3 CONCLUSÃO
Esse estudo teve por objetivo analisar o conflito existente entre o direito de resistência e o dever fundamental de pagar tributos. Firme-se que nessa oportunidade não se intentou esgotar o tema, haja vista que ele possui nuances que se desdobram para outras áreas do direito, máxime o direito tributário, além de áreas exteriores ao direito, como a ciência política, a sociologia e as ciências contábeis.
Durante o processo de elaboração desta pesquisa, deparou-se com gama vasta de dificuldades. Dentre as mais relevantes, ressalta-se a de definir quais princípios são os de maior ressalte a subsidiar a defesa da resistência tributária.
Como foi abordado, o fundamento do poder estatal de tributar é manifestação da soberania e a sua titularidade pertence ao povo, originalmente. O Estado, após a Assembleia Constituinte e a promulgação da Constituição, detém a competência tributária – limitada pelas leis. Esta noção ficou assente em linhas atrás. O poder de tributar, destarte, estava construído pela doutrina tributarista. Bastava à presente monografia contribuir com a construção segura da resistência tributária. O alicerce dessa construção reclamou uma revisita aos direitos fundamentais.
Como é cediço, os direitos de primeira geração (ou dimensão) foram os primeiros a constarem do instrumento normativo constitucional, a saber, direitos civis e políticos, que, em grande parte correspondem, por um prisma histórico, àquela fase inaugural do constitucionalismo do Ocidente.
O artigo 5°, caput¸da Carta Política de 1988, garante ao proprietário a inviolabilidade da propriedade – posição que é ratificada mais à frente, no inciso XXII, observando-se, em todo caso, a função social (inciso XXIII). Igualmente resguardada pelo manto constitucional foi a propriedade intelectual, como dimana dos incisos XXVII, XXVIII e XXIX. O artigo 5°, inciso XIII, da Carta Política, por sua vez, resguarda a liberdade de ação profissional. O que credencia esses direitos a figurarem com ressalte na defesa dos direitos fundamentais é o princípio da dignidade da pessoa humana.
Ora, esses direitos associam-se tanto com a liberdade como com as condições mínimas de subsistência. É neste âmbito que se insere a proteção ao mínimo existencial, expressão que identifica o conjunto de bens e utilidades básicas para a subsistência física e indispensável ao desfrute dos direitos em geral.
Camada superior do ordenamento, a Constituição tem sua supremacia assegurada por diversos mecanismos de controle de constitucionalidade. É com base neste princípio que uma norma infraconstitucional tributária que seja atentatória ao princípio da dignidade da pessoa humana e princípios correlatos, como visto supra, possa ser afastada no caso concreto.
Com o fim de marcar um parâmetro de segurança para a desobediência tributária, fez-se transplante da sistematização proposta por José Carlos Buzanello para a ordem tributária. Assim é que desobediência tributária reúne as seguintes características: a) é uma forma particularizada de resistência e qualifica-se na ação pública, simbólica e ético-normativa; b) pode manifestar-se de forma coletiva ou individual e pela ação “não-violenta”; c) quer demonstrar a injustiça da lei ou do ato governamental tributário mediante ações de grupos de pressão junto aos órgãos de decisão do Estado; d) visa à reforma jurídica e política do Estado, não sendo mais do que uma contribuição ao sistema político ou uma proposta para o aperfeiçoamento jurídico da ordem tributária.
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Notas
[1] TORRES, Ricardo Lobo. Os direitos humanos e a tributação: imunidades e isonomia. Rio de Janeiro: Renovar, 1995, p. 1.
[2] ZIMMERMANN, Augusto. Curso de Direito Constitucional. 4 ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006, p.6
[3] CARRAZZA, Roque Antônio. Curso de direito constitucional tributário. 17 ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2002, p. 427.
[4] ROCHA, João Marcelo. Direito tributário. 4 ed. Rio de Janeiro: Ferreira, 2005, p. 99.
[5] AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 16 ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 128.
[6] Ibidem, p. 55.
[7] PAUPÉRIO, Arthur Machado. O Direito Política de Resistência. São Paulo: Forense, 1978.
[8] HOBBES, Thomas. Leviatã ou matéria, forma e poder de um estado eclesiástico e civil. Tradução de João Paulo Monteiro e Maria Beatriz da Silva. São Paulo: Victor Civita, 1998, p. 111.
[9] SOUKI, N. Behemoth contra Leviatã: guerra civil na filosofia de Thomas Hobbes. São Paulo: Edições Loyola, 2008
[10] SILVEIRA, Luís Gustavo Guadalupe. A teoria da desobediência civil de John Locke. Revista Intuito. Rio Grande do Sul: v. 1, n. 2, p. 11, 2008.
[11] Idem, p.8.
[12] CHÂTELET, François. op. cit., p.74.
[13] Idem, p. 76.
[14] BOBBIO, Norberto, et al. Dicionário de Política. 12ª ed. Brasília: UNB, 1997, p. 445.
[15] DWORKIN, Ronald. Op. cit., p.328.
[16] SILVA, Ricardo Perlingeiro Mendes da. Teoria da Justiça de John Rawls. Revista de Informação Legislativa. Brasília, v.35, n.138, p. 206, abr./jun. 1998.
[17] Idem, p. 207
[18] PAULSEN, Leandro. Direito Tributário: Constituição e Código Tributário à Luz da Doutrina e da Jurisprudência. Porto alegre: Livraria do Advogado, 2005.
[19] BOTELHO, Rodrigo Jacobina. Op. cit., p. 145.
[20] BARROSO, Luís Roberto. op. cit., 2004, p. 363.