8. Conclusão:
Pelo quão exposto, não se vacila em afirmar que atualmente o legislador penal brasileiro vem ofertando a alguns dos bens jurídicos de feição transindividual uma proteção insuficiente.
Insuficiente porque conforme ensina Roxin o legislador apenas deve recorrer aos institutos da contravenção e da multa administrativa quando a perturbação social puder ser sanada com uma sanção menos onerosa. Nesse campo, deve rigorosamente atuar a proporcionalidade norteando a aplicação da penalidade, razão pela qual deve a gravidade da sanção fincar seu esteio no importe dado ao bem jurídico tutelado.
Não há dúvidas de que a Constituição deve ser o grande leme condutor da atividade legislativa, afinal os bens jurídicos tem seu suporte fático no texto da Lei Maior. Desse modo não deve – e também não pode – o legislador penal ordinário ofertar a um bem jurídico de feição constitucional uma proteção que seja indigna do status que o próprio legislador constituinte originário exigiu.
Mormente, vale ainda dizer que não se está defendendo aqui o Direito penal da tolerância zero e um endurecimento das penas como salvação do direito penal, mas sim, se diz que o legislador penal não é de todo livre para dispor dos bens jurídicos, sem observar a pauta valorativa constitucional.
Assim, deve-se ter em mente a necessária prudência que deve agir o legislador para não quedar-se numa proteção insuficiente e muito menos agir com excesso. Por outro lado, sabe-se desde já que não é fácil a tarefa de observando a realidade social e jurídica traçar um dispositivo jurídico que seja irretocável em sua atuação.
Nesse momento, em verdade, o que se faz é um convite a este tão necessário debate sobre como vem sendo feita e como deve ser feita a tutela pelo legislador penal de bens transindividuais.
Por ora, cabe dizer que enquanto não se der a devida importância a este tema e o legislador penal não dedicar-se com cuidado na oferta destes bens caberá ao judiciário por meio do controle de constitucionalidade e todas as suas ferramentas fazer uma filtragem constitucional das normas penais.
Nesse ponto, é preciso amplificar a ótica penal, é imperiosa a necessidade de harmonização entre a tutela penal e os valores constitucionais sob um prisma de proteção integral dos direitos. Por integral, entenda-se que as nossas leis devem atender ao seguimento de um garantismo positivo e negativo, sendo então, aplicada não só uma proteção contra o Estado, mas, mormente assegurando guarida efetiva de todos os direitos constitucionais, para que, só assim, então seja garantida ao cidadão uma existência digna.
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Notas
[1] FERRAJOLI, apud QUEIROZ, Paulo de Souza, Funções do Direito Penal, 2ª edição, São Paulo, RT, 2005 p. 122.
[2] FOUCALT, Michel apud QUEIROZ, Paulo de Souza, op. cit., p. 123.
[3]ANDRADE, Manuel da Costa - Consentimento e acordo em direito penal: contributo para a fundamentação de um paradigma dualista. Coimbra, Coimbra Editora, 2ª edição, 2004.
[4] BECHARA, Ana Elisa Liberatore S. O rendimento da teoria do bem jurídico no direito penal atual, disponível em http://www.ibccrim.org.br/site/revistaLiberdades/_pdf/01/artigo1.pdf, acessado em 12/12/2012 às 17:16 horas.
[5] SILVA, David. Op. cit.
[6] BECHARA, Ana Elisa Liberatore S. Op. cit.
[7]ANDRADE, Manuel da Costa. Op. cit., p. 69.
[8] LISZT. Franz von apud SILVA, David. Op. cit., p. 21.
[9] Ibidem, p. 22.
[10] COELHO, Yuri Carneiro. Bem Jurídico-Penal. Belo Horizonte: Mandamentos, 2003, p. 56.
[11] MIR PUIG, Santiago apud SILVA, David. Op. cit., p. 28.
[12] ROXIN, Claus apud SILVA, David. Op.cit., p. 28.
[13] SCHUNEMAN, Bernd. El sistema moderno Del derecho penal: cuestiones fundamentales. Madrid: Tecnos, 1991, p. 54.
[14] WELZEL, Hans apud SILVA, David. Op. cit., p. 33.
[15] Art. 17 – Não se pune a tentativa quando, por ineficácia absoluta do meio ou por absoluta impropriedade do objeto, é impossível consumar-se o crime.
[16] SILVA, David. Op.cit., p. 43.
[17] ROXIN, Claus. Op. cit. 22.
[18] Ibdem, p. 23.
[19] PRADO, Luiz Regis. Bem jurídico-penal e Constituição, 2. Ed., rev. e amp. São Paulo: Revista dos Tribunais, p. 36-37.
[20] DELGADO, Juana Del Carpio apud COELHO, Yuri Carneiro. Op.cit., p. 64-65.
[21] COELHO, op. cit.
[22] TAVARES, Juarez. Teoria do injusto penal. Belo Horizonte, Editora Del Rey, 3ª edição, 2000, p. 68.
[23] ANDRADE, Manuel da Costa. Op. cit.
[24] PRADO, Luiz Regis. Op. cit.
[25] COELHO, Yuri Carneiro. Op. cit., p.70-71.
[26] MOLINA, Antonio Garcia-Pablos de. Apud COELHO, Yuri Carneiro. Op. cit., p.72.
[27] PRADO, Luiz Regis. Op. cit.
[28] Ibdem, p. 51.
[29] COELHO, Yuri Carneiro, op. cit., p. 81-82.
[30] CUNHA, Maria da Conceição Ferreira da. Apud COELHO, Yuri Carneiro, op. cit. p. 87.
[31] Beck, Ulrich apud BUGALHO, Nelson Roberto. Sociedade de risco e intervenção do direito penal na proteção do ambiente, disponível em http://www.professorregisprado.com/Artigos/Nelson%20Roberto%20Bugalho/sociedade%20de%20risco.pdf, acessado em 02/01/13 ás 22:58 horas.
[32] MINAHIM, Maria Auxiliadora. Direito Penal e Biotecnologia. São Paulo: RT, 2005, p. 50.
[33] ROXIN apud NEVES, Sheilla Maria da Graça Coitinho das. A tutela penal dos bens jurídicos supra-individuais: um desafio da pós-modernidade. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, XIII, n. 72, jan 2010.Disponível em: http://www.ambitojuridico.com.br/site/index.php?_link=revista_artigos_leitura&artigo id=7063>. Acesso em jan 2013.
[34] NASCIMENTO, Tupinambá Miguel Castro do. Comentários ao Código do Consumidor. Rio de Janeiro, editora Aide, 1991, p. 101-111.
[35] CUNHA, Maria da Conceição Ferreira da. Apud, STRECK, Lênio Luiz, Bem jurídico e constituição: da proibição de excesso (übermassverbot) à proibição de proteção deficiente (untermassverbot) ou de como não há blindagem contra normas penais inconstitucionais, disponível em http://www.leniostreck.com.br/site/wp-content/uploads/2011/10/2.pdf, acessado em 23/12/2012 às 11:00 horas.
[36] STRECK, Lênio Luiz. O princípio da proibição de proteção deficiente (untermassverbot) e o cabimento de mandado de segurança em matéria criminal: superando o ideário liberal-individualista-clássico, disponível em http://www.prr5.mpf.gov.br/nucrim/boletim/2007_05/doutrina/doutrina_boletim_5_2007_proporcionalidade.pdf, acessado em 23/12/2012 às 22:07 horas.
[37] STRECK, Lênio Luiz. Op. cit., acessado em 23/12/2012 às 23:00 horas.
[38] SARLET, Ingo, op. cit.
[39] NEVES, Marcelo, apud, LENZA, Pedro. Direito Constitucional esquematizado. São Paulo, Editora Saraiva, 2012, p.78.
[40] BARATTA, Alessandro apud SARLET, Ingo, op. cit.
[41] SARLET, Ingo, op. cit.
[42] STRECK, Lênio Luiz; FELDENS, Luciano. Crime e Constituição: A legitimidade da função investigatória do Ministério Público. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2006. 3ª edição.
[43] MIR PUIG, Santiago apud STRECK, Lênio Luiz. Bem jurídico e constituição: da proibição de excesso (übermassverbot) à proibição de proteção deficiente (untermassverbot) ou de como não há blindagem contra normas penais inconstitucionais, disponível em http://www.leniostreck.com.br/site/wp-content/uploads/2011/10/2.pdf, acessado em 29/12/2012, as 20:00 horas.
[44] ÁVILA, Humberto. Teoria dos Princípios: da definição à aplicação dos princípios jurídicas. 3ª edição. São Paulo: Malheiros, 2010.
[45] SILVA,Virgílio Afonso da. Direitos Fundamentais conteúdo essencial, restrições e eficácia, 2ª ed., São Paulo: Malheiros Editores, 2010.
[46] ALEXY, Robert. Virgílio Afonso da Silva. Teoria dos Direitos Fundamentais. São Paulo: Malheiros. 2008.
[47] SARLET, Ingo, op. cit.
[48] Ibdem.
[49] CANARIS, Claus-Wihelm. Grundreche und Privatrecht apud SARLET, Ingo, op. cit., p. 39.
[50] PRADO, Luiz Regis. Apontamentos sobre o ambiente como bem jurídico penal. Revista de Direito Ambiental, pags: 134-158, ano 13, abril-junho 2008, editora RT.
[51] STRECK, Lênio Luiz, Bem jurídico e constituição: da proibição de excesso (übermassverbot) à proibição de proteção deficiente (untermassverbot) ou de como não há blindagem contra normas penais inconstitucionais, disponível em http://www.leniostreck.com.br/site/wp-content/uploads/2011/10/2.pdf, acessado em 07/01/2013 às 23:00 horas.
[52] Ibdem.
[53] RODRIGUES, Anabela Miranda, Contributo para a fundamentação de um discurso punitivo em Matéria Fiscal”, Temas de direito penal econômico, São Paulo: RT, 2000, p. 181.
[54] STRECK, Lênio Luiz, Bem jurídico e constituição: da proibição de excesso (übermassverbot) à proibição de proteção deficiente (untermassverbot) ou de como não há blindagem contra normas penais inconstitucionais, disponível em http://www.leniostreck.com.br/site/wp-content/uploads/2011/10/2.pdf, acessado em 08/01/2013 às 23:30 horas.
[55] FELDENS, Luciano apud STRECK, Lênio Luiz, op. cit.