A campanha referente ao Dia dos Namorados “Casais” do Boticário, notória rede de varejo de perfumes e cosméticos do País, em defesa da "diversidade do amor", "além das convenções", está causando uma guerra de opiniões na internet. Depois de estrear, no dia 24/06, no intervalo do Fantástico, e de ser exibida em rede nacional em horário nobre na TV aberta, a propaganda virou alvo de debates nas redes sociais, como Twitter e Facebook nos últimos dias. Tanto barulho rendeu a abertura de um processo no Conar, órgão de autorregulamentação publicitária, e também reclamações no site Reclame Aqui.
A propaganda mostra casais hetero e homosexuais trocando presentes no Dia dos Namorados, como demonstração de seu amor, causando reações homofóbicas, encabeçadas principalmente pelo Pr. Silas Malafaia, em defesa da família tradicional brasileira[1].
Vivemos em um Estado Democrático de Direito, em que os direitos fundamentais estão em sua essência e funcionam como limites do poder estatal e como diretrizes para atuação de todos os poderes constituídos, influenciando sobre todo o ordenamento jurídico. Daí porque a “democracia é o regime de garantia geral para a realização dos direitos fundamentais do homem”[2]. Dentro do rol dos direitos fundamentais vislumbra-se o direito à diversidade, capitaneado por diversos movimentos em defesa de políticas públicas, em busca de combate às desigualdades de raça/etnia, gênero, classe social, que incorporem as questões do direito à diversidade religiosa e o orientação sexual.
Só existe direito à diferença como verdadeiro direito, se exercido num plano de igualdade. Se não há igualdade, a diferença rapidamente se transforma em discriminação, e ao Estado cumpre criar as condições para que essa igualdade se verifique, cabendo-lhe implementá-la na sociedade independentemente de existirem eventuais consensos sociais acerca de determinada matéria decisivamente implicada na sua realização. De fato, a sua ação mostra-se plenamente legitimada pelos valores que comunitariamente foram erigidos à condição fundamental de constitucionais e pela densificação que lhes é dada.
Democracia, no entanto, não funciona sem pluralismo, por isso, convém respeitar a condição pessoal do outro. Mesmo porque impor-se à força, expressa um totalitarismo que ninguém quer reintroduzir no cenário político como ocorria na malversada era do golpe militar brasileiro. E eis precisamente o ponto que inspira o presente artigo, pois o direito à diferença, reivindicada pelo lado homo, é vendido à opinião pública em termos absolutos, sem limites ou contrapeso.
Mas onde ficam, então, aqueles cuja diferença é justamente não simpatizar com a corrente evolução? Onde se encaixam – falando bem claro – os que não aceitam a exposição homoafetiva na tolerância proposta na propaganda “Casais”?
Aqui está o cerne da controvérsia. Porque o espaço que travesti, bi, trans ou homossexual pretende ocupar é coletivo e necessariamente compartilhado (quando mostram seu afeto em público, como forma de autoafirmação e exposição de sua escolha sexual, através de demonstrações afetivas...), senão privativo e assim mesmo invadido, pois novelas, comerciais e outros programas televisivos inundam os lares com exposições que qualquer pai sensato preferiria manter bem longe, lá fora.
Conciliar liberdade de expressão com dogmas religiosos no contexto da família heterossexual é um problema, pois é nato no ser humano a luta pela perpetuação de sua espécie, manifestada na figura dos sexos opostos, na união do homem com uma mulher como únicos geradores da vida.
Muito natural que os homossexuais tenham a devida visibilidade e respeito, porém, as pessoas têm o direito de opinarem contra exposições que afrontem a moral e os bons costumes da dita “sociedade tradicional brasileira”. Igualmente, têm direito de não gostarem do que veem. Não gostando, também têm o direito de se expressarem, como fizeram os avessos ao comercial do O Boticário, expressando suas preferências e contrariedades da maneira que lher convier.
Igualdade de direitos é um bem em si diante da lei e é plenamente justificável que pessoas civilizadas lutem para que seja um bem universal. Contudo, essa igualdade também faculta as pessoas o exercício da sua liberdade a fim de elucidar o que as desagrada, especialmente quando se atua na esfera de valores.
Nenhum combate é mais justo do que a luta pela igualdade, e nenhuma ideia está mais madura para vingar do que a aceitação do direito às diferenças. Incorreto, é a forma como a mídia e os grupos sociais fazem, impondo a diversidade na demonstração homoafetiva às famílias tradicionais como se fosse o adequado, o politicamente correto, seja no mercado de ideias, no capitalismo ou dentro das famílias e a despeito da inércia e da ignorância.
Homossexualismo é opção individual, não condição, e como tal, não tem de ser banalizada ou imposta aos heteros como se fosse a regra a ser seguida.
Não precisa ser contra para mostrar que não é a favor.
Com estas palavras, não pretendemos defender o discurso do ódio, da exclusão, do preconceito, pois somos partidários do amor universal, da solidariedade, da caridade, da igualdade, no sentido de se ter mais misericórdia e aceitação perante as escolhas e posturas do outro, sem julgamento, mas tão somente advogar em favor dos que não pensam de forma tão liberal e aberta como se tenta impor à sociedade, na tentativa de transformar a exceção em regra.
Em suma, os conflitos humanos existiram e existirão de acordo com os adventos sociais, e têm balizas constitucionais para sê-los de forma salutar, ao passo que vivemos no Brasil, um Estado Democrático e Social de direito. E no ponto específico da escolha do gênero sexual, exposta na propaganda “O Boticário, Dia dos Namorados”, houve acentuadas contraposições ideológicas e culturais, por grande parte da comunidade brasileira, que salvo manifestações contrárias, mantém o ideal razoável de que a forma heterossexual de amor é a mais adequada para ser exposta ao público.
[1] http://f5.folha.uol.com.br/voceviu/2015/06/1637093-silas-malafaia-fala-contra-anuncio-da-boticario-e-compara-homossexuais-a-pedofilos.shtml
[2] SILVA, José Afonso, op. cit., p.132