Símbolo do Jus.com.br Jus.com.br
Artigo Selo Verificado Destaque dos editores

Interpretação constitucional entre a dogmática e a zetética

Exibindo página 4 de 4
Agenda 02/04/2014 às 13:40

CONCLUSÃO

Tendo em vista o escopo inicial da pesquisa, qual seja, o de localizar o ponto de equilíbrio nos pontos de vista e meios de interpretação a fim de atender à real necessidade do sistema jurídico pátrio, percebe-se que a questão demanda muito mais desenvolvimento.

Isso porque os dispositivos de ordem constitucional, dada a sua amplitude, trazem significativa complexidade quando da aplicação prática, uma vez que, via de regra, devem ser objeto de interpretação e, como tal, devem seguir uma série de critérios adotados em matéria de hermenêutica constitucional.

Justamente por exigir a Constituição a adoção de interpretação sistemática obrigatória – ao contrário do que geralmente ocorre com a legislação infraconstitucional, cuja primeira interpretação é a literal –, ainda que acompanhada de outra espécie de interpretação, a tarefa do intérprete deve ser acompanhada de cautela, sob pena de se extrair uma interpretação errônea que atinja frontalmente os postulados da unidade e da harmonização.

De igual forma, independentemente da espécie de interpretação adotada para complementar a interpretação sistemática, percebe-se nos princípios de interpretação constitucional, abordados no capítulo dois, uma força que não pode ser olvidada pelo interpretante.

Não obstante a observância da espécie de interpretação adotada e do respeito aos postulados de interpretação constitucional, ter em vista os limites da interpretação também é medida obrigatória, sob pena de extrapolação da atividade.

Tendo todos estes pontos bem claros e presentes, percebe-se que a margem de interpretação passa a ser resultado da perspectiva a ser adotada. Se dogmática, uma menor liberdade de questionamento e uma tendência a buscar interpretação que reafirme e corrobore a já existente, a fim de assegurar a solidez de determinadas bases, assim reconhecidas pelo consenso.

De outra banda, se a ótica adotada for a zetética, passa o intérprete a sentir-se desamarrado dos conceitos e interpretações então vigentes, podendo reapreciar todos os elementos que as ensejaram, reconsiderando-os na missão de encontrar uma interpretação mais adequada com a condição circunstancial hodierna que se apresenta.

Entretanto, o ponto mais interessante é ainda outro, resultado da análise até aqui trazida. O que se extrai, ao final, do tema abordado pelo trabalho em tela é uma visível constatação de que muito embora dogmática e zetética estejam situadas em pólos diametralmente opostos, sua co-existência não é apenas possível, mas saudável.

As influências dogmática e zetética, de forma equilibrada, em matéria de interpretação constitucional, são a segurança de que a Constituição não se tornará obsoleta e anacrônica, mas que terá o firme posicionamento que se mostrar necessário durante determinado período.

Afinal, a certeza e a dúvida são figuras importantes para todo estudo, eis que a primeira possibilita o seguro avanço em se tratando de interpretação constitucional, enquanto a segunda o promove.


REFERÊNCIAS

AZEVEDO, Plauto Faraco de. Crítica à dogmática e hermenêutica jurídica. Porto Alegre : Sérgio Antonio Fabris Editor, 1989.

BARROSO, Luís Roberto. A nova interpretação constitucional: ponderação, direitos fundamentais e relações privadas. 3ª ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2008.

BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da constituição: fundamentos de uma dogmática constitucional transformadora. 5ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2003.

BASTOS, Celso Ribeiro. Hermenêutica e Interpretação Constitucional. São Paulo: Celso Bastos Editor, 1997.

BOBBIO, Norberto. O positivismo jurídico: lições de filosofia do direito. São Paulo: Ícone, 2006.

CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional. Coimbra: Livraria Almedina, 1993.

CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. Coimbra: Almedina, 1997.

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

CASTRO, Flávia de Almeida Viveiros de. Interpretação constitucional e prestação jurisdicional. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2000.

COSTA, Alexandre Araujo. Introdução ao direito: uma perspectiva zetética das ciências jurídicas. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 2001.

COUTINHO, Jacinto Nelson de Miranda. Canotilho e a Constituição Dirigente. 2ª Ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2005.

DUARTE, Ícaro de Souza. Mais zetética, menos dogmática. A Hermenêutica como pressuposto para uma melhor formação dos alunos. Jus Navigandi, Teresina, ano 8, n. 434, 14 set. 2004. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/5691>. Acesso em:29 jul. 2010.

DANTAS, David Diniz. Interpretação constitucional no pós-positivismo: teoria e casos práticos. São Paulo: Madras, 2004.

DINIZ, Maria Helena. Lei de interpretação ao código civil interpretada. 11 ed. São Paulo: Saraiva, 2005.

FERRAZ JUNIOR, Tercio Sampaio. Introdução ao estudo do direito: técnica, decisão, dominação. 6ª ed. São Paulo: Atlas, 2008.

FRANÇA, R. Limongi. Hermenêutica Jurídica. São Paulo: Saraiva, 1999.

FREITAS, Lourival C. A crise do ensino e introdução a zetética jurídica. CEPPG Revista. Associação Catalana de Educação Catalão: CESUC, Ano III n. 04, p. 154-167. Fevereiro/2001.

HÄBERLE, Peter. Hermenêutica Constitucional, a sociedade aberta dos intérpretes da Constituição: a contribuição para a interpretação pluralista e “procedimental” da Constituição. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1997.

LEITE, George Salomão. Interpretação Constitucional e Tópica Jurídica. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2002.

MIRANDA, Pontes de. Dez Anos de Pareceres. 1ª edição. São Paulo: Francisco Alves, 1974.

PEREIRA, Jane Reis Gonçalves. Interpretação constitucional e direitos fundamentais: uma contribuição ao estudo das restrições aos direitos fundamentais na perspectiva da teoria dos princípios. Rio de Janeiro: Renovar, 2006.

PESSÔA, Leonel Cesarino. Em torno da distinção entre as perspectivas zetética e dogmática: nota sobre a pesquisa jurídica no Brasil. Prisma Jurídico. São Paulo, v. 4, p. 23-32, 2005.


Notas

[1] PEREIRA, Jane Reis Gonçalves. Interpretação constitucional e direitos fundamentais: uma contribuição ao estudo das restrições aos direitos fundamentais na perspectiva da teoria dos princípios. Rio de Janeiro: Renovar, 2006. p. 24.

[2] Ibidem, p. 25.

[3] Ibidem, p. 24.

[4] CASTRO, Flávia de Almeida Viveiros de. Interpretação constitucional e prestação jurisdicional. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2000. p. 1.

[5] BOBBIO, Norberto. O positivismo jurídico: lições de filosofia do direito. São Paulo: Ícone, 2006. p. 212.

[6] CASTRO, op. cit., p. 2.

[7] FRANÇA, R. Limongi. Hermenêutica Jurídica. São Paulo: Saraiva, 1999. p. 5.

[8] HÄBERLE, Peter. Hermenêutica Constitucional, a sociedade aberta dos intérpretes da Constituição: a contribuição para a interpretação pluralista e “procedimental” da Constituição. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1997. p. 13.

[9] Nome original: Die offene Gesellschaft der Verfassungsinterpreten. Ein Beitrag zur pluralistischen und “prozessualen” Verfassungsinterpretation.

[10] BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da constituição: fundamentos de uma dogmática constitucional transformadora. 5ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 119.

[11] Ibidem, p. 118.

[12] MIRANDA, Pontes de. Dez Anos de Pareceres. 1ª edição. São Paulo: Francisco Alves, 1974. p. 132.

[13] FRANÇA, op. cit., p. 7.

[14] LEITE, George Salomão. Interpretação Constitucional e Tópica Jurídica. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2002. P. 24

[15] Data máxima vênia ao raciocínio do autor, é relevante apontar que, uma vez estando a Administração atrelada ao cumprimento da lei, em observância ao princípio da legalidade, tal conduta passa a ser de questionável impropriedade, haja vista o dever de cumprimento da lei pelo administrador.

[16] BARROSO, op. Cit., p. 117.

[17] FRANÇA, op. cit., p. 7.

[18] BARROSO, op. cit., p. 126.

[19] FRANÇA, op. cit., p. 9.

[20] BARROSO, op. cit., p. 127.

[21] Ibidem, p. 128.

[22] DINIZ, Maria Helena. Lei de interpretação ao código civil interpretada. 11 ed. São Paulo: Saraiva, 2005. P. 147

[23] FRANÇA, op. cit., p. 9.

[24] LEITE, op. cit., p. 33.

[25] BARROSO, op. cit., p. 140.

[26] LEITE, op. cit., p. 30.

[27] FRANÇA, R. Limongi. Hermenêutica Jurídica. São Paulo: Saraiva, 1999. p. 10.

[28] BARROSO, op. cit., p. 132.

[29] Ibidem, p. 133.

[30] Ibidem, p. 135.

[31] LEITE, op. cit., p. 31

[32] BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição: fundamentos de uma dogmática constitucional transformadora. 5ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 136.

[33] SAMPAIO, José Adércio Leite. Hermenêutica e Jurisdição Constitucional. Belo Horizonte: Del Rey, 2001. p. 55.

[34] BASTOS, Celso Ribeiro. Hermenêutica e Interpretação Constitucional. São Paulo: Celso Bastos Editor, 1997. p. 102.

[35] LEITE, op. cit., p. 48.

[36] SILVA, Virgilio Afonso da. Interpretação constitucional. São Paulo: Malheiros editores, 2005. p. 127.

[37] LEITE, op. cit., p. 48.

[38] CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. Coimbra: Almedina, 1997. p. 1186-1187.

[39] BASTOS, Celso Ribeiro. Hermenêutica e Interpretação Constitucional. São Paulo: Celso Bastos Editor, 1997. p. 103.

[40] CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional. Coimbra: Livraria Almedina, 1993. p. 227.

[41] BASTOS, Celso Ribeiro. Hermenêutica e Interpretação Constitucional. São Paulo: Celso Bastos Editor, 1997. p. 105.

[42] CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional. Coimbra: Livraria Almedina, 1993. p. 228.

[43] LEITE, op. cit., . p. 49.

[44] BASTOS, op. cit., . p. 106.

[45] DANTAS, David Diniz. Interpretação constitucional no pós-positivismo: teoria e casos práticos. São Paulo: Madras, 2004. p. 266.

[46] SILVA, op. cit., p. 127.

[47] DANTAS, op. cit., . p. 263.

[48] CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional. Coimbra: Livraria Almedina, 1993. p. 227.

[49] LEITE, op. cit., p. 50.

[50] CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. Coimbra: Almedina, 1997. p. 1189.

[51] DANTAS, op. cit., p. 265.

[52] FRANÇA, op. cit., p. 13.

[53] FRANÇA, op. cit., p. 15.

[54] Ibidem, p. 15.

[55] Ibidem, p. 18.

[56]CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. Coimbra: Almedina, 1997. p. 1194

[57]Ibidem, p. 1194.

[58] SILVA, op. cit., p. 122.

[59] CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. Coimbra: Almedina, 1997. p. 1195.

[60] DUARTE, Ícaro de Souza. Mais zetética, menos dogmática. A Hermenêutica como pressuposto para uma melhor formação dos alunos. Jus Navigandi, Teresina, ano 8, n. 434, 14 set. 2004. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/5691>. Acesso em:29 jul. 2010.

[61] PESSÔA, Leonel Cesarino. Em torno da distinção entre as perspectivas zetética e dogmática: nota sobre a pesquisa jurídica no Brasil. Prisma Jurídico. São Paulo, v. 4, p. 26, 2005.

[62] DINIZ, Maria Helena. Lei de interpretação ao código civil interpretada. 11 ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 141.

[63] PESSÔA, Leonel Cesarino. Em torno da distinção entre as perspectivas zetética e dogmática: nota sobre a pesquisa jurídica no Brasil. Prisma Jurídico. São Paulo, v. 4, p. 27, 2005.

[64] FERRAZ JUNIOR, Tercio Sampaio. Introdução ao estudo do direito: técnica, decisão, dominação. 6ª ed. São Paulo: Atlas, 2008. p. 25.

[65] COSTA, Alexandre Araujo. Introdução ao direito: uma perspectiva zetética das ciências jurídicas. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 2001. p. 161.

[66] PEREIRA, op. cit., p. 47.

[67] COSTA, op. cit., p. 161.

[68] Ibidem, p. 161.

[69] Ibidem, p. 159.

[70] AZEVEDO, Plauto Faraco de. Crítica à dogmática e hermenêutica jurídica. Porto Alegre : Sérgio Antonio Fabris Editor, 1989. p. 59.

[71] Trecho trazido na obra do autor:

"A Lei de Segurança Nacional de 1978 cominava pena de reclusão de 6 meses a 4 anos a quem ofendesse, publicamente, por palavra ou escrito, chefe de nação estrangeira. Dispunha, contrariamente ao Código Penal, ser a ação incondicionadamente pública, não cabendo nem a prova da verdade nem sursis. Por este crime de expressão responderiam os deputados e senadores perante o Supremo Tribunal Federal, com a supressão da inviolabilidade parlamentar.

Nessa moldura legal foi enquadrado o comportamento de um deputado que, no exercício de uma atribuição decorrente de competência exclusiva do Congresso Nacional, nos termos do artigo 44 da Constituição de 1967, com Emenda nº 1, de 17/10/69, denunciou o regime do general Pinochet pelos seus atos de índole sanguinária e repressiva. A denúncia contra o “carniceiro dos Andes” estava em conformidade com o testemunho da imprensa internacional, o relato das vítimas que haviam conseguido evadir-se do inferno carcerário e a condenação pública desse regime feita pela ONU e Anistia Internacional. Traduzia, em suma, a verdade.

Inscrevia-se, ademais, o discurso do parlamentar no seu dever de desaconselhar a realização de tratados com um governo por essa forma comprometido com o assassínio e a tortura de dissidentes políticos.

Apesar de todos esses dados, o deputado foi condenado à pena mínima, em sessão secreta, perdendo o mandado e sendo recolhido à prisão.No caso, os juízes “aplicaram a lei” – provavelmente com desgosto íntimo – corretamente, na sua letra e conteúdo.

[72] Insta salientar que o conceito de correto, neste caso, passa a ser relativo, uma vez que as súmulas nada mais são do que o extrato da interpretação vigente da norma. Destarte, aquilo que hoje é tido por correta interpretação, pode ser ponto de vista descartado no futuro, quando houver alteração de entendimento sobre o assunto por parte do tribunal editor da súmula ou das circunstâncias que lhe deram ensejo.

[73] PEREIRA, op. cit., p. 22.

[74] STRECK, Lenio Luiz. Jurisdição constitucional e hermenêutica: uma nova crítica do direito. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2002. p. 474.

[75] FERRAZ JUNIOR, Tercio Sampaio. Introdução ao estudo do direito: técnica, decisão, dominação. 6ª ed. São Paulo: Atlas, 2008. p. 21.

[76] COUTINHO, Jacinto Nelson de Miranda. Canotilho e a Constituição Dirigente. 2ª Ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2005. p. 99.

[77] CASTRO, op. cit., p. 11.

[78] BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da constituição: fundamentos de uma dogmática constitucional transformadora. 4. ed. rev. e atual. – São Paulo: Saraiva, 2001. p. 139.

[79] CASTRO, op. cit., p. 10.

[80] DINIZ, Maria Helena. Lei de interpretação ao código civil interpretada. 11 ed. São Paulo: Saraiva, 2005. P. 149.

[81] FREITAS, Lourival C. A crise do ensino e introdução a zetética jurídica. CEPPG Revista. Associação Catalana de Educação Catalão: CESUC, Ano III n. 04, p. 158. Fevereiro/2001.

[82] COSTA, op. cit., p. 164.

[83] BARROSO, Luís Roberto. A nova interpretação constitucional: ponderação, direitos fundamentais e relações privadas. 3ª ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2008. p. 78.

[84] CASTRO, op. cit., p. 10.

[85] BARROSO, Luís Roberto. A nova interpretação constitucional: ponderação, direitos fundamentais e relações privadas. 3ª ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2008. p. 71-72.

[86] Ibidem, p. 72.

Sobre o autor
Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

DIAS, Ádamo Brasil. Interpretação constitucional entre a dogmática e a zetética. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 3927, 2 abr. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/27374. Acesso em: 23 nov. 2024.

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!