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A extinção da separação judicial do ordenamento jurídico brasileiro e as questões transitórias

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Agenda 18/07/2013 às 19:04

4  DAS QUESTÕES TRANSITÓRIAS

Diante da recente mudança legislativa e constitucional, cabe aos operadores do direito entenderem a sistemática atual para dissolução da sociedade conjugal, com coerente aplicação e observância.

No entanto, deparamo-nos com várias situações pendentes e que, pelas peculiaridades existentes, geram dúvida na prática forense.

Não somente quanto a aceitação e atual aplicação da lei pelos magistrados, como também os entendimento que os tribunais tem dado a diversas questões pendentes, tantos nos feitos em andamento como, também, quanto a conversão da separação judicial já decretada em divórcio.

Nesse sentido, algumas ponderações e análises serão efetivadas nos itens subseqüentes, sem questionamentos ou comentários em relação a existência ou inexistência da culpa, indenização, prestação alimentícia, entre outros temas importantes que necessitariam de outros tantos artigos para cada um dos temas elencados.

4.1  Dos processos de separação judicial em andamento

A realidade atual existente, evidencia vários processos em trâmite no poder judiciário brasileiro, tendo como contenda a separação judicial entre casais que manifestam a incompatibilidade de gênios, a desarmonia conjugal, ou outras nomenclaturas que aqui poderiam serem esposadas, a fim de desmistificar a única razão para o ajuizamento de ações da citada natureza: o desejo de não mais conviverem e coabitarem.[40]

Dentro desta sistemática, vislumbra-se que, na maioria dos casos e processos em andamentos, com as exceções existentes tão somente quanto ao desejo ou não pela separação conjugal, a maior parte dos processados ainda continuam tramitando, haja vista a discordância quanto a partilha de bens, guarda de filhos, visitas e alimentos em prol de filhos menores.

Resta clara a nova redação do § 6º do artigo 226 da Constituição Federal quanto à única possibilidade, na atualidade, para a dissolução do vínculo marital, que se dá com a decretação judicial ou administrativa do divórcio.

Nesse contexto, importa destacar que tais processos deverão ser adaptados, a fim de atingir o objetivo, sob pena de extinção do feito.

Sob tal adaptação, várias são as opiniões dos estudiosos do direito, quanto à conversão automática pelo Juízo ou a necessidade do pedido ser formulado pelas partes, consoante abaixo se transcreverá:

Com todo respeito à divergência doutrinária, entendemos que, com a supressão do instituto da separação judicial, atentando-se para a intenção do legislador em unificar no divórcio todas as hipóteses de separação dos cônjuges, sejam litigiosas ou consensuais, bem como a dos interessados, (entendendo-se aqui filhos e todos e tudo o mais envolvidos e atingidos em uma separação) estando claro e notório que o que se almejava quando da separação era atingir o divórcio (só que a legislação anterior não o permitia diretamente), os artigos regulamentadores da separação consensual devem ser considerados para o divórcio; ou seja, os feitos em andamento devem ser automaticamente convertidos em divórcio (SANT’ANNA, 2010).

Fundamenta-se a idéia, ainda, considerando o que segue:

Se a intenção do legislador é SIMPLIFICAR, concedendo diretamente e sem prazo algo que para ser atingido era necessário ultrapassar obstáculo, se essa ‘pedra’ foi retirada, e estamos pensando em economia processual; o bom senso deve prevalecer: o juiz deve determinar a conversão da ação de separação em ação de divórcio. Caso as partes interessadas não aceite, aí sim o feito deverá ser extinto sem julgamento de mérito (SANT’ANA, 2010).

Maria Berenice Dias (2010, p. 130) sustenta tal opinião:

Não há necessidade de a alteração ser requerida pelas partes, que nem precisam proceder á adequação do pedido. Cabe ao juiz dar-lhes ciência da alteração legal, deferindo um prazo para se manifestarem caso discordem do decreto do divórcio. Se os cônjuges silenciarem, tal significará concordância com a decretação do divórcio. A discordância de uma das partes – seja do autor, seja do réu – não impede a dissolução do casamento. Somente na hipótese de haver expressa oposição de ambos os separandos à concessão do divórcio deve ser decretada a extinção do processo por impossibilidade jurídica do pedido, pois não há como o juiz proferir sentença chancelando direito não mais previsto em lei.

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Destarte, parece-nos estranho o fato do Juiz, subjetivamente, converter a ação de separação em divórcio, sem manifestação das partes, ainda mais se litigiosa a ação, haja vista que, se consensual, certamente, as partes, no intuito de dissolver o vínculo marital sem delongas, preferirão tal procedimento.

Nesse sentido, aparecem entendimentos contrários ao anteriormente reproduzido.

Newton Teixeira Carvalho (Juiz de Direito da 1ª Vara de família em Belo Horizonte (...) deixou as seguintes sugestões: com relação às separações em andamento, o juiz ou o Tribunal deverá facultar às partes, no prazo de 10 (dez) dias, requerer, nos próprios autos, a conversão da separação em divórcio, inclusive se já prolatada sentença, porém sem o trânsito em julgado. Caso não modificado o pedido, de separação para divórcio, os autos deverão ser extintos, por impossibilidade jurídica do pedido. Não há que se falar em direito adquirido contra a Constituição federal, mesmo em se tratando de Emenda Constitucional. Evidentemente que, se existirem pedidos cumulados, a ação prosseguirá, normalmente, com relação aos pedidos remanescentes e independentes, como por exemplo, alimentos, guarda, etc.; no que tange às separações já decretadas, com sentença transitada em julgado, a qualquer momento o divórcio poderá ser pleiteado, em apenso. Enquanto não pleiteado o divórcio, o estado destas pessoas continua como de separado; caso, a partir de hoje, haja pedido de separação, os autos deverão, de plano, ser extintos, por impossibilidade jurídica do pedido, eis que não mais há separação no direito brasileiro (SANT’ANNA, 2010).

No mesmo sentido, quanto a necessidade das partes formularem o pedido de conversão da ação de separação judicial para divórcio, as fundamentações de ARNOLDO CAMANHO DE ASSIS[41]:

Há vozes a sustentar que, com a extinção da separação judicial, os processos que tenham esse objetivo devam ser igualmente extintos, por perda superveniente do seu objeto (art. 267, inciso VI, do CPC). Todavia, o princípio da razoabilidade permite ao juiz condutor do feito que conceda às partes (no procedimento litigioso) ou aos interessados (no procedimento de jurisdição voluntária) prazo para que adaptem seu pedido, postulando o divórcio no lugar da separação. Nesse caso, não seria jurídico impor às partes a restrição de inovação do pedido no curso do processo, em eventual desrespeito ao princípio da boa-fé objetiva. Cuida-se, a rigor, de supressão da base normativa que conferia sustentação jurídica ao pedido formulado, sendo desnecessário adaptar o pedido à nova ordem jurídico-constitucional a fim de que se dê ao processo máxima efetividade (SANT’ ANNA, 2010, p. 34).

Acrescenta o Excelentíssimo Desembargador, solucionando pela extinção do Processo em caso de não adaptação do pedido de conversão da ação, pelas partes, com fulcro no artigo 267, inciso VI, do Código de Processo Civil), discorrendo, ainda, sobre a não possibilidade da conversão automática:

(...) Destaque-se que não é possível ‘dar por adaptado’ o pedido, automaticamente, porque quem formula o pedido é a parte, cabendo ao Juiz, apenas, aferir a relação de compatibilidade entre o pedido formulado e o ordenamento jurídico. A Constituição, ao suprimir o instituto da separação judicial, não disse estarem automaticamente convertidos em divórcio os pedidos de separação judicial feitos antes de a EC nº 66/2010 entrar em vigor, nem há permissão, no sistema processual civil, para uma tal ‘conversão automática’, que possa eventualmente ocorrer à revelia da vontade das partes (SANT’ ANNA, 2010, p. 34).

Maria Berenice Dias (2010, p. 130) entende que todos os processos de separação judicial em tramite perderam o objeto por impossibilidade jurídica do pedido, ocorrendo a superveniência de fato extintivo ao direito objeto da ação, devendo, portanto, ser reconhecido de ofício, pelo julgador, na forma do artigo 462, do Código de Processo Civil.

(...) no momento em que o instituto deixou de existir, em vez de extinguir o processo de separação deve o juiz transformá-lo em ação de divórcio. Eventualmente cabe continuar sendo objeto de discussão as demandas cumuladas, como alimentos, partilha de bens, etc. mas o divórcio deve ser decretado de imediato. Como o fundamento do pedido não cabe mais ser questionado, deixa de ser necessária qualquer dilação probatória. Nem sequer os aspectos patrimoniais carecem de definição, eis ser possível a concessão do divórcio sem partilha de bens (CC. 1.581) (DIAS, 2010, p. 130).

O procedimento exposto pela doutrinadora é menos burocrático, haja vista uma mera intimação para manifestação quanto a concordância ou não das partes quanto a conversão do feito para divórcio.

Sendo assim, independente de alguns doutrinadores entenderem como intimação para manifestação, ou mesmo emenda à inicial com conseqüente adequação do feito à nova sistemática para dissolução do vínculo conjugal em vigor, necessário o silêncio ou a concordância para que os feitos em tramite tenham legal e normal prosseguimento.

4.2  Possibilidade da conversão da ação de separação judicial em divórcio

Discussões pendem sobre a possibilidade da conversão da separação judicial em divórcio, haja vista a existência do estado civil “separado”, uma vez que fora decretada judicialmente a primeira ação acima em comento. Para alguns é possível a conversão, para outros não, consoante segue:

O pedido de divórcio por conversão deixou de existir. Dessa forma, dever-se-á apenas requerer o divórcio (judicial ou extrajudicialmente), fazendo reproduzir, se assim o desejarem, todas as condições estipuladas ou decididas na separação judicial. Esclarece-se a expressão ‘ se assim o desejarem’ diante do entendimento do Supremo tribunal Federal de que não existe direito adquirido a instituto jurídico (como o caso da separação judicial). Assim, as condições ajustadas ou decididas não são imutáveis, podendo os cônjuges colocar em discussão os pontos anteriormente acordados ou decididos, quando do divórcio, para decisão judicial, que pode ser diferente da que vinham adotando (SANT’ANNA, 2010, p. 48/49).

Maria Berenice Dias entende que desapareceu a possibilidade da conversão da separação judicial em divórcio, conjuntamente com o instituto.[42]

De forma diversa entende Rodrigo da Cunha Pereira (2010), apresentando entendimento favorável à conversão da separação em divórcio:

(...) Caso queiram transformá-lo em estado civil de divorciado, poderão, excepcionalmente, converter tal separação em divórcio ou simplesmente propor ação de divórcio, o que na prática tem o mesmo resultado. São exceções, necessárias e justificáveis, para compatibilizar com o respeito aos princípios constitucionais da coisa julgada e o ato jurídico perfeito.

Ainda,

(...) O novo texto constitucional, além de acabar com todo e qualquer prazo para o divórcio, pelas razões aqui já expostas, tornou a separação judicial e as regras que a regiam incompatíveis com o sistema jurídico. Entretanto, há quatro situações transitórias que devem ser consideradas em relação à situação daqueles que já estavam separados judicialmente (ou administrativamente) na data da entrada em vigor da Emenda Constitucional nº 66/2010: se continua existindo o estado civil de "separado judicialmente"/ administrativamente; se eles ainda podem converter a separação em divórcio; se poderiam restabelecer o casamento; e se os processos judiciais ou administrativos de separação poderão continuar tramitando para se alcançar o seu objetivo proposto.(16) O estado civil daqueles que já eram separados judicialmente continua sendo o mesmo, pois não é possível simplesmente transformá-los em divorciados. Portanto, o estado civil ‘separado judicialmente administrativamente’ continua existindo para aqueles que já o detinham quando o novo texto constitucional entrou em vigor. É uma situação transitória, pois, com o passar do tempo, naturalmente, deixará de existir.

Fato que causou estranheza, foi a decisão exarada pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul sobre o tema, entendendo estar em vigor o artigo 1.580, do Código Civil:

APELAÇÃO CÍVEL. SEPARAÇÃO JUDICIAL. PEDIDO DE CONVERSÃO EM DIVORCIO. IMPOSSIBILIDADE. EMENDA CONSTITUCIONAL 66/2010. NOVA REDAÇÃO AO § 6º do art. 226 da Constituição Federal. vigência da LEGISLAÇÃO INFRACONSTITUCIONAL (ART. 1.580 DO CÓDIGO CIVIL). REQUISITOS PRESERVADOS, POR ORA. 1. A aprovação da Emenda Constitucional nº 66/2010, ao dar nova redação ao § 6º do art. 226 da Constituição Federal, que dispõe sobre a dissolubilidade do casamento civil pelo divórcio, efetivamente suprimiu, do texto constitucional, o requisito de prévia separação judicial por mais de 1 (um) ano ou de comprovada separação de fato por mais de 2 (dois) anos . 2. Não houve, porém, automática revogação da legislação infraconstitucional que regulamenta a matéria. Para que isso ocorra, indispensável seja modificado o Código Civil, que, por ora, preserva em pleno vigor os dispositivos atinentes à separação judicial e ao divórcio. Inteligência do art. 2º, § 1º, da Lei de Introdução ao Código Civil (Decreto-Lei nº 4.657/42).[43]

Destarte, apesar do entendimento acima vislumbrado, cabe ressaltar os fundamentos anteriormente esboçados, não somente quanto a revogação ou não da lei infraconstitucional, mas quanto a aplicação da lei mais benéfica as partes.

Nesse contexto, importante frisar a possibilidade das partes poderem ingressar com o pedido de divórcio como com o efetivo pedido de conversão da separação em divórcio, não havendo óbice para tanto, vez que o fim pretendido pelas partes é a dissolução do vínculo conjugal, independentemente da forma procedimental que será efetivada.

Cabe questionar se não seria uma vedação de acesso à Justiça, haja vista que o pedido formulado pelas partes do caso em análise não é impossível juridicamente.

Deveras, fora a única manifestação jurisprudencial encontrada no sentido contrário a conversão.

4.3  Do restabelecimento da sociedade marital

Quanto ao restabelecimento da sociedade conjugal, vislumbra-se não haver muitas discussões sobre o assento, tanto que poderá ser requerida pelas partes, considerando a separação judicial já decretada, através de simples petição encaminhada ao Juiz, na forma do artigo 1.577 do Código Civil atualmente em, vigor.[44]

No entanto, tratando-se de uma possível reconciliação na vida real, após a decretação do divórcio, a única possibilidade das partes é um novo casamento, vez que o restabelecimento da sociedade marital é possível, apenas quando há a decretação da separação e não do divórcio.

4.4 Da existência do estado civil de separado

Consoante afirma Maria Berenice Dias “o estado civil é um atributo da personalidade. A identificação do estado civil – que inclusive integra a qualificação da pessoa – tem significado tanto de ordem pessoa como social e patrimonial” (DIAS, 2010, p. 58).

Assim, o casamento é o ponto de referencia para a distinção entre o estado civil solteiro e o estado civil casado.

Há poucas diferenças neste sentido, no entanto, consoante afirma Rodrigo da Cunha Pereira (2010) “se o cônjuge separado judicialmente morre, o estado civil do sobrevivo é viúvo, ao passo que o divorciado continua sendo divorciado (...)”.

No mesmo sentido,

O estado civil daqueles que já eram separados judicialmente continua sendo o mesmo, pois não é possível simplesmente transformá-los em divorciados. Portanto, o estado civil ‘separado judicialmente administrativamente’ continua existindo para aqueles que já o detinham quando o novo texto constitucional entrou em vigor. È uma situação transitória, pois, com o passar do tempo, naturalmente, deixará de existir (PEREIRA, 2010, p. 13).

Deveras o citado estado civil tende a desaparecer com o desenrolar dos feitos em andamento, mas, momentaneamente continua em vigor e, havendo a morte de um dos cônjuges, ocorre a liberação do outro para novo casamento.

Sobre a autora
Carla Matiello

Assessora de Promotor de Justiça do Ministério Público do Estado do Paraná - PR. Especialista em Direito Civil e Processual Civil.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MATIELLO, Carla. A extinção da separação judicial do ordenamento jurídico brasileiro e as questões transitórias. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3669, 18 jul. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/24958. Acesso em: 22 nov. 2024.

Mais informações

Orientador: Alexandre da Silva Barbosa (Mestre em Direito Processual Contemporâneo e Cidadania. Professor do Curso Direito Civil e Direito Processual Civil da UNIVEL – Faculdade de Ciências Sociais Aplicadas de Cascavel).

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