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Arresto: requisitos e possibilidade de concessão com base no poder geral de cautela

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Agenda 11/09/2015 às 21:13

O presente artigo traz uma análise sucinta dos requisitos legais para a concessão de medida cautelar de arresto, bem como a possibilidade de concessão de tal medida, ausentes tais requisitos, com base no poder geral de cautela.

1. PRINCÍPIO DA INAFASTABILIDADE DA JUSRISDIÇÃO (ART. 5º, XXXV, CF)

Começando a análise por nossa norma maior, a Carta Magna Federal, nos traz algumas normas e princípios de cunho processual, como é o caso da divisão de poderes, competência dos tribunais, devido processo legal, e inafastabilidade da jurisdição, dentre outros.

Vale aqui destacar o princípio da inafastabilidade da jurisdição, consagrado no inciso XXXV do art. 5º da Constituição Federal, in verbis: “A lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito.”

Importante destacar que tal princípio também pode ter outros nomes, conforme:

“O princípio da inafastabilidade da jurisdição é também nominado direito de ação ou princípio do livre acesso ao Judiciário, ou, conforme assinalou Pontes de Miranda, princípio da ubiquidade da Justiça.” [1]

Tal princípio dentre outras coisas, garante o acesso de qualquer pessoa ao Poder Judiciário o qual deve apreciar o pedido, evitando lesão e/ou fazendo cessar ameaça à direito. Também obrigando o Estado à criar órgãos para que prestem assistência jurídica processual e pré-processual aos necessitados.

"Para a efetivação da garantia, a Constituição não apenas se preocupou com a assistência judiciária aos que comprovem insuficiência de recursos, mas a estendeu à assistência jurídica pré-processual. Ambas consideradas dever do Estado, este agora fica obrigado a organizar a carreira jurídica dos defensores..."[2]

Além de garantir o acesso de qualquer pessoa ao Poder Judiciário, tal princípio constitucional também garante o direito à uma tutela jurídica adequada este sentido que queremos destacar neste artigo:

"Embora o destinatário principal desta norma seja o  legislador, o comando constitucional atinge a todos indistintamente, vale dizer, não pode o legislador e ninguém mais impedir que o jurisdicionado vá a juízo deduzir pretensão.

(...)

Isto quer dizer que todos têm acesso à justiça para postular tutela jurisdicional preventiva ou reparatória relativamente a um direito. Estão aqui contemplados não só os direitos individuais, como também os difusos e coletivos.

Pelo princípio constitucional do direito de ação, todos têm o direito de obter do Poder Judiciário a tutela jurisdicional adequada. Não é suficiente o direito à tutela jurisdicional. É preciso que essa tutela seja a adequada, sem o que estaria vazio de sentido o princípio. Quando a tutela adequada para o jurisdicionado for medida urgente, o juiz, preenchidos os requisitos legais, tem de concedê-la, independentemente de haver lei autorizando, ou, ainda, que haja lei proibindo a tutela urgente.

Isto ocorre casuisticamente no direito brasileiro, com a edição de medidas provisórias ou mesmo de leis que restringem ou proíbem a concessão de liminares, o mais das vezes contra o pode público. Essas normas têm de ser interpretadas conforme a Constituição. Se forem instrumentos impedientes de o jurisdicionado obter a tutela jurisdicional adequada, estará o em desconformidade com a Constituição e o juiz deverá ignorá-las, concedendo a liminar independentemente de a norma legal proibir a concessão.

Pelo texto do art. 273, do CPC, cabe concessão de liminar em, praticamente, qualquer ação judicial de rito ordinário. Mesmo assim, ainda que a lei não preveja para determinada hipótese a concessão de medida liminar, se ela for necessária como tutela jurisdicional adequada. A lei infraconstitucional que impedir a concessão de tutela adequada será ofensiva ao princípio constitucional do direito de ação." [3]

Tal lição de Nelson Nery Jr. parece irretocável, captando o sentido e alcance do princípio que por estar no bojo da constituição, sendo alçado à garantia individual pétrea, não pode ser restringido de maneira nenhuma por lei infraconstitucional, ademais também impõe seja adequada a tutela à todos os casos que venham bater à porta do Judiciário, mesmo que isso signifique a concessão de medida de urgência sem previsão legal, ou seja, inominadas.

Tal interpretação dá à norma constitucional, um amplo alcance, que parece ter sido pretensão do constituinte, sendo a mais adequada levando-se em conta que a Constituição é norma de maior grandeza e deve prevalecer sobre as demais.

Assim, o princípio da inafastabilidade da jurisdição, garante à todos os jurisdicionados além do livre acesso ao Poder Judiciário, o direito de receber uma tutela jurisdicional adequada à sua pretensão, tendo, destarte, a atividade jurisdicional por função evitar ou fazer cessar lesão e evitar ameaça à direitos, podendo e devendo o juiz para este mister, conceder tutela de urgência, seja cautelar, seja tutela antecipada,  sendo este seu dever constitucional, o que implica que a concessão de tutela de urgência deve ser feita sempre que presentes os seus requisitos, independentemente de ausência de previsão legal ou até contra vedação legal, como no caso de lei infraconstitucional que venha a proibir a concessão de tutela de urgência.

Infelizmente no nosso ordenamento jurídico atual, podemos encontram exemplos de leis infraconstitucionais que querem restringir a concessão de tutela de urgência, como é o caso do art. 7º,§2º da Lei nº. 10.030/2009 (Lei do Mandado de Segurança), tal norma, conforme já exposto afronta o art. 5º, XXXV da Constituição Federal, sendo ao menos em tese inconstitucional, conforme se extrai da lição do prof. Nelson Nery Jr..

Menos graves são os casos em que não foi previsto pela lei a possibilidade de concessão de medidas de urgência, ou nos casos em que existem requisitos específicos para a concessão de tal medida, nestes casos parece que a melhor solução é sempre optar pela concessão quando presentes os requisitos próprios da tutela cautelar, o fumus boni iuris e o periculum in mora, mesmo que nem todos os requisitos específicos não estejam presentes.

Há quem defenda que bastaria tão somente a previsão constitucional do art. 5º XXXV para que fossem concedidas tutelas de urgência, acautelatórias ou antecipatórias, tornando-se dispensável até a previsão legal das cautelares do título III do CPC e da tutela antecipada no art. 273 do CPC, ademais o próprio Código ante a impossibilidade de prever todas as espécies de tutelas cautelares diferenciadas possíveis, dá ao julgador um poder geral de cautela (art. 797, CPC) o qual fica condicionado apenas à existência de periculum in mora e fumus boni iuris, sem a necessidade exigências adicionais.

2. DO PROCESSO CAUTELAR E SUA FUNÇÃO

As cautelares são tratadas no livro III do Código de Processo Civil como processos autônomos em relação aos processos de conhecimento e de execução, tendo em regra um caráter instrumental, visando tão somente garantir e proteger bens jurídicos, os quais serão envolvidos numa ação judicial principal, para que tais bens não pereçam, garantindo, destarte, a utilidade da prestação jurisdicional.

"Desde o momento em que ocorre uma possível lesão até o momento em que, declarado o direito da parte, o Judiciário entrega ao credor o bem jurídico devido ou seu equivalente compensatório, muitos bens jurídicos permanecem, por longo tempo, envolvidos no processo ou aguardando os atos de satisfação final. Esses bens jurídicos, em virtude do tempo, correm perigo de deterioração, a ponto de poder tornar-se inútil toda a atividade jurisdicional se não existir um outro tipo de providências assecuratórias da subsistência e conservação, material e jurídica, desses bens.

Com essa finalidade existem o processo cautelar e as medias cautelares que formam um tipo de atividade jurisdicional destinada a proteger bens jurídicos envolvidos no processo." [4]

Atendendo ao comando constitucional do art. 5 º, XXXV foram criadas a tutela antecipada, o processo cautelar e os procedimentos especiais, para o fim de adequar a tutela jurisdicional aos vários tipos de direito submetidos à apreciação do Poder Judiciário. O que justifica o processo cautelar é o perigo iminente que o bem jurídico sofre, fazendo com que outras formas jurisdicionais não sejam tão eficazes.

"A necessidade do processo cautelar, que lhe justifica a existência, resulta da possibilidade de ocorrerem situações em que a ordem jurídica se vê posta em perigo iminente, de tal sorte que o emprego das outras formas de atividade jurisdicional provavelmente não se revelaria eficaz, seja para impedir a consumação da ofensa, seja mesmo para repará-la de modo satisfatório. Isso explica o caráter urgente de que se revestem as providências cautelares, e , simultaneamente, o fato de que, para legitimar-lhes a adoção, não é possível investigar, previamente, de maneira completa, a real concorrência dos pressupostos que autorizariam o órgão judicial a dispensar ao interessado a tutela satisfativa: ele tem de contentar-se com uma averiguação superficial e provisória e deve conceder a medida pleiteada desde que os resultados dessa pesquisa lhe permitam formular um juízo de probabilidade acerca da existência do direito alegado, a parta da convicção de que, na falta do pronto socorro, ele sofreria lesão irremediável ou de difícil reparação." [5]

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Destarte, fica claro que a cautelar tem por escopo proteger o bem jurídico de maneira provisória evitando dano irreparável ou de difícil reparação, o qual poderia até tornar ineficaz futura solução num processo principal. Sendo assim a tutela cautelar é pautada pela urgência, caracterizando-se também pera referibilidade que é a referência à tal processo principal.

"O processo cautelar genuíno pressupõe sempre o processo principal, que seja ele de conhecimento, de execução ou monitório. É dessa relação de dependência que se extrai a característica da acessoriedade, o que está de acordo com o seu traço principal, qua seja, a instrumentalidade. Se o processo cautelar tem por fito resguardar o resultado prático do processo principal, subentende-se a existência deste, sem o qual esta tutela preventiva de exclusiva índole cautelar não teria razão de ser." [6]

Sem olvidar, que nem todos os processos cautelares descritos no livro III do Código de Processo Civil, tratam-se propriamente de cautelares conforme já definido acima, sendo que alguns têm ou podem ter caráter satisfatório e definitivo, como é o caso da posse em nome de nascituro (arts. 877 e 878, CPC) ,alguns casos de exibição de documentos (arts. 844 e 845, CPC), dentre outros, sendo que embora falar-se de cautelar satisfativa seja um contrassenso, não há como negar o caráter satisfativo de algumas medias tipificadas como cautelares.

"... não há como emprestar adesão a este entendimento. Menos por não entender existente algo próximo ao chamado “direito substancial de cautela”  e mais porque não há como aceitar o artificialismo da classificação dos “processos”, que desconhece que a finalidade da atuação jurisdicional é sempre, mesmo que com graus variáveis de intensidade ou com diferentes técnicas, cautelar (proteger) o plano a ele exterior, o plano material. É esta a diretriz constitucional (art. 5º, XXXV), da qual a legislação e seu intérprete não se pode furtar.

Ademais, a clássica e tão difundida afirmação de Calamandrei segundo a qual a cautelar é “instrumento do instrumento”, transcrita acima, isto é, servilão de um “outro processo”, o de “conhecimento” ou de “execução”, deve ser entendida no contexto proposto por aquele autor que faz importantes ressalvas com relação aos “provimentos cautelares” do terceiro grupo, isto é, aqueles que “decidem interinamente”, ou seja, provisoriamente, dentre os quais estão os “provimentos que servem para facilitar a fruição prática de uma futura execução forçada”. É que em tais casos, “o provimento cautelar consiste em uma decisão antecipatória e provisória do mérito, destinada a durar até o momento em que a esta regulação provisória da relação controvertida sobreponha-se a regulação de caráter estável a ser obtida através do mais lento processo ordinário” [7]

Outrossim, o processo cautelar traz intrinsicamente a urgência na proteção do bem jurídico, tratando-se de modalidade de tutela diferenciada a qual visa assegurar a integridade do bem jurídico provisoriamente até ulterior decisão definitiva em processo principal, tendo em algumas ocasiões específicas também caráter satisfativo.

"A tutela cautelar é sempre de urgência, e pressupõe perigo na demora. Inexiste tutela cautelar e quando não houver o periculum in mora." [8]

A cautelar por tratar-se de tutela diferenciada, pela urgência da pretensão, é agasalhada pelo princípio da inafastabilidade da jurisdição (art. 5º XXXV, CF), devendo proteger o bem jurídico sempre, e sem limitação, desde que presentes os requisitos para a concessão da tutela acautelatória.

3. PRESSUPOSTOS PARA A TUTELA CAUTELAR  E FUNGIBILIDADE COM A TUTELA ANTECIPADA E ENTRE AS MEDIAS CAUTELARES

Conforme já dito o processo cautelar propriamente dito trata de questões de urgência, protegendo o bem jurídico eminentemente ameaçado, garantindo, destarte, o resultado útil de um processo principal.

Para a concessão da medida cautelar mister se faz a demonstração de alguns requisitos, um deles é fácil de prever é a já citada urgência, que é referida na lei com periculum in mora, a outra exigência é a grande probabilidade de existência do direito alegado ou a verossimilhança do direito alegado numa cognição sumária e incompleta, o que a doutrina denomina de fumus boni iuris.

"Percebe-se também que o processo cautelar parte de dois pressupostos, tradicionalmente designados pela doutrina por expressões latinas: fumus boni iuris e periculum in mora.

A expressão fumus bom iuris significa aparência de bom direito ou, ainda, plausibilidade do direito), e é correlata às expressões cognição sumária, não exauriente, incompleta, superficial ou perfunctória. Quem decide com base em fumus não tem conhecimento pleno e total dos fatos e, portanto, ainda não tem certeza quanto a qual seja o direito aplicável. Justamente por isso é que, no processo cautelar, nada se decide acerca do direito da parte. Decide-se: se A tiver o direito que alega ter (o que é provável), deve-se conceder a medida pleiteada, sob pena do risco de, não sendo ela concedida, o processo principal não poder ser eficaz (porque, o devedor não terá mais bens para satisfazer o crédito).

Esta última característica de que acima se falou (o risco) é o que a doutrina chama de periculum in mora (perigo na demora ou perigo de danos irreparáveis ou de difícil reparação). É significativa da circunstância de que ou a medida é concedida quando se a pleiteia ou, depois de nada mais adiantará a sua concessão. O risco na demora é o risco da ineficácia (por isso, alguns textos legais aludem a “receio de ineficácia” como sinônimo de periculum in mora." [9]

Tais requisitos são sempre necessários para a concessão de liminar, contudo,  fazem com que as cautelares se aproximem da tutela antecipada, embora ainda possuam uma pequena diferença, uma vez que a tutela antecipada abrange situações de tutela da evidência não abarcados pela tutela cautelar.

"Ela não é única que pressupões urgência. A tutela antecipada pode ser deferida quando houver perigo de dano irreparável ou de difícil reparação. Mas esta pode ou não ser de urgência, já que há duas outras causas que autorizam o seu deferimento: o abuso de direito de defesa ou manifesto intuito protelatório e a incontrovérsia." [10]

No restante, tirando a tutela da evidência, os requisitos da cautelar e da tutela antecipada são exatamente os mesmos uma vez que o periculum in mora é comum à ambas,  já quando ao direito, em que pesa a lei se referia à prova inequívoca e verossimilhança da alegação para a concessão de tutela antecipada (art. 273) e apenas ao fumus boni iuris, nas tutelas cautelas, onde este seria quantitativamente e qualitativamente menos do que aquele, na prática não há como medir o grau de convencimento do julgador, e embora a lei, utilize expressões distintas para os dois institutos, dá pra ser concluir que ontologicamente são a mesma coisa, quanto à tais requisitos, tanto é que o art. 273,§7º estabelece a ampla fungibilidade entre tais institutos.

"A dificuldade, contudo, é que ela não corresponde à realidade do pensamento humano. Não há como avaliar, com precisão matemática, qual o grau de convicção do magistrado a respeito dos peidos que lhe são formulados e das provas e dos argumentos que lhe são embasamento. É impossível reduzir a um cálculo aritméticos ou a padrões matemáticos o quanto alguém está convencido."[11]

O que a doutrina costuma distinguir como um delineador entre a tutela cautelar e a tutela antecipa o fato da tutela cautelar apenas resguardar o bem jurídico até decisão definitiva, sendo o pedido cautelar diferente do pedido principal, ao passo que na tutela antecipada, antecipa-se o pedido principal ou parte dele, desde logo, tal critério de distinção parece ser mais coerente e conciso.

"A instituição no Código da antecipação da tutela provocou a melhor compreensão de ambos os institutos: a execução antecipada e a providência cautelar. A despeito de, na efetivação prática, ambas poderem ser iguais, na essência são substancialmente diferentes. Na tutela antecipada concedem-se efeitos que seriam produzidos pelo cumprimento da sentença, ou seja, antecipam-se os efeitos que a sentença teria na fase executiva; na cautelar, a providência é protetiva de bens jurídicos, para que possam ser entregues íntegros, se possível, a quem tem razão, mesmo que a providência seja diferente das que futuramente serão concedias por força da sentença, como, por exemplo, a proteção do próprio processo."[12]

Embora tratem-se de institutos distintos, como demonstrado existe grade semelhança entre eles, tanto que a lei consagra a fungibilidade, que destaca-se deve ser ampla, sendo, portanto, de mão dupla, havendo a concessão tanto de medida cautelar, quando for erroneamente pleiteada tutela antecipada, quanto a concessão de tutela antecipada quando erroneamente pleiteada medida cautelar, devendo neste ultimo caso o juiz conceder a medida e assinalar prazo para que o Autor complemente a emende a petição inicial .

Esta é a única interpretação que coaduna com o art. 5º, XXXV da Constituição Federal, vez que o processo servindo de instrumento para o direito material, não pode se apegar a formalismos desnecessários deixando o direito material perecer. Também merece destaque o fato das medidas cautelares típicas serem fungíveis entre si, podendo o julgador adotar a que entender mais adequada à preservação do bem jurídico, podendo adotar medida diferente da pleiteada, postura que também vai ao encontro do princípio esculpido no art. 5º XXXV da Constituição pátria.

"Diversamente do que pode parecer com uma leitura rápida, a providência de natureza cautelar pode ser postulada ainda que não tenha expressado peito de antecipação de tutela (até mesmo por eventualmente não lhe interessar a antecipação), mas ter pedido providência de natureza diversa do provimento final almejado, com os requisitos suficientes para a concessão de medida cautelar. Nessa hipótese, a norma autoriza o pedido (cautelar) em processo de conhecimento. Por outro lado, e embora a regra não o diga expressamente, as razões antes expostas evidenciam que a fungibilidade também haverá de ser reconhecida no sentido oposto – ou seja, poderá haver deferimento de tutela antecipada requerida sob a forma de “medida cautelar”. [13]

Cabe, ainda, destacar que presentes os requisitos fumus boni iuris e periculum in mora é dever do juiz a concessão de tutela cautelar ou antecipada, dependendo do que o julgador entender mais adequado, o que configura os chamados poder dever geral de cautela e poder dever geral de tutela antecipada, que podem ser resumidos num único poder dever geral de tutela de urgência, tanto é, que mesmo não havendo requerimento da parte uma vez que o julgador se convença da existência dos requisitos e da necessidade da medida, deve conceder a tutela de urgência mesmo de ofício, evitando o perecimento do bem jurídico e assegurando o resultado útil da demanda, conforme pede o art. 5º, XXXV da Magna Carta Federal.

"No entanto, parece-nos que o sistema de proteção criado pelo poder geral de cautela e pela fungibilidade entre as tutelas de urgência só ficará completo se o juiz puder, verificando que o provimento jurisdicional corre risco, conceder a tutela protetiva. Quando o autor formula uma pretensão a um provimento, fica implícito que o juiz o conceda de forma eficaz. Caso verifique que o provimento corre risco, pode conceder a tutela cautelar, ainda que não requerido pelo autor." [14]

Conforme todo o demonstrado neste tópico, uma vez que o julgador entender presentes os requisitos do periculum in mora e fumus boni iuris, deve conceder a tutela que entender mais adequada, seja ela medida cautelar as quais são fungíveis entre elas ou a tutela antecipada, sendo o seu dever constitucional assegurar o resultado útil da lide, protegendo o bem jurídico que corre perigo, independentemente até de requerimento da parte Autora.

4. DA CAUTELAR DE ARRESTO E SEUS REQUISITOS

Conforme já dito, a tutela cautelar é uma espécie de tutela de urgência que visa proteger bem jurídico em perigo e assegurar a efetividade da ação principal.

O arresto é medida cautelar típica que visa a apreensão cautelar de bens do devedor, com a finalidade de garantir uma futura execução. É verdade também que o arresto é instituto semelhante à penhora, tanto é que as normas referentes à penhora (arts. 659 a 670, CPC) se aplicam subsidiariamente ao arresto, até porque o arresto tem como tendência sua conversão em penhora, conforme art. 818 do CPC. Vale ressaltar também que a medida cautelar de arresto não deve ser confundida com o arresto executivo do art. 653 do CPC.

"O arresto é a apreensão cautelar de bens com a finalidade de garantir uma futura execução por quantia. Daí, quanto ao procedimento e extensão, serem aplicáveis as disposições relativas à penhora, que é medida executiva de apreensão de bens. São arrestáveis os bens penhoráveis; serão arrestados tantos bens quantos bastem para a garantia da futura execução; pode haver ampliação ou redução do arresto; dele é lavrado um auto, nomeando-se depositário para a guarda dos bens." [15]

Dentre as cautelares uma classificação útil é as distingue em: cautelares típicas, que são aquelas com procedimento próprio previstas no Código de Processo Civil e cautelares atípicas, que seguem o procedimento comum cautelar, estando abrangidas pelo poder geral de cautela, que a lei dá ao julgador a possibilidade de deferir medida atípica, ante a impossibilidade de previsão de legal de todas as hipóteses possíveis em que uma tutela cautelar pode ser necessária.

A cautelar de arresto é uma cautelar típica, com procedimento previsto nos arts. 813 a 821 do Código de Processo Civil, assim sendo, tem procedimento e requisitos próprios quanto ao cabimento e concessão, conforme consta dos artigos 813 (periculum in mora) e 814 (fumus boni iuris), in verbis:

Art. 813. O arresto tem lugar:

I - quando o devedor sem domicílio certo intenta ausentar-se ou alienar os bens que possui, ou deixa de pagar a obrigação no prazo estipulado;

II - quando o devedor, que tem domicílio:

a) se ausenta ou tenta ausentar-se furtivamente;

b) caindo em insolvência, aliena ou tenta alienar bens que possui; contrai ou tenta contrair dívidas extraordinárias; põe ou tenta pôr os seus bens em nome de terceiros; ou comete outro qualquer artifício fraudulento, a fim de frustrar a execução ou lesar credores;

III - quando o devedor, que possui bens de raiz, intenta aliená-los, hipotecá-los ou dá-los em anticrese, sem ficar com algum ou alguns, livres e desembargados, equivalentes às dívidas;

IV - nos demais casos expressos em lei.

Art. 814. Para a concessão do arresto é essencial: 

I - prova literal da dívida líquida e certa;

II - prova documental ou justificação de algum dos casos mencionados no artigo antecedente.

Parágrafo único. Equipara-se à prova literal da dívida líquida e certa, para efeito de concessão de arresto, a sentença, líquida ou ilíquida, pendente de recurso, condenando o devedor ao pagamento de dinheiro ou de prestação que em dinheiro possa converter-se.

Questão relevante é se os requisitos legais dos artigos supracitados, seriam conditio sine qua nom para o concessão do arresto, ou se tal rol é exemplificativo ou taxativo, podendo ou não ser flexibilizado.

Para parte da doutrina com leciona Antonio Carlos Marcato, tratam-se condições necessárias e concorrentes à concessão do arresto, tratando-se de rol taxativo:

1. Causa arresti: O art.813 do CPC trata da causa arresti, ou seja, das hipóteses que autorizam a cautela. Adotou o legislador um sistema exaustivo, de modo que a providência preventiva somente incidirá desde que se verifique um dos acontecimentos definidos em lei.

(...)

1. Requisitos indispensáveis e concorrentes do arresto: Pedido de arresto plenamente justificado é aquele que encontra no título executivo sua causa remota e no comportamento nocivo do devedor, descrito nas hipóteses do art. 813 do CPC, o temor de que a execução restará frustrada. São requisitos absolutamente necessários para a concessão da medida, de nítido caráter excepcional, sem os quais a cautela não poderá ser deferida.

Não basta a presença de um só deles, devendo apresentar-se os dois no caso concreto para que o pedido do requerente possa ser acolhido. Nenhum pode ser dispensado, porquanto a medida cautelar pressupõe título demonstrativo de uma dívida líquida e certa cuja satisfação encontre-se ameaçada pela conduta indicativa de fraude do devedor." [16]

Já quanto à possibilidade de concessão de arresto fora das possibilidades dos arts. 813 e 814, leciona Cassio Scarpinella Bueno:

"A discussão quanto aso referidos dispositivos comportarem, ou não, flexibilização ou interpretação ampliativa, admitindo-se , conseqüentemente, o arresto em outras hipóteses que não as autorizadas pelos dispositivos aqui examinados, conduz ao mesmo questionamento relativo à viabilidade de o magistrado, no exercício do “dever geral de cautela”, determinar o arresto de bens sem observância do que exigem os arts. 813 a 821.

Para este Curso, a resposta é positiva, máxime quando o art. 798 é interpretado com deve ser, à própria razão do “modelo constitucional do processo civil”, como algo inerente à própria razão de ser do exercício da função jurisdicional." [17]

Esta ultima posição é a que mais aceita na jurisprudência

RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CAUTELAR INOMINADA. PODER GERAL DE CAUTELA. PROCEDIMENTO ESPECÍFICO. ARRESTO. DÍVIDA LÍQUIDA E CERTA NÃO CONFIGURADA. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO EM TRÂMITE. GARANTIA DA EFICÁCIA DA DECISÃO. POSSIBILIDADE. É admissível o ajuizamento de ação cautelar inominada, com os mesmos efeitos do arresto, em face do poder geral de cautela estabelecido no art. 798 do CPC, para fins de assegurar a eficácia de futura decisão em ação de indenização proposta pelo autor, caso lhe seja favorável. Na hipótese, existe óbice à concessão desse procedimento específico - arresto - em razão da dívida não ser considerada líquida e certa (art. 814 do CPC), pois ainda em trâmite a outra demanda proposta contra o requerido. Recurso provido.

(STJ - REsp: 753788 AL 2005/0086351-6, Relator: Ministro FELIX FISCHER, Data de Julgamento: 04/10/2005, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJ 14/11/2005 p. 400)

“Considerando que a medida cautelar de arresto tem a finalidade de assegurar o resultado prático e útil do processo principal, é de concluir que as hipóteses contempladas no art. 813, não são exaustivas, mas exemplificativas, bastando para a concessão do arresto, o risco de dano e o perigo de demora” (STJ-RT, REsp 760/209: 4ª T., REsp 123.659)

(...)

Assim, tendo o credor comprovado a existência de protestos e execuções contra o afiançado, defere-se o arresto, em prestígio também ao poder geral de cautela (RT 827/325)” [18]

Ademais essa ultima posição parece ser a mais acertada, pois se coaduna com o princípio constitucional da inafastabilidade da jurisdição (art. 5º, XXXV, CF) vez que a proteção ao bem jurídico em perigo deve ser garantia, sem exagero de apego aos requisitos formais, caso o contrário, o bem jurídico a ser garantido pode perecer, e tornar inútil qualquer discussão sobre o tema, sendo dever do magistrado garantir a tutela do bem jurídico em perigo, garantindo a utilidade de posterior julgamento num processo principal, devendo para isto, flexibilizar as exigências legais, desde que se convença da existência do fumus boni iuris e do periculum in mora, devendo sempre providenciar uma tutela jurídica adequada a proteger o bem jurídico em questão.

5. CONCLUSÃO

Por todo o analisado, podemos concluir que:

  1. O princípio constitucional da inafastabilidade da jurisdição, insculpido no art. 5º, XXXV da Constituição Federal, garante dentre outras coisa a tutela jurisdicional adequada ao bem jurídico em litígio, direito que está sendo lesado ou ameaçado de lesão. Garantindo sempre que se evite ou faça cessar a lesão, ainda mais nos casos urgentes onde a demora pode tornar inútil a tutela jurisdicional. Devendo por ser norma Constitucional prevalecer sobre as normas infraconstitucionais, bem como nortear a interpretação das mesmas.
  2. O próprio princípio da inafastabilidade da jurisdição (art. 5º, XXXV,CF) por si só garante a proteção urgente dos bens jurídicos, servindo o título III do Código de Processo Civil, para regular os procedimentos cautelares e trazer exemplos de algumas tutelas possíveis, sem contudo ser um rol taxativo ou rígido;
  3. A função das cautelares propriamente ditas é primordialmente proteger um bem jurídico em perigo, trazendo sempre em seu bojo uma tutela de urgência, garantindo a proteção do bem jurídico para futura decisão judicial definitiva;
  4. Os requisitos para a concessão da tutela cautelar são o periculum in mora e o fumus boni iuris, aproximando-se dos casos de tutela antecipada, instituto com o qual há ampla fungibilidade, sempre de mão dupla, sendo também as medidas cautelares fungíveis entre si, sempre se atentando para tutela adequada do bem jurídico em questão, independentemente de pedido especiífico da parte.
  5. Os arts. 813 e 814 do Código de Processo Civil trazem requisitos para a concessão da cautelar de arresto, contudo a interpretação de tais requisitos não pode ser rígida, em respeito ao principio da inafastabilidade da jurisdição e a até a própria urgência intrínseca às tutelas cautelares, devendo o judiciário proteger o bem jurídico de maneira adequada em despego ao formalismo excessivo, pois o processo é instrumental em relação ao direito material que se visa proteger, e que clama pela proteção nos casos de urgência.
  6. Na prática para não se dizer estar interpretando de forma ampliativa as exigências dos arts. 813 e 814 do CPC com deve ser de acordo com todo o exposto e concluído, os juízes têm com base no poder geral de cautela, determinados verdadeiros “arrestos” só que com nomes distintos, como bloqueio ou indisponibilidade de bens, o que seria uma espécie de “hipocrisia” judicial, ou uma chicana, desnecessária, pois não há outra interpretação dos arts. 813 e 814 que se coaduna melhor com princípio constitucional da inafastabilidade de jurisdição (art. 5º, XXXV) do que uma interpretação ampliativa e elástica dos requisitos para o arresto.
Sobre o autor
Diego dos Santos Zuza

#Fique em casa! Faça sua consulta por Whatsapp (11) 97188-1220 Advogado e sócio de Zoboli & Zuza Advogados Associados. Formado pela Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo; Especialista de Direito Penal e Direito Processual Penal pela Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo; Especialista em Direito Processual Civil pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUC/SP. Advogado atuante nas áreas de Direito Penal, Direito Civil, Direito do Consumidor, Direito de Família e Direito do Trabalho.

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Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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