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Panorama da judicialização da política no Brasil

Agenda 10/05/2014 às 16:36

A internet revela que o problema existe, mas sua verdadeira dimensão não é cientificamente conhecida.

Como estou sem fazer nada resolvi realizar uma pequena pesquisa no Google para descobrir quais são as relações entre o PSDB/tucanos e a Justiça. Algumas expressões resultaram inexpressivas e foram descartadas. Abaixo reproduzo as expressões que mais apresentam páginas na web segundo o Google:

PSDB irá à justiça

10 resultados 

News 1

PSDB foi a justiça

Aproximadamente 1.600 resultados

News 1

PSDB vai a justiça

Aproximadamente 31.000 resultados

News 19.000

Os resultados acima parecem bem modestos. Portanto, entendi ser necessário repetir a pesquisa com o maior rival do PSDB para que pudéssemos fazer uma comparação entre ambos.

PT irá à justiça

1 resultado

News 1

PT foi a justiça

21.800 resultados

News 56.300

PT vai a justiça

92.400 resultados

News 53.100

As páginas não foram consultadas uma a uma. Isto seria impossível. O resultado aqui obtido e sua interpretação não podem ser considerados a expressão da verdade. As discrepâncias entre a realidade e sua representação virtual tendem também a ser enormes, pois as ações do PSDB sempre atraem mais a atenção dos telejornais (apesar de as redes de TV  embolsarem sozinhas quase toda a gorda verba federal de propaganda administrada atualmente pelo PT).

Já tive a oportunidade de criticar aqui a judicialização da política.

http://jornalggn.com.br/blog/fabio-de-oliveira-ribeiro/juizes-x-politicos-a-destruicao-do-estado-como-o-conhecemos

Na oportunidade acusei dois partidos de estarem produzindo o fenômeno, citando apenas dois exemplos:

“PT e PSDB são os dois principais protagonistas destas disputas político-judiciais. O programa de internações compulsórias do governo paulista (PSDB) foi questionado no Judiciário. O programa federal Mais Médicos (PT) também.”

Os dados da pesquisa feita por mim no Google hoje revelam contradições interessantes. A expressão “irá a justiça” para o PT é 9 vezes menor que para o PSDB.  O PT “foi a justiça” 13,62 vezes mais que o PSDB, partido que “vai a justiça” 2,98 vezes menos que seu adversário. Em se tratando de notícias, o PT “foi a justiça” 56 mil vezes mais que o PSDB. O PT “vai a justiça” 2,79 vezes mais do que seu adversário.

Em relação às notícias é preciso levar em conta um fator importante. É evidente que a imprensa brasileira tem sido historicamente mais simpática ao PSDB e aos tucanos do que ao PT. Os petistas vivem reclamando do Partido da Imprensa Golpista na internet. A expressão apresenta 573.000 resultados e conta até com um verbete na Wikipédia

http://pt.wikipedia.org/wiki/Partido_da_Imprensa_Golpista

Com base nos dados fornecidos pelo Google é impossível dizer se o PSDB e o PT foram realmente à justiça todas as vezes que algum registro na internet demonstrou que estes partidos tinham intenção de fazer isto. As estatísticas judiciárias divulgadas pelos Tribunais não revelam absolutamente nada sobre esta questão. Seria necessário pesquisar todos os Fóruns de todas as Comarcas e todos os Tribunais do país, para fornecer um quadro completo da judicialização da política no Brasil. O detalhamento por tema implicaria numa consulta rápida de cada processo. Esta tarefa hercúlea ainda não foi feita.

Há outro aspecto da judicialização que merece nossa atenção. Aquela que diz respeito aos processos movidos contra os políticos. Abaixo os resultados mais expressivos:

Justiça condena tucanos

Aproximadamente 717.000 resultados 

News 460

Justiça condena petistas

2 resultados

News  467

Apesar da atenção exagerada que a imprensa deu ao Mensalão (petista, não o tucano), o Google registra que a “justiça condena” tucanos 358.500 vezes mais do que os petistas. O PSDB também aparece como sendo o partido campeão absoluto da Ficha Suja em alguns registros importantes que corroboram o resultado da pesquisa por expressão feita no Google:

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http://www1.folha.uol.com.br/fsp/poder/65141-justica-barra-317-candidatos-a-prefeito-que-tem-ficha-suja.shtml .

A judicialização da política se dá em dois planos. Num deles, cada partido disputa a atenção do Judiciário para promover sua agenda e para atrapalhar a agenda do rival. Num outro plano, o Judiciário é requisitado a julgar a conduta pessoal dos políticos, se eles podem disputar eleições ou se devem seguir cumprindo seus mandatos. Os partidos poderiam aliviar o Judiciário desta tarefa se bloqueassem nas suas próprias instâncias a candidatura de pessoas com a Ficha Suja, mas não acredito que isto vá ocorrer. A legislação em vigor não incentiva os partidos a fazerem isto, nem os responsabiliza pelos danos que eles causam à estrutura do Estado ao permitir que bandidos ingressem na carreira política e nela permaneçam.

Os partidos controlam o Legislativo. Até o momento, apesar da retórica, não tenho visto PSDB e PT demonstrarem qualquer compromisso sério em reformar a Lei Eleitoral para que os partidos possam ser responsabilizados pelos bandidos que fazem parte de seus quadros. Quando um escândalo ocupa demais a atenção do público, os partidos políticos brasileiros expulsam ou ameaçam expulsar o envolvido para afastar-se do problema (o caso de Demóstenes Torres, que saiu do DEM para não ser expulso do partido é o exemplo mais notório desta prática). Mas a verdade é que os próprios partidos são o problema, pois poderiam evitar alguns escândalos se bloqueassem a carreira política de alguns bandidinhos que se tornam bandidões ao ingressar em cargos eletivos.

A judicialização da política no Brasil não é necessariamente culpa do Judiciário, pois este poder só age quando é provocado e não pode deixar de agir diante de uma provocação judiciária. Isto tem sido a regra, muito embora uma ou outra decisão corajosa já tenha sido tomada por Juízes de primeira instância que se recusaram a decidir em caso de disputas que deveriam ser resolvidas na arena política. Mas não podemos deixar de notar que há juízes que defendem o protagonismo político do Judiciário (Gilmar Mendes, por exemplo) e aqueles que criticam esta tendência (Teori Zavascki está entre os tais).

Sou advogado há 24 anos e tenho absoluta certeza de que o Mensalão foi o maior fenômeno judiciário-midiático brasileiro. Antes dele nenhum processo judicial chamou tanta atenção, nem mesmo o Impedimento de Collor fez isto (muito embora aquele não tenha sido um processo judiciário e sim um procedimento no Senado).  A Devassa que foi aberta para investigar a Conjuração Mineira e levou à condenação dos sediciosos entrou para a história judiciária da Colônia em razão de ter desdobramentos em duas províncias. Naquele tempo, porém, as notícias eram escassas e viajavam nos lombos dos burros. O Mensalão recebeu intensa cobertura jornalística e seu julgamento foi transmitido em tempo real para todo o país se transformando num verdadeiro espetáculo. As redes de TV lutaram pela audiência durante o processo, pois seu faturamento comercial está vinculado à atenção que o respeitável público devota ao seu telejornal preferido. A mídia vive do espetáculo e, portanto, descobriu um filão lucrativo durante o julgamento do Mensalão.

O MP tem uma série de prerrogativas constitucionais. O órgão tem o poder de ajuizar diversos tipos de processos visando a punição de crimes cometidos durante o exercício de função pública, a defesa da constitucionalidade das leis, a preservação ou recomposição do patrimônio público e a garantia dos interesses coletivos e difusos da população. No exercício de suas funções, os Promotores e Procuradores tem ajuizado milhares de ações contra políticos, questionado a legalidade de programas municipais, estaduais e federais. Portanto, o MP também tem sido uma fonte importante da judicialização da política. Há quem pretenda restringir o poder dos Promotores e Procuradores. Os políticos processados por eles encabeçam este movimento e não merecem nosso apoio. Pessoalmente, acredito que a  melhor forma de evitar abusos é responsabilizar pessoalmente os membros do MP pelos desvios que eles praticarem em favor ou em detrimento de um partido por razões partidárias ou não estritamente jurídicas.

O quadro geral é este. Há muita informação na internet sobre o tema, mas a desinformação científica sobre a judicialização da política é evidente. Não existem estatísticas confiáveis sobre as disputas judiciárias derivadas da política a partir de registros dos Fóruns e Tribunais. Os partidos políticos tem uma parcela grande de culpa, pois provocam constantemente o Judiciário e porque seus filiados eleitos acabam se tornando réus em ações promovidas pelo MP. A mídia parece inclinada a empurrar o problema com a barriga porque processo também vira espetáculo e produz lucro. Uma vez provocado, o Judiciário terá que decidir, mesmo que decida não afrontar os limites da CF/88 adentrando no “campo político”. 

Sobre o autor
Fábio de Oliveira Ribeiro

Advogado em Osasco (SP)

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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