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A mediação, a conciliação e a arbitragem como formas alternativas de resolução de conflitos

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Agenda 29/08/2012 às 18:22

No Brasil, tradicionalmente, não temos o costume de tentar resolver as questões de forma amigável. Para tudo se utiliza o Judiciário. Tanto que foi necessária a instituição de Juizados Especiais com competência para causas simples, de menor complexidade, que atolavam a Justiça Comum.

Resumo: Este trabalho possui como objeto de estudo os métodos alternativos de resolução de conflitos, dando ênfase à mediação, à conciliação e à arbitragem, salientando que existem outros métodos de resolução de conflitos, muitos dos quais pouco conhecidos no Brasil. Nesse estudo, buscou-se também compreender a evolução histórica dos referidos métodos, desde os primórdios da civilização humana até os tempos atuais, sem olvidar que o conflito é inerente ao ser humano e à medida que a sociedade evolui, novas formas de solução de litígios são criadas e as antigas melhoradas. Para realização do presente trabalho, foi utilizada ampla pesquisa doutrinária, inclusive no que se refere ao direito comparado. Por fim, constatou-se que as formas alternativas de resolução de conflitos são uma constante no mundo e, atualmente, estão cada vez mais presentes no Brasil, favorecendo assim a própria prestação jurisdicional, que passa a se ocupar de causas que verdadeiramente não podem ser transacionadas.

Palavra- chave: Arbitragem. Arbitragem internacional. Conciliação. Conflito. Mediação. Mediação Internacional.

Sumário: 1. INTRODUÇÃO. 2. JURISDIÇÃO. 3. A MEDIAÇÃO. 3.1. O mediador. 3.2. Breve comentário acerca do Projeto de Lei de mediação (PL 4.827 de 10 de novembro de 1998). 4. A CONCILIAÇÃO. 5. A PROXIMIDADE ENTRE A MEDIAÇÃO E A CONCILIAÇÃO. 6. A ARBITRAGEM. 6.1. Arbitragem e arbitramento. 6.2. Conceito de arbitragem. 7. A ARBITRAGEM NO BRASIL. 7.1. A convenção de arbitragem. 7.2. Arbitragem de direito e arbitragem por equidade. 7.3. Cláusulas compromissórias. 7.3.1. Cláusulas compromissórias cheias e vazias. 7.4. Compromisso arbitral. 7.4.1. Compromisso arbitral judicial e extrajudicial. 8. FACULTATIVIDADE DA PRESENÇA DE ADVOGADO. 9. O ÁRBITRO. 9.1. Qualificação do árbitro. 9.2. Impedimento e suspeição do árbitro. 9.3. Quem pode ser árbitro. 9.4. Poderes do árbitro. 10. O PROCEDIMENTO ARBITRAL. 10.1.  Acordo celebrado no decurso da arbitragem. 10. 2. Provas. 10.3. Litisconsórcio – Possibilidade. 10.4. Medidas cautelares – Possibilidade. 10.5. Antecipação de tutela – Possibilidade. 11. A SENTENÇA ARBITRAL. 12. HOMOLOGAÇÃO E EXECUÇÃO DE SENTENÇA ARBITRAL ESTRANGEIRA. 13. BREVE PANORAMA SOBRE A ARBITRAGEM INTERNACIONAL. 13.1. O Protocolo de Genebra de 1923 e a Convenção de Genebra de 1927. 13.2. A Convenção de Nova Iorque de 1958. 13.3. A arbitragem no âmbito do MERCOSUL. 13.4. Outras convenções. 13.5. A lei modelo da UNCITRAL sobre arbitragem comercial internacional, de 1985. 13.6.  A Associação Americana de Arbitragem. 14. A MEDIAÇÃO NO ÂMBITO INTERNACIONAL. 14.1. Breve estudo sobre a mediação nos Estados Unidos. 14.2. Breve estudo sobre a mediação na Argentina. 14.3. Breve estudo sobre a mediação em alguns países europeus. 14.3.1. Portugal. 14.3.2. Espanha. 14.3.3. França. 14.3.4. Inglaterra. 15.  MÉTODOS ALTERNATIVOS DE RESOLUÇÃO DE CONFLITOS NO ÂMBITO DO DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO. 15.1.  Métodos amistosos diplomáticos. 15.1.1. Negociações diretas ou diplomáticas. 15.1.2. Sistema de consultas. 15.1.3. Conferências. 15.1.4. Bons ofícios. 15.1.5. Mediação. 15.2. Métodos amistosos jurídicos. 15.2.1. Tribunais permanentes. 15.2.2. Corte Internacional de Justiça. 15.2.3. Comissões internacionais de inquérito e conciliação. 15.2.4. Comissões mistas. 15.2.5. Arbitragem. 16. CONCLUSÃO. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS. ANEXO A: Lei nº. 9.307, de 23 de setembro de 1999. ANEXO B: Protocolo de Brasília para solução de controvérsias, de 17 de dezembro de 1991.


 

1. INTRODUÇÃO

O acesso à justiça não é restrito ao chamado “direito de petição”, através do Poder Judiciário, mas abrange várias formas de resolução de controvérsias, dentre as quais se figuram a mediação, a conciliação e a arbitragem, que são métodos alternativos e práticos para solução de conflitos, permitindo o alcance da pacificação social com a mínima interferência do Estado.

O presente trabalho não visa a trazer argumentos para afastar o Estado-Juiz da prestação jurisdicional, mas demonstrar que a jurisdição se torna mais efetiva se se ocupa das questões que realmente não podem ser transacionadas, muito embora haja questões legal e constitucionalmente instituídas como de direito indisponível, as quais devem ser analisadas pelo Julgador, no âmbito do processo judicial.

A presente pesquisa merece destaque e relevância porque, atualmente, muito se discute acerca da celeridade e eficiência da prestação jurisdicional, principalmente com o advento da chamada “Reforma do Judiciário”, inserto no ordenamento jurídico nacional pela Emenda Constitucional nº 45/2004.

José Maria Rossani Garcez (2007, p. 3) dá início a sua obra explanando sabiamente que “O conflito não é um mal em si mesmo, ou algo anormal ou disfuncional, mas sim um fato da existência em que, conflitos e disputas existem como forma de demonstração ou confrontação de posições divergentes e competição, (...)”.

Capelletti e Garth citados pela professora doutora Lutiana Nacur Lorentz (2002, p. 21), também no início de sua obra, afirma que “somente quando os cidadãos tiverem maior acesso à justiça, os direitos se tornarão mais efetivos”. Continua a professora, citando Grinover, Cintra e Dinamarco, que afirmam que “a atual fase processual de acesso à justiça se desdobra em três ondas renovatórias”. Essas “ondas renovatórias” seriam nos seus dizeres:

Aquela que busca a ampliação da assistência judiciária aos necessitados; aquela que é voltada para os interesses metaindividuais (coletivos e difusos) e aquela que se volta para o modo de ser do processo, tentando simplificá-lo, racionalizá-lo, aumentar a conciliação, eqüidade, de modo a ter uma justiça acessível e participativa (LORENTZ, 2002, p. 22).

Nesse estudo, daremos ênfase ao terceiro aspecto dessas “ondas renovatórias” do acesso à justiça, ou seja, os mecanismos alternativos de solução de controvérsias.

Veremos que essas formas alternativas de resolução de conflitos são uma realidade, estão cada vez mais presentes e recorrentes não só na sociedade brasileira, mas também em muitas democracias ditas “avançadas”, em especial na Europa. Igualmente, a ONU adota e incentiva métodos alternativos como negociações diretas e a mediação para solução de controvérsias no âmbito do direito internacional.

A Carta da ONU rechaça a solução de querelas internacionais por meio da força, isto é, por meio armado, militar. Em contrapartida, sugere uma série de meios diplomáticos e políticos para tanto.

Por tudo isso, verifica-se a importância e recorrência do presente tema como meio de pacificação social, não só na sociedade brasileira cuja pacificação por métodos alternativos começou a tomar forma pouco a pouco, seja nas esferas extrajudicial ou judicial, mas também em outras democracias e, após a criação da ONU, no âmbito do Direito Internacional.


2. JURISDIÇÃO

Sabe-se que nos primórdios da civilização, não existia o conceito de “Estado”, tal qual o conhecemos hodiernamente. Os conflitos existentes eram resolvidos mediante a imposição da vontade do mais forte sobre o mais fraco, numa verdadeira “vingança privada”. Essa era a forma de composição conhecida pela doutrina como autotutela, também denominada autodefesa. À proporção que o inter-relacionamento humano torna-se mais complexo, essa forma de solução de conflitos mostra-se cada vez mais insatisfatória, pois a imposição da vontade do mais forte dificilmente alcançava a concepção de Justiça que a sociedade elaborava.

Assim, outras formas vieram a ocupar o lugar da força, ainda no advento da sociedade primitiva surgia a autocomposição, segundo a qual, um (ou ambos os contendores), espontaneamente, sacrificava interesse próprio, total ou parcialmente, em favor de interesse alheio, com escopo de solucionar o conflito. Mesmo assim, ainda havia um problema, eis que não existia o Estado com força de fazer cumprir o acordo celebrado. Acaso houvesse violação do ajustado, prevalecia a força privada como meio executório.

Outro meio de resolver as querelas era a aceitação, pelos contendores, de um terceiro, chamado mediador, que tentaria por fim ao impasse.

Não obstante, outro caminho seria confiar a decisão a uma pessoa estranha ao conflito que, por estar afastada do “calor das emoções” poderia encontrar solução mais justa. A arbitragem, por essa razão surgida, foi, inicialmente, confiada aos sacerdotes, que, através de suas ligações com as divindades “garantiam” soluções acertadas. Com igual respeitabilidade outros membros do grupo, notadamente os anciãos e os sábios, pelo fato de conhecerem os costumes do grupo, poderiam orientar no sentido de se obter a melhor solução para o impasse.

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Marcus Orione Gonçalves Correia (2005, p. 7) chama essa forma de resolução de conflitos, em que as partes se submetem à decisão de terceira pessoa, de heterocomposição, segundo ele “Pela heterocomposição, os sujeitos entregam a terceiros a resolução do litígio, submetendo-se à decisão destes”.

Cediço é dizer que, posteriormente, com a crescente e inegável afirmação do Estado, surgiu também de modo gradual, a sua tendência a absorver o poder de interferir na solução dos conflitos. No direito romano antigo, as partes conflitantes compareciam perante o pretor e se comprometiam a aceitar a solução que fosse encontrada para resolver o litígio. Não se aceitava, ainda, a interferência de qualquer pessoa da esfera privada. Era o chamado litiscontestatio. Após esse compromisso assumido perante o pretor, as partes escolhiam um árbitro confiável que recebia do pretor o encargo de solucionar o conflito. Observa-se que, preliminarmente, nem mesmo o pretor impunha alguma decisão. O processo romano desenvolvia-se, desse modo, em dois estágios: uma fase perante o pretor ou magistrado romano (fase in jure) e outra perante o árbitro, também chamado judex (fase apud judicem). Tal forma de solução de conflitos perdurou durante todo o período clássico romano, até por volta do séc. II d.C. Ressalte-se, outrossim, que estava próximo o fim da arbitragem dita facultativa, a qual seria substituída pela obrigatoriedade da sujeição das partes à decisão de um árbitro. Nesse contexto, o pretor assume o poder de nomear um juiz privado.

Já por volta do séc. III d.C encerrava-se o ciclo da justiça privada, quando o pretor tomou para si próprio a solução dos conflitos e a imposição da decisão que proferisse. Inaugurava-se, nessa época, a justiça pública. O poder de que o Estado estava investido para assim proceder recebeu o nome de jurisdição. (CINTRA; GRINOVER; DINAMARCO, 2007, p. 27-28)

Consoante os ensinamentos de Fredie Didier Júnior (2007, p. 65), jurisdição é “A realização do direito em uma situação concreta, por meio de terceiro imparcial, de modo criativo e autoritativo (caráter inevitável da jurisdição), com aptidão para tornar-se indiscutível”.

Ao concluir seus pensamentos sobre jurisdição, os autores Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart asseveraram que:

(...), a jurisdição, ao aplicar uma norma ou fazê-la produzir efeitos concretos, afirma a vontade espelhada na norma de direito material, a qual deve traduzir – pois deve estar de acordo com os fins do Estado – as normas constitucionais que revelam suas preocupações básicas. (MARINONI; ARENHART, 2008, p. 36)

No mesmo sentido, Elio Fazzalari, citado por Walsir Edson Rodrigues Júnior entende a jurisdição como:

A atividade mediante a qual o Estado, por meio dos juízes, considerados órgãos do Estado, coloca-se acima dos sujeitos implicados na violação de uma norma primária e, após ouvir suas razões, providencia a cessação do estado de fato contrário ao direito. Para o referido autor, a jurisdição tem o seu principal fundamento na estrutura procedimental que se segue até o provimento jurisdicional e essa estrutura é caracterizada pelo contraditório, pela participação em simétrica paridade pelos afetados pelo provimento. (RODRIGUES JÚNIOR, 2007, p. 19-20).  

Insta salientar também que acesso à justiça não se confunde com acesso à jurisdição. Aquele diz respeito à satisfação efetiva e em justa medida da demanda que se busca solucionar; este diz respeito à tentativa de satisfação da pretensão resistida pela via judicial, através do “direito de petição”. Nesse ínterim, não se pode delimitar o acesso à justiça como acesso ao Poder Judiciário, pois nem todas as suas soluções, principalmente em se tratando de jurisdição contenciosa, satisfazem a ambas as partes. Decerto, a decisão judicial, por buscar a verdade real, nem sempre se mostra a mais justa ou a mais correta.


3. A MEDIAÇÃO

A mediação é de origem antiga. Mediar significa literalmente dividir ao meio, advém do latim mediare. Como já fora dito, a mediação é uma forma de autocomposição, pois uma ou ambas as partes devem abrir mão de parcela ou da totalidade de seu interesse a fim de solucionar o litígio, que deve ser conduzido por um terceiro que detenha neutralidade em relação aos demandantes. Salienta-se que esse terceiro não decide, nem impõe decisão alguma, mas ajuda as pessoas envolvidas na querela a chegarem a um ponto comum, em que seja possível a solução da controvérsia sem necessidade de acionamento do Estado-Juiz.

Nesse mesmo sentido, Rodrigues Júnior aduz o que se segue:

A mediação é um processo informal de resolução de conflitos, em que um terceiro, imparcial e neutro, sem o poder de decisão, assiste às partes, para que a comunicação seja estabelecida e os interesses preservados, visando ao estabelecimento de um acordo. Na verdade, na mediação, as partes são guiadas por um terceiro (mediador) que não influenciará no resultado final. O mediador, sem decidir ou influenciar na decisão das partes, ajuda nas questões essenciais que devem ser resolvidas durante o processo. (RODRIGUES JÚNIOR, 2007, p. 50).

O autor Juan Carlos Vezzulla a define como:

Técnica de resolução de conflitos não adversarial, que, sem imposições de sentenças ou de laudos e com um profissional devidamente formado, auxilia as partes a acharem seus verdadeiros interesses e a preservá-los num acordo criativo em que as duas partes ganhem. (VEZZULLA, 1998, p. 16).

Decerto, pelos ensinamentos acostados, verifica-se que a mediação não tem forma rígida, é um procedimento informal. Outrossim, as partes envolvidas na sessão de mediação devem ser capazes, nos termos do Código Civil vigente, sendo que os interesses em jogo devem ser os chamados interesses disponíveis. Ainda, a ata de mediação pode ser verbal, mas recomenda-se que seja escrita na presença de pelo menos duas testemunhas, eis que conforme preceitua o art. 585, II, segunda parte, do CPC, o documento particular assinado pelo devedor e por duas testemunhas é título executivo extrajudicial. Nesse caso, havendo descumprimento dos termos acostados na ata de mediação, a parte descontente poderá acionar o Poder Judiciário, que não precisará do processo de conhecimento para mandar cumprir o que esteja pendente no acordo celebrado.

Por derradeiro, ressalte-se que o art. 5º, XXXV da Constituição Federal (CF/88) ordena que a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito. Isso não significa que, sempre que houver controvérsia ou a iminência de uma controvérsia, a pessoa deva ingressar em juízo a fim de fazer valer seu interesse. A Constituição apenas garante o direito de acesso, não faz nenhuma imposição unilateral, muito pelo contrário, o próprio preâmbulo da Carta Maior enfatiza a busca de solução pacífica de controvérsias. Por isso são importantes a mediação e as demais formas alternativas de resolução de litígios, elas são uma alternativa ao Poder Judiciário, que muitas vezes se mostra moroso e inchado de demandas repetitivas e desgastantes. Por suposto, o inverso também é verdade, a busca de formas alternativas de resolução de controvérsias não impede que a parte prejudicada se valha do Estado-Juiz para tentar satisfazer sua pretensão, notadamente quando há descumprimento dos termos acordados, razão porque nada há de inconstitucional nos métodos alternativos de resolução de conflitos.

3.1. O mediador

Decerto, o sucesso da mediação dependerá também do mediador, pessoa física neutra, responsável por conduzir a sessão de mediação da melhor forma possível. Ele deve buscar o diálogo entre as partes, mesmo que isso seja difícil, pois uma sessão de mediação satisfatória começa com o diálogo e o entendimento entre os demandantes. O mediador presidirá a sessão sem permitir ofensas, nem influências externas ao objeto da reunião, tampouco permitirá acordo contrário ao direito, aos bons costumes, à ética e ao interesse público. Deve o mediador atuar de modo imparcial, saber ouvir os problemas dos outros, ter capacidade de se ajustar a situações inesperadas, de ser flexível, dinâmico e paciente.

Christopher Moore (1998, p. 31), elucida brilhantemente a função do mediador ao informar que ele pode assumir vários papéis, com intuito de auxiliar as partes a resolverem a disputa, a saber:

O facilitador da comunicação, que inicia ou facilita a melhor comunicação quando as partes já estiverem conversando.

O legitimador, que ajuda todas as partes a reconhecerem o direito das outras de estarem envolvidas nas negociações.

O facilitador do processo, que propõe um procedimento e, em geral, preside formalmente a sessão de negociação

O treinador, que instrui os negociadores iniciantes, inexperientes ou despreparados no processo de barganha.

O ampliador de recursos, que proporciona assistência às partes e as vincula a especialistas e a recursos externos (por exemplo, advogados, especialistas técnicos, pessoas responsáveis pela tomada de decisão ou bens adicionais à negociação) que podem capacitá-los a aumentar as opções aceitáveis de acordo.

O explorador do problema, que permite que as pessoas em disputa examinem o problema a partir de várias perspectivas, ajuda nas definições das questões e dos interesses básicos e procura opções mutuamente satisfatórias.

O agente de realidade, que ajuda a elaboração de um acordo razoável, viável e que questiona e desafia as partes que têm objetivos radicais e não-realistas.

O bode expiatório, que pode assumir certa responsabilidade ou culpa por uma decisão impopular que as partes, apesar de tudo, estejam dispostas a aceitar. Isto lhes permite manterem sua integridade e, quando for o caso, obterem o apoio de seus constituintes.

O líder, que toma a iniciativa de prosseguir as negociações através de sugestões processuais ou fundamentais.

A capacitação do mediador conforme ensinamento de Jean-François Six deve ser constante, ele assevera que “a mediação é, com efeito, uma arte que não terminamos jamais de afinar, de aperfeiçoar; não a discernir, e tomá-la por uma aplicação de especialistas e de técnicos absolutos é enganar-se sobre ela”. (2001, p. 166).

Para se adquirir todas essas características de perfil do mediador, transcrevo a lição de Rodrigues Júnior, in verbis:

É necessário conciliar um aprendizado teórico e prático e desenvolvê-lo numa sólida instituição. Naturalmente que, além da capacitação teórica e prática, as características pessoais irão influenciar fortemente na formação do mediador. Assim, o seu tom de voz, a sua formação profissional anterior (psicólogo, advogado, assistente social,...), a sua religião, a sua condição social, servirão para definir o seu estilo próprio de mediação. Por isso cada mediador terá um estilo próprio e distinto dos demais. Por isso a importância de se definir os princípios da mediação, bem como um padrão ético de atuação. (RODRIGUES JÚNIOR, 2007, p. 114).

Lia Regina Castaldi Sampaio e Adolfo Braga Neto (2007) definem que o mediador detém um papel de liderança ante os mediados, devendo aquele dispor de empatia, isto é, capacidade para assimilar a condição das outras partes, colocando-se em seus respectivos lugares, de modo a tornar mais fácil a compreensão do problema vivenciado por ambas as partes, possibilitando o encontro de soluções mais eficientes.

Enquanto Christopher Moore define as várias facetas apresentadas pelo mediador, Sampaio e Braga Neto definem o que o mediador não é. Segundo esses autores (2007, p. 83-85), o mediador “não é juiz, nem árbitro; não é advogado; não é psicólogo; não é conselheiro; não é professor; não é assistente social; não é médico ou outro profissional da área de saúde; não é administrador” e, por fim, “não é engenheiro ou outro profissional da área de exatas”.

Sem necessidade de transcrever as palavras desses autores, é possível esclarecer o porquê do mediador não atuar como esses profissionais, a saber:

O mediador não é juiz porque não impõe decisão alguma; não é árbitro porque não existe prévia convenção entre as partes e, mais uma vez, não arbitra decisão alguma, não tendo o resultado da mediação força de título executivo. Conforme já estudado, o mediador apenas auxilia as partes a chegarem – elas mesmas – à solução da controvérsia.

Não é advogado porque não atua defendendo os interesses de uma das partes. Pelo contrário, é imparcial, neutro e não profere nenhum juízo de valor.

Não é psicólogo porque não atua explorando a emoção dos sujeitos, não se envolve em questões intersubjetivas das partes, como a relacional ou a comportamental. Pelo contrário, apenas identifica as questões basilares da controvérsia e encaminham as partes para que elas mesmas as percebam e busquem solucioná-las, pondo fim à querela.

Não é conselheiro, pois o conselho tem conteúdo extremamente subjetivo, pessoal, pobre de fundamentação e intimamente ligado à impressão preliminar limitada de quem aconselha, sem maiores conhecimentos sobre a questão. Assim, o mediador não é conselheiro, porquanto deve pautar o seu atuar pela melhor compreensão possível sobre a questão, de forma ética, prudente, sem subjetivismos e sem parcialidade.

Não é professor, haja vista que lhe cabe ensinar nada às partes. O mediador deve lembrar que seu atuar cinge-se exclusivamente pela condução das partes ao acordo, sem que para isso necessite inflamar-se de diálogos eruditos, improfícuos e que faça exaltação de si mesmo.

Do mesmo modo, o mediador não é assistente social, eis que não existe tutela dos mediados pelo mediador. A aparente condição de hipossuficiência de um dos mediados não traz para o mediador o dever de lhe prestar assistência no que tange a sua limitação. Pelo contrário, o mediador deve – mais uma vez – levar as partes para a melhor solução do litígio, pois o poder de decisão cabe a elas.

Também não é médico ou outro profissional de saúde, porque ele não vai “tratar” o conflito como se fosse uma doença passível de cura pela simples prescrição de uma receita. Pelo contrário, são as partes que devem buscar a “cura” do litígio, cabendo ao mediador o papel de explorador do problema, colocando em pauta as soluções possíveis para que as partes decidam.

Tampouco é administrador, posto que não dita regras preestabelecidas ou puramente sujeitas ao seu arbítrio. Pelo contrário, o mediador está no mesmo nível das partes, razão porque não lhe assiste impor regras ou decisões aos participantes da sessão de mediação.

Igualmente não é engenheiro ou outro profissional da área de exatas, uma vez que a mediação não é ciência exata, isto é, não possui uma fórmula específica para cada tipo de demanda distinta. Na mediação não se pode dizer que a o problema “x” ou “y” tem como solução “z”. Na mediação vige a espontaneidade, o informalismo e a ausência de regras preestabelecidas. Vale dizer, nem sempre a solução de algum caso servirá para outros, ainda que assemelhados.

Por fim, inegável é a afirmação de que o mediador, além de ter conhecimento acerca do direito material que se aplicará ao caso concreto, deverá possuir determinados conhecimentos específicos, isto é, habilidades pessoais relativamente a cada caso discutido. Não se concebe que o mediador atue, para solucionar o litígio, como se fosse advogado, juiz, psicólogo, engenheiro, médico, etc. Outrossim, nada impede que o profissional apto a exercer o papel de mediador exerça algumas dessas profissões. O que não vale é ele exercer sua função enquanto pendente a sessão de mediação, mas obviamente ele pode (leia-se como um poder-dever) usar de seus conhecimentos especializados, sem juízo de valor, para auxiliar as partes a chegarem ao acordo ideal.

3.2. Breve comentário acerca do Projeto de Lei de mediação (PL 4.827 de 10 de novembro de 1998)

De autoria da advogada criminalista, então Deputada Federal Zulaiê Cobra, o referido Projeto de Lei, em sua redação original, definia mediação em seu art. 1º como sendo a atividade técnica exercida por terceira pessoa, que, escolhida ou aceita pelas partes interessadas, as escuta e orienta com o propósito de lhes permitir que, de modo consensual, previnam ou solucionem conflitos. O texto original do PL era composto inicialmente por apenas sete artigos.

O citado texto original admitia licitamente a utilização da mediação em toda matéria que fosse passível de conciliação, reconciliação, transação ou acordo de outra ordem, para os fins que consinta a lei civil ou penal (parágrafo único).

Admitia como mediador (art. 2º, caput) qualquer pessoa capaz, com formação técnica ou experiência prática adequada à natureza do conflito, bem como (art. 2º § 1º) qualquer pessoa jurídica que, nos termos do seu objeto social, dedicasse-se ao exercício da mediação por intermédio de pessoas físicas que atendessem às exigências do referido art. 2º.

Aduzia o texto original ainda que, no desempenho de sua função, o mediador deveria proceder com imparcialidade, independência, competência, diligência e sigilo (art. 2º § 2º).

As grandes inovações propostas pelo Projeto de Lei de mediação estão nos artigos posteriores, como a possibilidade da mediação versar sobre apenas parte do conflito, podendo ocorrer até mesmo judicialmente (art. 3º); a possibilidade de o juiz tentar convencer as partes a participarem de mediação, em qualquer tempo e grau de jurisdição, inclusive com suspensão do processo pelo tempo necessário à instauração e conclusão da mediação, mediante designação de mediador, até o prazo máximo de três meses, prorrogável por igual período (art. 4º).

Além disso, o Projeto de Lei de mediação dispunha que, na mediação extrajudicial – aquela realizada fora do âmbito do Poder Judiciário – o acordo ajustado poderia ser levado à homologação judicial, valendo como título executivo judicial (tal qual a sentença arbitral), inclusive com produção dos efeitos jurídicos próprios de sua matéria (art. 6º).

Para dar início ao procedimento de mediação, o interessado poderia requerer ao juiz, antes de se iniciar qualquer discussão judicial e sem que lhe antecipasse os termos e a pretensão do conflito, que determinasse a intimação da parte contrária para comparecer à audiência de tentativa de conciliação ou mediação (Art. 6º). O requerimento de intimação feito pela parte não preveniria o juízo, mas impediria a decadência e interromperia a prescrição. 

A redação original do PL da mediação teve vários dispositivos alterados, com acréscimos de muitos outros. Foram ouvidos em Audiência Pública mediadores e representantes das Comissões porque passou o PL, mas desde 2006 e até hoje se encontra praticamente ”travado” na Comissão de Constituição, de Justiça e de Cidadania da Câmara dos Deputados, em Brasília. Resta-nos apenas aguardar o desfecho dessa morosa deliberação legislativa.

Sobre o autor
Tiago França Moraes

Oficial de Justiça Avaliador do TJMG - Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais. Advogado não atuante. Graduado em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Estado de Minas Gerais. Pós-graduando em Direito Administrativo pela Universidade Gama Filho/Rio de Janeiro.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MORAES, Tiago França. A mediação, a conciliação e a arbitragem como formas alternativas de resolução de conflitos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3346, 29 ago. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/22520. Acesso em: 22 dez. 2024.

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