CONCLUSÃO
14. A fim de atender aos fundamentos da Constituição brasileira, o Estado brasileiro, por meio de cada um de seus poderes e, por que não lembrar, também pela atuação dos órgãos independentes instituídos para tutela a cidadania no Brasil (Ministério Público, Defensoria Pública, Tribunal de Contas), há de estabelecer novas diretrizes para a proteção especial à gestante prevista no art. 201, II, da Carta de 1988, tendo em conta a atual situação de desamparo em que se encontra a segurada em gestação de alto risco.
Com efeito, na edição da Lei de benefícios do regime geral da Previdência Social (Lei nº 8.213/91), simplesmente o Poder Legislativo repetiu o que já garantido na Constituição, quanto ao direito a salário-maternidade, sem contemplar tutela específica à referida segurada.
Já na regulamentação do art. 26, II, da Lei nº 8.213/91, deixaram os Ministérios da Saúde, da Previdência e Assistência Social de atentar para sua obrigação de proteger de modo especial à gestação, a todo e qualquer tempo, independentemente de carência, mediante previsão, na lista de doenças a que se refere tal dispositivo legal, das enfermidades que caracterizam a gravidez de risco, a fim de que pudessem gozar de auxílio-doença as seguradas em tal situação.
A par disso, deveria o Instituto Nacional do Seguro Social reconhecer que os agravos que imprevisivelmente colocam em risco a vida e ou a saúde da gestante e do nascituro enquadram-se, na verdade, na expressão acidente de qualquer natureza ou causa prevista na primeira parte do art. 26, II, da Lei nº 8.213/91. De outro giro, deveria o instituto, em sua missão de garantir a efetividade dos direitos previdenciários no Brasil à cidadania, adotar uma interpretação conforme a Constituição do citado dispositivo legal para conceder auxílio-doença sem carência, reconhecendo que o rol de doenças fixado pelos Ministérios da Saúde, da Previdência e Assistência Social não é exaustivo, devido à impossibilidade de a Medicina e por conseguinte do Direito e do Poder Executivo preverem todas as enfermidades cuja especificidade e gravidade que mereçam tratamento particularizado, na linha do que tem reconhecido o STJ em face do art. 186, I, § 1º, da Lei nº 8.112/90 para reconhecer o direito a benefício por incapacidade que em princípio é vitalício (aposentadoria por invalidez).
Diante da clarividente determinação constitucional de proteção especial à gestante, prevista no art. 201, II, da Carta de 1988, do princípio da dignidade humana e da proteção integral à criança (aplicável também ao nascituro), forçoso é concluir que a Constituição visou amparar a mãe na situação mais delicada da maternidade, a gestação. Por conseguinte, não outorgar ao Legislador Ordinário e ao Poder Executivo a possibilidade de editarem normas (no campo legal e infralegal respectivamente) que levasse à gestante de alto risco ao desamparo ou mesmo a possibilidade de o INSS e o Judiciário adotarem interpretação do art. 26, II, da Lei nº 8.213/91 e de sua regulamentação, ao analisar pedido de auxílio-doença, que acarretasse tal conseqüência – aumentando o risco do abortamento não só pelas enfermidades que lhe acometem, mas também pelas decorrências que o desamparo financeiro pode ensejar, bem como levando a mãe possivelmente à demissão pelo impasse de não poder trabalhar e também não poder gozar do benefício em questão.
Notas
[1] SANTOS, Wanderley Guilherme dos. Cidadania e justiça: a política social na ordem. Rio de Janeiro: Campus, 1979, p. 71 a 123.
[2] “Art. 24. Período de carência é o número mínimo de contribuições mensais indispensáveis para que o beneficiário faça jus ao benefício, consideradas a partir do transcurso do primeiro dia dos meses de suas competências.”
[3] “Art. 195. (...). § 5º - Nenhum benefício ou serviço da seguridade social poderá ser criado, majorado ou estendido sem a correspondente fonte de custeio total.”
[4] Pequeno Dicionário Brasileiro da Língua Portuguesa. 11ª Edição. Editora Gamma.
[5] “Art. 186. O servidor será aposentado: (Vide art. 40 da Constituição)
I - por invalidez permanente, sendo os proventos integrais quando decorrente de acidente em serviço, moléstia profissional ou doença grave, contagiosa ou incurável, especificada em lei, e proporcionais nos demais casos;
§ 1o Consideram-se doenças graves, contagiosas ou incuráveis, a que se refere o inciso I deste artigo, tuberculose ativa, alienação mental, esclerose múltipla, neoplasia maligna, cegueira posterior ao ingresso no serviço público, hanseníase, cardiopatia grave, doença de Parkinson, paralisia irreversível e incapacitante, espondiloartrose anquilosante, nefropatia grave, estados avançados do mal de Paget (osteíte deformante), Síndrome de Imunodeficiência Adquirida - AIDS, e outras que a lei indicar, com base na medicina especializada.
(...).”
[6] “Art. 40 (...) § 12 - Além do disposto neste artigo, o regime de previdência dos servidores públicos titulares de cargo efetivo observará, no que couber, os requisitos e critérios fixados para o regime geral de previdência social. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 20, de 15/12/98)”