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Análise jurídica do instituto da desaposentação

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Agenda 21/04/2013 às 16:02

A desaposentação será apresentada como desconstituição do ato jurídico perfeito, o qual não deve ser encarado como um impedimento ao livre exercício de um direito, que é patrimonial, portanto de caráter disponível.

1. NTRODUÇÃO

Nas palavras de Ibrahim (2005, p.34) a desaposentação consiste na reversão do ato que transmudou o segurado em inativo, encerrando, por consequência, a aposentadoria. Far-se-á, no presente trabalho, uma análise doutrinária e jurisprudencial acerca do referido instituto, apresentando os embaraços jurídicos que envolvem o tema e a sua viabilidade.

A problemática consiste na necessidade que a desaposentação tem de ser regulamentada enquanto legislação, assim, o instituto poderá ser requerido mesmo a nível administrativo, sem precisar recorrer às vias judiciais.

O trabalho tem como objetivo a análise das decisões judiciais acerca do instituto, as quais têm aumentado gradativamente nos últimos anos, devido ao número crescente de aposentados que permanecem na ativa, após o jubilo, como forma de garantia da própria sobrevivência e de sua família.

Antes de tudo, porém, será apresentado o contexto histórico de evolução da seguridade social, em seus três pilares constitucionais, saúde, assistência e previdência. Este último, tratado como direito humano, pelo seu caráter de sistema protetivo plural e não discriminatório dotado de prerrogativas individuais, em detrimento do interesse do corpo social.

No segundo capítulo, será abordada a aposentadoria, em sentido amplo, discorrendo sobre a possibilidade de manutenção do vínculo de emprego, após o jubilo. Seguido de uma análise detida das modalidades de aposentadoria, tanto no regime geral de previdência, como nos regimes próprios.

O estudo acerca dos aspectos jurisprudenciais da desaposentação será feito no terceiro capítulo, o qual tratará da relação entre o surgimento do instituto e o extinto pecúlio, bem como relativamente à criação do fator previdenciário, pela Lei nº 9.876/99.

A desaposentação será apresentada como desconstituição do ato jurídico perfeito, o qual não deve ser encarado como um impedimento ao livre exercício de um direito, que é patrimonial, portanto de caráter disponível.

Há também, no mesmo capítulo, um enfrentamento sobre a possibilidade de restituição dos valores pagos anteriormente à desaposentação, tão defendida pelo INSS, todavia, fortemente criticada pelos defensores da desaposentação, uma vez que inviabilizaria o instituto. No decorrer de todo o capítulo será apresentado o entendimento das diversas cortes de justiça do país.

E ainda será apresentado o informativo do Supremo Tribunal Federal, no qual o tema da desaposentação foi considerado como de repercussão geral, no recurso extraordinário nº 661256.

No último capítulo desta monografia far-se-á um estudo sobre a viabilidade da desaposentação, quanto ao RGPS e aos RPPS. Com a apresentação das possibilidades de desaposentação, aventadas pela doutrina e observadas na seara judicial.

Para a confecção do trabalho utilizou-se a legislação pátria, doutrina, jurisprudência, um projeto de lei de autoria do Deputado Cleber Verde, artigos de sítios eletrônicos, informativos do STF, enunciados da Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais, bem como acórdãos do Tribunal de Contas da União, tudo como forma de garantir a melhor abordagem possível do tema.


2. A PREVIDÊNCIA SOCIAL COMO DIREITO HUMANO

A Previdência Social, juntamente com a Saúde e a Assistência Social compõemum conjunto integrado de ações de iniciativas dos Poderes Públicos, às quais se dá o nome de seguridade social, que é o regime protetivo, instituído pela Constituição Federal, no art. 194.

Ainda no mesmo dispositivo constitucional, em seu parágrafo único, o constituinte traçou os objetivos da seguridade social: universalidade da cobertura e do atendimento; uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais; seletividade e distributividade na prestação dos benefícios e serviços; irredutibilidade do valor dos benefícios; equidade na forma de participação no custeio; diversidade da base de financiamento e caráter democrático e descentralizado da administração.

Tais objetivos revestem-se de caráter principiológico, orientador e estruturante, norteando a seguridade social, oferecendo-lhe condições de exequibilidade e alcance a toda população.

Ibrahim (2005, p. 5) conceitua a seguridade social como sendo:

[...] a rede protetiva formada pelo Estado e particular, com contribuições de todos, incluindo dos beneficiários dos direitos, no sentido de estabelecer ações positivas no sustento de pessoas carentes, trabalhadores em geral e seus dependentes, providenciando a manutenção do padrão mínimo de vida.

Dentro do sistema da seguridade social, merece destaque a saúde,como sendo direito de todos, até mesmo daqueles que não são filiados à previdência social, na forma do art. 196 da CF/88. Significando, com isso, que a saúde é direito público subjetivo de toda a coletividade, o que permite a seus destinatários o direito de exigir do Estado a sua prestação, mesmo sem contribuir. O legislador destacou ainda que as ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único.

Da mesma forma, a assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição, conforme reza o art. 203, CF/88 e seus incisos, que dispõem sobre os objetivos dela, quais sejam, a proteção à família, a maternidade, a infância, etc. E ainda, o amparo às crianças e adolescentes carentes, a promoção da integração ao mercado de trabalho, a habilitação e a reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e a garantia de um salário mínimo mensal à pessoa portadora de deficiência.

Quanto à previdência social, seguro sui generis, de caráter contributivo, compulsório, de organização estatal, objetiva proporcionar amparo adequado aos segurados e seus familiares contra os chamados riscos sociais, na forma docaput do artigo 201do texto constitucional[1].

Faz-se, a seguir, uma análise histórica acerca da seguridade social, dando especial atenção à previdência, tema do presente capítulo. O referido estudo nos ajudará a compreender mais sobre a estrutura da seguridade social e a sua atual formação.

1.1.Evolução histórica da seguridade social no mundo

A ideia plantada, ainda em Roma e na Grécia antiga, sobre o que iria denominar-se sistema de proteção social, foi a do mutualismo, da ajuda ao necessitado, desenvolvidaem instituições que, mediante contribuição, visavam à prestação de assistência a seus membros mais necessitados[2].

Filho (2010, p.14) observa que os romanos tinham o costume de guardar duas partes de cada sete do salário do soldado para, quando se aposentasse, recebê-lo junto com um pedaço de terra.

À medida que o Império Romano ruía, se fortaleciam os ideais do cristianismo, baseados no amor ao próximo, na solidariedade humana e na caridade. Com este propósito, foram criadas organizações conhecidas como confrarias, corporações ou irmandades de ajuda mútua.

Mais a frente, na baixa idade média (séculos XI ao XV), ocorreu a evolução socioeconômica e o surgimento das associações de artesãos, chamadas guildas e as corporações de ofício, que eram associações de proteção mútua.

Contudo, o sistema de ajuda recíproca, que se convencionou chamar mutualismo, apresentava deficiência, sob o aspecto organizacional, em virtude da baixa capacidade dos trabalhadores administrarem sozinhos o referido sistema. Ademais, a massa de contribuições dos mutuários não era suficiente para garantir-lhes, bem como aos seus familiares, a necessária sustentação financeira, em caso de invalidez, morte, desemprego etc.

Sobre o assunto, destaca Filho (2010, p. 15):

Em que pesem as corporações ter exercido um papel muito importante para as novas instituições que surgiram no decorrer da evolução histórica, a influência e os efeitos da evolução socioeconômica deram início ao surgimento de atividades profissionais, exercidas em condição de risco, fazendo com que o sistema de mutualismo, por si só, já não atendesse às demandas advindas da evolução e do crescimento natural da humanidade.  E, em decorrência destes fatores, acabaram surgindo os sistemas de seguros privados, sustentados pelo empregador em prol do empregado.

Em 1601, na Inglaterra, foi editado o Poor Relief Act (Lei dos pobres), que instituiu auxílios e socorros públicos aos necessitados, o qual possuía caráter meramente assistencial. Somente no ano de 1762 surge o seguro de vida, em Londres, com a fundação “da primeira companhia de seguros de vida dentro de bases científicas”. (Castro e Lazzari, 2011, p. 38).

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O primeiro ordenamento legal a tratarde benefício previdenciário foi editado por Otto Von Bismarck, em 1883, na Alemanha. Tratou-se aí do auxílio doença. No ano seguinte, foi assegurada a cobertura compulsória para os acidentes de trabalho. Neste mesmo país, foi criado o seguro invalidez e velhice, em 1889. Essa foi a primeira vez que o Estado ficou responsável pela organização de um benefício custeado por contribuições recolhidas compulsoriamente das empresas.

Em seguida, outros países europeus editaram suas primeiras leis de proteção social. A exemplo da Inglaterra, que instituiu o seguro obrigatório contra acidentes de trabalho, workmen’scompensationact.

Em 1917, no México, foi criada a primeira constituição a tratar do tema previdenciário, em seu artigo 123.Veja-se:

O artigo 123 da Constituição Mexicana tratava de vários assuntos inéditos, tais como a limitação da jornada de trabalho para 8 horas diárias, a proteção do trabalho de menores de 12 anos, bem como a limitação de 6 horas diárias para os menores de 16 anos, a limitação de 7 horas de jornada de trabalho noturno, o descanso semanal, o salário mínimo, a igualdade salarial, o direito de greve, e outros institutos inovadores que vieram proteger as relações de trabalho. ALVES, Henrique Napoleão. Considerações acerca da importância histórica da Constituição do México de 1917. Em:<http://jus.com.br/revista/texto/9324/consideracoes-acerca-da-importancia-historica-da-constituicao-do-mexico-de-1917>. Acessado em 20/06/2012.

A referida carta é considerada também pioneira do chamado constitucionalismo social, assim definido por Nascimento (2009, p. 35):

Denomina-se constitucionalismo social o movimento que, considerando uma das principais funções do Estado a realização da Justiça Social, propõe a inclusão de direitos trabalhistas e sociais fundamentais nos textos das Constituições dos países.

  Outras constituições, que seguiram a mesma linha da mexicana, de 1919, foram as da Alemanha,no mesmo ano, da Polônia e da Iugoslávia, de 1921, e do Brasil,de 1934, dentre outras.

Em 1929, os Estados Unidos atravessavam uma grande crise, com a quebra da bolsa de valores de Nova Iorque. A solução para a referida crise só veio em 1933, com o New Deal, instituído por Franklin Delano Roosevelt, inspirado pelo WelfareState(estado do bem-estar social). Esse plano consistia no controle dos preços e da produção nas indústrias e nas fazendas.

Com isto, o país conseguiu controlar a inflação e evitar a formação de estoques. Havia também a responsabilidade de organizar os setores sociais com investimentos na saúde pública, na assistência social e na previdência. Nos EUA, em 1935, foi instituído o Social Security Act (previdência social como forma de proteção social).

Na Inglaterra, mais de uma década depois da crise norte-americana, foi criado o Plano Beveridge, “ponto chave do estudo da evolução histórica mundial”. (Kertzman, 2011, p. 40). O referido plano objetivava garantir atendimento suficiente aos indivíduos impossibilitados de trabalhar. Ele trouxe a estrutura da seguridade social, tal qual a conhecemos hoje, com a participação universal de todas as categorias de trabalhadores e cobrança compulsória de contribuições para financiar as três áreas da seguridade: saúde, previdência social e assistência social.

Nos anos de 1939 a 1945, a humanidade viveu um período de instabilidade, sofrimento e crueldade gratuita. Em seguida, veio o pós-guerra e todos alimentavam um forte desejo de paz duradoura e tranquilidade no mundo.

Foi a consciência de um período de luta militar, em que pereceram milhões de pessoas, e que deu lugar a genocídios e holocaustos que mancharam a Humanidade. Populações aniquiladas ou transferidas para outras regiões sofreram na carne e no espírito os efeitos de um conflito devastador e impiedoso. Aniquilados os campos de concentração, julgados os criminosos de guerra, a tentativa, nem sempre feliz, de reajustar fronteiras, deram ao Mundo uma nova perspectiva [...]. (SOARES, Sandra. SANTOS, Vítor. A Declaração Universal dos Direitos Humanos e a sua actualidade na sociedade contemporânea. Em: <http://www.dhnet.org.br/direitos/deconu/a_pdf/dec_univ_atualidade_pt.pdf>. Acesso em 24.abril.2012).

Munidos de tal anseio, foi proclamada a Declaração Universal dos Direitos Humanos na Assembleia Geral das Nações Unidas, em 10 de dezembro de 1948, numa tentativa de reunir as principais correntes políticas contemporâneas ocidentais.

Observa TOSI, em seu artigo eletrônico:

Tal documento vem reafirmar o conjunto de direitos das revoluções burguesas (direitos de liberdade, ou direitos civis e políticos) e os estende a uma série de sujeitos que, anteriormente, estavam deles excluídos (proíbe a escravidão, proclama os direitos das mulheres, defende os direitos dos estrangeiros, etc.); afirma, também, os direitos da tradição socialista (direitos de igualdade, ou direitos econômicos e sociais) e do cristianismo social (direitos de solidariedade) e os estende aos direitos culturais.(TOSI, Giuseppe. O Significado e as consequências da Declaração Universal de 1948.Em<http://www.redhbrasil.net/documentos/bilbioteca_on_line/modulo1/6.o_significado_dudh_tosi.pdf>. Acesso em 19 abril 2012).

Inclusive, o direito a seguridade social pertence à segunda geração dos direitos humanos, a qual compreende também os direitos econômicos, sociais e culturais, indispensáveis à dignidade humana e ao desenvolvimento da personalidade do homem. Tal conclusão está explicitada no art. 6º da Magna Carta de 1988.

A Declaração dos Direitos Humanos incluiu a proteção previdenciáriaem seu artigo 25, abaixo transcrito:

Art. 25. [...]

1. Toda pessoa tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar a si e a sua família saúde e bem estar, inclusive alimentação, vestuário, habitação, cuidados médicos e os serviços sociais indispensáveis, e direito à seguridade em caso de desemprego, doença, invalidez, viuvez, velhice ou outros casos de perda dos meios de subsistência fora de seu controle.    2. A maternidade e a infância têm direito a cuidados e assistência especiais. Todas as crianças nascidas dentro ou fora do matrimônio gozarão da mesma proteção social. (FILHO, 2010, p. 18 apud DECLARAÇÃO Universal dos Direitos do Homem, 1971, p.99).

A referida declaração possui grande prestígio na comunidade internacional, tanto que, desde sua criação, em 1948, influenciou muitas constituições nacionais. A DUDH, contudo, não possui caráter obrigatório, é apenas uma recomendação, a despeito de ter sido base para a instituição de dois pactos de caráter indispensável, são eles: Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos e o Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, ambos de 1966.

O Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, ratificado pelo Brasil em 24 de janeiro de 1992, em diversos artigos faz menção aos direitos que compõem a seguridade social:

Art. 9º[...]

Os Estados Membros no presente Pacto reconhecem o direito de toda pessoa à previdência social, inclusive ao seguro social.

Art. 12[...]

§1. Os Estados-partes no presente Pacto reconhecem o direito de toda pessoa de desfrutar o mais elevado nível de saúde física e mental.

§2. As medidas que os Estados-partes no presente Pacto deverão adotar, com o fim de assegurar o pleno exercício desse direito, incluirão as medidas que se façam necessárias para assegurar:

1. A diminuição da mortinatalidade e da mortalidade infantil, bem como o desenvolvimento são das crianças.

2. A melhoria de todos os aspectos de higiene do trabalho e do meio ambiente.

3. A prevenção e o tratamento das doenças epidêmicas, endêmicas, profissionais e outras, bem como a luta contra essas doenças.

4. A criação de condições que assegurem a todos assistência médica e serviços médicos em caso de enfermidade.

(PACTO Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais. Em<http://www.oas.org/dil/port/1966%20Pacto%20Internacional%20sobre%20os%20Direitos%20Económicos,%20Sociais%20e%20Culturais.pdf> Acesso em 19.abril.2012).

Assim, depreende-se dos dispositivos legais acima transcritos, que a previdência social tem um caráter humanitário, de amparo ao individuo, regulamentando as relações jurídicasde trabalho de forma a criar um padrão mínimo de direitos sociais.

1.2. Contexto histórico brasileiro

No Brasil, em 1824, uma Constituição Federal foi outorgada, a qual tratou, em seu art. 179, inciso XXXI, dos socorros públicos. Esse foi o primeiro ato securitário com previsão constitucional no País.

Já a Constituição brasileira de 1891 dispôs sobre a aposentadoria por invalidez para os servidores públicos, custeada pela nação. Destaque-se que não havia, à época, nenhuma fonte de contribuição,o benefício era fornecido pelo Estado sem nenhuma contrapartida do segurado, portanto não há que se falar em previdência social no Brasil por essa época.

No ano seguinte, com a Lei nº 217, de 29 de novembro, a aposentadoria por invalidez foi estendida para os operários do arsenal de marinha do Rio de Janeiro e foi instituída ainda a pensão por morte para os referidos trabalhadores. E, em 1919, surgiu no País a primeira lei de proteção aos trabalhadores contra acidentes de trabalho.

O Decreto legislativo nº 4.682, de 1923, conhecido com Lei Eloy Chaves[3],é considerado pela doutrina como o marco inicial do sistema previdenciário brasileiro, instituindo as caixas de aposentadorias e pensões para os empregados das empresas ferroviárias.

Castro e Lazzari (2011, p. 69) relatam que as caixas de aposentadorias e pensões eram custeadas mediante contribuições dos trabalhadores, das empresas do ramo e do Estado. Entretanto, o regime das “caixas” ainda era pouco abrangente, e, como era estabelecido por empresa, o número de contribuintes foi, às vezes, insuficiente.

Mais a frente, no ano de 1933, surgiu o IAPM (Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Marítimos), considerada a primeira instituição brasileira de previdência social. Seguida do IAPC[4], IAPB[5], em 1934; o IAPI[6], em 1936. Surgiram o IPASE[7] e o IAPETC[8] em 1938.

A Carta Magna promulgada em 1934 trazia em seu esboço a forma tripartite de custeio: contribuição dos trabalhadores, dos empregadores e do poder público (art. 121, § 1º, h). Já a constituição de 1937 somente utilizou a expressão “seguro social”, não trazendo maiores contribuições sobre o assunto.

Em se tratando de assistência social, foi criada a Legião Brasileira de Assistência (LBA), em 1942 (Decreto-lei n. 4.890/42), com ações de apoio ao cidadão e à família, creche, ações básicas de saúde, apoio nutricional, banco de leite humano, educação social, documentação e direitos civis, auxílio econômico e financeiro. E voltadas também para o incentivo das oportunidades de trabalho e geração de renda, dentre outras.

Mais tarde, a Constituição pátria de 1946 utilizou pela primeira vez a expressão “previdência social”, em substituição à denominação seguro social, anteriormente utilizada. Nesta Carta, houve ampliação de benefícios e criação de auxílios, tais como: auxílio-natalidade, auxílio-funeral e auxílio-reclusão.

No início de 1967, houve a unificação dos IAP, criando-se o INPS – Instituto Nacional de Previdência Social, o que há muito havia sido exigido pelos estudiosos da matéria, em vista dos problemas de déficit em vários dos institutos classistas.

A Constituição de 1967 não inovouem relação àCarta anterior. Contudo, é importante destacar legislação protetiva surgida à época. A Lei 5.316 integrou o seguro de acidentes de trabalho ao sistema da previdência social. Já o decreto-lei nº 367 de 1967, preocupou-se com a contagem de tempo de serviço dos funcionários civis da união e das autarquias.

Foi criado o Programa de Assistência ao Trabalhador Rural, em 1971, pela Lei complementar nº 11. E, em 1976, foi editada a consolidação das Leis da Previdência Social, através do Decreto nº 77.077.

Com a Lei nº 6.439/77, foi criado o SINPAS, Sistema Nacional de Previdência e Assistência Social. Em seguida o IAPAS[9], o INAMPS[10]. Manteve-se o INPS para arrecadação e fiscalização das contribuições. Foi criada a FUNABEM[11], para atendimento aos menores carentes, a CEME, para a fabricação de medicamentos a baixo custoe a DATAPREV, para controle dos dados do sistema, todas as instituições mencionadas faziam parte do SINPAS. À época, extinguiu-se o IPASE e o FUNRURAL.

Destacam Castro e Lazzari (2011, p.73) que “observa-se, ainda, em relação à criação do SINPAS, certa confusão entre os conceitos de previdência social, assistência social e saúde pública”.

Cumpre destacar que foi extinto o INAMPS com a Lei nº 8689/93, tendo sido absorvida a sua competência funcional pelo SUS, gerido pelo Conselho Nacional de Saúde, em órbita federal e, a nível estadual e municipal pelas secretarias de saúde.

A criação do atual INSS deu-se em 1990, juntamente com a extinção do INPS e do IAPAS, e em substituição a esses últimos, nas funções de pagamento de benefícios, prestação de serviços, arrecadação e cobrança de tributos. Com relação às competências tributárias da mencionada autarquia, essas foram atribuídas ao Ministério da Previdência Social, com a edição da Medida Provisória 222, de 4/10/2004.

Mais a frente, a Lei 11.457/2007 concebeu a Secretaria da Receita Federal do Brasil, órgão específico e singular, subordinado ao Ministério da Fazenda, que tem competência para planejar, executar, acompanhar e avaliar as atividades relativas à tributação, fiscalização, arrecadação, cobrança e recolhimento das contribuições sociais, conforme dispõe o art. 33, Lei nº 8212/91. Assim, o INSS passou a ser responsável, unicamente, pela administração dos benefícios previdenciários.

Voltando-se para a Carta Magna de outubro de 1988, é de se observar que esta assumiu uma postura de consolidação do sistema protetivo em evolução nas últimas décadas:

(...) a Constituição de 1988 também pode ser considerada como uma síntese dos arranjos consolidados inercialmente ao longo das décadas de 1970/1980. As inovações conceituais e organizatórias que apareceram na Carta não expressavam nenhuma ruptura com quaisquer dos interesses que incidiram sobre a arena setorial nessas décadas. (COSTA, Nilson do Rosário. Inovação Política, Distributivismo e Crise: A Política de Saúde nos Anos 80 e 90. Em: <http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0011-52581996000300007&script=sci_arttext>. Acesso em 19 abril 2012).

Destaque para a Saúde que, como já foi salientado alhures, tornou-se universal, acessível a qualquer um que dela necessite, independente de contribuição à previdência social. E o artigo 6º da CF/88 explicita que a previdência tem papelfundamental como Direito Social: “São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados na forma desta Constituição”.

A supracitada norma veio exatamente no sentido de estabelecer concretamente o significado dos direitos considerados essenciais à dignidade da pessoa humana, regrou o piso vital mínimo destinado aos brasileiros e estrangeiros residentes no país, a ser assegurado pelo Estado Democrático de Direito.

Como se vê, a Previdência dedica-se ao bem-estar da coletividade, buscando formas de sobrevivência àqueles que carecem de maior atenção do Estado, seja por idade avançada, doença ou qualquer outra razão que gere uma situação de desamparo.

Em uma explanação sobre o conceito de Direitos Sociais, destaca Ibrahim (2005 apud TAVARES, 2003, p. 66):

Os direitos sociais são um conjunto de direitos que possibilitam a participação no bem-estar social e englobam ordinariamente não só direitos a uma prestação material do Estado destinada a garantir o desenvolvimento individual, mas também as chamadas liberdades sociais, direitos que se aproximam dos direitos civis de liberdade pela prevalência do aspecto negativo de abstenção estatal, como a liberdade de sindicalização e o direito de greve.

Omencionado autor defende que os direitos sociais consistem não só em ações afirmativas do Estado, como também em abstenções, pois asseguram a dignidade da pessoa humana, “complementando a tríade clássica da liberdade, igualdade e fraternidade, agora acrescida da solidariedade”, (Ibrahim, 2005, p.12). Afinal de contas, é de interesse geral que se tenha condições mínimas de sobrevivência.

Inclusive, a referida doutrina classifica os direitos sociais como verdadeiros direitos de terceira geração, pelo caráter metaindividual, extensível a toda coletividade, à semelhança do direito ambiental e dos direitos humanos.

Sobre os direitos de 3ª geração observa Ibrahim (2005 apud CANOTILHO, 1998, p. 362):

A partir da década de 60, começou a desenhar-se uma nova categoria de direitos humanos vulgarmente chamados direitos de terceira geração. Nessa perspectiva, os direitos do homem reconduzir-se-iam a três categorias fundamentais: os direitos de liberdade, os direitos de prestação (igualdade) e os direitos de solidariedade.

Tais direitos de solidariedade, representados pelos direitos sociais, enquadram-se na terceira geração dos direitos humanos, pois decorrem de ações individuais e coletivas que alcançam a pessoa humana tanto na esfera pessoal como na sua esfera social. São direitos cuja titularidade não é de um só indivíduo, mas de grupos humanos como a família, o povo, a coletividade regional ou ética. É como se comporta a previdência social, que é um sistema protetivo plural e não discriminatório dotado de prerrogativas individuais, em detrimento do interesse do corpo social.

O sistema previdenciário atual adotado no Brasil é o de repartição das receitas, isso quer dizer que “a geração de hoje custeia os benefícios da atual geração de aposentados, trabalhadores de ontem”. (Filho, 2010, p. 31). É o que se costuma chamar de “pacto entre as gerações”. De antemão, cabe ressaltar que tal sistema apresenta uma grande falha, pois à medida que a população envelhece, aumenta o número de inativos, e se torna ainda menor o número de ativos, mantenedores do referido sistema.

De acordo com estimativas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a população brasileira de idosos será igual à de jovens aproximadamente em 2050. Além disso, a relação entre trabalhadores ativos e inativos do país está cada vez mais parecida com a européia. Na década de 1950, havia oito trabalhadores no mercado para cada aposentado; atualmente a taxa é de 1,27 para 1. Dentro de pouco tempo, cada trabalhador ativo vai sustentar um inativo, o que tornará a carga tributária inviável. LOVATI, Franciane. Em: <http://cienciahoje.uol.com.br/noticias/economia/trabalhar-mais-depois-de-velho>. Acessado em 20/06/2012.

O referido artigo introduz a ideia de déficit previdenciário, o qual nada mais é que essa desproporção entre o número de trabalhadores que contribui para a previdência e o de inativos que são sustentados pelo regime.

Atualmente, a Previdência Social brasileira é tida como uma das maiores distribuidoras de renda do país. A cada mês, são desembolsados cerca de R$ 16 bilhões no pagamento de 27 milhões de benefícios, como aposentadorias, pensões e auxílio-doença.

Tal regime protetivo tem caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá (art. 201, CF):

I – cobertura dos eventos de doença, invalidez, morte e idade avançada;

II – proteção à maternidade, especialmente à gestante;

III – proteção ao trabalhador em situação de desemprego involuntário;

IV – salário-família e auxílio-reclusão para os dependentes dos segurados de baixa renda;

V – pensão por morte do segurado, homem ou mulher, ao cônjuge ou companheiro e dependente.

E, como forma de viabilizar a prática dos princípios acima citados, a Lei 8.213, de 24 de julho de 1991 dispôs sobre os planos de benefício da previdência social. Os benefícios são os seguintes: aposentadorias, salário-maternidade, salário-família, auxílio-acidente, auxílio-doença, pensão por morte e auxílio-reclusão.

De acordo com Kertzman (2011, p.31), referidos benefícios podem ser “de natureza programada, como os que buscam cobrir o risco de idade avançada, ou não programada, como, por exemplo, a aposentadoria por invalidez e o auxílio-doença”.

Três regimes compõem a organização do sistema previdenciário brasileiro, sejam eles, Regime Geral da Previdência Social (RGPS), os Regimes Próprios de Previdência Social (RPPS) e ainda a Previdência Complementar.

O RGPS é regime de previdência social de organização estatal, contributivo e compulsório, administrado pelo INSS – Instituto Nacional do Seguro Social. É contributivo, poispara ter direito a qualquer benefício da Previdência Social, é necessário enquadrar-se na condição de segurado, devendo contribuir para a manutenção do sistema previdenciário. E é compulsório porque obriga a filiação aos trabalhadores que exercem atividades remuneradas. A previdência social seria inviabilizada se não fosse obrigatória a todos que trabalham. E ainda, tal regime é de repartição simples e de benefício definido.

A contribuição dos segurados do regime geral está sujeita a um valor máximo, reajustado, em regra anualmente. O teto das contribuições dos segurados em 2012 é de R$ 3.916,20 (três mil reais, novecentos e dezesseis reais e vinte centavos).

A questão da desaposentação é mais viável no regime geral, pela quantidade maior de segurados. Contudo, as ideias acerca do tema são igualmente aplicáveis aos regimes próprios de previdência social. Na medida em que proporcione aos seus servidores a obtenção de incrementos aos benefícios.

Já os RPPS são os regimes da administração direta (União, Estados e Municípios). Organizam-se mediante um estatuto próprio, com contribuições e benefícios peculiares. Os servidores sujeitos a estes regimes são denominados de servidores estatutários. Destaque-se ainda que a base de contribuição dos servidores públicos filiados a regimes próprios ainda não tem limite máximo definido.

Quanto ao Regime de Previdência Complementar, este tem previsão constitucional (art. 40, parágrafos 14 a 16, CF/88) e pode ser privado ou direcionado a servidores públicos. O dispositivo constitucional mencionado prevê que a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, desde que instituam regime de previdência complementar para os seus respectivos servidores titulares de cargo efetivo poderão fixar, para o valor das aposentadorias e pensões a serem concedidas por seus regimes, o limite máximo para os benefícios do Regime Geral de Previdência Social.

Inclusive, em 02 de maio do corrente ano, a presidenta Dilma Rousseff sancionou a Lei nº 12.618/12 que instituiu oFunpresp (Fundação de Previdência Complementar dos Servidores Públicos Federais), órgão responsável pela criação de fundos de previdência complementar para os servidores federais, dos três poderes (executivo, legislativo e judiciário).

Tal norma prevê que os servidores federais que ingressarem após a publicação da referida leiterão aposentadoria equiparada ao teto do RGPS (R$ 3.916,20). Somente podendo receber valor maior que este se contribuir para o mencionado fundo.

Sobre a autora
Aline Melo Braga

Bacharel em Direito pela Universidade Estadual do Piauí.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BRAGA, Aline Melo. Análise jurídica do instituto da desaposentação. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3581, 21 abr. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/24220. Acesso em: 22 dez. 2024.

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