3. IUJR: PROCEDIMENTOS E CONTEÚDO
Mesmo que com um certo atraso (a Lei 13.015/2014 foi publicada em 22/07/2014 e começou a viger após 60 dias desta data - vide art. 3º da citada lei -, seja, em 20/09/2014; já o Ato TST.SEGJUD.GP n. 491/2014, regulamento básico da mencionada legislação, teve a sua primeira publicação – foram feitas republicações em virtude de erros materiais – em 23/09/2014), o Tribunal Superior do Trabalho lançou luzes sobre o procedimento a ser adotado no “Incidente de Uniformização de Jurisprudência Regional”, por meio da Instrução Normativa do TST n. 37/2015 (Resolução do TST n. 195, de 02 de março de 2015, publicada no DEJT de 04/03/2015).
A mencionada instrução normativa, conforme seu preâmbulo “Regulamenta os procedimentos em caso de Incidente de Uniformização de Jurisprudência no âmbito dos TRTs, suscitado na forma do art. 896, § 4°, da CLT.”
Ou seja, o regramento se aplica tanto para os casos em que o TST, por meio do Ministro Relator, constata e suscita o IUJR, quanto para os casos em que tal incidente é levantado pelo Presidente do Regional, conforme interpretação conjugada dos parágrafos 4º e 5º do art. 896 da CLT.
Tal regulamento apresentou, ademais, a seguinte definição fundamental:
Art. 1° Para efeito do Incidente de Uniformização de Jurisprudência (IUJ) previsto nos §§ 4° e 5° do art. 896 da CLT, com a redação da Lei n° 13.015/14, considerar-se-á dissenso jurisprudencial sobre idêntica questão jurídica no âmbito do mesmo Tribunal Regional do Trabalho:
I - a discrepância subsistente de julgados entre órgãos fracionários da Corte, ainda que não uniformizada a matéria;
II - a divergência subsistente de julgados entre órgão fracionário e o Tribunal Pleno ou o Órgão Especial em decisão uniformizadora, sumulada ou não, ainda que anterior à Lei n° 13.015/14.
Quanto ao art. 1º, I, importa salientar que a ressalva “ainda que não uniformizada a matéria”, compreendida em sentido contrário, aponta que o IUJR se aplica mesmo que já exista tese uniformizada sobre a matéria no Regional. Compreendida em seu sentido efetivamente positivado, a mesma assertiva leva a crer que o regulamento está dizendo algo “evidente”: deve-se uniformizar a jurisprudência sempre que houver divergência subsistente e ainda não tiver havido uniformização. Entretanto, compreender a ressalva destes modos implicaria em torná-la inútil. No primeiro caso, estar-se ia dizendo algo (“aplica-se o IUJR sempre que houver divergência relevante entre julgado do órgão fracionário e tese uniformizada”) que já encontra respaldo no inciso II do mesmo artigo. Já no segundo caso (”deve-se uniformizar a jurisprudência sempre que houver divergência subsistente e ainda não tiver havido uniformização”), estar-se-ia dizendo o óbvio e a ressalva seria desnecessária, afinal é justamente para isso que serve o IUJR. Por que a situação comum e trivial viria disposta como se fosse uma exceção? (“ainda que não uniformizada a matéria”) Por que o texto teria feito questão de autorizar o que é evidente? Pela perplexidade e pelas indagações expostas, conclui-se que a ressalva, para ter um maior sentido lógico, deve ser melhor compreendida como se referindo à ausência de uniformização da matéria no próprio órgão fracionário. O inciso, segundo essa compreensão, poderia ser reescrito do seguinte modo: “a discrepância subsistente de julgados entre órgãos fracionários da Corte, ainda que não uniformizada a matéria no âmbito dos próprios órgãos fracionários”.
Já a qualificação “subsistente” deve ser entendida como aquela discrepância jurisprudencial séria e minimamente persistente no tempo. É como se fosse exigido, para a viabilidade da suscitação do IUJR, tanto na hipótese do inciso I ora analisado quando do inciso II infra, que o próprio dissenso interno fosse já razoavelmente “consolidado”. Tal restrição imposta pelo regulamento, apesar de não contar com base legal clara, deve ser plenamente acolhida, haja vista que é bastante razoável exigir a uniformização de jurisprudência apenas quando o dissenso já se mostrar elementarmente claro e, consequentemente, relevante.
No que pertine ao art. 1º, II, na hipótese, o IUJR caberia a fim de consolidar divergências existentes em torno da interpretação, da aplicação e do alcance da tese uniformizada. Essa interpretação do texto em exame deve prevalecer porque, uma vez uniformizada a jurisprudência, conforme adiante veremos, eventual “simples rebeldia” da Turma em aplicar a tese consolidada não se resolveria pelo IUJR, mas sim por meio de retorno à Turma para adequação ao entendimento uniformizado (art. 3º do Ato TST.SEGJUD.GP n. 491/2014), expediente mais simples.
Apresentadas essas noções gerais, entende-se que uma melhor exposição dos procedimentos para uniformização de jurisprudência regional – escopo do presente tópico – exige, neste momento, uma divisão, em face das respectivas peculiaridades, entre o IUJR suscitado pelo Presidente do TRT e aquele invocado pelo Ministro Relator no TST.
3.1. IUJR SUSCITADO PELO MINISTRO RELATOR NO TST
Apesar de, sem dúvidas, se aplicar no que couber ao IUJR provocado pelo Presidente do Regional, a IN/TST 37/2015 foca sua linha regulamentadora ao caso, digamos assim, mais “complexo” do ponto de vista procedimental e mais “importante” sob a óptica do próprio TST, seja, a suscitação do IUJR pelo Ministro Relator no TST.
Assim, segue abaixo a lista, quase que sequencial, de procedimentos a serem adotados uma vez identificada a divergência jurisprudencial interna no âmbito de um Tribunal Regional do Trabalho:
a)Sendo o recurso de revista tempestivo (art. 2º, §1º, IN/TST 37/2015), o Ministro Relator, de ofício ou mediante provocação, deverá proferir decisão fundamentada demonstrando com clareza o conflito de teses existente no âmbito do Regional e suscitando o IUJR (art. 2º, caput, III e §1º, c/c art. 3º, III, todos da IN/TST 37/2015). A necessidade de fundamentação decorre mais amplamente do art. 93, IX, CF. Já a exigência de consistente definição do “objeto a ser uniformizado” é uma questão elementar para evitar, ao máximo, dúvidas no processamento do IUJR pelo Regional e, ao mesmo tempo, garantir a máxima transparência da atividade jurisdicional.
Atente-se para o fato de que, pela literalidade da regulamentação elaborada pelo TST, basta o atendimento de um único requisito extrínseco (tempestividade) do recurso de revista para viabilizar a invocação do IUJR. Tal opção é bastante “contestável” ou, no mínimo, “admirável”, mormente diante da rígida jurisprudência do TST em torno da estrita e necessária observância dos demais requisitos extrínsecos (representação e preparo) para viabilizar o conhecimento do recurso de revista. Nessa linha, por óbvio, o IUJR, como etapa prévia à análise dos pressupostos intrínsecos e do próprio mérito do recurso de revista, não tem como requisito de suscitação que a matéria a ser uniformizada - que deverá ao menos ser necessariamente alegada e discutida na peça recursal, sob pena de, em caso contrário, o próprio Ministro Relator, quando da invocação de ofício, vir a estar adotando providência que terminará por potencialmente causar a reforma do julgado sem a irresignação da parte prejudicada -, possua efetiva viabilidade de conhecimento ou provimento.
A regra do parágrafo anterior, entretanto, só vale para os recursos de revista. Isso porque o TST entendeu que, como o agravo de instrumento ataca a decisão denegatória de seguimento ao apelo de revista, esta deve ser primeiramente superada, antes ser possível a suscitação do IUJR. É essa a ideia contida no art. 2º, §2º, IN/TST 37/2015: “O IUJ somente será suscitado nos recursos de revista, inclusive aqueles oriundos dos agravos de instrumento providos”;
b)Ordenada a uniformização de jurisprudência nos termos do item “a” acima, o Ministro Relator deverá:
b.1)Sobrestar o julgamento do recurso de revista relativo ao feito em que suscitado o IUJR (art. 2º, caput, IN/TST 37/2015) e determinar a devolução dos autos ao Regional de origem (art. 2º, I, IN/TST 37/2015);
b.2)Oficiar ao Ministro Presidente do TST (art. 2º, II, IN/TST 37/2015);
b.3)Oficiar ao Ministro Presidente da “Comissão de Jurisprudência e de Precedentes Normativos do TST”, dando ciência da respectiva decisão que determina a uniformização e informando, com precisão, o Tribunal Regional do Trabalho que deverá uniformizar, o número do processo em que foi determinada a uniformização, a classe e o tema objeto de IUJR (art. 2º, III, IN/TST 37/2015);
b.4)Publicar a decisão que suscita o IUJR no Diário Eletrônico da Justiça do Trabalho - DEJT (art. 2º, IV, IN/TST 37/2015);
c)Efetivada a providência do item “b.2”:
c.1)O Ministro Presidente do TST oficiará ao Presidente do Tribunal Regional do Trabalho respectivo, dando-lhe ciência da decisão que provocou o IUJR (art. 2º, II, IN/TST 37/2015);
c.2)O Ministro Presidente do TST oficiará aos demais Ministros do TST, dando-lhes ciência da decisão que provocou o IUJR (art. 2º, II, IN/TST 37/2015). Tais Ministros, uma vez cientes do IUJR, suspenderão, mediante decisão fundamentada, o julgamento de outros recursos de revista que estejam sob suas respectivas relatorias e que sejam oriundos do mesmo Tribunal Regional do Trabalho, sejam tempestivos e versem sobre idêntica questão jurídica (que se enquadrem precisamente no escopo do IUJR suscitado). Em seguida, determinarão, ainda, o retorno dos autos à origem e as providências enunciadas nos itens “b.2” e “b.3” (art. 2º, §1º, IN/TST 37/2015).
Apenas uma observação. Havendo uma decisão “base” já suscitando o IUJR, a decisão posterior, de outros Ministros Relatores de outros feitos, que suspende os respectivos processos, aparentemente não deveria gerar o oficiamento ao Presidente do TST, nem consequentemente ao Presidente Regional e aos demais Ministros, no caso de inexistência de inovação decisória (ampliação do objeto a ser uniformizado, por exemplo).
Isso porque, esses Ministros, de um certo modo, “apenas” estariam decidindo em torno do enquadramento do recurso de revista sob análise ao escopo do IUJR já suscitado, não parecendo existir qualquer relevância prática nesse fluxo de oficiamentos, uma vez que se estaria dando ciência, no final das contas, de algo cujo destinatário já tem conhecimento.
Além disso, a comunicação ao Ministro Presidente, em particular, tem como um dos principais objetivos que este oficie ao Presidente do TRT acerca do IUJR. Entretanto, já havendo ciência pelo Presidente Regional sobre o IUJR “original”, não seria surpresa que outros feitos com a mesma discussão passassem a retornar do TST para providências do Regional, situação que poderia simplesmente “ocorrer”, sem maiores formalidades, até mesmo para evitar ao máximo a burocratização de algo que, simplesmente por ser novidade, já apresenta(rá) naturais dificuldades.
Os Ministros do TST, por outro lado, também já estariam cientes do IUJR desde a primeira decisão que o suscitou, não parecendo existir qualquer relevância na comunicação, aos Ministros, de cada processo que viesse a ser suspenso em virtude de se enquadrar no âmbito do IUJR original.
Diante dessas peculiaridades, pareceria mais razoável que fosse apenas realizado o oficiamento mencionado no ponto “b.3” - que em última análise serve apenas para fins de registro.
Ademais, não se vislumbra qualquer motivo para não ser providenciada a publicação da decisão em epígrafe no DEJT, a despeito do silêncio do normativo;
d)Cumprido o item “b.3”, a “Comissão de Jurisprudência e de Precedentes Normativos do TST”, providenciará a publicização, por meio do Banco Nacional de Jurisprudência Uniformizada (BANJUR) - cujas informações contidas, que são de caráter público, ficarão disponíveis a todos por meio do site do TST -, do processo de uniformização em curso, fazendo constar os seguintes dados: classe e número do processo em que acolhida a suscitação de IUJR; o Tribunal Regional do Trabalho que deverá uniformizar; tema(s) objeto de IUJR; Ministro Relator que provocou o IUJR; e a data da suspensão do julgamento do processo pelo Ministro Relator (artigos 3º e 7º, IN/TST 37/2015).
Enquanto não criadas as condições materiais de implementação do BANJUR, será adotada, como medida paliativa, a compilação/divulgação de tais informações, atinentes às uniformizações regionais suscitadas, apenas por meio da rede interna do TST (art. 3º, IN/TST 37/2015).
Em homenagem ao postulado da publicidade e com o fito de garantir a máxima eficiência no desenvolvimento da atividade uniformizadora, espera-se que o BANJUR seja criado com a maior brevidade possível;
e)Cumprido o item “c.1”:
e.1)O Presidente do Regional, ciente do IUJR suscitado, deverá, segundo a literalidade do art. 5º da IN/TST 37/2015, “antes de emitir juízo de admissibilidade”, “suscitar Incidente de Uniformização de Jurisprudência em todos os outros processos que tratam da mesma matéria, enquanto não uniformizada a jurisprudência interna, e sobrestar a remessa ao TST dos respectivos autos até o julgamento do IUJ referente ao caso concreto e a reapreciação da questão no órgão fracionário prolator do acórdão originário recorrido”.
Salienta-se que o termo IUJ aplicado pela Instrução Normativa, corresponde ao que este trabalho vem chamando de “IUJR”.
As discussões e controvérsias em torno da “reapreciação da questão no órgão fracionário prolator do acórdão originário recorrido” serão desenvolvidas mais adiante.
Por ora, importante salientar que a IN deve ser interpretada segundo a sua finalidade e segundo a teleologia da própria lei. No caso, o que se busca é uniformizar a jurisprudência regional, evitar a subida ao TST de novos recursos de revista que discutam o tema divergente em processo de uniformização e formalizar a situação de cada caso concreto que estiver abrangido pelo IUJR, mediante decisão fundamentada. Nessa linha de raciocínio, parece inadequada a suscitação de um IUJR para cada processo que venha a ser suspenso em virtude do IUJR originário (que no caso foi aquele levantado pelo primeiro Ministro Relator que identificou a matéria dissensiosa). Ora, o IUJR tem natureza objetiva, sendo certo, conforme adiante será demonstrado, que a tese prevalecente exsurgente se aplicará, salvo em específicas hipóteses, a todos os casos concretos que possuam as mesmas premissas fáticas (conforme será demonstrado na sequência). Não será necessário processar e julgar tantos IUJR´s quantos sejam os feitos suspensos. Bastará apreciar apenas um e, em seguida, passar a aplicar a jurisprudência uniformizada.
Por isso, propõe-se que simplesmente os Presidentes dos Regionais, diante da primeira decisão de suscitação de IUJR, passem a, de forma fundamentada, determinar a suspensão dos feitos afetados pelo tema em uniformização, até que seja processado e julgado o IUJR ou, ainda em sintonia com a instrumentalidade das formas, até que seja simplesmente definida a tese prevalecente, por qualquer outro meio que não o convencional processamento do IUJR. Os “feitos afetados pelo tema em uniformização” devem ser considerados como sendo aqueles que, caso optada a via tradicional eleita pela Instrução Normativa (provocação de IUJR em cada processo), seriam passíveis de suscitação de novo IUJR (ou seja, as lides nas quais tenha sido interposto recurso de revista tempestivo versando sobre a matéria em uniformização).
Destaca-se, por outro lado, que, tanto quanto possível, deverá também ser conferida, ao IUJR suscitado, ampla publicidade pelos mais diversos meios (nova publicação desta feita DEJT do Regional, internet, intranet etc.), a fim de precipuamente possibilitar a mobilização de entidades interessadas e a consequente habilitação como “amicus curiae” (“amigo da corte”) no processamento do IUJR;
e.2)Na mesma linha do ponto anterior, por medida de eficiência e cautela, é fundamental que os Recursos Ordinários ainda não julgados tenham seus processamentos suspensos, também por decisão do Presidente do Regional, a fim de evitar potencial aplicação de tese que termine por conflitar com o resultado do IUJR – dissenso que, se ocorrido, provocaria, via de regra, a “reapreciação da questão no órgão fracionário prolator do acórdão originário recorrido” e causaria mais morosidade do que o próprio sobrestamento ora proposto.
Uma vez prolatada tal decisão suspensiva, para garantir sua eficácia, deverá ser dada ciência urgente aos demais Desembargadores, Gabinetes e Turmas do Regional.
Mister destacar que a decisão de suspensão - que terá o seu escopo devidamente definido, mas, de qualquer sorte, terminará por ter caráter genérico - deverá ser aplicada, caso a caso, pelo respectivo Desembargador Relator ou Revisor de cada recurso ordinário. Ou seja, o Presidente profere a decisão geral de suspensão, e o Relator/Revisor deverá verificar se cada respectivo processo se subsume aos termos determinados na deliberação do Presidente, aplicando a suspensão ao caso concreto;
e.3)No que pertine tanto aos dois itens anteriores (“e.1” e “e.2”), destaca-se que a “suscitação de IUJR em cada feito” (ou a mera suspensão dos processos com recurso de revista que versem sobre o tema afetado pelo IUJR, conforme salientado nos parágrafos antecedentes) e a suspensão dos processos com recurso ordinário que possuam discussão que se insira no objeto do IUJR deverão, tanto quanto possível, ser acompanhadas de, ao menos, publicização às partes, de cada processo afetado, por meio do DEJT, a fim de garantir o exercício do contraditório e a consequente possibilidade de o interessado demonstrar que o caso não se insere na hipótese de divergência ou, até mesmo, renunciar a determinada parcela ou desistir do recurso interposto, com o fito de que o feito possa prosseguir regularmente;
e.4)O Presidente do Regional, após uniformizada a jurisprudência, além de dar ampla divulgação à tese uniformizada no próprio Regional (art. 6º do Ato TST.SEGJUD.GP n. 491/2014)7, deverá, então, comunicar, com a maior brevidade possível (“imediatamente”, segundo os termos adotados pela instrução normativa), o ocorrido ao Presidente do TST que, por sua vez, cientificará a “Comissão de Jurisprudência e de Precedentes Normativos do TST”, a fim de que providencie o registro no BANJUR e, consequentemente, confira a devida publicidade à tese prevalecente do Regional entre os órgãos do TST (artigos 6º e 7º, IN/TST 37/2015) e, por consequência de se tratar de banco de dados público disponibilizado na internet, também entre o público em geral e os demais órgãos da Justiça Laboral.
Conforme já dito, as consequências processuais (vinculatividade e reanálise pelo órgão fracionário) da uniformização ainda serão pormenorizadas. Além disso, mais adiante os detalhes em torno do processamento do IUJR em si, também receberão comentários.
3.2. IUJR SUSCITADO PELO PRESIDENTE DO TRT
O Presidente do Tribunal Regional do Trabalho no processo em que foi interposto o recurso de revista, ao exercer a sua prerrogativa de admissibilidade primária (art. 896, §1º, CLT), deverá suscitar o IUJR (art. 896, §5º, CLT), conforme já visto mais acima.
Na linha já anunciada, o procedimento, nesta hipótese, deve tomar por base as disposições da IN/TST 37/2015, com as devidas adaptações, uma vez que o normativo em epígrafe optou por regulamentar a situação mais abrangente, supondo certamente que, a partir desse regramento, seria possível extrair o procedimento dos Regionais. Vejamos.
aa)Sendo o recurso de revista tempestivo (art. 2º, §1º, IN/TST 37/2015) e nele contendo irresignação em relação ao tema “divergente”, o Presidente do Regional, de ofício ou mediante provocação, deverá proferir decisão fundamentada demonstrando com clareza o conflito de teses existente no âmbito do Regional e suscitando o IUJR (art. 2º, caput, III e §1º, c/c art. 3º, III, todos da IN/TST 37/2015). Maiores comentários são desnecessários no particular uma vez que já foram realizados no item “a” do tópico “3.1. IUJR SUSCITADO PELO MINISTRO RELATOR NO TST”.
Rememora-se, apenas, que a decisão que suscita o IUJR deverá ser publicada no Diário Eletrônico da Justiça do Trabalho - DEJT - (art. 2º, IV, IN/TST 37/2015) e que, tanto quanto possível, deverá também ser conferida, por outros meios (internet, intranet etc.), a maior publicidade possível, até mesmo para possibilitar a mobilização de entidades interessadas e a consequente habilitação como “amicus curiae” (“amigo da corte”) no processamento do IUJR;
bb)Ordenada a uniformização de jurisprudência nos termos do item “aa” acima, o Desembargador Presidente deverá:
bb.1)Dar ciência do IUJR levantado ao Presidente do Tribunal do Trabalho, a fim de que os demais Ministros e a “Comissão de Jurisprudência e de Precedentes Normativos do TST” sejam consequentemente informados e adotem os procedimentos compatíveis com a hipótese (sobrestamento dos recursos de revista e retorno dos autos dos feitos afetados pelo IUJR; registro no BANJUR; consequente intimação das partes via publicações por meio do DEJT etc.);
bb.2)Suscitar, “antes de emitir juízo de admissibilidade” em novos recursos de revista que forem sendo interpostos, “Incidente de Uniformização de Jurisprudência em todos os outros processos que tratam da mesma matéria, enquanto não uniformizada a jurisprudência interna, e sobrestar a remessa ao TST dos respectivos autos até o julgamento do IUJ referente ao caso concreto e a reapreciação da questão no órgão fracionário prolator do acórdão originário recorrido”, conforme o texto do art. 5º da IN/TST 37/2015.
Conforme já comentado no item “e.1” do tópico “3.1. IUJR SUSCITADO PELO MINISTRO RELATOR NO TST”, a despeito da literalidade da Instrução Normativa, parece ser muito mais eficiente a mera suspensão, mediante decisão fundamentada, dos processos com recurso de revista tempestivo que versem sobre o tema afetado pelo IUJR, diante do caráter objetivo do resultado do julgamento do IUJR;
bb.3)Por medida de eficiência e cautela, determinar a suspensão dos feitos em trâmite ainda não julgados no Regional (recursos ordinários) que estejam discutindo a matéria que será objeto de uniformização. Maiores ponderações e detalhes, no particular, já realizadas no ponto “e.2” do tópico “3.1. IUJR SUSCITADO PELO MINISTRO RELATOR NO TST”;
bb.4)No que pertine tanto aos dois itens anteriores (bb.2” e “bb.3”), destaca-se que a “suscitação de IUJR em cada feito” (ou a mera suspensão dos processos com recurso de revista que versem sobre o tema afetado pelo IUJR, conforme salientado nos parágrafos antecedentes) e a suspensão dos processos com recurso ordinário que possuam discussão que se insira no objeto do IUJR deverão, tanto quanto possível, ser acompanhadas de, ao menos, publicização às partes, de cada processo afetado, por meio do DEJT, a fim de garantir o exercício do contraditório e a consequente possibilidade de o interessado demonstrar que o caso não se insere na hipótese de divergência ou, até mesmo, renunciar a determinada parcela ou desistir do recurso interposto, com o fito de que o feito possa prosseguir regularmente;
bb.5)O Presidente do Regional, após uniformizada a jurisprudência, além de dar ampla divulgação à tese uniformizada no próprio Regional (art. 6º do Ato TST.SEGJUD.GP n. 491/2014), deverá, então, comunicar, com a maior brevidade possível (“imediatamente”, segundo os termos adotados pela instrução normativa), o ocorrido ao Presidente do TST que, por sua vez, cientificará a “Comissão de Jurisprudência e de Precedentes Normativos do TST”, a fim de que providencie o registro no BANJUR e, consequentemente, confira a devida publicidade à tese consolidada do Regional entre os órgãos do TST (artigos 6º e 7º, IN/TST 37/2015) e, por consequência de se tratar de banco de dados público disponibilizado na internet, também entre o público em geral e os demais órgãos da Justiça Laboral.
Apresentados os procedimentos gerais, mister adentrar nas miúças do processamento do próprio IUJR.
3.3. PROCESSAMENTO DO IUJR E CONTEÚDO DO JULGAMENTO
A uniformização Regional necessariamente terá como “tutor” o Presidente do Regional. Isso porque, este, seja quando suscita o IUJR de ofício, seja quando é comunicado do IUJR levantado pelo Ministro Relator no TST, deverá tomar as medidas necessárias, nem que seja orientando e indicando o caminho a ser seguido para a uniformização da jurisprudência regional.
Dito isso, elementarmente o IUJR, caso processado pela via normal, deverá contar com um relator para conduzir o procedimento.
Nessa linha, atente-se que o que foi dito no penúltimo parágrafo não significa que o Presidente Regional deverá ser o relator do IUJR. Acredita-se até que esta opção seja válida, caso adotada pelo Regional – mormente diante da omissão neste tocante na legislação processual civil e nas novas disposições processuais trabalhistas -, mas, em linhas gerais, entende-se que a relatoria do incidente deverá seguir a lógica natural do sistema – até mesmo para não assoberbar o Presidente ou o Vice-Presidente.
Assim, normalmente, a definição do desembargador relator do IUJR poderá se dar por sorteio ou por meio de alguma estipulação no sentido de que o relator do recurso ordinário deverá assumir tal encargo também em relação ao IUJR.
Como exemplo de que a questão passa por um processo de legítima escolha do Regional, citamos o caso da opção adotada pelo TRT da 3ª Região por meio da Resolução TRT3.GP n. 6, de 19 de março de 2015 que, em seu art. 9º, caput, estabelece que “O Relator do IUJ será o Desembargador originariamente sorteado Relator no processo em que foi suscitado o Incidente” e o caso da escolha diversa feita pelo TRT da 5ª Região no art. 182, caput, de seu Regimento Interno (com redação dada pela Resolução Administrativa TRT5 n. 018, de 23 de março de 2015) que estipula que “Recebido o incidente, caberá ao Presidente do Tribunal proceder ao sorteio do Relator dentre os Desembargadores, excluídos os que integram a Mesa Diretora” (procedimento aplicável ao IUJR por força da também nova redação do art. 184 do Regimento Interno do TRT 5, dada pela mesma Resolução Administrativa).
Deverá também ser necessariamente ouvido o Ministério Público do Trabalho (art. 478, parágrafo único, CPC/1973).
Deve-se, tanto quanto possível, em face da notória importância e transcendência da jurisprudência que será firmada, fazer largo uso do instituto do “amicus curiae” (amigo da corte”), seja por aplicação analógica da disciplina, atinente aos “Recursos de Revista Repetitivos”, prevista no §8º, do art. 896-C, CLT (“O relator poderá admitir manifestação de pessoa, órgão ou entidade com interesse na controvérsia, inclusive como assistente simples, na forma da Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973 (Código de Processo Civil)” - texto incluído pela Lei 13.015/2014), seja pelas ponderações de Bueno (2014a, p. 503-508), plenamente aplicáveis ao processo do trabalho:
O amicus curiae é um terceiro interveniente. (…)
O que enseja a intervenção deste “terceiro” no processo é a circunstância de ser ele, desde o plano material, legítimo portador de um “interesse institucional”, assim entendido aquele interesse que ultrapassa a esfera jurídica de um indivíduo e que, por isso mesmo, é interesse metaindividual, típico de uma sociedade pluralista e democrática, que é titularizado por grupos ou por segmentos sociais mais ou menos bem definidos. (…)
O amicus curiae não atua, assim, em prol de um indivíduo ou uma pessoa, como faz o assistente, em prol de um direito de alguém. Ele atua em prol de um interesse, que pode, até mesmo, não ser titularizado por ninguém, embora seja compartilhado difusa e coletivamente por um grupo de pessoas e que tende a ser afetado pelo que vier a ser decidido no processo.
(…)
O que é relevante destacar, contudo, é que a admissão do amicus curiae para desempenhar o papel que, no direito estrangeiro, ele desempenha (e que para nós, vale o destaque, é, em largas linhas, exercido pelo Ministério Público quando atua na qualidade de fiscal da lei […]) não depende de expressa previsão legislativa. Ela decorre do sistema processual civil, isto é, das próprias normas de direitos processual civil quando analisadas, como devem ser, desde a Constituição Federal ou, como prefere este Curso, desde o “modelo constitucional do direito processual civil”. Foi a partir desta visão que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal desenvolveu o instituto no âmbito do controle concentrado de constitucionalidade (aí entendidas as ações direta de inconstitucionalidade; declaratória de constitucionalidade e a arguição de descumprimento de preceito fundamental), no que foi seguida por alguns Tribunais de Justiça no exercício do controle de constitucionalidade das leis municipais.
Não há, pelo que consta do parágrafo anterior, como concordar com o entendimento que já prevaleceu na 2ª Seção do STJ (REsp 1.023.053/RS, rel. Min. Maris Isabel Galloti, j.un. 23.11.2011, DJe 16.12.2011) no sentido de recusar, em questão de ordem, o ingresso de associações como amicus curiae por não se tratar de recurso sujeito à disciplina do precitado art. 543-C, isto é, “Recurso Especial Repetitivo”. A razão de ser da intervenção do amicus curiae não se limita àqueles casos porque ela se justifica para todas aquelas hipóteses em que o julgamento puder, de forma direta ou indireta, influenciar outros casos (como, aliás, se verifica com relação à tese jurídica discutida no referido Recurso) ou, ainda, sempre que a valoração ínsita à interpretação do direito recomendar a oitiva de representantes adequados da sociedade civil ou do próprio Estado.
Nessa direção, pessoas, órgãos e entidades podem ser intimados diretamente pelo Relator para, querendo, se manifestarem no feito e, caso entendido pertinente, realizarem até mesmo sustentação oral quando da ocasião da sessão de julgamento da uniformização8.
Além dessa hipótese, acredita-se pertinente lançar edital, com ampla publicação no DEJT e por meio de outras mídias (site, redes sociais, jornais etc.), abrindo prazo razoável para que interessados institucionais requeiram a intervenção no feito como “amicus curiae”, demonstrando na oportunidade a sua “representatividade adequada” para atuar no feito. O Relator deverá, nesse caso, analisar se a pessoa, órgão ou entidade possui condições razoáveis de democratizar e acrescentar elementos relevantes ao debate uniformizante.
Merece destaque, pois em sintonia com o que foi defendido, o art. 182, §11, do Regimento Interno do TRT da 5ª Região (com redação dada pela Resolução Administrativa TRT5 n. 018, de 23 de março de 2015), que trata dos poderes do relator do incidente de uniformização de jurisprudência (procedimento aplicável ao IUJR por força da também nova redação do art. 184 do Regimento Interno do TRT 5, dada pela mesma Resolução Administrativa):
Considerando a relevância da matéria, a especificidade do tema objeto da demanda ou a repercussão social da controvérsia, o Relator poderá admitir ou solicitar, por decisão irrecorrível, a manifestação de pessoa natural ou jurídica, órgão, inclusive o Ministério Público do Trabalho, ou entidade especializada, com representatividade adequada, no prazo de 15 (quinze) dias, a contar da sua intimação, definindo, de imediato, os poderes do amicus curiae.
É recomendável, ainda, que o relator realize estudo apurado acerca do tema divergente, levando em conta, em sua proposta, as manifestações contidas e admitidas no feito, a jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho e a tese que, apesar das divergências, vem sendo prevalecente no âmbito do Regional. Concluído seu relatório/voto, o relator deverá encaminhar cópia de seu pronunciamento aos demais desembargadores, com antecedência razoável da data em que designada a sessão de julgamento, a fim de que os magistrados possam se aprofundar previamente na cognição do tema e formar seu convencimento de forma mais robusta. Tal medida (ciência prévia do voto do relator aos pares) serve até mesmo para evitar “pedidos de vistas” no curso da sessão.
Convém esclarecer que, uma vez suscitado o IUJR, é possível que o Regional, destacadamente por meio de sua Comissão de Jurisprudência, realize procedimento “simplificado” ou “alternativo” em busca do regular alcance da súmula ou tese prevalecente em torno do tema divergente, mesmo que dissociado do processamento “comum” do IUJR, conforme já anunciado no último parágrafo do item “e.1” do tópico “3.1. IUJR SUSCITADO PELO MINISTRO RELATOR NO TST”.
Tudo isso, claro, desde que essa via “alternativa” observe a substância das diretrizes propostas (debate democrático, pluralizado, amplo, cauteloso e profundo para a definição da súmula ou tese prevalecente).
O órgão julgador do IUJR será o Tribunal Pleno (artigos 478, caput, e 479, caput, CPC/1973) ou, onde exista e conte com tal competência por delegação, o Órgão Especial do Regional (art. 93, XI, CF). Isso porque a legislação processual civil, ao regular o incidente de uniformização de jurisprudência tradicional, menciona o “tribunal” como competente para uniformizar, nitidamente aludindo à corte em sua composição plenária. De qualquer modo, se a legislação estabelece expressamente, no caso do Tribunal Superior do Trabalho – que possui inclusive a Seção Especializada em Dissídios Individuais –, que a uniformização é de competência do Tribunal Pleno desta E. Corte Superior (art. 4º, “c”, Lei 7.701/1988), certamente, por analogia, tal competência também incumbirá ao respectivo Tribunal Pleno de cada Regional.
Do julgamento, formalmente poderá ser editada uma súmula ou apenas fixada uma tese prevalecente. Tal diferenciação, segundo Dalazen (2015, p. 41), decorre do quórum: “Segundo a lei, caso não se alcance maioria absoluta de votos convergentes para ensejar a edição de súmula regional, a maioria simples pode firmar a tese jurídica prevalecente no Tribunal (...)”.
A despeito de, em regra, fazer sentido a análise do eminente autor, aparentemente o termo “tese prevalecente” pode ser entendido em um sentido mais aberto, seja, como tudo aquilo que resulte do IUJR e não se transforme em súmula. Assim, eventualmente, determinado Regional pode, por exemplo, firmar tese prevalecente mesmo que esta tenha contado com a maioria absoluta de votos (quórum exigido para edição de súmula, segundo o art. 479, caput, CPC/1973). As razões disso acontecer podem ser as mais variadas. Eventualmente, imagina-se, algum regional pode não querer editar súmula que trate de caso específico de determinada relação laboral envolvendo determinada empresa, preferindo, por questões de organização, que a uniformização de tal matéria seja tratada em “orientação jurisprudencial” ou mesmo que não se transforme em verbete algum e seja consolidada apenas por meio do teor do acórdão uniformizante.
Por fim, convém esclarecer que, em tese, inexiste limitação ao conteúdo da súmula ou da tese prevalecente firmada. Assim, a despeito de gerar efeitos inconvenientes e tornar o entendimento uniformizado desvinculante, o Regional pode firmar sua jurisprudência em sentido diverso até mesmo ao que já foi consolidado pelo TST e, a depender do caso, pelo STF. Neste particular convém transcrever a doutrina de Dalazen (2015, p. 40):
Editada súmula regional não conflitante com súmula ou OJ do TST, dali por diante tão somente ela poderá servir de confronto com acórdão de outro TRT para viabilizar o conhecimento de recurso de revista por divergência (artigo 896, § 6º, da CLT).
Está claro que, na solução do Incidente de Uniformização de Jurisprudência, o Regional é livre para encampar a tese jurídica que lhe parecer de direito, em princípio. Se discrepar, contudo, de Súmula do Tribunal Superior do Trabalho ou de Orientação Jurisprudencial do TST, a súmula regional será inócua e inservível como precedente, em casos futuros, para viabilizar o conhecimento de recurso de revista por divergência.
Conforme já dito alhures, entende-se como mais harmonioso com o sistema que a súmula ou tese prevalecente regional que pretenda servir como precedente apto à configuração de divergência jurisprudencial, não possam contrariar toda a iterativa, atual e notória jurisprudência do TST (e não apenas Súmula ou OJ do TST conforme a literalidade do texto leva a crer) e nem do STF9. Desse modo a súmula ou tese prevalecente regional que, por exemplo, contrarie entendimento que receba tratamento homogêneo e firme por parte de ao menos a maioria das Turmas do TST ou se oponha a tese já bastante solidificada e uniformizada no TST por meio do recurso de embargos previsto no art. 894 da CLT ou mesmo entre em dissonância com a jurisprudência firmada do STF, também não deverá servir de parâmetro para fins de demonstração de dissenso pretoriano com outro Regional.
Enfim, obtido o “produto” jurídico do IUJR, é essencial delinear o grau de vinculatividade da súmula ou da tese prevalecente obtida em relação aos órgãos do Regional.