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O ITBI: estudo sobre pontos controversos

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Agenda 11/09/2013 às 07:50

4. TEMAS CONTROVERSOS

4.1. FATO GERADOR

O fato gerador da obrigação tributária, como foi dito, é a transmissão (e a cessão) do bem imóvel objeto do negócio jurídico oneroso e inter vivos.

Neste momento, é importante estabelecer a base dos tradicionais sistemas de transmissão imobiliária existentes no mundo.

4.1.1. Sistemas de transmissão imobiliária

No Direito brasileiro, a aquisição de direitos reais sobre imóveis ocorre com o registro do título formal perante o Serviço de Registro de Imóveis da circunscrição da localização do bem (art. 1227 do Código Civil). Quanto aos bens móveis, a transmissão ocorre com a tradição.

Seguiu-se, assim, o sistema de transmissão adotou no direito germânico, adaptando à realidade registral brasileira. O registro, ou a inscrição é o ato necessário e obrigatório para a transmissão dos direitos reais sobre imóveis. Antes disso, com o título formal, há apenas uma relação obrigacional entre as partes. A oponibilidade erga omnes, a disposição e a sequela somente são poderes inerentes aos titulares de direitos reais. E esses direitos somente se constituem e transferem pelo registro.

Sobre os sistemas de transmissão imobiliária existentes, importante a lição de Sílvio de Salvo Venosa:

“Nosso ordenamento de aquisição de propriedade seguiu o modelo alemão, sem, contudo, ser-lhe totalmente fiel. Afastou-se, portanto, do modelo francês, em que o simples pacto transfere a propriedade. Advirtamos, contudo, de que ainda há juristas em nosso país que, de forma absolutamente minoritária, defendem que o contrato de per si transfere a propriedade em nosso direito.

(...)

Para o sistema francês, a transcrição no registro imobiliário não é constitutiva de direito real. O efeito translativo decorre do próprio contrato de compra e venda, doação, permuta etc. O contrato é, ao mesmo tempo, obrigação e fato gerador do direito real. Transfere-se a propriedade pelo simples consentimento. Quanto aos imóveis, existem nesse direito duas fases distintas: quando do contrato, a propriedade transfere-se, acarretando efeito entre as partes; com o registro imobiliário, o direito alcança o efeito erga omnes. O registro tem apenas o efeito de tornar o negócio público e oponível perante terceiros.

(...)

O Código alemão de 1896 instituiu a transferência de propriedade fundada no registro imobiliário. Pelo sistema alemão, há um exame prévio do título que serve de instrumento para a transferência da coisa, perante juízes de registro imobiliário. Essa modalidade exige cadastro rigoroso e confiável dos imóveis. Efetivado o registro nesse sistema. O ato assume caráter de negócio jurídico abstrato. Desvincula-se o negócio da causa anterior, seja ela contrato de compra e venda, doação, permuta etc. Destarte, o conteúdo do registro estabelece presunção absoluta de propriedade. A transcrição imobiliária é sua prova plena. O registro alemão concede publicidade formal ao tornar públicos os atos ali inscritos, permitindo a qualquer interessado deles tomar conhecimento. Também confere publicidade material ao ato registrado porque a ele atribuiu precipuamente eficácia. A inscrição exterioriza o ato e outorga-lhe eficácia erga omnes.

Nosso ordenamento civil adota o sistema tedesco, com a mitigação necessária à realidade social. O registro imobiliário não poderia apresentar o mesmo caráter absoluto em razão de nossas deficiências estruturais” (VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: direitos reais. – 11. ed. – São Paulo : Atlas, 2011, páginas 185 e 186).

A deficiência a que fez referência Sílvio Venosa é do sistema registral e cadastral. A eficiência do sistema registral imobiliário alemão permite obter a certeza que o imóvel inscrito corresponde com o bem imóvel na realidade. Os direitos inscritos podem gozar de presunção absoluta em razão da base cadastral moderna e minuciosa adotada. E a origem da divisão latifundiária daquele país é mais robusta, sedimentada.

No Brasil, o sistema registral não permite conferir a presunção absoluta. Por isso, o sistema alemão foi adotado com restrições, adaptações. Tanto que o próprio Código Civil relativiza a certeza da inscrição, do registro:

“Art. 1.245. Transfere-se entre vivos a propriedade mediante o registro do título translativo no Registro de Imóveis.

§ 1º Enquanto não se registrar o título translativo, o alienante continua a ser havido como dono do imóvel.

§ 2º Enquanto não se promover, por meio de ação própria, a decretação de invalidade do registro, e o respectivo cancelamento, o adquirente continua a ser havido como dono do imóvel.

Art. 1.246. O registro é eficaz desde o momento em que se apresentar o título ao oficial do registro, e este o prenotar no protocolo.

Art. 1.247. Se o teor do registro não exprimir a verdade, poderá o interessado reclamar que se retifique ou anule.

Parágrafo único. Cancelado o registro, poderá o proprietário reivindicar o imóvel, independentemente da boa-fé ou do título do terceiro adquirente”.

O nosso sistema de transmissão da propriedade imobiliária, assim, impõe a eficácia constitutiva ao registro. A publicidade registral, portanto, possui eficácia constitutiva dos direitos reais ali inseridos.

Francisco Loureiro explana:

“O terceiro sistema, denominado misto ou eclético, foi acolhido em nossos Códigos de 1916 e atual. Para nós, o registro é constitutivo de direito real sobre coisa imóvel. É ele que converte o título, gerador de simples direito de crédito, em direito real, irradiando seus efeitos contra todos. Nesse ponto, aproxima-se do sistema alemão. A diferença, porém, está no fato do registro em nosso sistema ter a natureza de ato jurídico causal, pois permanece vinculado ao título que lhe deu origem. Invalidado o título, invalida-se o registro. O registro tem efeito constitutivo, mas não saneador do título causal. Disso decorre que viciado o título, contaminado estará o registro, que será, então, cancelado. Presume-se ser o imóvel daquele que tem o título registrado no sistema imobiliário, mas tal presunção é relativa no direito brasileiro (juris tantum), segundo se extrai dos arts. 1.245, § 2º, e 1.247 do Código civil, adiante examinados”.(LOUREIRO, Francisco Eduardo. Código Civil Comentado: doutrina e jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.01.2002: contém o Código Civil de 1916 / coordenador Cezar Peluso. – 5. ed. rev. e atual. – Barueri, SP: Manole, 2011,página 1424).

Talvez a evolução do sistema registral brasileiro, a teor das novas técnicas de registro, o avanço do registro eletrônico, as disposições sobre georreferenciamento de imóveis rurais e urbanos, possa indicar, algum dia, a supressão desse regime relativizado. Mas antes disso, é necessário consolidar a base cadastral imobiliária. O mapeamento dos solos urbanos e rural é uma das ferramentas iniciais nesse processo.

Ricardo Dip expõe pensamento crítico sobre o tema:

“Vigente, no Brasil, desde 1976 - quando se inaugurou a eficácia da Lei n. 6.015/73 -, o critério do fólio real teve logo a força propulsora de mito. Afirmou-se que era o predecessor de uma reunião com o cadastro (por misteriosas razoes). O tempo cuidou de mostrar uma realidade menos feliz. A falta de previsão de técnicas mais gráficas para apontar os assentos encerrados ou cancelados fez desaparecer a utopia da claridade dos fólios; hoje, fala-se na hipermatrícula, e sua inflação se dá de tal modo (hoje há casos de matrículas com centenas de fichas) que seu conhecimento e certificação são uma contraeconomia publicitária.

Entre as soluções possíveis – a exigir lei, no entanto – estão: a de permitir averbações marginais (que, atualmente, não se preveem nas matrículas), o que mitigaria a complexa tarefa de conhecimento dos registros vigentes em dado fólio; a de acolher o trato consecutivo abreviado; e até mesmo, após determinado tempo e depois de certo previsto número de inscrições, a da expedição de “matrículas consolidadas”, em que se refeririam apenas os assentos com vigência, conservando-se as matrículas antecedentes para fins de rastreamento histórico, aferição de fidelidade na consolidação e eventual processo judiciário.

A unificação dos signos expressivos permite, por outro lado, já um fólio real realmente gráfico, até mesmo com o recurso visual atualizado por imagens de satélites. Nessa mesma trilha técnica, têm-se por agora os passos iniciais de descrições imobiliárias com utilização de hipertextos de confrontações ou parcelamentos, ou ainda para as menções das pessoas cujos nomes apareçam no fólio. Cumpre evadir, contudo, que esses dados excedam o exigível para a razoável publicidade da situação jurídica imobiliária. A avulsão de informações pode mesmo produzir o efeito contrário ao da perseguida publicidade.

Emerge nesse quadro de progresso técnico o problema da inteira conformação dos novos meios técnicos com a finalidade do registro de imóveis. Vem à tona uma série de interpelações, que partem, p. ex., da justificativa de persistir uma textualização diante de sinalizações imagéticas, passando pelo protocolo de convivência entre sistemas distintos de sinalização – visual e textual -, exigindo critérios para estabelecer a prevalência de uns sobre outros dados, ao par de aferir o ponto em que os hipertextos registrários não vulneram o direito de privacidade e não molestam a graficidade do fólio real” (DIP, Ricardo Henry Marques. Direito administrativo registral. – São Paulo : Saraiva, 2010, p. 60 e 61).

Depois de realizada a prenotação (protocolo) do título formal no Serviço de Registro de Imóveis competente, e efetivada a qualificação registral positiva, o direito, até então obrigacional, expresso no título se torna real. Significa que há uma verdadeira cisão da natureza dos direitos no momento do registro. Antes do registro, o adquirente possui direito obrigacional, inter partes. Após, o adquirente possui direito real, ou seja, com a coisa. A relação jurídica formada é entre o titular do direito e a coisa. A coletividade também é afeta, pois o registro produz o efeitos de oposição frente a todos (eficácia erga omnes).

4.1.2. Momento da ocorrência do fato gerador

Deste modo, podemos chegar ao entendimento que, no direito pátrio, o fato gerador do ITBI é a transmissão do bem (farei referência, daqui em diante, para fins didáticos, apenas aos bens imóveis).

E, mais, que o momento da ocorrência da transmissão é o do registro do título formal, aquele que expressa a relação causal de transferência da coisa.

A hipótese de incidência somente pode ser preenchida no momento da inscrição (registro) do título no Serviço de Registro de Imóveis competente. Essa interpretação deriva da analise do art. 1227 do Código Civil, e do art. 156, II, da Constituição Federal. E a exegese aqui levantada não pode ser afastada. A incidência da norma tributária, hipoteticamente prevista, ocorre no momento em que se dá a transmissão do bem.

A cobrança do tributo em comento deveria ocorrer no momento em que o direito obrigacional constante do título tiver entrada no fólio real, transformando-se em direito real.

Esse é entendimento jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça:

“PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. AGRÁRIO. PARCELAMENTO DO SOLO. ITBI.AUSÊNCIA DE EMISSÃO DA GUIA DE RECOLHIMENTO. OCORRÊNCIA DO FATOGERADOR. DEPENDÊNCIA DA REGULARIDADE DO PROCEDIMENTO. QUESTÃOPREJUDICIAL NÃO RESOLVIDA. RETORNO DOS AUTOS. VIOLAÇÃO DO ARTIGO535, II, DO CPC. CARACTERIZADA.

1. Os autos foram redistribuídos a este relator em 11 de novembro de2009.

2. Os autores ajuizaram ação contra o Distrito Federal, asseverandoque seus imóveis decorreram de parcelamento do solo rural queobedeceu o módulo mínimo de 2,00 ha. Entre outras coisas, afirmaramque o réu tem impedido a alienação (livre disposição) a terceirospela negativa da Secretaria de Finanças de lhes permitir orecolhimento do imposto de transmissão 'inter-vivos' - ITBI.

3. O acórdão recorrido reformou a sentença e reconheceu ser ilegal a"recusa ao fornecimento das certidões negativas de tributos,necessárias ao registro das terras, para os que ainda não oconseguiram, ou para as alienações que houverem por bem intentar"(fl. 470).

4. O debate sobre a regularidade do parcelamento é questãoprejudicial à pretensão dos autores no sentido de alienar livrementeseus imóveis. Isso porque o ITBI tem por fato gerador o registro datransferência no cartório de imóveis, que somente pode serefetivado, nos termos da lei, se obedecido o regular processo para oparcelamento.

5. No caso dos autos, o Tribunal não se debruçou sobre a licitude doparcelamento do solo, limitando-se a mencionar que teria obedecidoao módulo rural mínimo previsto para a área.

6. Para a adequada prestação jurisdicional é inevitável resolver a questão prejudicial imposta (regularidade do parcelamento) quedirecionará a decisão sobre a pretensão principal (possibilidade dealienar os imóveis sem o entrave imposto pelo Distrito Federal).Caracterizada a violação do artigo 535, II, do CPC.

7. Recurso especial provido, determinando-se o retorno dos autos aoTribunal de origem.(REsp 196.982/DF, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 15/12/2009, DJe 02/02/2010)” (destacado e grifado).

PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO – ITBI – RECURSO ESPECIAL INTERPOSTO PELA ALÍNEA "B" DO ART. 105, III, DA CF/88, APÓS A ENTRADA EM VIGOR DA EC 45/2004 – ART. 148 DO CTN – SÚMULA 211/STJ – ITBI – FATO GERADOR.

1. Com a nova redação dada ao permissivo constitucional pela Emenda Constitucional nº 45/2004, transferiu-se ao Supremo Tribunal Federal a competência para julgamento de recurso contra decisão que julgar válida lei local contestada em face de lei federal (art. 102, III, "d" da CF).

2. Aplicável a Súmula 211/STJ quando o Tribunal de origem, a despeito da oposição de embargos de declaração, não se pronuncia sobre tese suscitada em recurso especial.

3.  O fato gerador do Imposto de Transmissão de Bens Imóveis ocorre com o registro da transferência da propriedade no cartório imobiliário, em conformidade com a lei civil. Precedentes.

4. Recurso especial conhecido em parte e, nessa parte, provido.

(REsp 771.781/SP, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 12/06/2007, DJ 29/06/2007, p. 540)” (destacado e grifado).

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Entretanto, o que se tem visto é a cobrança, pelos Municípios, do ITBI no momento da lavratura da escritura pública. No Município de São Paulo, por exemplo, a Lei nº 11.154, de 30 de dezembro de 1991, estipula que a obrigação de efetuar o recolhimento do imposto antecede a própria lavratura do instrumento público.

Vejamos:

Art. 12. Ressalvado o disposto nos artigos seguintes, o imposto será pago antes de se efetivar o ato ou contrato sobre o qual incide, se por instrumento público e, no prazo de 10 (dez) dias de sua data, se por instrumento particular. 

Tal pratica afronta a previsão constitucional da regra-matriz de incidência tributária prevista na Constitucional originária.

Entretanto, com o advento da Emenda Constitucional nº 03, de 17 de março de 1993, houve inovação significativa.

4.1.3. Substituição tributária “por fato futuro”

A mencionada Emenda constitucional incluiu o § 7º no art. 150 da Constituição, instituindo que a “lei poderá atribuir a sujeito passivo de obrigação tributária a condição de responsável pelo pagamento de imposto ou contribuição, cujo fato gerador deva ocorrer posteriormente, assegurada a imediata e preferencial restituição da quantia paga, caso não se realize o fato gerador presumido”.

A cobrança antecipada do tributo é fenômeno tributário conhecido como substituição tributaria “por fato futuro” ou “para frente”. Presume-se que o fato gerador ocorrerá. O objetivo é o de evitar fraudes fiscais.

Essa é a justificativa que os Municípios levantam para a cobrança do ITBI antes da transmissão do direito real perante o Serviço de Registro de Imóveis. Tributa-se, assim, um fato futuro. A hipótese de incidência do imposto em comento não é satisfeita, preenchida. O fato gerador não ocorreu, apesar de já ter sido demonstrado o interesse ou indicado o sentido de que ocorrerá.

Roque AntonioCarraza informa o motivo da criação da figura acima mencionada:

“Na substituição tributária “para frente” parte-se do pressuposto de que o fato imponível (fato gerador “in concreto”) ocorrerá no futuro e que, portanto, se justifica a cobrança antecipada do tributo (ainda mais quando há fundados receios de que o realizador daquele fato futuro praticará evasão fiscal).

Para acautelar interesses fazendários, tributa-se, na substituição tributária “para frente”, fato que ainda não aconteceu (e que, portanto, ainda não existe e, em tese, poderá nunca vir a existir”(CARRAZA, Roque Antonio. Curso de Direito Constitucional Tributário. 20ª ed. – São Paulo : Malheiros, 2004, página 418).

Sobre a figura da substituição tributária “para frente”, o ex-Ministro Ilmar Galvão discorreu no julgamento da ADIN 1.851:

“A EC n. 03/93, ao introduzir no art. 150 da CF/88 o § 7º, aperfeiçoou o instituto, já previsto em nossosistema jurídico-tributário, ao delinear a figura do fato gerador presumido e ao estabelecer a garantiade reembolso preferencial e imediato do tributo pago quando não verificado o mesmo fato a final. Acircunstância de ser presumido o fato gerador não constitui óbice à exigência antecipada do tributo,dado tratar-se de sistema instituído pela própria Constituição, encontrando-se regulamentado por leicomplementar que, para definir-lhe a base de cálculo, se valeu de critério de estimativa que aaproxima o mais possível da realidade. A lei complementar, por igual, definiu o aspecto temporal dofato gerador presumido como sendo a saída da mercadoria do estabelecimento do contribuintesubstituto, não deixando margem para cogitar-se de momento diverso, no futuro, na conformidade,aliás, do previsto no art. 114 do CTN, que tem o fato gerador da obrigação principal como a situaçãodefinida em lei como necessária e suficiente à sua ocorrência. O fato gerador presumido, por issomesmo, não é provisório, mas definitivo, não dando ensejo a restituição ou complementação doimposto pago, senão, no primeiro caso, na hipótese de sua não-realização final. Admitir o contráriovaleria por despojar-se o instituto das vantagens que determinaram a sua concepção e adoção, comoa redução, a um só tempo, da máquina-fiscal e da evasão fiscal a dimensões mínimas, propiciando,portanto, maior comodidade, economia, eficiência e celeridade às atividades de tributação earrecadação." (ADI 1.851, Rel. Min. Ilmar Galvão, julgamento em 8-5-02,DJ de 22-11-02)”.

A cobrança antecipada, no entanto, configura inconstitucionalidade. E esta incompatibilidade se dá em relação à própria Emenda constitucional.

É o que assevera Carraza:

“Temos para nós, entretanto, como já adiantamos, que o referido § 7º é inconstitucional, porque atropela o princípio da segurança jurídica, que, aplicado ao Direito Tributário, exige, dentre outras coisas, que o tributo só nasça após a ocorrência real (efetiva) do fato imponível.

É sempre bom reafirmarmos que o princípio da segurança jurídica diz de perto com os direitos individuais e suas garantias. É, assim, “cláusula pétrea” e, nessa medida, não poderia ter sido amesquinhado por emenda constitucional (cf. art. 60, § 4º, da CF).

Evidentemente, a inconstitucionalidade perdura, mesmo “assegurada a imediata e preferencial restituição da quantia paga, caso não se realize o fato gerador presumido”. Deveras, a eventual recomposição do dano não restabelece o primado da segurança jurídica, que, aliás, resta irremediavelmente atropelado com a simples tributação de fato imaginário, isto é, que ainda não aconteceu (mesmo que, depois, ele realmente aconteça)” (CARRAZA, Roque Antonio. Curso de Direito Constitucional Tributário. 20ª ed. – São Paulo : Malheiros, 2004, páginas 420 e 421).

Ao efetuar a exigência de recolhimento do tributo de forma antecipada, o Município estará prevendo uma conduta, antevendo uma ação. A liberdade e a autonomia da vontade restarão prejudicadas. O particular é compelido a efetuar o pagamento de um tributo sem nem mesmo ter ocorrido a hipótese legalmente prevista. Existem situações em que a parte interessada não deseja, no momento, submeter o título ao registro. Pode ocorrer, por exemplo, de o adquirente não dispor da quantia necessária para efetuar o pagamento. Conseguiu apenas pagar o preço da coisa ao vendedor, com muito sacrifício. Ou ainda, de outro modo, o adquirente não pode efetuar o registro, visto que sobre o imóvel adquirido recai ônus real hipotecário, que depende da sua devida quitação. O adquirente deveria ter o direito de optar pagar o imposto apenas no momento do registro, que pode levar anos para ocorrer. E isso ocorre reiteradamente, não é uma situação rara ou isolada.

Por fim, a jurisprudência no Superior Tribunal de Justiça confirma o entendimento aqui exposto:

"TRIBUTÁRIO. RECURSO ORDINÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. ITBI. FATO GERADOR. CTN, ART. 35 E CÓDIGO CIVIL, ARTS. 530, I, E 860, PARÁGRAFO ÚNICO. REGISTRO IMOBILIÁRIO.

1.  O fato gerador do imposto de transmissão de bens imóveis ocorre com a transferência efetiva da propriedade ou do domínio útil, na conformidade da Lei Civil, com o registro no cartório imobiliário.

2. A cobrança do ITBI sem obediência dessa formalidade ofendeo ordenamento jurídico em vigor.

3. Recurso ordinário conhecido e provido."(ROMS 10650/DF, Rel. Min. Francisco Peçanha Martins. DJ de 04-09-2000, página 0135) (grifo nosso).

"TRIBUTÁRIO - IMPOSTO DE TRANSMISSÃO DE BENS IMÓVEIS - FATO GERADOR - REGISTRO IMOBILIÁRIO - (C. CIVIL, ART. 530).

A propriedade imobiliária apenas se transfere com o registro respectivo título (C. Civil, Art. 530). O registro imobiliário é o fato gerador do Imposto de Transmissão de Bens Imóveis. Assim, a pretensão de cobrar o ITBI antes do registro imobiliário contraria o Ordenamento Jurídico." (REsp 12.546/HUMBERTO) (RESP nº 253.364/DF, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, DJ de 16/04/2001, página 104).

4.2. BASE DE CÁLCULO

Outro tema que tem gerado inúmeras discussões é a base de cálculo do ITBI.

O art. 38 do Código Tributário Nacional impõe que seja utilizado o valor venal dos bens transmitidos.

O interprete deve ter em mente, como foi dito anteriormente, que o CTN foi editado na vigência da Constituição de 1946, com a alteração da EC nº 18, de 1965. Houve, na época, a unificação dos tributos incidentes sobre as operações de transmissão inter vivos e causa mortis. O CTN seguiu essa tendência. Merece, neste momento, repetir a crítica já feita quanto à desatualização do Código. Acrescendo, ainda, que a aplicação, hoje, da base de cálculo escolhida pelo legislador da década de 1960 pode configurar verdadeiro erro fiscal.

E isso pode ser justificado pelo simples fato de que o fato gerador do tributo em comento é a transmissão onerosa de bens imóveis. A onerosidade indica que a transferência de domínio ocorreu por meio da atribuição de valor econômico à coisa.

Certos negócios jurídicos, como a compra e venda, possuem, além dos elementos essenciais a todo negócio jurídico, elementos essenciais específicos. Neste caso, ao vender e ao comprar certo imóvel, deve ser fixado o preço do bem. A relação causal somente se firmou pelo acordo de vontades quanto a este elemento do negócio, o preço. Não havendo acordo quanto ao preço, não há negócio jurídico.

Pois bem. A transmissão imobiliária, neste exemplo, foi valorada. A apresentação da escritura pública de compra e venda no Serviço de Registro de Imóveis competente somente foi possível pela existência do elemento preço.

É possível depreender, com isso, que a transmissão (fato gerador do ITBI) deve estar vinculado ao valor do negócio jurídico que lhe deu existência. O estabelecimento de outra base de cálculo para o ITBI não merece ser acolhida.

O Código Tributário Nacional elegeu o valor venal. Em verdade, todos os atos de transmissão sujeitos à incidência do ITBI possuem certo valor econômico. Na compra e venda tem o preço. Na dação em pagamento tem o valor da dívida. Na permuta desigual pode haver a compensação financeira da troca (em não havendo, incide o ITCMD sobre a diferença). Na cessão de direitos há o pagamento pela cessão.

O Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido de que a base de cálculo do ITBI deve ser o valor real do imóvel.

Vejamos o entendimento do Ministro Luiz Fux, atualmente no Supremo Tribunal de Justiça:

TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DECLARATÓRIA. ITBI. ARREMATAÇÃO JUDICIAL. BASE DE CÁLCULO. VALOR DA ARREMATAÇÃO E NÃO O VENAL.

PRECEDENTE. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL DEMONSTRADO. DIREITO LOCAL.

SÚMULA 280 DO STF. OMISSÃO – ART. 535, CPC. INOCORRÊNCIA. RECURSO PROVIDO PELA ALÍNEA "C".

1. A arrematação representa a aquisição do bem alienado judicialmente, considerando-se como base de cálculo do ITBI aquele alcançado na hasta pública. (Precedentes: (REsp 863.893/PR, Rel.

Ministro FRANCISCO FALCÃO, PRIMEIRA TURMA, DJ 07/11/2006; e REsp 2.525/PR, Rel. Ministro  ARMANDO ROLEMBERG, PRIMEIRA TURMA, DJ 25/06/1990).

2. Nesse sentido, o precedente: TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE TRANSMISSÃO INTER VIVOS. BASE DE CÁLCULO.

VALOR VENAL DO BEM. VALOR DA AVALIAÇÃO JUDICIAL. VALOR DA ARREMATAÇÃO.

I - O fato gerador do ITBI só se aperfeiçoa com o registro da transmissão do bem imóvel. Precedentes: AgRg no Ag nº 448.245/DF, Rel. Min. LUIZ FUX, DJ de 09/12/2002, REsp nº 253.364/DF, Rel. Min.HUMBERTO GOMES DE BARROS, DJ de 16/04/2001 e RMS nº 10.650/DF, Rel.Min. FRANCISCO PEÇANHA MARTINS, DJ de 04/09/2000. Além disso, já se decidiu no âmbito desta Corte que o cálculo daquele imposto “há de ser feito com base no valor alcançado pelos bens na arrematação, e não pelo valor da avaliação judicial” (REsp. n.º 2.525/PR, Rel. Min.ARMANDO ROLEMBERG, DJ de 25/6/1990, p. 6027). Tendo em vista que a arrematação corresponde à aquisição do bem vendido judicialmente, é de se considerar como valor venal do imóvel aquele atingido em hasta pública. Este, portanto, é o que deve servir de base de cálculo do ITBI.

II - Recurso especial provido.

(REsp 863.893/PR, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, PRIMEIRA TURMA, DJ 07/11/2006, p. 277)

3. Deveras, é cediço que o Tribunal a quo assentou: “Instituído o ITBI pelo Município de Porto Alegre, “A base de cálculo do imposto é o valor venal do imóvel objeto da transmissão ou da cessão de direitos reais a eles relativos, no momento da estimativa fiscal efetuada pelo Agente Fiscal da Receita Municipal” (caput do art. 11 da LCM Nº 197/89).

Já, o art. 12 da referida legislação dispõe o seguinte: “Art. 12 – São, também, bases de calculo do imposto: [...] IV – a estimativa fiscal ou o preço pago, se este for maior, na arrematação e na adjudicação de imóvel”.

No caso, cuida-se de arrematação judicial efetuada por R$ 317.000,00. O arrematante tem responsabilidade tributária pessoal relativamente a esse tributo, que tem por fato gerador a transmissão do domínio (art. 35, I, do Código Tributário Nacional), prevalecendo, portanto, a legislação municipal”. (fls. 114 e ss).

4. A Súmula 280/STF dispõe que: "Por ofensa a direito local não cabe recurso extraordinário".

5. O acórdão recorrido, em sede de embargos de declaração, que enfrenta explicitamente a questão embargada não enseja recurso especial pela violação do artigo 535, II, do CPC.

6. Ademais, o magistrado não está obrigado a rebater, um a um, os argumentos trazidos pela parte, desde que os fundamentos utilizados tenham sido suficientes para embasar a decisão.

7. Recurso especial parcialmente conhecido e provido.

(REsp 1188655/RS, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 20/05/2010, DJe 08/06/2010) (grifado e destacado).

A competência tributária é do Município. Ele é o ente jurídico titular do direito de definir a forma pela qual será cobrado o ITBI.

Estamos aqui, no entanto, expondo o entendimento constitucional sobre o tema.

O valor venal corretamente é a base de cálculo do Imposto sobre a Propriedade Territorial Urbana. Não há como agir de outra forma. Deve ser estabelecido um padrão de avalição dos imóveis, mesmo que não expresse a realidade comercial dos mesmos. A razão é evidente: não são, em sua maioria, bens disponibilizados à negociação. A avaliação genérica, portanto, é a mais plausível.

De outra forma, os bens sujeito ao ITBI foram postos em comercialização, em negociação.

O Superior Tribunal de Justiça, novamente, se posicionou no mesmo sentido:

“ITBI – Base de cálculo – Contribuinte que busca aplicar ao imposto sobre a transmissão de bens imóveis (ITBI) a mesma base de cálculo adotada pelo Município para o cálculo do IPTU – Impossibilidade – A base de cálculo do ITBI é o valor venal real do bem, assim tido como o valor de comercialização do imóvel. Desta forma, no caso de transmissão de bem imóvel por compra e venda firmada entre particulares, a base de cálculo do imposto de transmissão de competência municipal é o valor real da operação, devendo prevalecer sobre qualquer outro, pois o valor venal real é uma grandeza que não se confunde, necessariamente, com aquela indicada na planta genérica de valores (IPTU)”. (STJ – AREsp nº 95.738 – SP – 2ª Turma – Rel. Min. Herman Benjamin – DJ 08.03.2012).

Hugo de Brito Machado concorda com o entendimento de que o elemento preço é essencial para diferenciar as bases de cálculo do IPTU e do ITBI:

“Em se tratando de imposto que incide sobre a transmissão por ato oneroso, tem-se como ponto de partida para a determinação de sua base de cálculo na hipótese mais geral, que é a compra e venda, o preço. Este funciona no caso, como uma declaração de valor feita pelo contribuinte, que pode ser aceita, ou não, pelo fisco, aplicando-se, na hipótese de divergência, a disposição do art. 148 do CTN. (MACHADO, Hugo de Brito. CURSO DE DIREITO TRIBUTÁRIO. 29ª ed. – São Paulo : Malheiros, 2008, p. 398)

E o Superior Tribunal de Justiça confirma o entendimento:

“ITBI. BASE DE CÁLCULO. VALOR DE MERCADO. VIOLAÇÃO AOS ARTS. 535, II, E 458, II, DO CPC. INOCORRÊNCIA. PREQUESTIONAMENTO DO ART. 146 DO CTN. INOCORRÊNCIA. REEXAME DE PROCESSO ADMINISTRATIVO FISCAL. INADMISSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. (…) III – É cediço na doutrina majoritária e na jurisprudência dessa Corte que a base de cálculo do ITBI é o valor real da venda do imóvel ou de mercado, sendo que até nos casos em que não houve recolhimento, pode-se arbitrar o valor do imposto, por meio de procedimento administrativo fiscal, com posterior lançamento de ofício.

(...)

IV – Conforme consignado no v. acórdão, houve a devida intimação da complementação do lançamento, fato que a agravante alega não ter ocorrido. Entretanto, a análise da alegada irregularidade do procedimento administrativo fiscal demanda reexame de provas, o que é inadmissível pela via eleita do especial, a teor da Súmula 07/STJ. V – Agravo regimental improvido”. (AgRg no REsp 1057493/SP, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 26/08/2008, DJe 04/09/2008).

4.2.1. Evasão fiscal e simulação

A eleição de outra base de cálculo, que não seja o valor real da alienação, pode gerar prejuízos ao erário publico. Em alguns casos, as leis tributárias municipais aceitam, como base de cálculo do ITBI, o valor declarado pelas partes.

E a autoridade legislativa, ciente disso, instituiu formas de coibir as condutas tendentes à prática da chamada evasão fiscal.

A Lei nº 8.137, de 27 de dezembro de 1990, foi editada justamente para tipificar condutas tributárias ilícitas.

O art. 1º assim prevê:

Art. 1° Constitui crime contra a ordem tributária suprimir ou reduzir tributo, ou contribuição social e qualquer acessório, mediante as seguintes condutas:

I - omitir informação, ou prestar declaração falsa às autoridades fazendárias;

II - fraudar a fiscalização tributária, inserindo elementos inexatos, ou omitindo operação de qualquer natureza, em documento ou livro exigido pela lei fiscal;

III - falsificar ou alterar nota fiscal, fatura, duplicata, nota de venda, ou qualquer outro documento relativo à operação tributável;

IV - elaborar, distribuir, fornecer, emitir ou utilizar documento que saiba ou deva saber falso ou inexato;

V - negar ou deixar de fornecer, quando obrigatório, nota fiscal ou documento equivalente, relativa a venda de mercadoria ou prestação de serviço, efetivamente realizada, ou fornecê-la em desacordo com a legislação.

Pena - reclusão de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa.

Ao prestar declaração falsa às autoridades fazendárias, o contribuinte comete crime contra a ordem tributária. Isso se aplica ao adquirente de imóvel que, com o intuito de recolher valores menores à Fazenda, informa que a transação, por exemplo, ocorreu por valor muito menor do que realmente foi acordado entre as partes. E isso acontece com frequência.

Pode ocorrer ainda a simulação. A definição deste vício do negócio jurídico é dada pelo Código Civil, no art. 167:

Art. 167. É nulo o negócio jurídico simulado, mas subsistirá o que se dissimulou, se válido for na substância e na forma.

§ 1º Haverá simulação nos negócios jurídicos quando:

I - aparentarem conferir ou transmitir direitos a pessoas diversas daquelas às quais realmente se conferem, ou transmitem;

II - contiverem declaração, confissão, condição ou cláusula não verdadeira;

III - os instrumentos particulares forem antedatados, ou pós-datados.

§ 2º Ressalvam-se os direitos de terceiros de boa-fé em face dos contraentes do negócio jurídico simulado.

As partes, deliberadamente, acordam em exprimir declaração não verdadeira, ou falsa.

Diariamente, essas condutas são recorrentes nos Tabelionatos de Notas. A prática ocorre justamente para diminuir o encargo financeiro da operação imobiliária.

Manuel de Andrade ensina a simulação ocorre quando há “a divergência intencional entre a vontade e a declaração, procedente do acordo entre o declarante e o declaratário e determinada pelo intuito de enganar terceiros” (ANDRADE, Manuel A. Domingues de.Teoria geral da relação jurídica. Coimbra, Almedina, 1974, vol. II, página 169).

Um dos exemplos da política de combate a essas práticas é o art. 20 do Decreto nº 51.627, de 13 de julho de 2010, do Município de São Paulo. Segue o teor do dispositivo:

“Art. 20. Comprovada, a qualquer tempo, pela fiscalização, a omissão de dados ou a falsidade das declarações consignadas nas escrituras ou instrumentos particulares de transmissão ou cessão, o Imposto ou sua diferença será exigido com o acréscimo da multa de 100% (cem por cento), calculada sobre o montante do débito apurado, sem prejuízo dos acréscimos devidos em razão de outras infrações eventualmente praticadas”.

E isso ocorre em São Paulo em razão de que a base de cálculo escolhida, muito embora seja o valor venal, mais se aproxima do o valor real do bem transmitido.  É que o conceito legal de valor venal naquele Município é o seguinte:

“Art. 7º A base de cálculo do Imposto é o valor venal dos bens ou direitos transmitidos, assim considerado o valor pelo qual o bem ou direito seria negociado à vista, em condições normais de mercado”.

E continua:

“Art. 8º A Secretaria Municipal de Finanças tornará públicos os valores venais atualizados dos imóveis inscritos no Cadastro Imobiliário Fiscal do Município de São Paulo.

§ 1º A Secretaria Municipal de Finanças deverá estabelecer a forma de publicação dos valores venais a que se refere o “caput” deste artigo.

§ 2º Os valores venais dos imóveis serão atualizados periodicamente, de forma a assegurar sua compatibilização com os valores praticados no Município, através de pesquisa e coleta amostral permanente dos preços correntes das transações e das ofertas à venda do mercado imobiliário, inclusive com a participação da sociedade, representada no Conselho Municipal de Valores Imobiliários.

§ 3º Os valores venais dos imóveis a que se refere o “caput” deste artigo têm presunção relativa e poderá ser afastada se:

I – o valor da transação for superior;

II – a Administração Tributária aferir base de cálculo diferente em procedimentos relativos, dentre outros, a avaliação especial, arbitramento e impugnação de lançamento;

III – a Administração Tributária constatar erro, fraude ou omissão, por parte do sujeito passivo, ou terceiro, em benefício daquele, na declaração dos dados do imóvel inscrito no Cadastro Imobiliário Fiscal e utilizados no cálculo do valor venal divulgado”.

O dispositivo deixa claro que a base para o cálculo do ITBI terá por referência valores de mercado. Obviamente, o método utilizado não corresponde ao ideal, que somente existiria se o valor real das transações fosse utilizado como base. Entretanto, a obtenção de tais informações é tarefa árdua, considerando que isso depende da declaração das partes interessadas. Para evitar a simulação, o fisco municipal decidiu estabelecer que o valor venal deve corresponder ao valor real de mercado. Isso como forma de aproximar-se do valor real da transação, que pode ser maior ou menor do que o valor venal.


5. CONCLUSÃO

O estudo do Imposto de Transmissão de Bens Imóveis, direitos reais sobre imóveis, e cessão de direitos a sua aquisição, inter vivos, a título oneroso nos expõe a diversas questões controversas.

O sistema de transmissão imobiliária adotado no Brasil reza que a aquisição de direitos reais sobre imóveis ocorre com o registro do título perante o Cartório de Registro e Imóveis competente. O título constituição apenas uma relação obrigacional entre as partes contratantes. A publicidade formal conquistada com o registro possui eficácia constitutiva, garantindo oponibilidade erga omnesà aquisição ocorrida. Adotou-se a sistemática alemã, com a necessária adaptação à realidade econômica, social, geográfica, cultural e tecnológica do Brasil.

Assim, o fato gerador do ITBI é a transmissão do bem imóvel ou do direito real a ele relativo. E o momento em que ocorre essa transmissão, no Brasil, é o mesmo do registro. A exação fiscal deve ocorrer, portanto, quando da apresentação do título formal perante o Serviço de Registro de Imóveis, e não quando da lavratura da escritura pública. Exigir a cobrança da guia de recolhimento quitada para a lavratura do instrumento público configura inconstitucionalidade, pois fere a regra-matriz de incidência do ITBI prevista no art. 156, II, da Constituição Federal.

Se a transmissão ainda não ocorreu, como é possível ser exigido o recolhimento do tributo? Por algum motivo, o negócio pode deixar de ser realizado. O adquirente pode desistir do acordo, por livre e espontânea vontade. O fato gerador, ou fato imponível não ocorreu. Não há incidência da norma abstrata e hipotética. Não há, então, que se em cobrança.

Pelo contrário, a exigência do pagamento do ITBI antes da ocorrência do fato gerador é reiterada entre os Municípios. O argumento utilizado é o da tese da substituição tributária “por fato futuro”, introduzida pela Emenda Constitucional nº 03, de 1993, que incluiu o parágrafo 7º no art. 150 da Constituição de 1988. A inconstitucionalidade é evidente. A segurança jurídica do cidadão é afetada. A liberdade e a autonomia da vontade são prejudicadas, mesmo que haja previsão de restituição dos valores pagos, caso o fato gerador não se consume. O valor pago a título de imposto pode ser necessário para o contribuinte naquele exato momento para custear outras despesas pessoais. Em seu amago, tem a intenção de registrar o título em outro momento, não definido. Poderia muito fazê-lo, não fosse a mencionada tese.

A simulação e a evasão fiscal estão diretamente ligadas à noção de base de cálculo.

O ITBI tem por base de cálculo, constitucionalmente, mesmo que implicitamente, o valor real das transmissões imobiliárias. Ocorre que as leis municipais, muitas vezes, utilizam como parâmetro o valor venal obtido por plantas de valores elaborados com base no valor de mercado médio dos imóveis situados numa mesma região, bairro, distrito, etc. Frequentemente, essas plantas estão desatualizadas, configurando uma forma de diminuição na arrecadação de tributos, especialmente o ITBI (o valor venal também é base de cálculo do IPTU).

Em alguns casos, tem-se por base o valor declarado pelas partes. Tal permissivo dá azo à condutas simulatórias e fraudulentas. Permitir ao eventual contribuinte definir, de livre e espontânea vontade, o valor do tributo a ser pago é conduta que deve ser evitada pelos fiscos municipais.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ANDRADE, Manuel A. Domingues de. Teoria geral da relação jurídica. Vol. II. Coimbra, Almedina, 1974.

AMARO, Luciano da Silva. Direito Tributário Brasileiro. 14ª. ed. São Paulo: Saraiva, 2008.

ATALIBA, Geraldo. Hipótese de incidência tributária. 6ª ed. São Paulo: Malheiros, 2006.

CARRAZA, Roque Antonio. Curso de Direito Constitucional Tributário. 20ª ed. – São Paulo : Malheiros, 2004.

CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 22ª Edição. – São Paulo : Saraiva, 2010.

DIP, Ricardo Henry Marques. Direito administrativo registral. – São Paulo : Saraiva, 2010.

LOUREIRO, Francisco Eduardo. Código Civil Comentado: doutrina e jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.01.2002: contém o Código Civil de 1916 / coordenador Cezar Peluso. – 5ª. ed. rev. e atual. – Barueri, SP: Manole, 2011.

MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 29ª ed. – São Paulo : Malheiros, 2008.

VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: direitos reais. – 11ª. ed. – São Paulo : Atlas, 2011.

Sobre o autor
José Eduardo de Moraes

Tabelião e Registrador do 1º Ofício de Porto Franco - Maranhão.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MORAES, José Eduardo. O ITBI: estudo sobre pontos controversos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3724, 11 set. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/25262. Acesso em: 22 dez. 2024.

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