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Processo civil contemporâneo:

aspectos conceituais, constitucionalização e tutela jurisdicional efetiva

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5. ALTERAÇÕES TRAZIDAS PELA LEI 11.187/2005 CONFERINDO NOVA DISCIPLINA AO CABIMENTO DOS AGRAVOS RETIDO E DE INSTRUMENTO – UMA REFORMA EM BUSCA DE EFETIVIDADE.

Toda digressão feita anteriormente terá a sua exemplificação prática no presente tópico.

Trataremos da nova sistemática do agravo, seja ele na modalidade retido ou por instrumento.

A análise das alterações, no recurso do agravo, foram escolhidas justamente por demonstrarem que o direito processual contemporâneo exige um tratamento, célere, oral, que ampare as tutelas de urgência de forma adequada e efetiva.

Analisaremos a alteração legislativa trazida pela 11.187/2005, comentando seus artigos e a influência por ela trazida na busca de uma tutela jurisdicional concreta.

Art. 522. Das decisões interlocutórias caberá agravo, no prazo de 10 (dez) dias, na forma retida, salvo quando se tratar de decisão suscetível de causar à parte lesão grave e de difícil reparação, bem como nos casos de inadmissão da apelação e nos relativos aos efeitos em que a apelação é recebida, quando será admitida a sua interposição por instrumento.

O recurso de agravo, que é cabível contra decisão interlocutória proferida por juiz de primeiro grau de jurisdição, com a reforma legislativa, passou a ser aplicado em regra em sua modalidade retida no âmbito do processo judicial que tramita no juízo ad quo. Antes da reforma, sua utilização tanto na modalidade retida como por instrumento dava-se indiscriminadamente, afinal, não havia previsão legal de obrigatoriedade entre uma ou outra modalidade.[30]

Deste modo deve-se observar que, sempre que a decisão for suscetível de causar à parte, lesão grave e de difícil reparação, o agravo se dará na modalidade por instrumento. Passa-se a haver um policiamento processual maior em verificar se o agravo interposto tem por fundamento alguma situação que demande uma tutela de urgência. Hipóteses (processuais) que bem ilustram a tal situação são as decisões que concedem ou negam pedido de liminar ou tutela antecipada, além da própria aferição da situação de direito material sub judice, à exemplo, uma demanda possessória.[31]

O tratamento do prazo legal de 10 dias para sua interposição, bem como as situações legais de inadmissão da apelação e efeitos em que a apelação é recebida, que dão azo à aplicação do agravo de instrumento direto no tribunal ficaram inalterados pela reforma.

Percebe-se assim, que a simples prestação da tutela jurisdicional na ótica positivista do Estado Liberal em apenas conceber um rito para que o cidadão tivesse direito à uma sentença, não importando qual fosse o resultado, não mais vigora. O rito deve ser propício à tutela do direito e condizente com um prestação da tutela jurisdicional mais célere.

Temos na apreciação deste artigo traços do princípio da adequação e da celeridade processual.             

Art. 523. Na modalidade de agravo retido o agravante requererá que o tribunal dele conheça, preliminarmente, por ocasião do julgamento da apelação. (...) § 3o Das decisões interlocutórias proferidas na audiência de instrução e julgamento caberá agravo na forma retida, devendo ser interposto oral e imediatamente, bem como constar do respectivo termo (art. 457), nele expostas sucintamente as razões do agravante.

O atual art. 523, § 3º do CPC determina que se interponha o agravo na forma oral, na audiência de instrução e julgamento, devendo o respectivo recurso ser reduzido a termo.          Diferentemente do que prescrevia a antiga redação do citado artigo[32], a faculdade permissiva da antiga redação deu lugar a determinação cogente da interposição do agravo na forma oral, em obediência ao princípio da oralidade. No tocante à restrição de se permitir apenas na audiência de instrução e julgamento, não é possível apreender sua razão de ser.

Alexandre Freitas Câmara discorre:

Temos que lex minus dixit quam voluit, isto é, a lei menos disse do que queria. Não há qualquer razão aceitável para excluir-se a admissibilidade da interposição oral do agravo retido contra decisões proferidas na audiência preliminar, ou em qualquer outra audiência que não a de instrução e julgamento. Pensamos, assim, que esse dispositivo deve ser interpretado extensivamente e que só será admitido o agravo retido oral contra decisões proferidas em audiência (de qualquer natureza). [33]

Observe-se que no momento da argüição do recuso oralmente na audiência de instrução e julgamento, bem como na redução a termo do mesmo, o agravante deve expor a razões que fundamentam seu recurso, devendo com clareza expor o(s) ponto(s) da decisão que merece reforma, porquanto a fundamentação (ou motivação) é um dos pressupostos recursais do agravo. No que tange a obrigação da utilização da forma oral, José Eduardo Carreira Alvim entende que na prática, pode até não ser na forma oral, desde que o juiz solicite ao advogado do agravante que elabore a peça por escrito fazendo-se juntar aos autos, daí não resultando nenhuma nulidade ou prejuízo ao recorrente.[34]

Art. 527. Recebido o agravo de instrumento no tribunal, e distribuído incontinenti, o relator (...) II - converterá o agravo de instrumento em agravo retido, salvo quando se tratar de decisão suscetível de causar à parte lesão grave e de difícil reparação, bem como nos casos de inadmissão da apelação e nos relativos aos efeitos em que a apelação é recebida, mandando remeter os autos ao juiz da causa;

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A previsão de conversão do agravo de instrumento em agravo retido salvo quando se tratar de decisão suscetível de causar à parte lesão grave e de difícil reparação, bem como nos casos de inadmissão da apelação e nos relativos aos efeitos em que a apelação é recebida, mandando remeter os autos ao juiz da causa, promoveu uma adequação da legislação processual à tão debatida idéia de uma prestação jurisdicional efetiva.

Parte minoritária da doutrina critica a alteração legislativa alegando ofensa a princípios processuais de ordem constitucional, como por exemplo, o princípio do acesso ao juiz natural, utilizando como argumento que nos casos de competência recursal dos tribunais, o relator, quando decide singularmente, atua como delegado do colegiado, e o faz por economia processual, sem, entretanto, anular a competência originária do ente coletivo.[35]

Bruno Dantas Nascimento também critica o referido dispositivo:

[...] a irrecorribilidade estatuída pelo parágrafo único do art. 527 terá duas faces, nenhuma delas construtiva para a ciência processual brasileira: uma inconveniente e outra inconstitucional. De um lado, inconveniente quando a vexata quaestio encerrar direito líquido e certo, pois o novo dispositivo ensejará a impetração do mandado de segurança contra o decisum do relator, que, como dissemos alhures, trará todo um cabedal de recursos propícios a assoberbar, ainda mais, nossos tribunais. De outro, inconstitucional pois a subtração do exame do recurso do colegiado, que é seu juiz natural, culmina em flagrante inconstitucionalidade.[36]

Vejamos, é cediço na doutrina majoritária que o princípio do juiz natural atua em duas frentes, (i) uma direcionada ao juízo enquanto competência constitucional e legalmente delimitada; (ii) outra, frente ao juiz quando se exige imparcialidade na sua atuação, além dos casos da não criação dos tribunais de exceção.

Nesse sentido: Nelson Nery Junior[37] e Leonardo Greco[38]

Vemos claramente que, a partir de uma leitura sistemática da constituição e da legislação processual infraconstitucional, temos uma competência fixada, um juiz individualizado, os critérios de divisão funcional observados... A reforma em nada feriu as bases teóricas do processo civil, portanto qualquer crítica não pode prosperar.

Então: 1) possuímos uma lei ordinária federal disciplinando o recurso do agravo que teve o correto trâmite nas casas legislativas obedecendo ao devido processo legislativo, 2) esta mesma lei respeitou ao princípio do devido processo legal substantivo que, pela vertente do princípio da proporcionalidade, um meio que representa “restrição” a um direito fundamental pode ser empregado, desde que, cumulativamente: i) seja adequado para prestigiar um outro direito fundamental (que deve ser apontado); ii) seja necessário para tanto, vale dizer, não existam outros meios que também sejam adequados e que não impliquem restrição ao direito fundamental de que se cuida; e iii) seja proporcional em sentido estrito, vale dizer, seu emprego, além de adequado ao prestígio de um direito fundamental, e necessário, na medida em que não existam outros também adequados e menos gravosos, traga mais vantagens do que desvantagens, ou, dizendo de uma outra forma, traga maior acréscimo à efetividade do princípio que visa a efetivar do que decréscimo àquele que por ele é restringido,[39] 3) teve como bússola norteadora o princípio da razoável duração do processo, prestigiando o desafogamento do judiciário.

Portanto, acreditamos particularmente, que o legislador foi feliz, pois também reverenciou dentre outros, o respeito ao princípio da adequação bem como ao da instrumentalidade do processo.

No mesmo sentido, mas com outros fundamentos, José Eduardo Carreira Alvim:

A alteração do inciso II do art. 527 do CPC objetivou harmonizá-lo com o disposto no art. 522, adotando a mesmíssima redação, na conversão do agravo de instrumento, inadequadamente interposto, em agravo retido. A diferença fica por conta da faculdade processual antes conferida ao relator [...] para o dever processual. [...] Seja como for, a restrição [...] tem sua razão de ser, pois a experiência dos pretórios demonstra que, no Brasil, se recorre (agrava-se) de toda e qualquer decisão interlocutória... [40]

Temos Fredie Didier:

Em vez de determinar o não-conhecimento do recurso, o legislador cria regra de aproveitamento do ato processual indevidamente praticado, em nítida aplicação ao princípio da instrumentalidade das formas. [41]

Art. 527. Recebido o agravo de instrumento no tribunal, e distribuído incontinenti, o relator: (...) V - mandará intimar o agravado, na mesma oportunidade, por ofício dirigido ao seu advogado, sob registro e com aviso de recebimento, para que responda no prazo de 10 (dez) dias (art. 525, § 2o), facultando-lhe juntar a documentação que entender conveniente, sendo que, nas comarcas sede de tribunal e naquelas em que o expediente forense for divulgado no diário oficial, a intimação far-se-á mediante publicação no órgão oficial;

A intimação do agravado, dando-se por ofício dirigido ao advogado ou mesmo por publicação no diário oficial, preza impecavelmente pelo princípio da publicidade, bem como está presente também o princípio do contraditório e paridade das armas, ao conceder o prazo de dez dias para resposta do agravado.

Art. 527. Recebido o agravo de instrumento no tribunal, e distribuído incontinenti, o relator: (...) VI - ultimadas as providências referidas nos incisos III a V do caput deste artigo, mandará ouvir o Ministério Público, se for o caso, para que se pronuncie no prazo de 10 (dez) dias. Parágrafo único. A decisão liminar, proferida nos casos dos incisos II e III do caput deste artigo, somente é passível de reforma no momento do julgamento do agravo, salvo se o próprio relator a reconsiderar.

Nos casos especificados na prescrição legal, abrir-se-á vista dos autos ao Ministério Público. É necessário frisar que o Ministério Público não atuará em todo e qualquer processo que tenha a interposição de um agravo, mas apenas naqueles em que o recurso tiver sido interposto e a intervenção ministerial seja obrigatória.

Luiz Guilherme Marinoni ao apreciar a atual sistemática do recurso entende que a decisão liminar do relator, nos casos dos incisos II e III, é irrecorrível, somente podendo ser objeto de pedido de reconsideração, dirigida ao próprio relator, sendo apreciada pelo colegiado apenas por ocasião do julgamento do agravo (art. 527, parágrafo único, do CPC).[42]

Assim, a supressão do agravo interno, dá maior credibilidade ao relator, afirmando que fora um retrocesso a previsão do agravo interno na medida em que permitia a duplicação de recursos cabíveis, eliminando a intenção de celeridade buscada por aquela modificação.


CONCLUSÃO

Superou-se o Estado Legalista e impôs-se o Estado Constitucional. O homem de mero coadjuvante passa a ser ator principal traduzido em sua dignidade. Institutos clássicos do processo civil são redimensionados sob a ótica dos direitos fundamentais. Ao Estado não cabe mais o papel burocrático de garantir ao cidadão uma sentença inerte e ineficaz, cabe-lhe agora promover a proteção apropriadamente concreta sob a nomenclatura de tutela jurisdicional efetiva adequada e adaptável ao direito material sub judice.

Nesse quadro, é necessário percebermos que a repercussão reflexiva da atuação das normas constitucionais sobre os demais ramos do direito, em especial sobre o processo civil, revela-se apropriada e necessária.

Assim, nos é permitido afirmar que a evolução do processo civil, com suas novas tendências, está trilhando um caminho evolutivo e de mão única, com o escopo de se chegar a uma justiça social célere e efetiva.


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Sobre os autores
Karine Rodrigues Piauilino Cruz

Especialista em Direito Empresarial pela UECE/CE e em Direito Civil pela FIJ/RJ.

Danilo Nascimento Cruz

Membro da Associação Brasileira de Direito Processual – ABDPro; Especialista em Direito do Estado e em Direito Processual Civil; Desenvolve pesquisas nas áreas: Teoria da Constituição e do Processo Civil, Direito & Literatura e Direito & Filosofia; Contato: dnc_pi@hotmail.com

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CRUZ, Karine Rodrigues Piauilino; CRUZ, Danilo Nascimento. Processo civil contemporâneo:: aspectos conceituais, constitucionalização e tutela jurisdicional efetiva. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 4032, 16 jul. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/30238. Acesso em: 22 nov. 2024.

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