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Os programas sociais e o direito à moradia:

Uma análise à luz do princípio da impessoalidade e da competência das entidades federativas

Agenda 11/08/2014 às 15:09

Analisa a natureza jurídica dos programas sociais e do direito à moradia. Esquadrinha-se a distribuição de competências e a a responsabilidade das entidades federativas. Coteja-se o direito à moradia e o princípio da impessoalidade e o da legalidade.

Intróito

A Constituição da República Federativa do Brasil expressamente estatuiu o Título III destinado à Organização do Estado, no qual estabeleceu uma repartição de competências entre as entidades federativas.

A distribuição de competências realizada pela Carta Magna era algo fundamental para que se pudesse concretizar o modelo federativo de estado, que é adotado pelo nosso País e agasalhado como cláusula pétrea no art. 60, §4º, da CF.

Assim, buscou-se estabelecer um rol de competências privativas da União e dos Municípios de natureza legislativa, um rol de competências exclusivas da União e dos Municípios de natureza administrativa, um rol de competências concorrentes de ordem legislativa e um elenco de competências comuns de ordem administrativa. Ao tempo, em que se reconheceu a competência remanescente dos Estados-membros.

Nesse diapasão, dentro da estrutura federativa do Brasil, a União, os Estados-membros, os Municípios e o Distrito Federal, na qualidade de entidades autônomas (nos termos preconizados no art.18 da Carta Magna), devem agir nos limites de suas competências.

Art. 18. A organização político-administrativa da República Federativa do Brasil compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos, nos termos desta Constituição.

Assim, em razão da quantidade de pessoas que necessitam do auxílio do Estado ser superior aos recursos que são destinados aos programas sociais, mister se analisar os critérios que poderão ser utilizados para identificar as pessoas que serão contempladas por estas prestações positivas.


Do Direito à Moradia

O direito à moradia insere-se dentro dos direitos sociais, configurando-se um direito fundamental de segunda geração, através do qual o Estado se compromete por meio de prestações positivas a buscar melhorar as condições de vida da população mais pobre.

Assim, por meio da Emenda Constitucional n. 26, de 14 de fevereiro de 2000, foi inserido de forma expressa no caput do art. 6º o direito à moradia, in verbis:

Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.

            Nesse diapasão, em que pese à enorme relevância dos direitos sociais dentro de um ideário de Estado Social (estado intervencionista ou de welfare state), é pensamento praticamente unânime na doutrina de que o art. 6º da Carta Magna deve ser enquadrado como uma norma programática, na linguagem de J.J. Gomes Canotilho, ou norma de eficácia limitada, na expressão cunhada por José Afonso da Silva. Assim, registre-se o pensamento de José Afonso da Silva (Curso de Direito Constitucional Positivo. Malheiros: São Paulo, 2007, p. 315) sobre a matéria:

Esse é daqueles direitos que têm duas faces: uma negativa e uma positiva. A primeira significa que o cidadão não pode ser privado de uma moradia nem impedido de conseguir uma, no que importa a abstenção do Estado e de terceiros. A segunda, que é a nota principal do direito à moradia, como dos demais direitos sociais, consiste no direito de obter uma moradia digna e adequada, revelando-se como um direito positivo de caráter prestacional, porque legitima a pretensão do seu titular à realização do direito por via de ação positiva do Estado. É nessa ação positiva que se encontra a condição de eficácia do direito à moradia. E ela está prevista em vários dispositivos da nossa Constituição, entre os quais se destaca o art. 3º, que define como objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil construir uma sociedade justa e solidária, erradicar a marginalização – e não há marginalização maior do que não se ter um teto para si e para a família -, e promover o bem de todos, o que pressupõe, no mínimo, ter onde morar dignamente. Além dessas normas e princípios gerais, há ainda o disposto no art. 23, X, que dá competência comum a todas as entidades públicas da Federação para combater as causas da pobreza e os fatores da marginalização, promovendo a integração social dos setores desfavorecidos, o que importa, só por si, criar condições de habitabilidade adequada para todos. Mas há, ainda, norma específica determinando ação positiva no sentido da efetiva realização do direito à moradia, quando, no mesmo art. 23, IX, se estabelece a competência comum para ‘promover programas de construção de moradias e a melhoria das condições habitacionais e de saneamento.

De maneira ainda mais específica, assim se manifesta José Afonso da Silva na obra Aplicabilidade das Normas Constitucionais (Malheiros: São Paulo, 2002, p. 140 e 141):

O problema que se coloca agudamente na doutrina recente consiste em buscar mecanismos constitucionais e fundamentos teóricos para superar o caráter abstrato e incompleto das normas definidoras de direitos sociais, ainda concebidas como normas programáticas, a fim de possibilitar sua concretização prática. Cogita-se de responder à seguinte questão, posta por Canotilho: em que medida pode uma lei  fundamental transformar-se em programa normativo do Estado e da sociedade. Mais concretamente: como pode (se é que pode) uma constituição servir de fundamento normativo para o alargamento das tarefas estaduais e para a incorporação de fins econômico-sociais, positivamente vinculantes das instâncias de regulação jurídica?

As normas programática são de grande importância, como dissemos, porque procuram dizer para onde e como se vai, buscando atribuir fins ao Estado, esvaziado pelo liberalismo econômico. Essa característica teleológica  lhes confere relevância e função de princípios gerais de toda a ordem jurídica, como bem assinala Natoli, tendente a instaurar um regime de democracia substancial, ao determinarem a realização de fins sociais, através da atuação de programas de intervenção na ordem econômica, com vistas a assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social. Esta é o fim que os arts. 170 e 193 da Constituição de 1988 prescrevem para as ordens econômica e social. Não é fácil realizar a justiça social num sistema em que predomina a concentração da riqueza. É que ela só se concretizará mediante equitativa distribuição da riqueza nacional, pois um regime de justiça social será aquele em que cada um deve poder dispor dos meios materiais de viver confortavelmente segundo as exigências de sua natureza física, espiritual e política. Um regime democrático de justiça social não aceita as profundas desigualdades, a pobreza e a miséria. Ora, o reconhecimento dos direitos sociais, como instrumentos de tutela dos menos favorecidos, não tem tido a eficácia necessária para reequilibrar a posição de inferioridade que lhes impede o efetivo exercício das liberdades garantidas. Assim, no sistema anterior, a promessa constitucional de realização da justiça social não se efetivara na prática. A Constituição de 1988 é mais incisiva no conceber  a ordem econômica sujeita aos ditames da justiça social para o fim de assegurar a todos existência digna. Dá a justiça social um conteúdo preciso. Preordena alguns princípios da ordem econômica – a defesa do consumidor, a defesa do meio ambiente, a redução das desigualdades regionais e pessoais e a busca do pleno emprego – que possibilitam a compreensão de que o capitalismo concebido há de humanizar-se (se é que isso é possível). Traz, por outro lado, mecanismos na ordem social voltados à sua efetivação. Tudo depende da aplicação das normas constitucionais que contêm essas determinantes, esses princípios e esses mecanismos.

            Dessa forma, ao revés dos direitos individuais e coletivos estatuídos no art. 5º, que podem ser objeto de tutela jurisdicional por meio do mandado de segurança ou de outro remédio constitucional, os direitos sociais previstos a partir do artigo 6º, em especial, o direito à moradia está jungido ao princípio da reserva do possível, não podendo este direito ser exigido judicialmente.

            Contudo, a constatação de que o direito à moradia insere-se dentro dos direitos sociais não esgota a matéria, pois como já destacado anteriormente, dentro de uma federação é fundamental identificar de quem é a competência para cuidar da matéria, bem como, identificar de que tipo de competência se trata.


Da Competência das Entidades Federativas

A Constituição Federal ao distribuir as competências de natureza legislativa, não trouxe nenhuma regra específica acerca do direito à moradia. Contudo, ao tratar das competências comuns expressamente estabeleceu no art. 23, inc. IX, como sendo de responsabilidade da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios promover programas de construção de moradias e a melhoria das condições habitacionais e de saneamento básico, in verbis:

Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios:

...        

IX - promover programas de construção de moradias e a melhoria das condições habitacionais e de saneamento básico;

Mais uma vez, pela própria dicção do texto constitucional, já se deduz que se trata de uma norma constitucional de eficácia limitada, que deve servir como norte para a atuação da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal.

Assim, conforme entende a melhor doutrina, na medida em que se estabeleceu uma competência comum para as entidades federativas de natureza administrativa, estabeleceu-se, indiretamente, também uma competência de natureza legislativa. A teoria dos poderes implícitos que tem origem no direito constitucional norte-americano, parte do pressuposto que quem deu os fins, tem que conceder os meios necessários para alcançá-lo. Registre-se, quanto ao tema, o ensinamento de Manoel Jorge e Silva Neto (Direito Constitucional. Lumen Juris: Rio de Janeiro, 2009, p. 318):

Não há qualquer dificuldade para a compreensão do conteúdo desta engenhosa Teoria desenvolvida no âmbito da Suprema Corte norte-americana.

Significa simplesmente o seguinte:

Ali onde foi atribuído o ônus a uma unidade federativa, deve ser reservado, ainda que implicitamente, o respectivo bônus a fim de ser cumprida a obrigação firmada em nível constitucional.

Embora a Teoria dos Poderes Implícitos, per se, não seja suficiente para descobrir todas as intrincadas questões que circundam a divisão de competências em um Estado Federal, auxilia sobremaneira o intérprete da constituição por meio da utilização do raciocínio lógico.

Deveras, se ao órgão central da Federação foi cometido um rol muito mais extenso de obrigações, quer no campo prestacional dos serviços de saúde, educação, segurança ou previdência social, ainda que o sistema constitucional não tenha, de modo explícito, proporcionado os meios à consecução daquelas finalidades, passou-se a entender, com amparo na Teoria, que os recursos tendentes à satisfação de tais necessidades deveriam ser alocados à unidade central.

E o raciocínio empregado foi precisamente o de que, se a ‘constituição estabelecera obrigações adicionais a determinados órgãos da Federação, a interpretação constitucional deveria ser conformada pela ideia relativa à necessidade de dotar-se de meios e recursos aptos ao cumprimento das indigitadas obrigações, mesmo que o constituinte originário tenha silenciado a respeito.

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Assim, para que a União, os Estados, os Municípios e o Distrito Federal possam cumprir o quanto estabelecido no art. 23, inc. IX, da Constituição Federal, antes terão que aprovar Leis criando um programa relativo à moradia.

Nesse sentido, crive-se que este é o único entendimento possível a respeito da temática, pois se a União, os Estados, os Municípios e o Distrito Federal promoverem programas de construção de moradia sem a existência de legislação específica a respeito do assunto, ter-se-á uma violação ao princípio da legalidade, expressamente agasalhado no caput do artigo 37 da Constituição da República.

Ademais, se a Administração Pública construir moradias e distribuir a algumas famílias carentes, sem a existência de norma sobre o assunto, esse procedimento configurará uma violação ao princípio da legalidade e ao princípio da impessoalidade, pois não se torna possível contemplar algumas pessoas em programas de caráter social em detrimento de outras, sem a existência de critério legal que possa orientar essa diferenciação de tratamento.


Da Normatização Federal

Em razão da relevância do direito à moradia no cenário mundial, identifica-se diversos instrumentos internacionais que buscam regulamentar esta temática. Nesse sentido, o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (1966), que integra o Sistema Internacional de Proteção aos Direitos Humanos assim dispõe sobre a matéria no seu art. 11:

Art. 11. Os Estados partes do presente Pacto reconhecem o direito de toda pessoa a nível de vida adequado para si próprio e sua família, inclusive à alimentação, vestimenta e moradia adequadas, assim como a uma melhoria continua de suas condições de vida. Os Estados Partes tomarão medidas apropriadas para assegurar a consecução desse direito, reconhecendo, nesse sentido, a importância essencial da cooperação internacional fundada no livre consentimento.

            Destarte, em que pese a República Federativa do Brasil ter ratificado o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais o entendimento que se consolidou no cenário doutrinário e jurisprudencial sobre o assunto, fora no sentido de se tratar de uma norma programática. Nesse sentido, registre-se o entendimento de Thomas Buergental (Protecting human rights in the Americas-cases and materiais apud Piovesan, Flávia. Direitos Humanos e o Direito Constitucional Internacional. 7ª ed. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 169):

Ao ratificar o Pacto, os Estados não se comprometem a atribuir efeitos imediatos aos direitos especificados no Pacto. Ao revés, os Estados se obrigam meramente a adotar medidas, até o máximo dos recursos disponíveis, a fim de alcançarem progressivamente a plena realização desses direitos.

     

Mister registrar, ainda, que no plano internacional o Brasil ratificou as Convenções sobre a Eliminação de todas as formas de Discriminação Racial (1965), a Eliminação de todas as formas de Discriminação Racial contra a Mulher (1979) e a Convenção sobre os Direitos da Crianças (1989), sendo que em todos estes instrumentos normativos prescrevem o direito à moradia.

Ademais, ainda no plano internacional, a Declaração sobre Assentamentos Humanos de Vancouver (1976) e a Agenda 21 sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento (1992), também asseguram o direito à moradia.

Dessa forma, na medida em que o direito à moradia é expressamente garantido na Constituição Federal, bem como, em instrumentos normativos internacionais dos quais o Brasil é signatário, impõe-se a adoção de políticas públicas que possam buscar concretizar este direito.

Buscando assim dar cumprimento ao comando constitucional contido no art. 6º da nossa Carta Magna, a União vem nos últimos anos criando programas que buscam garantir o direito à moradia à população carente.

Nesse sentido, deve-se buscar conceder especial atenção ao Programa Minha Casa, Minha Vida que se configura no principal programa habitacional atualmente existente no País.


Do Programa Minha Casa, Minha Vida e da Atribuição dos Municípios

O Governo Federal buscando cumprir com os seus deveres constitucionais, instituiu nos últimos anos diversos programas sociais com o desiderato de combater a pobreza e reduzir a desigualdade social e regional.

Nesse sentido, respeitando os princípios constitucionais informadores da administração pública insculpidos no caput do art. 37 da Carta Magna, notadamente, o princípio da legalidade e o princípio da impessoalidade, foi publicada em 07 de julho de 2009, a Lei Federal n. 11.977, que dispõe sobre o Programa Minha Casa, Minha Vida – PMCMV e a regularização fundiária de assentamentos localizados em áreas urbanas e dá outras providências.

Assim, registrem-se as informações apresentadas pelo site http://www2.planalto.gov.br/, no link, http://www2.planalto.gov.br/imprensa/noticias-de-governo/saiba-como-funciona-e-como-participar-do-programa-minha-casa-minha-vida, acerca do programa:

O Programa Minha Casa, Minha Vida (MCMV) se propõe a subsidiar a aquisição da casa própria para famílias com renda até R$ 1.600,00 e facilitar as condições de acesso ao imóvel para famílias com renda até R$ 5 mil. Para isso, o governo federal disponibilizou, na segunda etapa do programa, um total de R$ 125,7 bilhões, entre subsídio e linhas de financiamento.

Para participar do Minha Casa, Minha Vida, as famílias deverão estar enquadradas nas faixas de renda previstas (veja abaixo). A seleção dos beneficiários é de responsabilidade das prefeituras. Portanto, os interessados devem se cadastrar na sede administrativa do município.

Toda família com renda bruta mensal de até R$ 5 mil pode participar do programa, desde que não possua casa própria ou financiamento em qualquer unidade da federação, ou tenha recebido anteriormente benefícios de natureza habitacional do Governo Federal.

Faixa 1 - Famílias com renda mensal bruta de até R$ 1.600,00.

Faixa 2 - Famílias com renda mensal bruta de até R$ 3.275,00.

Faixa 3 - Famílias com renda mensal bruta acima de R$ 3.275,00 até R$ 5 mil.

Modalidades

O MCMV possui cinco modalidades  para a Faixa 1:

Empresas – atende famílias com renda mensal de até R$ 1.600, por meio da transferência de recursos ao Fundo de Arrendamento Residencial  (FAR).  Nessa modalidade, a maior parte do subsídio é da União. A parcela paga pelo beneficiário é de 5% da renda mensal, com prestação mínima de R$ 25.

Entidades – para as famílias com renda mensal de até R$ 1.600,00 organizadas em cooperativas habitacionais ou mistas, associações e demais entidades privadas sem fins lucrativos. O trabalho é feito por meio da produção, aquisição ou requalificação de imóveis já existentes. A União concede subsídio para a construção da unidade por meio de financiamentos a beneficiários organizados de forma associativa por uma entidade. A parcela paga pelo beneficiário é de 5% da renda mensal, com prestação mínima de R$ 25.

Municípios com até 50 mil habitantes – atende às famílias com renda mensal de até R$ 1.600,00 em municípios com população de até 50 mil habitantes, não integrantes de regiões metropolitanas das capitais estaduais. O subsídio é da União, sendo que o valor de contrapartida pode ou não ser cobrado do beneficiário.

FGTS – para atender às famílias com renda mensal até R$ 5 mil por meio do financiamento com recursos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço.

Rural – modalidade destinada aos agricultores familiares e trabalhadores rurais com renda anual bruta de até R$ 15 mil, para o Grupo 1, de R$ 15 mil a R$ 30 mil para o Grupo 2 e de R$ 30 mil a R$ 60 mil para o grupo 3.

Recursos

Os recursos do MCMV são do orçamento do Ministério das Cidades repassados para a Caixa Econômica Federal, que é o agente operacional do programa. Para atender à Faixa 1, nas modalidade Empresas e Entidades, a Caixa e o Banco do Brasil analisam e aprovam a contratação dos projetos apresentados pelas construtoras, conforme as diretrizes definidas pelo Ministério das Cidades. A liberação dos recursos ocorre a cada medição de obra.

Nas outras faixas de renda e modalidades, os recursos são repassados pelo ministério à Caixa para subsidiar os contratos de financiamento dos interessados na aquisição do imóvel tanto na área urbana como na rural. A contrapartida dos municípios é para a construção da infraestrutura externa, assim como alguns equipamentos públicos como escolas, postos de saúde e creches.

Impacto Econômico

No ano de 2012, o programa MCMV seguiu influenciando fortemente o crescimento, com um impacto estimado em 0,8 % no Produto Interno Bruto do país. Foi gerado aproximadamente 1,4 milhão de postos de trabalho formais, viabilizados pela superação da marca de dois milhões de unidades contratadas.

O programa alcançou a contratação de 2.863.384 unidades habitacionais no país, distribuídas por faixa de renda, conforme quadro abaixo:

Faixas de Renda

Valor de Investimento

Unidades Habitacionais

Contratadas

Concluídas

Entregues

Até R$ 1.600,00

R$ 60 bilhões

1.311.154

464.795

353.940

Até R$ 3.100,00

R$ 96,7 bilhões

1.221.126

960.112

855.484

De R$ 3.100,01 a R$ 5.000,00

R$ 26,8 bilhões

331.104

165.143

88.322

TOTAL

R$ 183.5 bilhões

2.863.384

1.590.050

1.297.746

Fonte: Portal Planalto, com informações do Ministério das Cidades

Dessa forma, o principal instrumento jurídico atualmente existente no País no sentido de buscar dar concretude ao direito à moradia é o Programa Minha Casa, Minha Vida.

Destarte, ao se realizar uma análise acurada da legislação vigente sobre a matéria, se constata que os Municípios podem aderir ao Programa, por meio de Termos de Adesão, e que, aqueles que o fizerem, ficam atrelados as obrigações contidas na Lei Federal n. 11.977/2009, in verbis:

Art. 3o  Para a indicação dos beneficiários do PMCMV, deverão ser observados os seguintes requisitos:  (Redação dada pela Lei nº 12.424, de 2011)

I - comprovação de que o interessado integra família com renda mensal de até R$ 4.650,00 (quatro mil, seiscentos e cinquenta reais);  (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)

II - faixas de renda definidas pelo Poder Executivo federal para cada uma das modalidades de operações;  (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)

III - prioridade de atendimento às famílias residentes em áreas de risco ou insalubres ou que tenham sido desabrigadas;  (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)

IV - prioridade de atendimento às famílias com mulheres responsáveis pela unidade familiar; e  (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)

V - prioridade de atendimento às famílias de que façam parte pessoas com deficiência. (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)

§ 1o  Em áreas urbanas, os critérios de prioridade para atendimento devem contemplar também: 

I – a doação pelos Estados, pelo Distrito Federal e pelos Municípios de terrenos localizados em área urbana consolidada para implantação de empreendimentos vinculados ao programa; 

II – a implementação pelos Estados, pelo Distrito Federal e pelos Municípios de medidas de desoneração tributária, para as construções destinadas à habitação de interesse social; 

III a implementação pelos Municípios dos instrumentos da Lei no 10.257, de 10 de julho de 2001, voltados ao controle da retenção das áreas urbanas em ociosidade. 

...

§ 4o  Além dos critérios estabelecidos no caput, os Estados, Municípios e Distrito Federal poderão fixar outros critérios de seleção de beneficiários do PMCMV, previamente aprovados pelos respectivos conselhos locais de habitação, quando existentes, e em conformidade com as respectivas políticas habitacionais e as regras estabelecidas pelo Poder Executivo federal.   (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)

§ 5o  Os Estados, Municípios e Distrito Federal que aderirem ao PMCMV serão responsáveis pela execução do trabalho técnico e social pós-ocupação dos empreendimentos implantados, na forma estabelecida em termo de adesão a ser definido em regulamento. (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)   (grifos nossos)

Dessa forma, a maior parte dos municípios cientes da alta relevância do Programa Minha Casa, Minha Vida e também de suas responsabilidades na qualidade de entidade federativa, aderiu ao referido programa e vem cumprindo com todas as obrigações que lhe são atribuídas.

Nessa ótica, em que pese reconhecer os enormes esforços do Governo Federal e das demais entidades federadas em instituir programas de melhoria e distribuição de renda, infelizmente não se torna possível acabar com males endêmicos no País há mais de 500 anos de uma hora para outra. Assim, cônscio dos seus deveres os municípios deverão agir dentro dos limites de sua possibilidade para concretizar o direito à moradia estatuído na Constituição Federal.

Contudo, a busca pela concretização do direito constitucional à moradia, não pode servir de fundamento para que o município descumpra o princípio da legalidade, verdadeiro baluarte do estado de direito, conquista civilizatória que deve ser sempre protegida.

Assim, data máxima vênia, ao se buscar a concretização do Direito à Moradia garantido pela Carta Magna, as entidades federativas deverão agir dentro dos limites da legalidade, devendo guardar estrita observância ao princípio da impessoalidade. Dessa forma, não deverão ser adotadas providências para garantir o direito à moradia especificamente para determinados pessoas físicas, pois isto representaria uma flagrante violação ao princípio da legalidade (uma vez que as leis são por natureza geral e abstrata) e da impessoalidade.

Com efeito, os municípios não podem construir ou alugar uma residência para uma família (ainda que carente), sem que exista uma legislação específica que venha a servir de fundamento para tal conduta e sem que existam critérios objetivos e previamente definidos de quais serão as famílias beneficiadas.

Dessa forma, não se torna possível aceitar, que nem mesmo o Ministério Público Estadual tenha possibilidade de estabelecer os seus próprios critérios (sem a existência de legislação específica sobre o assunto) para exigir que os municípios construam ou aluguem residências para uma família, enquanto que milhares de outras famílias ainda não tem este direito assegurado.

Entrementes, os municípios têm o dever de dar cumprimento ao direito à moradia contribuindo da melhor forma possível para os programas sociais instituídos por Lei pelo Governo Federal e que necessitam do aporte de recursos da municipalidade para que se tornem viáveis!!!

Salvo melhor juízo, esta é a única maneira de se coadunar o direito à moradia aos princípios da legalidade e da impessoalidade.


Considerações Finais

A identificação de que o direito à moradia se insere como uma norma de caráter programática, não pode servir de guarida para que as entidades federativas deixem de adotar as medidas pertinentes para garantir a máxima eficácia a este postulado constitucional.

Contudo, também não se pode em nome do direito à moradia relativizar os princípios constitucionais orientadores da Administração Pública insculpidos no caput do art. 37, notadamente, o princípio da legalidade e do da impessoalidade.

Nesse diapasão, compete às entidades federativas buscar dentro dos limites constitucionais a concretização do direito à moradia, objetivando assim, em última análise, a proteção da dignidade da pessoa humana.


Referência Bibliográfica

Constituição Federal.

Lei Federal n. 11.997/2009

Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais.

Piovesan, Flávia. Direitos Humanos e o Direito Constitucional Internacional. São Paulo: Saraiva, 2006.

Silva, José Afonso da. Aplicabilidade das Normas Constitucionais. São Paulo: Malheiros, 2002.

____ Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Malheiros, 2007.

Silva Neto, Manoel Jorge e. Direito Constitucional. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009.

www2.planalto.gov.br/imprensa/noticias-de-governo/saiba-como-funciona-e-como-participar-do-programa-minha-casa-minha-vida

Sobre o autor
Erick Menezes de Oliveira Junior

Advogado. Procurador Jurídico do Município de Vitória da Conquista. Professor de Direito Internacional Público e Privado da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia. Mestre em Ciências Sociais pela PUC-SP.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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