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Ativismo judicial: excesso aos limites das atribuições positivadas dos poderes na Constituição Federal de 1988

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Agenda 14/06/2014 às 12:43

O ATIVISMO JUDICIAL COMO FENÔMENO JURÍDICO

3.1 Conceito e Breve Evolução Histórica

O fenômeno designado, atualmente, de Ativismo Judicial consiste em uma postura mais participativa do magistrado, segundo o qual, busca uma hermenêutica jurídica mais expansiva. Tem como finalidade a adequação de valor normativo constitucional, buscando o exercício do direito das partes de forma célere, e solucionando os litígios e às dificuldades oriundas da morosidade ou omissão legislativa, e até mesmo executiva. Essa postura do Judiciário justifica-se pela preeminência do interesse público geral, visto a inércia e omissão estatal em atender as necessidades básicas da sociedade em geral.  (SOUZA, 2013).

Acerca da idéia de Ativismo Judicial, posiciona-se Luis Roberto Barroso:

A ideia de ativismo judicial está associada a uma participação mais ampla e intensa do Judiciário na concretização dos valores e fins constitucionais, com maior interferência no espaço de atuação dos outros dois Poderes. A postura ativista se manifesta por meio de diferentes condutas, que incluem: (i) a aplicação direta da Constituição a situações não expressamente contempladas em seu texto e independentemente de manifestação do legislador ordinário; (ii) a declaração de inconstitucionalidade de atos normativos emanados do legislador, com base em critérios menos rígidos que os de patente e ostensiva violação da Constituição; (iii) a imposição de condutas ou de abstenções ao Poder Público. (BARROSO, 2014.)

Segundo Luis Roberto Barroso as origens da postura ativista remontam a jurisprudência americana. (BARROSO, 2014).

No ano de 1947, o jornalista estadunidense Arthur Schlesinger publicou um artigo na revista Fortune, denominado ‘The SupremeCourt: 1947’, em que descreveu a atuação dos magistrados e os classificou em dois grupos: ‘ativistas’ (activists) e ‘campeões de restritividade’ (championsof judicial restraint), também chamados de ‘passivistas’ (self-restrain). (VALLE 2009)

Esses passivistas eram juízes que apreciavam os fatos estritamente dentro dos diplomas legais, ou seja, em nome da lealdade ao instituído pelo legislador, suas decisões denegriam as próprias visões. Já os ativistas decidiam a demanda com base em seus juízos de valores, verifica-se aí, possivelmente, pela primeira vez a expressão ativismo judicial. (VALLE 2009)

Ressalta Bruno Paiva Menezes que conceito de ativismo judicial surge em contexto histórico-político estadunidense desfavorável. Entretanto, a apreciação desse ativismo, não se refere essencialmente à ação imprópria do Poder Judiciário. Acrescenta o autor que existem muitas discussões a cerca da postura do judiciário em tratar de assuntos de competência de outros poderes, que pode ser vista de forma negativa ou não. (MENEZES, 2013)

Consiste o fenômeno do Ativismo Judicial em uma teoria interligada ao Estado Democrático de Direito e aos Tribunais Constitucionais, nos quais, o Judiciário por meio de suas deliberações passa a criar o direito, sendo que foi legitimado pelo poder constituinte originário, através da função de guardião das constituições. Cenário em queo julgador recebe maiores atribuições, proferindo decisões com alta carga política. (SANTOS; BALESTRIN, 2011)

No Brasil, vale ressaltar, que as decisões dos aplicadores do direito, se limitavam estritamente ao disposto na lei, ou seja, não lhes era permitida qualquer margem de interpretação particular nos julgamentos e na aplicação dos princípios Constitucionais, dadas as previsões constitucionais discutidas no capitulo anterior e o sistema de direito adotado no país.

Segundo Vicente Paulo de Almeida ao Poder Judiciário, em face da rigorosa separação dos poderes, não cabia de maneira alguma, interpretação axiológica. A interpretação jurídica era pautada exclusivamente norma legal existente. (ALMEIDA, 2011)

Nesse sentido, acerca da possibilidade de interpretação dos aplicadores do direito, posiciona-se Carlos Maximiliano citado por Eduardo Monteiro Lopes Junior:                                           

Dirige-se ao magistrado (a parte prejudicada) somente porque ele encarna a vontade soberana do estado, respeitada pelos bons, imposta aos maus. Não se fala no pretório, em motivos econômicos, sentimentos morais, costumes populares. O juiz apenas colhe nos repositórios as ordens escritas do estado, sob qualquer de suas formas; conclui com aparente rigor lógico, e profere a sentença, como se fora esta uma simples realização positiva da vontade do soberano Rex ou do soberano Demos, isto é, do monarca, ou do povo representado pelas autoridades eleitas. (LOPES JÚNIOR 2007, p. 48)

Em relação à experiência política e constitucional vivida no Brasil da independência até a Constituição de 1988, Luis Roberto Barroso afirma que:

A experiência política e constitucional no Brasil, da independência até 1988, é a melancólica história do desencontro de um país com a sua gente. [...] a falta de efetividade das sucessivas constituições brasileiras decorreu do não reconhecimento da força normativa aos seus textos e da falta de vontade política de dar-lhe aplicabilidade direta e imediata. (BARROSO, 2008, p. 18)

Eduardo Lopes Junior citando Carlos Maximiliano,dispõe sobre dois eventos que contribuirão para modernização dos costumes jurídicos do Brasil, quais sejam a Reforma Constitucional de 1926 e a influência do italiano Enrico TullioLiebman, a partir da década de 1940.

A reforma constitucional de 1926 e a influência do processualista italiano Enrico TullioLiebman, a partir da década de 1940. O autor se reporta na reforma de 1926 à instituição do instrumento processual, recurso extraordinário, que passou a possibilitar a contestação de atos administrativos, leis e decisões judiciais que contrariassem dispositivo de lei federal ou da própria constituição federal. Ainda que esse remédio judicial possibilitasse a homogeneização da jurisprudência constitucional, até então fragmentada por decisões contraditórias por todo o território nacional, este continuava a ser método de controle da constitucionalidade por via de exceção. (LOPES JÚNIOR 2007, 2007, P. 17)

Para uma melhor compreensão desse fenômeno, faz-se necessário estabelecer a diferenciação entre ativismo judicial e judicialização.  Adriana Monteiro Ramos define judicialização como consequência natural do Constitucionalismo contemporâneo, especialmente, após a promulgação da CRFB/1988:

É uma consequência natural do constitucionalismo contemporâneo, intensificada principalmente após a promulgação da Constituição de 1988. Consiste em uma reação do Poder Judiciário à omissão dos demais Poderes que deixaram de responder aos anseios sociais. (RAMOS, 2014)

Fazendo uma distinção sobre os dois institutos, posiciona-se João Carlos Medeiros Aragão:

No primeiro momento o ativismo judicial e a judicialização podem parecer a mesma situação, pois ambos se referem à atuação do Judiciário que extrapola sua competência. No entanto, há diferenças que delimitam essas expressões: o ativismo pressupõe opções, escolhas dos magistrados quando da interpretação das regras constitucionais; já a judicialização representa a adoção de determinado paradigma constitucional em vez da ação de vontade política individual. (ARAGÃO, 2012. p. 66)

A diferença entre os dois institutos consiste em que, na judicialização, os Poderes, Executivo e Legislativo, cedem determinadas decisões, de caráter político, ao Poder Judiciário, que definirá regras de conduta a serem seguidas pelos outros Poderes e dirimir conflitos. Nesses termos Luis Roberto Barroso aponta que esses dois institutos são gerados a rigor pelas mesmas causas imediatas:

A judicialização e o ativismo judicial são primos. Vêm, portanto, da mesma família, freqüentam os mesmos lugares, mas não têm mesmas origens. Não são gerados, a rigor, pelas mesmas causas imediatas. A judicialização, no contexto brasileiro, é um fato, uma circunstancia que decorre do modelo constitucional que se adotou, e não um exercício deliberado de vontade política. Em todos os casos referidos acima, o Judiciário decidiu porque era o que lhe cabia fazer, sem alternativa. Se uma norma constitucional permite que dela se deduza uma pretensão, subjetiva ou objetiva, ao juiz cabe dela conhecer, decidindo a matéria. Já o ativismo judicial é uma atitude, a escolha de um modo especifico e proativo de interpretar a Constituição, expandindo o seu sentido e alcance. Normalmente ele se instala em situações de retração do Poder Legislativo, de um certo descolamento entre a classe política e a sociedade civil, impedindo que as demandas sociais sejam atendidas de maneira efetiva. A idéia de ativismo judicial esta associada a uma participação mais ampla e intensa do judiciário na concretização dos valores e fins constitucionais. (BARROSO, 2012, p.35)

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Colaborando com o tema, Adriana Monteiro Ramos estabelece algumas condutas as quais o ativismo judicial encontra-se associado, quais sejam:

O ativismo judicial, dessa forma, está associado às seguintes condutas: [a] aplicação direta da Constituição, mesmo inexistindo regra expressa ou lei ordinária autorizando (ex: súmula vinculante n.13); [b] declaração de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo com base em critérios menos rígidos que os de violação ostensiva à Constituição; e [c] interferência em questões de políticas públicas, impondo-se ações ou abstenções ao Poder Público (exemplos: obrigatória distribuição de medicamentos ou realização de tratamentos médicos; a imposição aos Municípios para criar condições objetivas que possibilitem, de maneira concreta, em favor de crianças de zero a seis anos de idade (CF, art. 208, IV), o efetivo acesso e atendimento em creches e unidades de pré-escola – RE 410715 AgR /SP); ou a determinação à Municipalidade para que mantivesse a prestação de serviços de creche e de pré-escola de forma contínua, mesmo no período de férias escolares (Agravo de Instrumento n. 173 497 – 0/5-00 – TJ/SP). (RAMOS, 2014)

Com as alterações trazidas pelo Estado Democrático de Direito, com base nas constituições modernas, os magistrados adquiriram status de protetores, heróis do direito devido a sua popularidade.  Santos e Balestrin acrescentam que compreeensão da irrupção do ativismo judicial pasa pela relação de um movimento profundo que leva a uma nova maneira de conceber a democracia, a saber:

A irrupção do Ativismo Jurídico, só poderá ser compreendida se relacionada a um movimento profundo, do qual ele é apenas uma das manifestações. Não se trata de uma transferência de soberania para o juiz, mas, sobretudo uma transformação da democracia.  A grande popularidade dos juízes está diretamente ligada ao fato de que foram confrontados com uma nova expectativa política da qual, se sangraram como heróis, e encarnaram uma nova maneira de conceber a democracia. (DWORKIN, 1999. p. 09)

Dada essa breve evolução histórica do fenômeno, passa-se a explorar pontos positivos e negativos do ativismo judicial no atual panorama da justiça brasileira.

3.2 Argumentos favoráveis e contrários à postura proativa do Poder Judiciário

A postura proativa do Poder Judiciário é um tema controvertido na atualidade, apresenta uma discussão peculiar no que se refere a essa atuação mais autônoma do Poder Judiciário em aplicar e preservar dos direitos fundamentais disposto na CRFB/1988. (MONTEIRO, 2011)

Nesse sentido, existem duas correntes doutrinárias que abordam o tema ativismo judiciário, uma, a denominada de Teoria Procedimentalista, que defende a inconstitucionalidade da atuação de natureza legislativa do Poder Judiciário, e a outra, a Teoria Substancialista, que defende a atuação interventiva do Poder Judiciário nas questões de natureza legislativa.

Acerca de Teoria Procedimentalista assevera Janicleide Neri Monteiro, não ter a sociedade o direito de exigir do Judiciário ações de natureza legislativa sob pena de violação do príncipio da separação dos poderes, ainda que estas sejam para garantir faculadades previstas na Constituição Federal:

Não tem qualquer cidadão o direito de exigir do Judiciário, que lhe garanta determinadas faculdades prevista na Lex fundamentalis para que possa ser-lhe atendido o princípio da dignidade da pessoa humana cujo é o mesmo, um fundamento da Constituição Federal, através de imposições ao Estado, no afã de que este preste ao cidadão determinados direitos sociais mínimos, porque tal condição e aplicação pelo Judiciário violariam o princípio da separação dos poderes (art. 2º CF/88). (MONTEIRO, 2011, p. 172)

Por outro lado a Teoria Substancialista, apóia a intervenção do Poder Judiciário, como guardião da Constituição Federal, nas questões de natureza legislativa, desde que esta seja garantidora dos direitos fundamentais. Assim, segundo José Octavio Lavocat Galvão:

Deve sim o Judiciário intervir nestas questões, pois é o Supremo Tribunal o guardião da Constituição Federal, e quando certos comportamentos venham a prejudicar a paz social, a vida digna de uma coletividade, direitos mínimos existenciais, deve sim este Poder, fazer valer as suas vezes e garantir estes direitos fundamentais, seja em controle concentrado, seja em controle difuso de constitucionalidade. (GALVÃO, 2010, p. 137)

Em uma postura favorável a intervenção do Poder Judiciário, Hélder Fábio Cabral Barbosa, em defesa desse fenômeno, expressa o seguinte entendimento:

Pensadores do direito podem se mostrar contrários ao ativismo judicial, sob a alegação de que um acréscimo de poder ao judiciário seria um desvio de finalidade, desvio do fim do judiciário, entretanto inexiste tal afirmação, uma vez que os juízes estariam apenas aplicando o direito, os direitos fundamentais em especial, direitos estes que gozam de autoexecutoriedade. (BARBOSA, 2011, p. 151)

O referido defende a postura que o judiciário é capaz de colocar equilíbrio entre a legalidade e todo ato emanado pelo poder público, sejam vinculado ou discricionário, além disso, as ações políticas deveram estar em harmonia com a conveniência e oportunidade – típicos do administrador, ressalta também que, as ações devem ser controladas pelo Judiciário numa interpretação não mais lógico-formal de suas atribuições, mas em sentido material-valorativo, ao examinar se a medida está de acordo com os princípios contidos na Constituição. (BARBOSA, 2011)

Ainda sobre a defesa da postura interventiva do Poder Judiciário, posiciona-se Luiz Werneck Vianna:

Deste modo, verifica-se que existe um conflito doutrinário, sendo o mesmo ferrenho, mas que ousamos em dizer ser mais aplicada atualmente a corrente teórica substancialista, haja vista, não poder ficar o Judiciário de mãos atadas e assistindo de camarote as barbaridades cometidas pelo Executivo ao dizer não ter dinheiro nos cofres públicos para satisfazer as necessidades coletivas e concretizar os direitos fundamentais sociais, enquanto que muitos passam fome, morrem em hospitais sem serem atendidos, não têm medicamentos para combater um Câncer, tratar de uma AIDS-HIV ou qualquer outra doença grave, crianças ficam sem leites especiais, vindo com isso a ficar com sua saúde comprometida devido alergia a lactose, essa sim é a realidade cediça com grande participação omissiva do Executivo, e sem falar do Legislativo que não elabora ou aprova projetos lei para concretizar estes direitos como já foi frisado acima, então não resta outra saída a este desrespeito em face da sociedade, a não ser que o Judiciário intervenha nestas questões para concretizar os direitos sociais e principalmente os considerados como mínimo existencial, tais como: saúde, alimentação, educação, moradia, assistência social, impondo obrigações ao Estado para que ele cumpra os direitos mencionados, pois na visão de Luiz Werneck Viana citado por Flávia Lima, “visa o STF efetivar os grandes princípios programáticos da Constituição e não criar uma instancia que discuta para solucionar pretensões das diferentes corporações sobre questões de Direito Administrativo”. (VIANNA, 2007, p. 230) 

Outro posicionamento em defesa da postura proativa do Poder Judiciário pode ser encontrada nas palavras do Ministro Celso de Mello, extrádas da ADPF nº 45, e trazidas à luz porJuliano RaloMonteiro:                      

O Supremo não se curva a ninguém nem tolera a prepotência dos governantes nem admite os excessos e abusos que emanam de qualquer esfera dos três Poderes da República, desempenhando as suas funções institucionais de modo compatível com os estritos limites que lhe traçou a própria Constituição. (MONTEIRO, 2010, p. 165)

Ao se posicionar acerca da postura ativista do Supremo Tribunal Federal, o Ministro Celso de Mello, ressalta que essa prática tornou-se uma necessidade institucional, pela omissão ou atraso do Poder Público no cumprimento de obrigações expressas na CRFB/1988.

Práticas de ativismo judicial, embora moderadamente desempenhadas por esta Corte em momentos excepcionais, tornam-se uma necessidade institucional, quando os órgãos do Poder Público se omitem ou retardam, excessivamente, o cumprimento de obrigações a que estão sujeitos por expressa determinação do próprio estatuto constitucional, ainda mais se se tiver presente que o Poder Judiciário, tratando-se de comportamentos estatais ofensivos à Constituição, não pode se reduzir a uma posição de pura passividade. A omissão do Estado - que deixa de cumprir, em maior ou em menor extensão, a imposição ditada pelo texto constitucional - qualifica-se como comportamento revestido da maior gravidade político-jurídica, eis que, mediante inércia, o Poder Público também desrespeita a Constituição, também ofende direitos que nela se fundam e também impede, por ausência (ou insuficiência) de medidas concretizadoras, a própria aplicabilidade dos postulados e princípios da Lei Fundamental. (SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL)

Por outro lado, adotando posição contrária à postura protiva do Poder Judiciário, Faustino da Rosa Júnior, assevera não caber ao magistrado a faculdade de impor ao caso concreto sua opção político-ideológico, dado o fato de não possuir legitimidade política para apresentar juízo de valor sobre a forma de execução dos direitos fundamentais. (ROSA JÚNIOR, 2008)

Outro ponto apontado pelo autor, é que os magistrados ocupam seus cargos por meio de concurso públicos, diferente dos políticos, privando-os de qualquer representatividade política. Sendo assim, não possuem a capacidade de conhecerem as peculiaridades de efetivas políticas publicas que inspirem a execução dos direitos fundamentais pela Administração Publica. (ROSA JÚNIOR, 2008)

Na mesma linha de raciocínio, Faustino da Rosa Júnior alerta para o que seria uma politização do Poder Judiciário:

Dessa forma, efetua-se uma "politização" do Judiciário, uma vez que os magistrados passam a efetuar, fundados na distorcida prerrogativa do chamado "controle difuso", inadequado a países de sistema romano-germânico, juízos eminentemente políticos. Surge o chamado "juiz político", que concretiza políticas públicas de forma descomprometida, uma vez que não é responsabilizado pelo cumprimento da alocação de recursos efetuada pelos orçamentos e planos plurianuais, nem goza de qualquer espécie de representatividade política, ou mesmo compromisso político-partidário e/ou com algum programa de governo específico. (ROSA JÚNIOR, 2008)

Ainda em relação ao posicionamento contrário ao ativismo judicial, Marcos Falcão Critsinelis traz para a discussão o seguinte questionamento:

Como é possível que um minúsculo grupo de juízes, que não são eleitos diretamente pela cidadania (como o são os funcionários políticos), e que não estejam sujeitos a periódicas avaliações populares (e, portanto gozam de estabilidade em seus cargos, livre do escrutínio popular) possam prevalecer, em última instância, sobre a vontade popular? (CRITSINELIS, 2003. p. 45)

Observe-se que as principais críticas e posicionamentos contrários a postura ativista do Poder Judiciário tem por base a ilegitimidade desse Poder em discordar das ações realizadas pelos representantes eleitos pelo povo.

Nessa linha, surge o contramajoritarismo, que adota postura contrária à intervenção do Poder Judiciário, seja atuando como legislador negativo ou positivo.  Esclarecendo que o Judicário atua como legislador negativo ao extinguir atos ou leis do legislativo ou executivo, e posiciona-se como legislador positivo quando elucida normas e princípios e lhes atribuírem juízo de valor. 

O contramajoritarismo defende que, em ambas atuações, há interferência do Judiciário nas esferas de competência dos outros poderes, ferindo, assim o princípio da separação dos poderes. (ALMEIDA, 2011)

Uma das questões de natureza legislativa que tem assumido o Poder Judiciário é a edição de Súmulas Vinculantes, instituto que será tratado no próximo tópico.

3.3 Súmula Vinculante como forma de usurpar as competências de natureza legislativa do Poder Legislativo.

Antes de adentrar ao tema ora proposto, faz-se relevante apresentar as definições dos termos usurpação e súmula, para uma melhor compreensão daquilo que pretende esse tópico.

O termo usurpar significa “Obter alguma coisa sem a merecer; apropriar-se: (DICIONÁRIO ONLINE DE PORTUGUÊS).

A palavra súmula, por sua vez, é definida como uma pequena suma; breve epítome ou resumo e, juridicamente, é um enunciado que reflete a jurisprudência de um tribunal ou de uma seção especializada autorizada a emitir a consolidação de teses controversas. (ROSAS, 1997).

De acordo com André Ramos Tavares a definição de Súmula Vinculante consiste em um meio para sintetizar o entendimento já consolidado pelo Supremo Tribunal Federal em relação à matérias constitucionais, nesse sentido assevera que:

As súmulas vinculantes são um meio para sintetizar um entendimento já consolidado do Supremo Tribunal Federal (STF) em relação a matérias constitucionais. Elas possuem efeito vinculante, desta forma, os órgãos do Poder Judiciário e da Administração Pública, direta e indireta, devem seguir esse entendimento sob pena de seus atos tornarem-se inválidos e de serem responsabilizados. (TAVARES 2007, p. 18-20)

Ressalta-se que, essa forma de sentitizar o entendimento entendimento já consolidado pelo Supremo Tribunal Federal em relação à matérias constitucionais, ou seja, as designadas Súmulas Vinculantes, foram inseridas no ordenamento jurídico brasileiro através da Emenda Constitucional número 45/04.

Poder Constituinte derivado foi o responsável, através da promulgação da Emenda Constitucional n. 45/04, pela introdução da Súmula vinculante em nosso sistema, prevendo, pela inserção do novo artigo 103-A no texto constitucional, a faculdade do Pretório Excelso editar súmulas cuja observância será de caráter obrigatório para os demais órgãos do Poder Judiciário e para a administração pública direta e indireta, federal, estadual e municipal, desde que após reiteradas decisões precedentes sobre a matéria. (SGARBOSSA; JENSEN, 2008)

Em conjunto com as inovações trazidas pela Emenda Constitucional de número 45/04, está a inserção do artigo 103-A na CRFB/1988. O referido artigo dispõe sobre os requisitos e a legitimidade para propositura da súmula.

Assim, estabelece o artigo Art. 103-A da CRFB/1988:

 Art. 103-A O Supremo Tribunal federal poderá, de ofício ou por provocação, mediante decisão de dois terços de seus membros, após reiteradas decisões sobre matéria constitucional, aprovar Súmula que, a partir de sua publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, bem como proceder a sua revisão ou cancelamento, na forma estabelecida em lei. § 1º: A Súmula terá por objetivo a validade, a interpretação e a eficácia de normas determinadas, acerca das quais haja controvérsia atual entre órgãos judiciários ou entre esses e a administração pública que acarrete grave insegurança jurídica e relevante multiplicação de processos sobre questão idêntica. § 2º: Sem prejuízo d que vier a ser estabelecido em lei, a aprovação, revisão ou cancelamento de Súmula poderá ser provocada por aqueles que podem propor a ação direta de inconstitucionalidade. § 3º: Do ato administrativo ou da decisão judicial que contrariar a Súmula aplicável ou que indevidamente a aplicar, caberá reclamação ao Supremo Tribunal Federal que, julgando-a procedente, anulará o ato administrativo ou cassará a decisão judicial reclamada, e determinará que outra se proferido, com ou sem a aplicação da Súmula, conforme o caso. (BRASIL/88)

Segundo, Sgarbossae Jensen os legitimados a propositura de edição da Súmula vinculante são os mesmos competentes para propor sua revisão e seu cancelamento, resguardada a competência ex-oficio pelo Supremo Tribunal Federal. (SGARBOSSA; JENSEN, 2008)

Constatam, ainda, os referidos autores que os efeitos da súmula vinculante estendem-se a todos os tribunais, assim com, a administração pública de todos os níveis, representando, portanto, um poder de decisão expressivamente superior em relação a aquele atribuído à jurisprudência uniformizada nas hipóteses pré-existentes. (SGARBOSSA; JENSEN, 2008)

Ressalte-se que a edição da súmula acontece após várias decisões referentes a uma matéria específica, nesse sentido acrescentaAndré Ramos Tavares:

Assim sendo, o STF, após várias decisões reiteradas acerca de determinada matéria constitucional, pode editar súmula de efeito vinculante retirando os fatores concretos das decisões anteriores que fundamentaram a sua origem. Há uma "transposição do concreto para o abstrato-geral" e surge uma ponte entre o controle difuso-concreto e o controle abstrato-concentrado, a fim de solucionar a insegurança jurídica. (TAVARES, 2007. p.13-14)

Conforme Kildare Gonçalves Carvalho, se configurado o desacordo jurisprudencial entre acórdãos que tratam da mesma matéria, o magistrado poderá de oficio ou a requerimento da parte interessada, instaurar um incidente de uniformização de jurisprudência, com o objetivo de uniformizar a matéria em discussão. ( CARVALHO, 2008)

De acordo com o entendimento da doutrina clássica referente à Teoria da Separação dos Poderes trazida por  Montesquieu, no primeiro capítulo deste trabalho, as deliberações dos magistrados deveriam restar estritamente baseadas na lei para que a segurança jurídica pudesse ser garantida e para que não ocorresse à usurpação das competencias dos poderes ente si.

Ressalte-se que a súmula vinculante é alvo de várias críticas no sentido de estar o Poder Judiciário, através dessa ação violando a teoria de separação dos poderes, e assim, usurpando a competência de legislar do Poder legislativo. Em relação a essa crítica, Kildare Gonçalves Carvalho aponta que esse entendimento restaria, atualmente, fragilizado, dadas as atribuições estabelecidas para o Poder Judiciário na CRFB/1988:

Esse entendimento apresenta fragilizado frente à diferença entre texto normativo e a norma jurídica, vez que, tanto a atividade interpretativa exercida pelos demais órgãos do judiciário, quanto à exercida pelo Supremo Tribunal Federal, acabam por produzir normas jurídicas. Na concepção superada do modelo de Estado legatário é que não se admitia os juízes o poder de criação normativa, porém com o advento com o estado Constitucional esse entendimento restou superado. (CARVALHO, 2008. p. 30)

Nesse sentido, a edição de súmulas vinculantes pelo Supremo Tribunal Federal não deveria ser interpretado como usurpação de função própria do Legistativo, estando o Supremo Tribunal Federal legitimado constitucionalmente para essa ação.

Não obstante as súmulas vinculantes determinarem limites á atividade interpretativa dos demais órgãos do Poder Judiciário e vinculem a administração publica, a edição de tais súmulas pelo Supremo Tribunal Federal, não devem ser compreendidas como sendo o exercício de função própria do poder legislativo, pois nesses casos, o STF estará, legitimamente, exercendo jurisdição Constitucional.  (CARVALHO, 2008. p. 30)

Necessário trazer um importante posicionamento do Ministro Gilmar Mendes a respeito da ação do Supremo Tribunal Federal em relação à edição de súmulas.

Ora, se ao Supremo Tribunal Federal, compete, precipuamente, a guarda da Constituição Federal, é certo que a interpretação do texto constitucional por ele fixada deve ser acompanhada pelos demais pelos demais tribunais, em decorrência do efeito definitivo outorgado a sua decisão. Não se pode diminuir a eficácia das decisões do Supremo Tribunal Federal com a manutenção de decisões divergentes. Contrariamente, a manutenção de soluções divergentes, em instancias inferiores, sobre o mesmo tema, provocaria, além da desconsideração do próprio conteúdo da decisão da corte, última interprete do texto constitucional, a fragilização da força normativa da Constituição. (BRASIL, 2014)

Sobre a legalidade do Judiciário em editar súmulas, sem configurar violação do princípio da separação dos poderes, posiciona-se Paulo Roberto GalliChuery no seguinte sentido:

O Poder Judiciário não estaria violando a separação de poderes ao editar Súmula de efeitos vinculantes, não estaria exercendo inconstitucionalmente função atribuída ao Poder Legislativo, tendo em vista que isso é permitido pela teoria dos freios e contrapesos, a qual justifica a ingerência de um Poder na atividade do outro, ou mesmo o exercício por um Poder de uma função típica ou predominante de outro. (CHUERY 2010, p 26)

Observa-se que apesar das controvérsias acerca da ação do Poder Judiciário na edição de súmulas, restou demonstrado que ato do Poder Judiciário na edição destas, não configura usurpação de poder, tendo em vista ser essa ação uma atribuição do Poder Judiciário disposta na própria CRFB/1988.

Sobre o autor
Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SANTOS, Fernanda Oliveira. Ativismo judicial: excesso aos limites das atribuições positivadas dos poderes na Constituição Federal de 1988. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 4000, 14 jun. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/28270. Acesso em: 15 nov. 2024.

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