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Do Estado liberal ao neoliberal: aspectos sociais e jurídico-econômicos

Agenda 23/05/2014 às 07:34

Estudam-se os vários momentos do Estado, dando-se destaque aos aspectos sociais e jurídico-econômicos, principalmente a sua intervenção no domínio econômico.

RESUMO: Trata o presente trabalho de um estudo sobre os vários momentos do Estado, dando-se destaque aos aspectos sociais e jurídico-econômicos, principalmente a sua intervenção no domínio econômico. Para a efetivação do artigo foi feita uma pesquisa qualitativa, com uma abordagem histórica e técnica de pesquisa de revisão bibliográfica. Percebe-se, na evolução histórica do Estado, o quanto há consequências numa intervenção maior ou menor do Estado no domínio econômico.

PALAVRAS-CHAVE: Estado; Domínio Econômico.


1 ESTADO LIBERAL

O Estado moderno nasceu absolutista e, durante alguns séculos, os monarcas concentravam todos os poderes estatais em suas mãos, isto é, o Estado se confundia com a pessoa do monarca.

Havia uma centralização do poder político no rei, que passou a impor barreiras econômicas à burguesia (classe social em franca expansão) por meio de altos impostos. Ideologicamente, as monarquias justificaram-se com a doutrina da soberania, no século XVII, centrada essa no monarca. Chegava-se ao ponto de divinizar os monarcas, havendo, assim, uma exacerbação dos poderes do rei.

Esse contexto histórico perdurou até o século XVIII, conhecido como século das luzes, quando se deslocou o eixo do poder divino soberano para o Estado de Direito, no decurso das revoluções burguesas. Nessa época, primou-se pela soberania do povo, princípio da separação dos poderes e preponderância do princípio da legalidade. Contemporaneamente, a burguesia pregava a intervenção mínima do Estado na sociedade.

Nesta mesma época, houve uma fecunda produção intelectual, através dos ilustres Montesquieu, Rosseau, Lock. Teve também a Declaração dos Direitos, como o “Bill of Rights” na Inglaterra em 1689, Declaração dos Direito do Homem e do Cidadão na França em 1789 e o surgimento das primeiras constituições, tais como a Constituição Federal dos Estados Unidos em 1787 e as constituições da época da revolução francesa (1791, 1793, 1795), entre outras.

Sendo assim, Silva (2004, p. 299) esclarece que, entre o final do século XVIII e o início do século XX, cresce o liberalismo econômico, que teve como propósito garantir a predominância da burguesia sobre as demais classes, bem como a busca daquela classe de se defender da atuação interventiva do Estado. Neste momento, evoluem os ideais liberais.

O liberalismo tem duas vertentes: política e econômica. O liberalismo político seria a doutrina cuja finalidade é estabelecer a liberdade política do indivíduo em relação ao Estado. E liberalismo econômico seria a doutrina que preceitua a existência de uma ordem natural para os fenômenos econômicos, a qual tende ao equilíbrio, sem a necessidade da intervenção do Estado. (IRIARTE, 1995, p. 9)

Desta forma, a idéia principal do liberalismo político é que o homem se basta a si mesmo como indivíduo. Entretanto, esta idéia foi, originalmente, progressista e até revolucionário diante dos regimes absolutistas de seu tempo. Já o liberalismo econômico sempre foi conservador, antidemocrático e partidário de um despotismo esclarecido. (IRIARTE, 1995, p. 9).

Na política, o pensamento liberal mostra o direito do indivíduo de seguir a sua própria determinação, tendo apenas como limites as normas fundamentais para o desenvolvimento da vida social. Defende as liberdades individuais frente ao poder do Estado e prevê oportunidades iguais para todos.

  Na economia, defende a não-intervenção do Estado, por acreditar que a dinâmica de produção, distribuição e consumo de bens é regida por leis que já fazem parte do processo, tais como a lei da oferta e da procura.

Insta destacar que, a partir de meados do século XVIII, foi criada a grande frase: “laissez faire, laissez passer”, que foi o pensamento basilar para o liberalismo econômico, significando o “laissez faire” (deixar fazer) uma oposição ao intervencionismo estatal, abertura da economia à iniciativa privada, e o “laissez passer” (deixar passar) uma supressão às barreiras alfandegárias, para que haja um estímulo à circulação das riquezas. (IRIARTE, 1995, p. 13).

Vale ressaltar, ainda, que se formou na França, na segunda metade do século XVIII, a escola liberal, que foi conhecida também como escola individualista, tendo em vista que o individualismo é uma doutrina que destaca que não somente toda atividade econômica deve ter por fim a felicidade dos indivíduos, porém também que toda atividade econômica deve ser exercida pelos indivíduos, sendo o papel do Estado reduzido ao mínimo possível, ou seja, os individualistas viam no indivíduo o fim da atividade econômica. Destacaram-se nesta escola grandes economistas, tais como, Adam Smith, Malthus, Ricardo e Stuart-Mill na Inglaterra e J. B. Say na França.

Insta salientar os três princípios caracterizadores da doutrina da escola liberal:

1) existe no domínio econômico uma ordem natural que tende a estabelecer-se espontaneamente, contanto que os indivíduos fiquem livres para agir, inspirando-se em seus próprios interesses;

2) essa ordem natural é a melhor, a mais capaz de assegurar a prosperidade das nações: é muito superior a todas as coordenações artificiais que se poderiam obter com a ajuda de leis humanas;

3) não há antagonismo, mas harmonia entre os interesses individuais, e o interesse geral concorda, igualmente, com os interesses individuais. Esta harmonia econômica forma a própria essência da ordem natural. (GUITTON, 1961, p. 47)

Adam Smith (1723-1790) ficou conhecido como pai do liberalismo econômico, nasceu em 1723 em Kirkaldy, na Escócia; era filho de um funcionário das alfândegas, onde posteriormente, ele foi empregado. Foi destinado à carreira eclesiástica, porém não aceitou segui-la. Após estudar em Glasgow e Oxford, lecionou primeiramente literatura inglesa e economia política em Edimburgo, depois lógica em Glasgow. Em 1759, publicou a “Teoria dos Sentimentos Morais” e em 1776 publicou, sua mais notável obra, “Investigações sobre a natureza e causa da riqueza das nações”.

Smith explanou com clareza a divisão do trabalho, que antes foi imprecisamente exposta pelos fisiocratas (que foram os primeiros a ter a idéia da circulação da riqueza no corpo social e sua concepção de uma ordem natural, apesar de incidirem em erro quando afirmavam que os trabalhas dos cultivadores são os únicos que fornecem produto líquido). Entendia que todas as classes de trabalhadores concorrem para produzir riquezas, e não apenas a classe agrícola, como diziam os fisiocratas.

A sua visão otimista se aplica à produção das riquezas, mas ele não chega a sustentar que as riquezas são distribuídas entre os homens da maneira mais eqüitativa possível. É um liberal hostil à intervenção do Estado no domínio econômico, pois a julga não somente inútil, mas nefasta. Seu liberalismo, entretanto, nada tem de intransigente, e, em certos casos, a intervenção dos poderes públicos parece-lhe absolutamente justificada.

Destacam-se como sucessores imediatos de Adam Smith, na Inglaterra, Malthus (1766-1836) e Ricardo (1772-1823), conhecidos como os pessimistas, pois, segundo suas teorias, as leis naturais provocariam certas conseqüências desoladoras para o gênero humano.

Após isto, cabe citar algumas características principais do liberalismo:

a) o individualismo (confere primazia absoluta ao indivíduo, deixando o coletivo ou social relegado a um plano secundário);

b) a liberdade de pensamento e de expressão;

c) a livre iniciativa, desembaraçada dos empecilhos da ação do Estado;

d) a propriedade privada dos meios de produção;

e) a livre concorrência;

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f) um Estado reduzido (o Estado mínimo), apenas responsável pela manutenção da ordem interna e da segurança externa. (BRUM, 1999, p. 27)


2 ESTADO INTERVENCIONISTA:

O capitalismo avançou rumo a uma expansão oligopolística, com a formação dos monopólios e oligopólios, ruindo o liberalismo econômico, instalando a fase do capitalismo monopolista e do surgimento do Estado intervencionista, isto devido a vários fatores, porém os que se destacam são: 1) o movimento que provocou a concentração industrial e o surgimento de empresas gigantescas, com influencias mundiais; 2) o frenesi imperialista dos principais países capitalistas; 3) inúmeras depressões que terminaram culminando a grande depressão mundial dos anos trinta. Vale ressaltar também a turbulência social do mundo, que se manifestou na grande convulsão da Primeira Guerra Mundial, na revolução soviética e no aparecimento do fascismo na Itália e na Alemanha. (TÁCITO, 1997, p. 378).

Cabe mostrar, ainda, as causas fundamentais para a crise do Estado liberal:

a) o reconhecimento de que determinadas atividades econômicas estão imbuídas, por sua natureza, de um interesse coletivo, afetando, praticamente, em sua exploração, a generalidade do grupo social; b) a exploração capitalista de atividades privadas e a competição predatória entre grupos se extrema em abusos lesivos a interesses indefesos e sem a representação eficaz, sensibilizando a opinião pública e inspirando o legislador, o juiz e o administrador na proteção ao economicamente fraco. O aviltamento da mão-de-obra lança as sementes da proteção ao trabalhador e da representação sindical. A política de preços espoliativos, as manipulações da produção e do comércio, as concentrações de capital visando lucros imoderados ou monopólios de mercado contrastam com os interesses do público consumidor, conduzindo ao regime de controle de tarifas e preços, aa defesa da economia popular e às medidas contra as concentrações de capital; c) a expansão dos grupos capitalistas entra em conflito direto com os próprios órgãos do poder político, sobre os quais atua, cuidando de aperfeiçoá-los aos seus interesses econômicos (o poder dentro do poder). (TÁCITO, 1997, p. 378)

No liberalismo houve um acúmulo de riqueza que trouxe por conseqüência o poder econômico, porém este poder cresceu de tal forma que se transformou num abuso do poder econômico que fez com que a igualdade do liberalismo virasse uma “piada”. (NEVES, 2003, p. 211)

A nova concepção de Estado intervencionista fez com que este (Estado) chamasse para si as funções assistencialistas, paternalistas, previdenciárias, intervencionistas na economia. Deixou, pois, a sua inércia social e ganhou foros intervencionistas.

Com o intervencionismo, inúmeras atividades comerciais, industriais e sociais foram transformadas em serviços públicos, o que solicitou do poder executivo uma administração bastante ampliada, inclusive na edição de atos legislativos, tais como decretos-leis, leis-delegadas e medidas provisórias. (PERIN, 2003, p. 146).

A necessidade da intervenção do Estado corporificou-se como uma exigência da sociedade civil, principalmente sentido a partir de 1929, com a Grande Depressão, onde o Estado assumiu economicamente diversos papéis, controlando alfândega, promovendo incursões no setor agrícola, industrial, com as exacerbadas nacionalizações, dos períodos entre as duas guerras mundiais, criação da noção de serviços públicos industriais e comerciais essenciais e das concessões, a nível de Direito Administrativo, além de os empreendimentos privados se posicionarem ao lado dos empreendimentos públicos, com a instalação de várias empresas públicas e sociedades de economia mista.

Morais (2002, p. 35) dando ênfase ao lado social da passagem do liberalismo para o intervencionismo diz que esse momento destaca-se pela luta dos movimentos operários, buscando conquistar uma regulação, promoção das questões sociais, tais como as relações de produção e seus reflexos, a previdência social, a assistência social, o transporte, a moradia entre outras necessidades sociais, que o Estado intervencionista ou social, que também é conhecido como Welfare State, buscou assumir.

Este mesmo autor conceitua Welfare State, como sendo

(...) aquele Estado no qual o cidadão, independentemente de sua situação social, tem direito a ser protegido, através de mecanismos/prestações públicas estatais, contra dependências e/ou ocorrências de curta ou longa duração, dando guarida a uma fórmula onde a questão da igualdade aparece – ou deveria aparecer – como fundamento para a atitude interventiva do Estado. (MORAIS, 2002, p. 37-38)

Cabe ainda ressaltar que, com a crise de 1929, muitos economistas passaram a mudar seus ideais. Destacou-se neste contexto John Maynard Keynes (1883-1946), que veio contestar muitas idéias de Adam Smith.

Keynes nasceu em Cambridge, na Inglaterra, pertenceu a uma família influente na sua cidade natal. Foi um estudioso da matemática, filosofia e humanidades, e posteriormente, dedicou-se ao estudo da economia. Participou de uma sociedade secreta, chamada “Apóstolos”, fundou o “Bloomsbury Group” em Londres. Em 1906, ingressa no funcionalismo público, onde não se sente à vontade. Em 1908, ingressa na Universidade de Cambridge, logo após é aceita a sua dissertação “Teoria da Probabilidade”. Posteriormente, dedicou-se ao debate sobre política econômica, algumas conferências anuais e à orientação acadêmica de um grupo de jovens economistas, fundando o Clube de Economia Política. Após isto, Keynes escreve sua obra máxima, chamada “Teoria Geral”. (LIMA, 1999, p. 31-32).

Para Keynes, o regime de laissez-faire, com cada um buscando atingir seus objetivos individuais, não conseguiria atender aos interesses coletivos. Por essa razão, defendia uma ação inteligente do Estado na condução econômica do país em convivência com a livre iniciativa privada. Em sua visão, o bem-estar e o progresso econômico só seriam alcançados se o capitalismo fosse dirigido inteligentemente e se o poder estatal ocupasse o lugar de regulador, não podando as iniciativas individuais. Nesse processo, caberia ao Estado assumir funções que estivessem fora do âmbito individual e que somente ele o faria. (LIMA, 1999, p. 32).

Caberia ao Estado tomar certas decisões de controle da moeda, do crédito e do nível de investimentos, com o objetivo de eliminar grandes males econômicos de seu tempo (desigualdade de riqueza, desemprego, decepção de expectativa dos empresários, redução da eficiência e da produção), frutos do risco e das incertezas, da ignorância e da especulação financeira.

Portanto, com o intervencionismo, o Estado ingressou no campo antes reservado à iniciativa privada com a criação de pessoas jurídicas que ora atuavam de forma monopolística, ora de forma concorrencial no mercado. Além disso, desenvolveram-se antigos e novos instrumentos normativos oficiais de indução e inibição da atividade econômica, tais como, a tributação, a fiscalização e o fomento, por meio dos quais o Estado passou a condicionar indiretamente a atuação dos particulares no mercado e, desta forma, a favorecer ou limitar a proliferação das atividades econômicas na razão direta do interesse coletivo por elas representado.

O modelo Welfare State passou por fortes crises, entre estas se destaca a fiscal-financeira, percebendo-se, desde 1960, que as despesas superavam as receitas. A partir de 1970, este desequilíbrio econômico aumenta, à medida que o Estado chama cada vez mais atividades para si, além da crise econômica mundial. Para resolver este desfalque financeiro, fazia-se mister o aumento na carga fiscal ou a redução de custos através da diminuição da ação estatal, ou seja, a passagem da prestação dos serviços públicos ora executados pela Administração Pública para o particular, através das privatizações. (LIMA, 1999, p. 40-42).


3 ESTADO NEOLIBERAL

A derrocada do socialismo no Leste Europeu provocou perplexidade em todos, pois correspondeu a uma tentativa de se aplicar o ideal do Estado social de forma mais concreta possível. Portanto, idéias como justiça social, igualdade, fraternidade, solidariedade internacional estariam se deteriorando. O que trouxe um terreno bastante fértil para o neoliberalismo.

Sendo assim, logo após a Segunda Guerra Mundial, surge o neoliberalismo (que é uma reação teórica e política contra o Estado intervencionista) nos locais onde imperavam o capitalismo, ou seja, na Europa e Estados Unidos da América (E.U.A.). Foi aplicado radicalmente por Margareth Tatcher na Inglaterra e por Reagan nos E.U.A. Inicialmente, conseguiu nestes países uma redução da inflação e estabilização econômica, porém, em contrapartida, houve um grande corte social. Inclusive, nos E.U.A. houve uma elevação do número de pessoas vivendo abaixo da linha de pobreza, supressão de garantias de emprego, bombardeamento da organização sindical, entre outros fatos. (LIMA, 1999, p. 35).

As raízes teóricas mais remotas do neoliberalismo, que já foi conhecido como o “vodu econômico” e também como “monetarismo”, são encontradas na escola austríaca, que se centralizou em torno do catedrático da Faculdade de Economia de Viena, Leopold von Wiese, na segunda metade do século XIX e que ficou conhecido por seus trabalhos teóricos sobre a estabilidade da moeda, especialmente o publicado com o título de “O valor natural”, em 1889.

Porém, o texto de origem do neoliberalismo foi “O caminho da servidão”, de Friedrich August von Hayek, que foi escrito em 1944, que trata “de um ataque apaixonado contra qualquer limitação dos mecanismos de mercado por parte do Estado, denunciados como uma ameaça letal à liberdade, não somente econômica, mas também política” (LIMA, 1999, p. 09). O alvo imediato de Hayek, naquele momento, era o Partido Trabalhista inglês nas eleições de 1945, que pretendia colocar em prática os princípios do Estado de bem-estar social. E, na verdade, o Partido Trabalhista venceu as eleições. Hayek, não concordando com as idéias do Partido Trabalhista, escreveu este manifesto neoliberal, que foi “O caminho da servidão”.

Hayek, junto com grande pensadores, tais como, Milton Friedman, Karl Popper, Lionel Robbins, Ludwing von Mises, Walter Eupken, Walter Lipman, Michael Polanyi, Salvador de Madariaga constituíram a Sociedade de Mont Pèlerin, na Suíça, que parecia uma franco-maçonaria neoliberal, que tinha a finalidade de combater o Estado intervencionista. (LIMA, 1999, p. 09-10).

Uma outra vertente do neoliberalismo cresceu nos Estados Unidos da América e se centrou na Escola de Chicago do Professor Milton Friedman, que combatia a política de “New Deal” do Presidente americano Roosevelt, que era um regime intervencionista. Friedman ia de encontro a qualquer regulamentação que inibisse as empresas, condenou até o salário-mínimo, opunha-se a qualquer piso salarial fixado pelas categorias sindicais.

A ideologia base do neoliberalismo é que o mercado é quem regula a vida social, só restando para o Estado as funções mínimas de guardião da defesa nacional e também da ordem neoliberal. A competição é um elemento imprescindível para desenvolvimento da sua política, chegando a ser considerada a mola mestra do neoliberalismo.

Quanto à filosofia neoliberal, é importante dizer que crêem que os homens não nascem iguais, nem tendem à igualdade. Qualquer tentativa de justiça social torna-se inócua, porque novas desigualdades fatalmente ressurgirão. Tornar iguais os desiguais é contraproducente, conduz para a estagnação.

Em relação à pobreza, vêem a sociedade como cenário da competição. Se há vencedores, então tem-se que aceitar que existem perdedores. Sendo assim, inspirados pelo darwinismo, afirmam que os fortes sobrevivem, cabendo aos fracos se conformarem com a exclusão natural. E, estes fracos, não devem ser assistidos pelo Welfare State, e sim pela caridade feita por associações e instituições privadas. Já dos ricos é que surgem as iniciativas racionais de investimentos baseados em critérios lucrativos. Estes que irrigam, com seus capitais, a sociedade inteira. Por isto, os neoliberais entendem que a política de tributação sobre os ricos deve ser diminuída o máximo possível, afim de não lhes diminuir ou prejudicar seus lucros, nem desestimulá-los nos seus projetos.

Na visão neoliberal, a inflação seria resultado do descontrole da moeda, que é conseqüência do aumento constante das demandas sociais pleiteadas pelos sindicatos, tais como, previdência, redução da jornada de trabalho, aumento salarial, seguro-desemprego, entre outros, ou seja, provocando um desequilíbrio financeiro (despesas maiores do que receitas). Sendo assim, este aumento do déficit público tem que ser compensado pela emissão de moeda.

Os neoliberais defendem que se afinam com qualquer regime que assegure os direitos da propriedade privada. Podendo ser democrata, autoritário ou até ditatorial. O regime político ideal seria aquele que consegue neutralizar os sindicatos e diminuir a carga fiscal sobre os lucros e fortunas, ao mesmo tempo desregulando ao máximo a economia.

O neoliberalismo vê, pois, o Estado intervencionista, como fonte de políticas restritivas à expansão da iniciativa, que tenta solucionar os problemas de desigualdade e da pobreza por meio de uma política tributária e fiscal que, na verdade, provoca o aumento da inflação e desajustes orçamentários.

Em contrapartida, alguns ideais neoliberais podem ser resumidos da seguinte forma:

a) o egoísmo humano como motor da economia, ou seja, há um incentivo dos impulsos egoístas e das ambições pessoais para se chegar ao crescimento econômico, buscando-se desenfreadamente o lucro; b) “mão-invisível” do mercado, isto é, o mercado é o regulador da vida econômica e social, reutilização da expressão de Adam Smith “mão-invisível” do mercado; c) o Estado benfeitor como inimigo, isto é, o Estado não quer se preocupar com políticas sociais, portanto, um Estado totalmente submisso às leis do mercado; d) não concordam com os movimentos sindicais; e) defendem a desregulamentação geral da economia; f) buscam a eliminação do controle de preços; g) fim da rede pública de proteção social; h) privatização de empresas públicas; i) defendem a existência de uma taxa natural de desemprego; j) buscam a disciplina orçamentária do Estado e a estabilidade da moeda, através de cortes de gastos públicos, prioritariamente os gastos sociais. (IRIARTE, 1995, p. 34).

No Brasil, a ideologia neoliberal ingressou com toda força, por meio da mídia e de pressões das instituições financeiras internacionais que começaram a incutir na população o neoliberalismo como sendo uma realidade inafastável, pois estava diretamente ligada à globalização.

Cabe destacar a inclusão das idéias neoliberais no povo brasileiro:

Nada mais nocivo ao nosso país do que essa falácia. Enquanto ‘vendem’ essas esdrúxulas idéias às elites corruptas e apodrecidas dos países subdesenvolvidos, as grandes nações industriais redesenham em seu benefício o mapa do mundo, praticam o mais declarado protecionismo (afinal, quem são os famosos ‘blocos’, senão áreas de comércio protegidas por barreiras que excluem os demais?) e restringem cada vez mais os direitos dos imigrantes que introduziram em seus territórios, a fim de que seus empresários pudessem dispor de mão-de-obra barata. (SAMPAIO apud MUSETTI, 1998).

Na verdade, as instituições financeiras internacionais, juntas com os grandes grupos econômicos e políticos dos países mais desenvolvidos buscam uma política destinada a forçar uma nova divisão internacional do trabalho, reservando para os países mais ricos as atividades que são mais rendosas, e para os países mais pobres o suprimento de produtos primários e manufaturados.

É necessário, pois, haver uma ação popular (mormente por parte das classes prejudicadas pelo neoliberalismo) com o cunho de cobrar ações governamentais e da própria sociedade que sejam voltadas a um equilíbrio das atividades, buscando que estas atividades não sejam rendosas apenas para os países e classes mais ricas.

Cabe, por último, elencar alguns dos principais pensamentos dos que são a favor do neoliberalismo e dos que são contra.

Os que são a favor alegam: a) o Estado não deve intrometer-se na economia. É um mau administrador; b) a iniciativa privada é mais eficiente que a estatal; c) os modelos estatizantes fracassaram no mundo inteiro; c) o modelo neoliberal incentiva e garante a eficiência; d) as privatizações atraem o capital estrangeiro; e) a abertura da economia ao mercado externo garante a abundância de produtos no país; f) a livre contratação é garantia de maior eficiência e produtividade; g) o neoliberalismo busca o equilíbrio fiscal, reduzindo os gastos públicos. (IRIARTE, 1995, p. 37).

Estes aspectos destacam, principalmente, a importância e influência social e econômica da privatização. Porém, insta salientar que a privatização da execução dos serviços públicos não pode ser considerada apenas como um “vilão social”.

Já os que são contra o neoliberalismo afirmam: a) o Estado é sustentáculo do bem comum. Deve ser o regulador da economia; b) é muito importante a presença do Estado nas empresas estratégicas; c) o Estado benfeitor impulsionou o desenvolvimento de muitos países; d) o neoliberalismo criou profundas desigualdades econômicas e sociais. Ao mesmo tempo que, enriquece uns poucos, empobrece a maioria; e) o capital estrangeiro busca sempre o maior lucro possível, levando embora os dividendos; f) a excessiva abertura externa acaba enfraquecendo as pequenas empresas nacionais; g) a livre contratação é causa de discriminação, fincando excluídos os menos capacitados e os mais críticos; h) assiste-se a uma progressiva deterioração da saúde pública, da educação, da segurança social, entre outros, comprometendo até o futuro econômico do país. (IRIARTE, 1995, p. 37).

Estes traços, ressaltados pelos contrários ao neoliberalismo, mostram, principalmente, a repercussão social e econômica das privatizações. Mas, ao mesmo tempo, servem de fonte para a necessidade de um Estado mais preocupado com a fiscalização e regulação dos serviços públicos privatizados.

Desta forma, tanto a doutrina nacional, quanto internacional destacam vários aspectos positivos e negativos do neoliberalismo, porém estes aspectos (na verdade, observações jurídico-sociais) não podem ser motivadores ou desmotivadores do neoliberalismo, e sim, dados para serem avaliados com o fim de gerarem uma melhora na atuação do Estado.


CONSIDERAÇÕES FINAIS:

Sendo assim, o Estado Neoliberal é hoje uma realidade social, política e econômica, que tem aspectos positivos e negativos. Entretanto, entendemos que as seqüelas sociais estão sendo muito altas com o neoliberalismo, pois se observa, cada vez mais, um distanciamento entre as classes sociais, o rico ficando mais rico e o pobre tendendo para situação de miséria.

Entendemos ainda que não é através do Estado Absolutista, ou Liberal, ou Intervencionista, ou Neoliberal que teremos a solução dos grandes problemas sociais e econômicos dos países subdesenvolvidos, mas sim por meio da própria ação popular na busca dos seus interesses, na luta pelos seus direitos.

Portanto, a qualidade e eficiência do Estado vai ser conseqüência da própria atuação da sociedade, da consciência política da coletividade e da busca e alcance da liberdade como um instrumento de desenvolvimento social e econômico.


REFERÊNCIAS

BRUM, Argemiro J. O desenvolvimento econômico brasileiro. Ijuí: Unijuí, 1999.

GUITTON, Henri. Economia política. 2 ed. Rio de Janeiro: Fundo de Cultura, 1961.

IRIARTE, Gregório. Neoliberalismo sim ou não? Manual destinado a comunidades, grupos e organizações populares. São Paulo: Paulinas, 1995.

LIMA, Nelson Paulo. Como não privatizar: uma proposta para o Brasil. Brasília: Valci, 1999.

MORAIS, José Luis Bolzan de. As crises do Estado e da Constituição e a transformação espacial dos direitos humanos. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2002.

MUSETTI, Rodrigo Andreotti. Neoliberalismo, globalização e Ética na Política. Jus Navigandi, Teresina, a. 3, n. 27, dez. 1998. Disponível em:<http://jus.com.br/artigos/72>. Acesso em: 12 ago. 2006.

NEVES, Rodrigo Santos. O Estado regulador. Revista de direito constitucional e internacional, São Paulo, n. 44, jul-set. 2003.

PERIN, Jair José. A intervenção do Estado no domínio econômico e a função das agências de regulamentação no atual contexto brasileiro. Revista de informação legislativa. Brasília, n. 159, jul-set. 2003.

TÁCITO, Caio. Do Estado liberal ao Estado de bem-estar social. In: Temas de direito público: estudos e pareceres. Rio de Janeiro: Renovar, 1997.

SILVA, Sérgio André R. G. da. A legitimidade das agências reguladoras. Revista de direito administrativo, Rio de Janeiro, n. 235, jan-mar. 2004.

VILLABI, Gual. El intervencionismo del Estado em las actividades econômicas. Barcelona: Bosch, 1946.

Sobre o autor
André Ricardo Fonseca da Silva

Doutor em Políticas Públicas e Formação Humana pela UERJ e Mestre em Ciências Jurídicas pela UFPB. Professor da UNIPÊ.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SILVA, André Ricardo Fonseca. Do Estado liberal ao neoliberal: aspectos sociais e jurídico-econômicos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 3978, 23 mai. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/27961. Acesso em: 22 nov. 2024.

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