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Considerações sobre assédio moral como fator desencadeador para a Síndrome de Burnout no âmbito das relações de trabalho

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Agenda 02/03/2014 às 12:39

4 SÍNDROME DE BURNOUT

O Assédio Moral acarreta consequências desastrosas ao trabalhador assediado, desencadeando, após longo período sobre grande estresse, a Síndrome do Esgotamento Profissional ou Síndrome de Burnout que trataremos neste tópico.

4.1 Definição

Os primeiros estudos sobre a Síndrome de Burnout datam da década de 70 nos Estados Unidos, o qual o psiquiatra americano Herbert J. Fredenberger descreveu o fenômeno observando em si e seus colegas com quadro de exaustão profunda, perda de motivação e responsabilidade para com o trabalho.

O termo advém do verbo em inglês to burn out, que em tradução livre significa 'queimar por completo', Fredenberger[31] definiu a síndrome como um esgotamento de energia, no qual os acometidos sentem-se sobrecarregados por causa de outras pessoas. Tornando seu trabalho ineficiente, não se relacionando com a perda da criatividade, muito menos ao tédio, mas a causa principal advém do relacionamento interpessoal.

Definida em estudo do website Psiqweb como:

[...] uma reação à tensão emocional crônica gerada a partir do contato direto, excessivo e estressante com o trabalho, essa doença faz com que a pessoa perca a maior parte do interesse em sua relação com o trabalho, de forma que as coisas deixam de ter importância e qualquer esforço pessoal passa a parecer inútil.

É comparado ao mais alto nível de estresse: a exaustão, não se sabendo ao certo quanto tempo é necessário para se alcançar esse estágio. A Classificação Internacional das Doenças - CID 10 - inclui a Síndrome de Burnout, no grupo V dos Transtornos Mentais e do Comportamento Relacionados com o Trabalho, fixando-o no item Z73.0: "Esgotamento".

A Síndrome de Burnout é conhecida na doutrina por diversos termos, tais como: estresse laboral, estresse laboral assistencial, estresse profissional, estresse ocupacional, Síndrome de queimar-se pelo trabalho, neurose profissional, neurose de excelência e Síndrome do esgotamento profissional.

4.2 Características

A Síndrome de Burnout é a terceira maior causa de afastamento do trabalho, segundo informações coletadas junto à Previdência Social.

Pessoas inicialmente saudáveis, em algum momento de suas vidas profissionais têm sua estrutura abalada, ante o ambiente de trabalho desestabilizado, com metas impossíveis de realizadas.

Segundo Pereira[32], a Síndrome do Esgotamento Profissional caracteriza-se basicamente pelo:

[...] esgotamento físico, psíquico e emocional em consequência das condições excessivas de estresse no ambiente de trabalho, causando distúrbios mentais e psíquicos seguido de: estresse, hipertensão arterial, perda de memória, ganho de peso e depressão, [...] ansiedade, absenteísmo, cansaço constante, apatia, irritabilidade, sono excessivo, despersonalização, [...] falta de energia e baixa autoestima.

Pereira apresenta relação de sintomas característicos da síndrome, são eles:

a)  Físicos: fadiga constante e progressiva distúrbios de sono, dores musculares ou osteomusculares, cefaléias, perturbações gastrointestinais, imunodeficiência, transtornos cardiovasculares, distúrbios do sistema respiratório, disfunções sexuais e alterações menstruais em mulheres;

b) Psíquicos: falta de atenção e concentração, alterações na memória, lentificação do pensamento, sentimento de alienação, sentimento de solidão, impaciência, sentimento de insuficiência, baixa autoestima, labilidade emocional, dificuldade de autoaceitação, depressão, paranóia;

c) Comportamentais: negligência ou excesso de escrúpulos, irritabilidade, incremento da agressividade, incapacidade pra relaxar, dificuldade de aceitação de mudança, perda de iniciativa, aumento do consumo de substâncias, comportamento de alto risco, suicídio;

d) Defensivos: tendência ao isolamento, sentimento de onipotência, perda de interesse pelo trabalho/lazer, absenteísmo, ironia/cinismo.

É diagnosticada por profissionais da psicologia e psiquiatria e encontrada em vítimas assediadas, apresentam quadro de desabilidade pessoal e profissional, afastamento do convívio de pessoas próximas e embotamento afetivo.

O website PsiquiWeb relacionou características da personalidade, os fatores individuais, de pessoas com predisposição a adquirirem a Síndrome de Burnout, abaixo segue a quadro:

Padrão de Personalidade

Pessoas competitivas, esforçadas, impacientes, com excesso de necessidade em ter o controle da situação, dificuldade de tolerância das frustrações.

Envolvimento

Pessoas empáticas e agradáveis, sensíveis e humanos, com alta dedicação profissional, altruístas, obsessivos, entusiasmados.

Pessimismo

Costumam destacar aspectos negativos, suspeitam sempre do insucesso, sofrem por antecipação.

Perfeccionismo

Pessoas muito exigentes com si mesmas e com os outros, intolerância aos erros, insatisfeitas com os resultados.

Grande expectativa profissional

Pessoas com grande chance de se decepcionarem.

Centralizadores

Pessoas com dificuldade em delegar tarefas ou para trabalhar em grupo.

Passividade

Pessoas sempre defensivas, tendem à evitação diante das dificuldades.

Nível educacional

São mais propensas pessoas com maior nível educacional.

Estado civil

As pessoas solteiras, viúvas ou divorciadas são mais propensas ao Burnout.

O referido website ainda relaciona algumas características que despertam no assediado o Burnout, “[...] pouca autonomia no desempenho profissional, problemas de relacionamento com as chefias, problemas de relacionamento com colegas ou clientes, conflito entre trabalho e família, sentimento de desqualificação e falta de cooperação da equipe”.

4.3 Diferenças

O assediado não necessariamente adquire todos os sintomas apresentados no item anterior, assim, faz-se necessário estabelecermos parâmetros entre a Síndrome de Burnout e alguns elementos que se assemelham. Vejamos:

4.3.1 Estresse, o Burnout é inicialmente um estresse crônico, mas com ele não se confunde, pois o estresse é a dificuldade de agir com adequação e propriedade, um exemplo apresentado pelo professor Roberto Cruz em entrevista à Justiça do Trabalho de Santa Catarina é que as pessoas estressadas são como elásticos que se esticam até um limite, quem sofre do Burnout a elasticidade é rompida não conseguindo voltar a sua forma original.

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Outros pontos a serem discutidos é que enquanto o Burnout é uma defesa caracterizada pela desistência, produzindo no assediado paranóias, a despersonalização e o desligamento, o estresse é pelo super envolvimento, produzindo desordens associadas à Síndrome do Pânico, fobias e quadros de ansiedade, dentre outras características.

4.3.2 Depressão, a Síndrome ora tratada no presente trabalho assemelha-se em muito com a depressão, pois o acometido de Burnout não tem motivação para a vida, afastando-se de pessoas próximas, isolando-se de modo integral, contudo, na depressão, segundo Pereira[33], há maior "[...] submissão à letargia e a prevalência aos sentimentos de culpa e derrota, enquanto nas pessoas com Burnout os sentimentos são de desapego e tristeza".

A depressão é tida como um fenômeno global e generalizado, ou seja, pode desenvolver-se por razões e consequências não englobando necessariamente o ambiente de trabalho.

4.4 Formas de Tratamento

Saúde mental pressupõe equilíbrio emocional total, uma capacidade de autocontrole, capacidade de adaptação rápida a situações difíceis e uma capacidade de superá-los, ter o conhecimento para restaurar o equilíbrio emocional em um curto período de tempo.

Contudo, o indivíduo assediado e portador do Burnout necessita de atendimento profissional adequado, sendo necessária a utilização medicamentosa atrelada à terapia, podendo este auxílio ser executado preventivamente para que não ocasione maiores danos.

O diagnostico é realizado por profissionais da área de psicologia e psiquiatria. As vítimas assediadas apresentam quadro de desabilidade pessoal e profissional, afastamento do convívio de pessoas próximas e embotamento afetivo, como já verificado nos itens anteriores.

Alguns fatores impedem o desenvolvimento da Síndrome de Burnout na empresa, são eles: Desenvolvimento de habilidades e conhecimentos; Melhoria das condições de trabalho e de descanso; Desenvolvimento de um conteúdo de trabalho e das condições de trabalho; Motivação; Criação de sistema de escape do estresse diário; e Melhoria na atmosfera psicológica visando o coletivo.

Outros fatores a serem elencados para evitar o desenvolvimento do Burnout, são os de cunho individual e pessoal, no qual o próprio assediado poderá cultivar: possuir outros interesses; dormir e alimentar-se bem; vida social satisfatória; procurar relacionamentos nas diversas áreas do conhecimento; autoavaliação; estar aberto às novas experiências; leitura de literaturas, ou quaisquer outros passatempos que tragam alegria e satisfação.

4.5 Jurisprudência

Acerca do tema, estão dispostos apenas dois acórdãos oriundos de Recurso Ordinários, que seguem abaixo.

TRECHO.[34] Indubitavelmente, a conduta do reclamante no trabalho denotava seu stress, uma vez que reveladora dos sintomas apontados nas lições acima reproduzidas. E o ambiente de trabalho, com a pressão de sua Chefe, a quantidade de  pessoas para  a ser  atendidas é  o nexo  de  causalidade e agravamento de sua doença. É possível inferir também que em decorrência dos anos de trabalho (o reclamante  ingressou  aos  serviços  da  reclamada  em  18/06/84)  e  sempre tendo que atender a muitos usuários por dia (380 pessoas) somente com mais dois  colegas,  mediante  pressão  da  Chefe  para  atendimento  rápido, desencadeou o stress do reclamante, tendo se manifestado em seu penúltimo afastamento. Conseguintemente, caso a reclamada não rompesse seu contrato de trabalho abruptamente, de inopino, de supetão, com o claro objetivo de livrarse do reclamante, este ainda estaria afastado para tratamento de saúde junto aos serviços médicos da reclamada. Por tais razões, ao contrário do Magistrado “a quo” que fundamentou sua convicção na conclusão do laudo pericial, esta Relatora, pela prova dos autos, convence-se de que  a  doença  do  reclamante  teve  como  motivo desencadeador o ambiente de trabalho que, ao longo dos anos, agravou os sintomas culminando com seus afastamentos sucessivos tornando-o doente e stressado, sem condições de enfrentar as tarefas diárias. (TRT 15º R. - RO 01079200304015004 - Rel. Keila Nogueira Silva - 14/10/2005).

TRECHO[35]. DO EXPOSTO, CONHEÇO dos recursos ordinários interpostos pelas partes e, no mérito, DOU PARCIAL PROVIMENTO ao recurso da reclamante para condenar a reclamada a reintegração da autora no emprego, com a suspensão do contrato de trabalho até o fim do afastamento com a percepção de benefício previdenciário, devendo pagar os salários do período de 22.1.03 a 13.3.03, com garantia de emprego até doze meses após o término do auxílio-doença, o qual deverá ser considerado como acidentário, na forma do art. 118 da Lei 8.213/91e com o restabelecimento do convênio médico. Acresço à condenação, ainda, a indenização por dano moral, arbitrada em R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais) para a data da propositura da ação, e determino que a responsabilidade da ré na satisfação de honorários periciais. NEGO PROVIMENTO ao recurso da reclamada. Por força dos acréscimos, rearbitro o valor da condenação em R$80.000,00 (oitenta mil reais) e das custas em R$1.600,00 (um mil e seiscentos reais). No mais fica mantida a r. sentença recorrida, nos termos da fundamentação do voto. (TRT 2º R. - RO 00234200446402000 - Rel. Antero Arantes Martins - 25/02/2008).


5 CONSEQUÊNCIAS JURÍDICAS E SOCIAIS

Nos primórdios da civilização quando havia a necessidade de uma reparação pro um mal causado, era aplicado o instituto da vingança privada, na égide da Lei de Talião, onde a vítima poderia apenas produzir no meliante “[...] dano idêntico ao que experimentou” [36].

Como visto nos tópicos anteriores, a prática do Assédio Moral objetiva à exclusão do assediado no ambiente de trabalho, acarretando, além do evidente dano à moral e a saúde do empregado, consequências jurídicas, as quais o assediador e o empregador deverão ser responsabilizados.

Apesar de não haver, ainda, legislação especifica a respeito, há violação expressa nas normas Constitucionais, Lei Civil e Penal, na Consolidação das Leis do Trabalho – CLT –, além de diversos Tratados Internacionais dos Direitos do Homem e do Cidadão, nos quais o Brasil é signatário.

Inicialmente, quanto às normas constitucionais, atreladas ao Código Civil, temos a proteção dos direitos fundamentais da personalidade, dentre eles: a dignidade da pessoa humana, incolumidade física e psíquica, à honra, dentre outros.

O ilustríssimo professor Miguel Reale em seu artigo ‘Os direitos da personalidade’ disserta a respeito:

A pessoa, como costumo dizer, é o valor-fonte de todos os valores, sendo o principal fundamento do ordenamento jurídico; os direitos da personalidade correspondem às pessoas humanas em cada sistema básico de sua situação e atividades sociais, [...] O importante é saber que cada direito da personalidade corresponde a um valor fundamental, a começar pelo do próprio corpo, que é a condição essencial do que somos, do que sentimos, percebemos, pensamos e agimos.

A responsabilidade civil, prevista nos artigos 186, 187 e 927 e seguintes ambos do Código Civil, é conceituada pela douta professora Maria Helena Diniz como sendo:

[...] a aplicação de medidas que obriguem alguém a reparar dano moral ou patrimonial causado a terceiro em razão de ato do próprio imputado, de pessoa por quem ele responde, ou de fato de coisa ou animal sob sua guarda (responsabilidade subjetiva), ou ainda, de simples imposição legal (responsabilidade objetiva). Definição esta que guarda, em sua estrutura, a idéia da culpa quando se cogita da existência de ilícito e a do risco, ou seja, da responsabilidade sem culpa.

Para que tal reparação ocorra é indispensável à incidência de requisitos intrínsecos, que sejam: ação comissiva ou omissiva; ocorrência de dano moral ou patrimonial; e por fim, o nexo de causalidade entre a ação e o dano causado.

Em destaque ao dano, Diniz[37] leciona: “[...] é a lesão que, devido a um certo evento, sofre uma pessoa, contra sua vontade, em qualquer bem ou interesse jurídico, patrimonial ou moral”, devendo preencher os seguintes requisitos para configurar-se: a) diminuição ou destruição de um bem jurídico, patrimonial ou moral pertencente a uma pessoa; b) efetividade ou certeza do dano; c) causalidade; d) subsistência do dano no momento da reclamação do lesado; e) legitimidade; e f) ausência de causas excludentes e responsabilidade.

Diferentemente da esfera civil, na trabalhista o dano moral é caracterizado pela abusividade dos atos do empregador em face da dignidade do empregado, bastando que se pratique a ofensa para estabelecer o nexo causal, além de almejar a proteção da parte menos favorecida (hipossuficiente), visando o verdadeiro amparo a quem realmente necessita, no caso, o empregado-assediado.

Estabelecido este contraponto, damos prosseguimento, salientando que é previsto na Consolidação das Leis do Trabalho em seus artigos 482 e 483 a possibilidade da rescisão do contrato de trabalho por justa causa oriundos do Assédio Moral.

No primeiro artigo mencionado, temos a figura do assédio praticado pelo empregado, devendo incidir o assediador-empregado em uma das alíneas do referido artigo, seguem:

Art. 482 - Constituem justa causa para rescisão do contrato de trabalho pelo empregador:

[...] b) incontinência de conduta ou mau procedimento;

[...] h) ato de indisciplina ou de insubordinação;

[...] j) ato lesivo da honra ou da boa fama praticado no serviço contra qualquer pessoa, ou ofensas físicas, nas mesmas condições, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem;

k) ato lesivo da honra ou da boa fama ou ofensas físicas praticadas contra o empregador e superiores hierárquicos, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem.

No artigo 483 da CLT, temos a figura da rescisão indireta, ou rescisão do empregado, que devido à conduta desleal e degradante no ambiente de trabalho, tornou-se insustentável a convivência, vejamos:

Art. 483 - O empregado poderá considerar rescindido o contrato e pleitear a devida indenização quando:

a) forem exigidos serviços superiores às suas forças, defesos por lei, contrários aos bons costumes, ou alheios ao contrato;

b) for tratado pelo empregador ou por seus superiores hierárquicos com rigor excessivo;

c) correr perigo manifesto de mal considerável;

d) não cumprir o empregador as obrigações do contrato;

e) praticar o empregador ou seus prepostos, contra ele ou pessoas de sua família, ato lesivo da honra e boa fama;

f) o empregador ou seus prepostos ofenderem-no fisicamente, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem;

g) o empregador reduzir o seu trabalho, sendo este por peça ou tarefa, de forma a afetar sensivelmente a importância dos salários.

§ 1º - O empregado poderá suspender a prestação dos serviços ou rescindir o contrato, quando tiver de desempenhar obrigações legais, incompatíveis com a continuação do serviço.

[...]§ 3º - Nas hipóteses das letras "d" e "g", poderá o empregado pleitear a rescisão de seu contrato de trabalho e o pagamento das respectivas indenizações, permanecendo ou não no serviço até final decisão do processo.

Em todas as alíneas supra descritas é constatado exagero e desrespeito ao empregado, seja por atribuir tarefas ao empregado, mesmo sabendo que este não conseguirá desempenhar a função por alguma limitação física; seja quando maliciosamente não cumpre com suas obrigações contratuais no intuito de que o assediado peça demissão, ou ainda, humilhá-lo publicamente.

No âmbito Penal, como não temos figura típica do Assedio Moral, dependendo do caso em concreto, será aplicado o dispositivo que mais se adequar, segue alguns a título de exemplo: Calúnia – art. 128, CP -, Difamação – art. 139, CP –, Injúria – art. 140 –, Lesão corporal, estendendo-se a percepção para a integridade psíquica da vítima – art. 129, CP –, Instigação/ Indução ao suicídio, no caso do assediado investir contra sua própria vida em razão da Síndrome acometida pelo assédio sofrido – art. 122, CP.

Ballestero[38], ao citar Hirigoyen, apresenta um caso relatado pela pesquisadora francesa de uma auxiliar de serviços gerais de uma instituição de ensino que tentou suicídio jogando-se da janela do terceiro andar, devido aos constantes martírios provocados por sua chefia, quedou-se paraplégica recebendo indenização vitalícia por ter sido comprovado o Assédio Moral sofrido.

Ante tal narrativa, conjecturando em nossas leis, a auxiliar, devido à paraplegia estaria incapacitada para o trabalho, necessitando de benefício da Seguridade Social.

Horvath[39] classifica acidentes do trabalho em três espécies: a) acidente-tipo: exterioridade, subtaneidade e violência; b) doença profissional ou tecnopatica: decorrente da função exercida no emprego; e c) doença do trabalho ou mesopatia: decorrente das influências externas do ambiente de trabalho, é em decorrência da função exercida que adquire o mal.

Neste diapasão, esclarecemos que a Síndrome de Burnout é considerada doença ocupacional, e equiparada a acidente de trabalho, conceituado pela Lei nº 8.213 de 1991 em seus artigos 19 e 20[40]:

Art. 19. Acidente do trabalho é o que ocorre pelo exercício do trabalho a serviço da empresa ou pelo exercício do trabalho dos segurados referidos no inciso VII do art. 11 desta Lei, provocando lesão corporal ou perturbação funcional que cause a morte ou a perda ou redução, permanente ou temporária, da capacidade para o trabalho.

§ 1º A empresa é responsável pela adoção e uso das medidas coletivas e individuais de proteção e segurança da saúde do trabalhador.

§ 2º Constitui contravenção penal, punível com multa, deixar a empresa de cumprir as normas de segurança e higiene do trabalho.

§ 3º É dever da empresa prestar informações pormenorizadas sobre os riscos da operação a executar e do produto a manipular.

§ 4º O Ministério do Trabalho e da Previdência Social fiscalizará e os sindicatos e entidades representativas de classe acompanharão o fiel cumprimento do disposto nos parágrafos anteriores, conforme dispuser o Regulamento.

Art. 20. Consideram-se acidente do trabalho, nos termos do artigo anterior, as seguintes entidades mórbidas:

I - doença profissional, assim entendida a produzida ou desencadeada pelo exercício do trabalho peculiar a determinada atividade e constante da respectiva relação elaborada pelo Ministério do Trabalho e da Previdência Social;

 II - doença do trabalho, assim entendida a adquirida ou desencadeada em função de condições especiais em que o trabalho é realizado e com ele se relacione diretamente, constante da relação mencionada no inciso I.

§ 1º Não são consideradas como doença do trabalho:

a) a doença degenerativa;

b) a inerente a grupo etário;

c) a que não produza incapacidade laborativa;

d) a doença endêmica adquirida por segurado habitante de região em que ela se desenvolva, salvo comprovação de que é resultante de exposição ou contato direto determinado pela natureza do trabalho.

§ 2º Em caso excepcional, constatando-se que a doença não incluída na relação prevista nos incisos I e II deste artigo resultou das condições especiais em que o trabalho é executado e com ele se relaciona diretamente, a Previdência Social deve considerá-la acidente do trabalho.

O decreto regulamentador nº 3.048 de 1991, determina em seu artigo 337, §3º, que estabelecido o nexo de causalidade entre o agente causador e a doença adquirida no trabalho e estando a moléstia descrita pela Classificação Internacional de Doenças - CID 10 – será o assediado periciado pela equipe médica do INSS, in verbis:

Art. 337.  O acidente do trabalho será caracterizado tecnicamente pela perícia médica do INSS, mediante a identificação do nexo entre o trabalho e o agravo.

I - o acidente e a lesão;

II - a doença e o trabalho; e

III - a causa mortis e o acidente.

§ 1º O setor de benefícios do Instituto Nacional do Seguro Social reconhecerá o direito do segurado à habilitação do benefício acidentário.

§ 2º Será considerado agravamento do acidente aquele sofrido pelo acidentado quando estiver sob a responsabilidade da reabilitação profissional.

§ 3o  Considera-se estabelecido o nexo entre o trabalho e o agravo quando se verificar nexo técnico epidemiológico entre a atividade da empresa e a entidade mórbida motivadora da incapacidade, elencada na Classificação Internacional de Doenças - CID em conformidade com o disposto na Lista C do Anexo II deste Regulamento.

Isto posto, nas palavras de Ballestero[41]: “[...] há previsão legal para o reconhecimento de doenças desencadeadas pelo stress profissional [...]”, contudo verifica-se que “[...] ainda são poucos os casos em que os trabalhadores se afastam do emprego por acidente de trabalho decorrente de Assédio Moral [...]”, muito provável pela falta de conhecimento e propagação do tema do presente trabalho.

Outrossim, as consequências sociais acarretam em prejuízo ao Estado e aos seus contribuintes, visto que o pagamento precoce dos benefícios previdenciários e a necessidade de criação de entidades, disponibilização de equipamentos, pessoas habilitadas e medicamentos tem custo elevado. Temos ainda a problemática da iniciativa privada, em que a questão dos índices de desemprego, absenteísmo, marketing negativo, prejuízo financeiro e estratégico tendem a crescer absurdamente ante a falta de políticas de prevenção ao Assédio Moral.

Sobre a autora
Carolina Block Stefanelli

Advogada especialista em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

STEFANELLI, Carolina Block. Considerações sobre assédio moral como fator desencadeador para a Síndrome de Burnout no âmbito das relações de trabalho. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 3896, 2 mar. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/26496. Acesso em: 23 nov. 2024.

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