no processo de conhecimento, seja no de execução ou no cautelar, são os advogados os verdadeiros autores de atos protelatórios, atentatórios e emulativos, que fazem o processo correr fora dos trilhos da lealdade processual. Enquanto se insistir em punir, por deslealdade e má-fé processual apenas as partes – que agem representadas por advogados, e nem sabem o que seja lealdade processual -, estar-se-á tratando da “doença” o paciente errado.[47]

Não obstante a relevância da opinião de J.E.Carreira Alvim, observa-se que o posicionamento majoritário da doutrina pesquisada é no sentido da impossibilidade da aplicação do artigo 16, do Código de Processo Civil, aos advogados, não sendo cabível, portanto, sua responsabilização pessoal e direta em indenização por perdas e danos decorrentes da litigância de má-fé, devendo, assim, à parte ser imputada a sanção de perdas e danos, para que, posteriormente, ingresse com a ação regressiva perante seu procurador judicial para que possa ser ressarcida.

De fato, a responsabilidade por dano processual prevista no art. 16, do Código em comento, não se estende ao advogado, mas tão-somente ao autor, réu ou interveniente, devendo, portanto, a parte que for considerada litigante de má-fé, em virtude de conduta de seu procurador, responder pelos prejuízos a que tiver dado causa, tendo a ação regressiva contra o patrono.

3.3. Responsabilidade por dano processual do advogado decorrente da litigância de má-fé e a (im)possibilidade de sua condenação pessoal sob a óptica jurisprudencial

No âmbito jurisprudencial, por sua vez, destaca-se, inicialmente, que poucos são os julgados emanados pelo Superior Tribunal de Justiça acerca da possibilidade ou não de responsabilização pessoal do advogado, tendo em vista tratar-se de matéria que, regra geral, necessita de reexame fático–probatório, esbarrando, assim, na Súmula nº 7[48] do mencionado Tribunal. Nesse sentido, apenas a título de exemplificação, observa-se trecho de acórdão proferido pelo Superior Tribunal de Justiça, no REsp 1.173.848/RS, relatado pelo Ministro Luis Felipe Salomão, no sentido de que “revisar a decisão que reconheceu a má-fé do recorrente somente seria possível mediante incursão indevida nas provas produzidas nas instâncias ordinárias, o que é defeso em sede de recurso especial”[49], em virtude da incidência do Enunciado da Súmula nº 07/STJ.

No entanto, não obstante o óbice acima mencionado, o Superior Tribunal de Justiça manifestou-se algumas vezes sobre o assunto, sob a justificativa de ser possível examinar a legalidade da condenação em litigância de má-fé, diante de aspectos objetivos, como o seu cabimento, vedado, apenas, investigar a intenção das partes e as condutas processuais.[50]

Desta forma, a partir dos poucos julgados, traçaram-se alguns parâmetros a serem aplicados ao caso em estudo. Observa-se que, em um primeiro momento, o Superior Tribunal de Justiça, por meio de sua Segunda Turma, entendeu pela possibilidade de condenação pessoal do advogado em indenização por perdas e danos decorrentes da litigância de má-fé. Tal entendimento fora expressado no EDcl nos EDcl no AgRg no REsp 494.021/SC[51], no EDcl no AgRg nos EDcl no Ag 438.554/SC[52] e no REsp  986.443/RJ[53], todos de relatoria da Ministra Eliana Calmon, sendo o mais recente datado de 6 de março de 2008.

Em todos estes julgados, o advogado fora condenado ao pagamento de multa, bem como à indenização pelos prejuízos causados. Na primeira decisão, a condenação fora imposta aos advogados como decorrência da omissão no tocante à ocorrência de erro na primeira oportunidade em que se manifestaram nos autos após o julgamento, vindo a fazê-lo somente após o julgamento de diversos recursos, quando a decisão que iria prevalecer seria desfavorável à sua cliente, reputando-se litigante de má-fé ao proceder de modo temerário. Nas duas últimas, por sua vez, a condenação se deu em virtude da interposição de recurso com propósito meramente protelatório e por infringência aos deveres de lealdade e boa-fé, consubstanciados no art. 14, do Código de Processo Civil.

Ressalte-se, ainda, que, nos precedentes acima mencionados, não fora feita qualquer ressalva quanto à necessidade de ajuizamento de ação própria para discutir eventual responsabilidade dos causídicos, tendo sido condenados nos mesmos autos do processo em que agiram de má-fé e atuaram como procurador judicial da parte.

Por outro lado, observa-se a existência de outros julgados, deste mesmo Tribunal, em sentido contrário ao acima exposto. Neste sentido, os REsp  140.578/SP[54], 1.173.848/RS[55], 1.194.683/MG[56], 1.247.820/AL[57], sendo o mais recente datado de 28 de junho de 2011.

No julgamento do REsp 140.578/SP, relatado pelo Ministro Luis Felipe Salomão, não obstante se tratar de afastamento de multa pela litigância de má-fé ao advogado, referido Ministrou firmou entendimento no sentido de que, em caso de má-fé, somente os litigantes estarão sujeitos à multa e indenização a que se refere o art. 18, do Código de Processo Civil, motivo pelo qual os danos eventualmente causados pela conduta do advogado deverão ser aferidos em ação própria para esta finalidade, sendo vedado ao magistrado, nos próprios autos do processo em que fora praticada a alegada conduta de má-fé ou temerária, condenar o patrono da parte nas penas a que se refere o art. 18, do citado Código.

Outro não foi o posicionamento adotado no julgamento do REsp 1.247.820/AL pelo relator Ministro Humberto Martins, o qual decidiu por não aplicar as penas decorrentes da litigância de má-fé ao advogado, sob o fundamento de que referidas penas só devem ser imputadas à parte, e não ao seu advogado, nos termos dos arts. 14 e 16, do Código de Processo Civil, razão pela qual eventual condenação do advogado pela litigância de má-fé deve ser apurada em ação própria, e não nos mesmos autos em que defende seu cliente.

Assim, como se vê, os julgados demonstram uma mudança de entendimento do Superior Tribunal de Justiça, que, nas suas decisões mais recentes, entende pela impossibilidade de o advogado sofrer as sanções previstas no art. 18, do Código de Processo Civil, nos próprios autos em que supostamente atua como litigante de má-fé, ainda que incorra em falta profissional, devendo eventual conduta desleal do advogado ser apurada em processo autônomo, nos termos do art. 32 do Estatuto da Advocacia.

Desta forma, resta demonstrado que, de acordo com o entendimento mais recente do Superior Tribunal de Justiça, o advogado que se conduzir com má-fé, no exercício profissional, deverá ser responsabilizado na seara própria, em conformidade com o disposto no art. 32, do Estatuto da Advocacia, não podendo, portanto, a ele ser imputada a condenação em indenização por perdas e danos decorrentes da litigância de má-fé nos próprios autos em que atuou em defesa de seu cliente e conduziu-se com má-fé processual.

No âmbito dos tribunais locais, por sua vez, a jurisprudência também não se encontra pacificada. Nos Tribunais Regionais Federais, observa-se que há julgados que admitem a condenação pessoal do advogado em indenização por perdas e danos, decorrentes da conduta praticada de má-fé, podendo, inclusive, esta condenação ser solidária com a parte, e outro, por conseguinte, que nega a possibilidade da mencionada condenação.

No julgamento da AC 199903990995695[58], de relatoria do Juiz Federal Rodrigo Zacharias, do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, os advogados foram condenados a pagarem multa, bem como indenização por perdas e danos, nos termos do artigo 18, do Código de Processo Civil, tendo em vista que lograram extrair valores indevidos dos cofres da previdência social, por manipulações sucessivas, incorrendo, assim, em litigância de má-fé ao alterar a verdade dos fatos, usar do processo para conseguir objetivo ilegal e proceder de modo temerário. [59]

Neste mesmo sentido, o julgamento da AC 200038000266617[60], de relatoria da Desembargadora Federal Maria Isabel Gallotti Rodrigues, do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, afirmou pela possibilidade de condenação pessoal do advogado, ressaltando-se, ainda, a possibilidade de tal condenação ocorrer de forma solidária entre o procurador e a respectiva parte.

Por sua vez, no julgamento da Ação Rescisória 200705001043064[61], relatada pelo Desembargador Federal Francisco Cavalcanti, do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, o entendimento foi divergente dos acima expostos. No caso em questão, citada ação foi proposta objetivando rescindir parte da sentença exarada nos autos principais, em que o advogado fora condenado nas sanções de litigância de má-fé, sob a alegação de impossibilidade de o advogado ser condenado por má-fé, no mesmo processo em que atuou na qualidade de causídico, bem como que eventual má-fé deveria ser apurada em ação própria, nos termos do artigo 32 do Estatuto da Advocacia.

Ressalte-se, também, que referida ação rescisória fora julgada, por duas vezes, em face da propositura de embargos de declaração com finalidade de declarar a nulidade do julgamento anterior e impor nova inclusão em pauta de julgamento, em vista do tempo transcorrido de nove meses entre a inclusão em pauta e o efetivo julgamento do feito.

No primeiro julgamento, datado de 28 de janeiro de 2009, o Desembargador Federal Francisco Cavalcanti julgou improcedente o pedido da ação rescisória, sob o fundamento de que “afirmar que o advogado, embora tendo deveres processuais inscritos no art. 14, do CPC, não se sujeita às punições tipificadas nos arts. 17 e 18, da Lei Adjetiva Civil, implicaria negativa ao referido art. 14, tornando-o letra morta.”[62] Num segundo momento, alertou que o dever de lealdade a que se submetem os advogados deve ser aferido mais rigorosamente que em relação às partes, pois no que diz respeito à definição e a escolha das providências processuais, é o procurador judicial quem tem a direta informação técnica necessária.

Ocorre que, quando do segundo julgamento, o pronunciamento do Desembargador foi no sentido oposto ao anteriormente exarado, para adequar-se ao entendimento do Supremo Tribunal Federal, tudo em consonância com a ADIn 2652-6/DF, cabendo, portanto, à Ordem dos Advogados do Brasil zelar pelo exercício ético da advocacia.

No âmbito dos Tribunais de Justiça, por sua vez, também é possível verificar a controvérsia existente a respeito do tema em debate. Há julgados que entendem pela possibilidade de condenação solidária da parte e do causídico, diante da verificação de conduta caracterizadora de litigância de má-fé, bem como há julgado que, em sentido contrário, destaca a impossibilidade de o advogado ser condenado nas penas decorrentes da litigância de má-fé por não ser parte.

O Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, no julgamento da AC 70016772600[63], entendeu ser perfeitamente possível a condenação solidária do causídico atuante na causa às penas da litigância de má-fé, sob a fundamentação de que, por ser um profissional do direito, não poderia agir em confrontação ao princípio da probidade, bem assim tem o dever de saber suas obrigações profissionais e processuais, seja frente ao seu cliente, seja frente à parte adversária e, inclusive, ao próprio Judiciário, não devendo, portanto, agir em contrariedade aos princípios da boa-fé, lealdade e probidade processuais.

Acompanhando o mesmo posicionamento adotado no julgamento acima referido, pronunciou-se o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios, no julgamento do AgReg nos EDcl na AC 20000110760192[64], de relatoria da Desembargadora Ana Cantarino, pela possibilidade da parte e dos procuradores judiciais serem condenados, solidariamente, por litigância de má-fé, pois, no caso em questão, os causídicos extrapolaram os limites da ética e da lealdade processuais ao agirem de forma altamente reprovável, motivo pelo qual deveriam sofrer as sanções cabíveis.

Por sua vez, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, no julgamento da AC 0019030-43.2007.8.26.0562[65], decidiu diferentemente, ao destacar ser incabível a condenação do advogado nas penas decorrentes da litigância de má-fé, em virtude da inaplicabilidade dos arts. 16 a 18, do Código de Processo Civil, ao procurador judicial e que os danos causados pela conduta dos advogados deverão ser aferidos em ação própria para essa finalidade.

Diante de todo exposto, restou demonstrado o posicionamento dos Tribunais acerca da (im)possibilidade de responsabilização pessoal do advogado em indenização por perdas e danos, decorrente da litigância de má-fé, passando-se, assim, a tecer outras considerações relevantes.

3.4. Outras considerações

Como demonstrado nos tópicos acima, pode-se concluir, nos termos da doutrina pesquisada, que esta se inclina no sentido de não ser aplicável o art. 16, do Código de Processo Civil, ao procurador judicial da parte, por não ter o dispositivo em comento sido explícito no sentido de que o advogado também responde por perdas e danos. Isto porque, tal dispositivo dispõe, tão-somente, que responde por perdas e danos aquele que pleitear de má-fé como autor, réu ou interveniente, sendo cediço, pois, que o procurador não é autor, nem réu, nem interveniente, não tendo, portanto, a responsabilidade processual prevista no art. 16, do citado Código, a não ser que postule em causa própria, quando será responsabilizado pela qualidade de parte.

Já no que diz respeito ao posicionamento adotado pelos Tribunais, verificou-se a existência de decisões divergentes, que apontam tanto pela possibilidade de condenação pessoal do advogado, podendo, inclusive, esta condenação ser solidária com a parte, como no sentido da impossibilidade de referida condenação. Todavia, nota-se uma tentativa de pacificação, adotando-se o segundo entendimento, tendo em vista que os julgados mais recentes vêm decidindo pela impossibilidade de condenação pessoal do advogado em indenização por perdas e danos, decorrentes da conduta de má-fé, nos próprios autos em que atuou como patrono da parte.

Tais decisões se fundamentam não só na interpretação dada aos artigos 16 e 18, do Código de Processo Civil, que não explicitam a possibilidade da condenação do causídico por litigância de má-fé, e, em especial, em indenização por perdas e danos, como sustentam que os danos eventualmente causados por conduta do advogado deverão ser aferidos em ação própria para esta finalidade. Desta forma, é vedado ao juiz ou tribunal, de ofício ou a requerimento, condenar o advogado em indenização por perdas e danos, em virtude da litigância de má-fé, nos próprios autos do processo em que fora praticada a conduta caracterizadora de má-fé.

Há de se destacar, ainda, que o fato de ser defeso ao juiz ou tribunal condenar o advogado por litigância de má-fé nos autos em que atuou na qualidade de causídico não implica afirmar que o procurador judicial seja imune às sanções decorrentes da litigância de má-fé. Isto porque, conforme demonstrado, com base nos mandamentos do Código de Processo Civil, do Estatuto da Advocacia e do Código de Ética e Disciplina, que tem por finalidade zelar pela conduta processual proba do advogado, é dever do advogado não só observar as regras de ordem técnica e ética, como, também, atuar perante o Juízo em conformidade com os princípios da boa-fé, lealdade e probidade processuais, para que, assim, seja merecedor de respeito e contribua para o prestígio da classe e da advocacia.

Assim, uma vez desrespeitados tais deveres, fica o causídico sujeito às sanções legais, e, no mesmo sentido, tendo sua conduta de má-fé ocasionado lesão ou prejuízo a outrem, é seu dever ressarcir os danos sofridos. No entanto, o que se tem é que referida responsabilidade tem de ser verificada em seara própria, como determina o art. 32 do Estatuto da Advocacia, podendo a eventual condenação em indenização decorrente de litigância de má-fé ser pleiteada pelo prejudicado em ação autônoma com a finalidade de ressarcimento.

 Desta forma, de acordo com a doutrina majoritária, bem como nos termos do entendimento firmado pela jurisprudência pátria em seus julgados mais recentes, deve-se entender pela impossibilidade, por parte do juiz ou tribunal, em condenar o advogado em indenização por perdas e danos decorrentes da litigância de má-fé nos mesmos autos em que fora praticada a conduta caracterizadora da má-fé, sendo possível, no entanto, que eventual condenação do advogado decorrente da litigância de má-fé se dê por meio de ação autônoma para tal finalidade ou em virtude da apuração de sua responsabilidade em processo disciplinar, o qual ocorrerá na seara especifica da Ordem dos Advogados do Brasil.

Sobre a autora
Maria Catarina Lopes Calado

Bacharela em Direito pela Universidade Católica de Pernambuco – UNICAP Pós-graduanda em Ciências Penais na Universidade Anhanguera - UNIDERP

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CALADO, Maria Catarina Lopes. Da (im)possibilidade de responsabilização do advogado em indenização por perdas e danos na litigância de má-fé. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3250, 25 mai. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/21872. Acesso em: 23 dez. 2024.

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