3. DISPARIDADE ECONÔMICA
Desde o início desse projeto, a economia mundial vem se recuperando de uma crise financeira eclodida em setembro de 2008, originada nos Estados Unidos, em face da concessão de empréstimos imobiliários a clientes de duvidosa capacidade de adimplir, ensejando milhares de títulos que passaram a circular nas mais diversas instituições financeiras, quebrando elas e prejudicando diversos setores como o automobilístico, siderúrgico, imobiliário.
O país passa por uma difícil situação econômica, enfrentando problemas como a superinflação, a redução do PIB, alto desemprego e os pesados cortes do governo no PAC, em nome do ajuste fiscal necessário para o equilíbrio da economia.
Segundo dados do IBGE entre 1995 – 2014, o PIB do Brasil em 2015 teve o menor crescimento em 20 anos, com índice ínfimo de 0,1%, perdendo assim a posição da 7° potência mundial na economia para a Índia. O desenvolvimento não pode ser limitado a uma elevação de renda per capta e do PIB, apresentando maiores características.
Primeiramente, é necessário afirmar que não deve prosperar a ideia de que crescimento e desenvolvimento sejam sinônimos. Enquanto existir profundas disparidades sociais, o crescimento continuará sendo uma condição necessária, porém insuficiente ao desenvolvimento, cujos aspectos distributivos e qualitativos não podem ser negligenciados. Ademais, a distribuição está cada vez mais desigual das receitas provenientes dos progressos tecnológicos e econômicos, mostrando a irresponsabilidade do poder político em não saber gerir o poder tecnológico que possui.
De acordo com os dados do IBGE, a inflação chegou à incrível marca de 0,99% no mês de maio de 2015, em pesquisa realizada pelo Banco Central com mais de 100 instituições financeiras, medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo – IPCA, o maior índice desde 2003, devido à alta do dólar, telefonia, água, energia, combustíveis e tarifa de ônibus.
Em um momento de crise financeira, o governo preferiu enxugar gastos da máquina pública, com um corte de R$25,7 bilhões de reais do Programa de Aceleração do Crescimento, cerca de 40% do orçamento anual, atingindo a lista de cortes as áreas econômicas e socais de: cidades, saúde, educação, transportes, defesa, integração nacional.
As facilidades econômicas são oportunidades que os indivíduos têm para utilizar recurso com propósitos de consumo, produção ou troca. Oportunidades sociais são as condições que a sociedade oferece nas áreas de educação, saúde, etc. Essas facilidades são importantes não só para condução da vida privada, como também para participação mais efetiva em atividades econômicas e políticas.
À medida que o processo de desenvolvimento aumenta a renda e a riqueza de um país, estas se refletem na capacidade econômica da população. Deve ter uma finalidade social justificada pelo pilar ético da solidariedade entre gerações e da equidade concretizada num contrato social.
Para as montadoras de veículos, a crise atual é pior que a de 2008, uma vez que na época, havia diversas ferramentas que ajudaram o Brasil a não ser drasticamente afetado, como a redução de impostos, IPI, os juros estavam mais baixos e os consumidores estavam menos endividados. Atualmente, a maioria das montadoras opera com alta ociosidade, concedendo férias coletivas, “day off”, reduzindo empregos.
Em um momento de crise, toda empresa pensa em reduzir os custos operacionais e se for beneficiada com incentivos fiscais, é necessário saber se o prazo estipulado está chegando ao fim, gerando a incidência de novos tributos, antes isentos.
Uma boa oportunidade seria a mudança da sua sede para outro lugar, fazendo os Estados membros “brigarem” para quem melhor ofereceria as benesses fiscais com o objetivo de atraí-las para gerar empregos, mover a economia, captando mais recursos federais e privados para o seu Estado, mesmo que para isso estabeleça isenções de tributos por longo prazo de tempo.
As diferenças salariais nas outras regiões do Brasil e a redução do problema da escolaridade do país nos últimos anos teriam estimulado as montadoras a buscar locais com menores custos nessa área.
A melhor opção pro Governo é estabelecer uma isenção onerosa[33], concedida sobre determinadas condições, a empresa tem de cumprir certos requisitos ou obrigações de fazer ou não fazer para adquirir a benesse, como por exemplo: investir na cultura, eventos sociais, cuidar do meio ambiente. No final do prazo, se não for prorrogado, a empresa procurará outro Estado para se instalar, que ofereça a mesma isenção ou até melhor, gerando assim a conhecida guerra fiscal.
Uma possível implicação em mudar a sede é ir para um local afastado isolado, dos grandes centros urbanos, fazendo aumentar o custo de transporte e ter de importar mão de obra qualificada de outros Estados ou até mesmo de outros países, uma vez que nos grandes centros urbanos a industrialização é mais forte, o que gera um Estado mais equipado e preparado para atrair novas empresas, além de produzir profissionais mais qualificados para o cargo devido ao maior investimento em educação.
Isso contribui para o aumento da densidade demográfica no Sul e Sudeste do País, as regiões mais ricas e industrializadas, atraindo as novas indústrias, aumentando o desemprego que já está em índice de 8% segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua - PNAD Contínua, sendo o maior desde 2013.
A população das regiões mais carentes, das periferias menos industrializadas, começa a se transferir para os grandes centros urbanos, com o objetivo de progredir, melhorar de vida, devido à escassez de empregos e ensino regular deficitário.
Aliado a esse evento, existe o fato que o ICMS numa operação de venda de uma empresa localizada no Estado X, produtor, tendo como destinatário final o consumidor localizado no Estado Y, a receita ficará retida na fonte, majorando assim o problema da disparidade econômica causada aos Estados membros da federação, devendo ter o tributo um papel fundamental no equilíbrio das receitas para um desenvolvimento nacional como um todo.
Quando a receita proveniente do tributo é repassada para investimento nos Estados mais carentes em obras públicas de melhoria de calçamento, canalização, posteamento, energia, educação, saúde... A população começa a viver melhor, atraindo no futuro empresas para explorar essa nova demanda em ascensão.
Dessa forma, a redistribuição está abrangida na ideia de uma sociedade livre, justa e solidária[34], como também na garantia de uma existência digna a todos, conforme os ditames da justiça social[35].
A homogeneidade dos centros de poder econômico e político está contida no princípio da soberania nacional[36], com a implementação de um desenvolvimento autocentrado não dependente dos centros capitalistas já desenvolvidos, e que estimula a livre concorrência.[37]
3.1. BENEFÍCIOS FISCAIS
É possível uma empresa se beneficiar com o não pagamento do tributo de quatro formas: imunidade, isenção, não incidência e alíquota zero. É importante descrever o processo tributário por completo para uma melhor compreensão do tema.
O tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não se constitua sanção por ato ilícito, instituída por lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada.[38]
Como é requisito a instituição por lei, devido ao princípio da estrita legalidade tributária, todo tributo deve ser criado por um processo legislativo com as devidas formalidades, mas existem exceções.
A hipótese de incidência surge para dar segurança jurídica e auxilia a previsibilidade das relações, certeza do direito, servindo como princípio da não surpresa das relações jurídicas tributárias. Se fazendo uma analogia com o direito penal, seria equiparada ao tipo penal, o enquadramento legal da conduta do agente no mundo dos fatos.
O nexo de ligação entre o tipo penal e a conduta se chama fato típico, no caso do direito tributário, é chamado de fato gerador, a conduta do sujeito passivo que faz incidir a hipótese de incidência. Após o procedimento administrativo de lançamento tendente a verificar o quantum debeatur do tributo, contribuinte, ente público competente para cobrança, local do pagamento, prazo... O sujeito passivo terá o prazo de 30 dias, em regra, para realizar o pagamento, caso contrário, iniciará a etapa judicial de execução fiscal.[39]
Para o tributo incidir é necessário que o fato gerador praticado pelo agente preencha todos os requisitos objetivos e subjetivos da referida hipótese de incidência.
Segundo o professor Paulo de Barros Carvalho, os objetivos seriam:
- Critério Material – como a hipótese normativa que uma vez ocorrida gera a incidência de tributar.
- Critério Espacial – normas jurídicas que trazem os locais expressos em o fato deve ocorrer, a fim de que irradie os efeitos que lhe são característicos. As que nada trazem, carregam implícitos os indícios que permite ao intérprete saber onde se origina o laço obrigacional.
- Critério Temporal – momento a partir do qual preenchido o fato gerador, começa a produzir seus efeitos, podendo já incidir e ser passível de cobrança.
- Critério Quantitativo – grupo de notícias informativas que o intérprete obtém da leitura atenta dos textos legais e que lhe faz possível precisar com segurança, a exata quantia devida a título de tributo, representada pela fórmula Base de Cálculo + Alíquota. Para existir a hipótese de incidência é necessária a base de cálculo, que confere o gênero jurídico ao tributo. É a grandeza instituída na consequência da regra-matriz tributária, e que se destina a dimensionar a intensidade do comportamento inserto no núcleo do fato jurídico, para que, combinando-se com a alíquota, seja determinado o valor da prestação pecuniária. Congregada à base de cálculo, a alíquota dá a compostura numérica da dívida, produzindo o valor que pode ser exigido pelo sujeito ativo, em cumprimento da obrigação que nascera pelo acontecimento do fato típico.
Já os subjetivos seriam:
- Sujeito Ativo[40] – titular do direito subjetivo de exigir a prestação pecuniária, podendo ser o próprio ente público; uma pessoa jurídica de direito privado, pela transferência da capacidade ativa que não se confunde com a competência que é indelegável; e inclusive uma pessoa física, hipótese que traz como pressuposto que tal pessoa desempenhe, em determinado momento, atividade exclusiva e de real interesse público. Para Paulo de Barros Carvalho, concorrendo os requisitos nada conspiraria contra a indicação de sujeito de direitos, pessoa física, para arrecadar taxas, por exemplo.
- Sujeito Passivo[41] – Pessoa sujeito de direitos física ou jurídica, privada ou púbica, de quem se exige o cumprimento da prestação.
A não incidência tributária, está ligada à situações em que o fato gerador não cumpriu todos os requisitos da hipótese de incidência, não podendo assim ser alcançado pela regra da tributação, ou seja, ocorreu um fato gerador que por não ter seu enquadramento legal tipificado por completo, não incide tributo devido ao princípio da estrita legalidade.
Pode acontecer por vários motivos, como: falta de definição do fato como hipótese de incidência tributária; o ente tributante não dispõe de competência para definir determinada situação como hipótese de incidência do tributo, etc.
Quando essa hipótese de não incidência vem constitucionalmente qualificada, se configura a imunidade. Prevista no próprio texto da Constituição Federal de 1988 de forma espalhada, limita a competência tributária dos entes tributantes, obstando a própria atividade legislativa impositiva sobre determinados bens, pessoas, operações e serviços.
Simplificando, caracteriza a imunidade o fato de a Constituição, diretamente, excluir parcela da competência das pessoas políticas que, se não fosse a regra imunizante, estariam aptas a instituir tributos sobre aquele ato ou fato.
Qualquer que seja o termo utilizado no texto constitucional: “são isentas...; não incidirá...; é vedado institui impostos sobre...; sujeita-se exclusivamente a incidência do imposto...” sempre que a própria Constituição, diretamente estiver exonerando ou impedindo a imposição tributária tem-se imunidade.
A isenção tributária opera efeitos no plano da legislação ordinária, como expediente redutor do campo da abrangência dos critérios da hipótese ou da consequência da regra-matriz do tributo. Consiste na dispensa legal do pagamento do tributo, uma vez que o ente político tem competência para instituir e ao fazê-lo, opta por dispensar o pagamento em determinadas situações. Na isenção, o ente tributante pode revogar e passar a cobrar, o que é impossível na imunidade, a não ser caso de emenda a Constituição.
Informadas as características gerais dos institutos, são perceptíveis as distinções entre eles, assim destacadas por Luciano AMARO[42]:
A diferença entre imunidade e a isenção está em que a primeira atua no plano da definição da competência e a segunda opera no plano da definição da incidência. Ou seja, a Constituição, ao definir a competência, excepciona determinadas situações que, não fosse a imunidade, quedariam dentro do campo de competência, mas, por força da norma de imunidade, permanecem fora do alcance do poder de tributar outorgado pela Constituição. Já a isenção atua noutro estágio: quando a pessoa política competente exerce o poder de tributar, editando a lei instituidora do tributo, essa lei pode, através da técnica da isenção, excluir determinadas situações que, não fosse a isenção, estariam dentro do campo de incidência, mas, por força da norma isentiva, permanecem fora desse campo.
No caso da alíquota zero, que muitos afirmam se tratar de uma isenção, no famoso caso que o governo federal diminui a alíquota do IPI para incentivar as vendas de veículos, não se trata de uma isenção, mas sim de uma alíquota zero. Nesses casos, o ente tributante tem competência para criar o tributo, tanto que o faz, e o fato gerador ocorre no mundo concreto, mas a obrigação tributária dele decorrente, por uma questão de cálculo é nula.
É mais comum nos tributos extraficais, Imposto de Importação – II, Imposto de Exportação – IE, Impostos sobre Produtos Industrializados – IPI, Imposto sobre Operações Financeiras – IOF, uma vez que suas alíquotas podem ter alteradas por ato do poder executivo, exceções ao princípio da legalidade, por motivos sociais, políticos, econômicos, jurídicos, querendo o poder público incentivar certa atividade.
A Constituição prevê, ainda, a necessidade de lei específica e exclusiva para a outorga de qualquer benefício fiscal[43]. Tal imposição revela-se de suma importância para evitar a desorganização legislativa e o encobrimento da concessão de privilégios a determinados contribuintes ou grupos de contribuintes, já que a previsão de benefícios em contextos legais esparsos torna muito mais difícil a fiscalização sobre situações de desigualdade desarrazoada.
Uma das importâncias dos benefícios fiscais como incentivo ao desenvolvimento das regiões de um modo geral e progresso do País pode ser visualizado com relação aos investimentos em ‘Pesquisa & Desenvolvimento – P&D’, que entre 2000 e 2010, o Brasil manteve estável em relação ao PIB numa taxa próxima a 1% durante a década.
Em outros países desenvolvidos, esse índice é de 2,3%, dessa forma, o Governo tem tratado com prioridade o tema e traçado metas para os próximos anos, com o objetivo de investir 1,8% do PIB. Diante desse cenário, o governo federal lançou importantes iniciativas para ampliação dos investimentos em P&D no país nos últimos anos.
Tendo como principal iniciativa os incentivos fiscais como ferramenta de ampliação dos investimentos privados em pesquisa e desenvolvimento. Como exemplo, tem-se a Lei n° 11.196/05, conhecida como Lei do Bem, que incentiva o investimento em P&D nas empresas por meio de benefícios fiscais, ou seja, abatimentos no Imposto de Renda e na Contribuição Social sobre o Lucro Líquido.
Um dos mais importantes exemplos bem sucedidos do incentivo fiscal é o desenvolvimento da Zona Franca de Manaus, criada pelo Decreto-Lei 288/1967 para impulsionar o desenvolvimento econômico na Amazônia. Administrado pela Superintendência da Zona Franca de Manaus - SUFRAMA, o polo industrial abriga na atualidade cerca de 720 indústrias, especialmente concentradas nos setores de televisão, informática e motocicletas. Nos últimos anos, o polo recebeu um novo impulso com os incentivos fiscais para a implantação da tecnologia de TV digital no Brasil. A ZFM compreende três polos econômicos: comercial, industrial e agropecuário.
Recebe o benefício de isenção no imposto de importação e exportação[44], IPI, desconto parcial no ICMS e isenção de IPTU, e apesar disso, continua sendo uma importante e crescente fonte de arrecadação pública, contribuindo assim para o desenvolvimento de umas das áreas mais afastadas e isoladas do país, fazendo o Estado da Amazônia concorrer com as regiões Sul e Sudeste do país.
Outro importante exemplo de aplicação do instituto da benesse fiscal é no Complexo Porto de Suape em Pernambuco, garantindo uma crescente melhoria pro Estado, gerando mais de 25 mil empregos uma vez que já são mais de 100 empresas em operação.
O Complexo Industrial Portuário de Suape é considerado um dos principais polos de investimentos do país, estando a movimentação portuária crescendo em ritmo acelerado e consolidando Suape como um porto concentrador e distribuidor de cargas. A sua concepção de porto-indústria oferece condições ideais para a instalação de empreendimentos nos mais diversos segmentos.
Dentre elas, indústrias de produtos químicos, metal-mecânica, naval e logística, que vão fortalecer os polos de geração de energia, granéis líquidos e gases, alimentos e energia eólica, além de abrir espaços em outros segmentos como metal-mecânico, grãos e logística. Tudo isso somado supera os 40 bilhões de reais em investimentos, gera 15 mil novos empregos e mais de 40 mil empregos na construção civil.
Com relação aos benefícios fiscais no Coplexo de Suape que também são fortes atrativos, tem-se: reduções de 75% nos impostos federais, de até 50% nos municipais e programas estaduais, como o Programa de Desenvolvimento da Indústria Naval e de Mecânica Pesada Associada do Estado de Pernambuco, e o Programa de Desenvolvimento de Pernambuco, objetivam o estímulo à geração de empregos e o incremento da economia regional.
O ato de conceder benefícios tributários é uma política pública já consagrada em diversos países. Sua utilização pretende auxiliar o desenvolvimento de segmentos econômicos estratégicos, regiões desfavorecidas e grupos de contribuintes.
Ao conferir incentivos fiscais, portanto, o Poder Público procura induzir determinados comportamentos ao ente privado, pois aumenta sua disponibilidade econômica e lhe confere a decisão alocativa dos recursos. A partir da última década, contudo, a concessão de incentivos fiscais, como estratégia para atrair novos investimentos, aumentou exageradamente. Esse fenômeno passou a ser conhecido como guerra fiscal.
3.2. GUERRA FISCAL
De maneira geral, a expressão guerra fiscal caracteriza os procedimentos de concessões fiscais e creditícias implementados pelos Estados, uma situação de disputa econômica entre entes autônomos, com competência tributária, que se utilizam das benesses fiscais para atração de investimentos.
A respeito do tema, segue o entendimento de Sérgio Prado e Carlos Eduardo G. Cavalcanti:[45]
A guerra fiscal é um caso de uma classe geral de fenômenos que emergem quando iniciativas políticas de governos subnacionais adquirem conotações negativas e geram efeitos econômico perversos em decorrência do caráter insuficiente ou conjunturamente inoperante do quadro político-institucional que regula os conflitos federativos, o qual se revela incapaz de garantir um equilíbrio mínimo entre interesses locais para evitar efeitos macroeconômicos e sociais perversos. No caso em questão, essas iniciativas são o uso de benefício e incentivos fiscais com a finalidade de induzir a alocação de investimentos nos territórios locais.
O tema vem ganhando importância por causa da desordem e do frenesi no processo de disputa que vem sendo concedidos os benefícios pelos Estados as grandes empresas, para que se instalem em seus territórios.
Os Governos estaduais passaram a conceder a “torto e a direito” as benesses fiscais sem um aprofundado estudo de viabilidade e suas possíveis implicações pela ocorrência demasiada, esquecendo, ainda, que o ICMS tem a finalidade fiscal, ou seja, arrecadatória.
Devido à tributação elevada do país, os novos investimentos são afastados, onerando com maior impacto o contribuinte final. A consequência é que muitos Estados e Municípios se utilizam da redução de impostos para atração, soando como algo extremamente vantajoso ao investidor e prejudicial ao ente público pela perda da arrecadação.
É de fácil percepção a violação da Constituição e da LC n° 24/75 no tocante a necessidade de Lei Complementar regular os convênios do CONFAZ para concessão de benefícios e isenções fiscais que serão concedidos e revogados, dependendo ainda de decisão unânime dos Estados representados e previsão de penalidades pela sua inobservância.[46] Com o ápice da disputa violenta por investimentos, o procedimento foi “esquecido” por completo, passando o Estado a conceder as vantagens diretamente às empresas, sem que o fato fosse levado para discussão, deliberação com os outros secretários fazendários, podendo-se evitar os atuais efeitos de sua imprudência na concessão.
Várias são as origens da guerra fiscal, sendo uma delas a falta de um planejamento de desenvolvimento tanto nacional quanto regional. Caberia ao Governo Federal a continuidade desse planejamento, que infelizmente não vem ocorrendo, acarretando a redução de sua capacidade de regular as relações federativas. Diante da Omissão, os Estados passam a se enfrentar, na ânsia de atrair investimentos para os seus territórios.
A respeito do tema, Marcos Nóbrega e Carlos Maurício Figueiredo[47] afirmam que a efetiva ausência de uma política industrial, sobretudo, regional e o fechamento das agências regionais de fomento, contribuiu para as concessões de incentivos de ICMS, alterando alíquotas efetivas de impostos, levando a uma competição desordenada e promovendo a concentração industrial em vez de minorá-la.
O conflito fiscal se generalizou, uma vez que todos os Estados passaram a adotar os mesmos instrumentos, havendo a concessão de inúmeros benefícios sem a observância das normas legais, ou seja, sem a autorização de convênios celebrados nas reuniões do CONFAZ.
A consequência da falta de um planejamento tributário e a utilização por outros Estados da benesse fiscal como atrativo é a tendência dos créditos se anularem, fazendo os entes públicos não arrecadarem, gerando prejuízo para toda sociedade uma vez que é o tributo a fonte principal de renda da nação, prejudicando a provisão púbica de bens e serviços, com o aumento das pressões fiscais dessas esferas sobre o governo da União, dando início a uma guerra fiscal e em vez de reduzir a concentração industrial, as desigualdades regionais acabam aumentando, em detrimento dos Estados mais pobres.
O próprio Governo Federal, em sua cartilha acerca da reforma tributária, admite que no início, a guerra fiscal foi vista como opção dos Estados mais pobres para atrair investimentos, compensando a falta de uma política mais efetiva de desenvolvimento regional. Com o tempo, no entanto, os Estados mais ricos também passaram a praticar a guerra fiscal, a qual perdeu força como instrumento de desenvolvimento regional e passou a gerar uma série de distorções altamente prejudiciais ao crescimento do País.[48]
A generalização da guerra fiscal acaba por beneficiar exatamente aqueles Estados mais desenvolvidos e que possuem fatores de produção mais adequados ao empreendimento em questão, não havendo uma reação direta entre a concessão de benefícios fiscais e a desconcentração indústria no Brasil.
O tema é tão impactante que esse projeto teve o cuidado e a preocupação em estudar a viabilidade de alteração da Constituição Federal, sobretudo no tocante ao ICMS, de modo a impedir o desequilíbrio que ameaça o pacto federativo.
A linha de solução que o projeto adotou para acabar com a guerra fiscal e a disparidade econômica causada aos Estados membros da federação pela divisão atual do ICMS foi a transferência de toda receita para o Estado consumidor, ou seja, destinatário da cobrança imposto, se antecipando o pagamento na fonte para evitar a sonegação fiscal.
Entretanto uma mudança imediata no sistema de transações interestaduais não seria viável, pois a medida teria forte impacto na distribuição de receitas entre os Estados e uma transição brusca dificultaria muito a montagem de um sistema confiável de compensação.
Dessa forma, o Governo Federal propõe uma transição gradual para a tributação do ICMS no destino, reduzindo-se a alíquota na origem progressivamente e completando-se o processo no oitavo ano após a aprovação da Reforma, com a criação do novo ICMS.
Tendo em vista essa transição lenta e gradual do ICMS, no dia 16/04/2015 foi promulgada pelo Presidente do Senado, Renan Calheiros, a Proposta de Emenda a Constituição – PEC n° 87/2015 que prevê a divisão, entre os Estados de origem e de destino, da arrecadação do ICMS cobrado sobre mercadorias e serviços vendidos à distância, tanto pela internet quanto por telefone.
3.3. EMENDA CONSTITUCIONAL 87/2015
A emenda n° 87/2015 alterou o artigo 155, §2°, VII e VIII e incluiu o artigo 99 no Ato das Disposições Constitucionais e Transitórias - ADCT no tocante a cobrança do ICMS incidente sobre as operações e prestações que destinem bens e serviços a consumidor final, contribuinte ou não do imposto, localizado em outro Estado.
Antes da alteração, o texto constitucional era assim disposto:
Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal Instituir impostos sobre:
(...)
§2° O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte:
(...)
VII – em reação às operações e prestações que destinem bens e serviços a consumidor final localizado em outro Estado, adotar-se-á:
a) A alíquota interestadual, quando o destinatário for contribuinte do imposto;
b) A alíquota interna, quando o destinatário não for contribuinte dele;
VIII – na hipótese da alínea a do inciso anterior, caberá ao Estado da localização do destinatário o imposto correspondente à diferença entre a alíquota interna e a interestadual;
Com a alteração, passou a dispor:
Art. 155 (...)
§2° (...)
VII - nas operações e prestações que destinem bens e serviços a consumidor final, contribuinte ou não do imposto, localizado em outro Estado, adotar-se-á a alíquota interestadual e caberá ao Estado de localização do destinatário o imposto correspondente à diferença entre a alíquota interna do Estado destinatário e a alíquota interestadual;
a) (revogada);
b) (revogada);
VIII - a responsabilidade pelo recolhimento do imposto correspondente à diferença entre a alíquota interna e a interestadual de que trata o inciso VII será atribuída:
a) ao destinatário, quando este for contribuinte do imposto;
b) ao remetente, quando o destinatário não for contribuinte do imposto;
O ADCT passou a vigorar acrescido seguinte artigo 99:
"Art. 99. Para efeito do disposto no inciso VII do § 2º do art. 155, no caso de operações e prestações que destinem bens e serviços a consumidor final não contribuinte localizado em outro Estado, o imposto correspondente à diferença entre a alíquota interna e a interestadual será partilhado entre os Estados de origem e de destino, na seguinte proporção:
I - para o ano de 2015: 20% (vinte por cento) para o Estado de destino e 80% (oitenta por cento) para o Estado de origem;
II - para o ano de 2016: 40% (quarenta por cento) para o Estado de destino e 60% (sessenta por cento) para o Estado de origem;
III - para o ano de 2017: 60% (sessenta por cento) para o Estado de destino e 40% (quarenta por cento) para o Estado de origem;
IV - para o ano de 2018: 80% (oitenta por cento) para o Estado de destino e 20% (vinte por cento) para o Estado de origem;
V - a partir do ano de 2019: 100% (cem por cento) para o Estado de destino."
Art. 3º Esta Emenda Constitucional entra em vigor na data de sua publicação, produzindo efeitos no ano subsequente e após 90 (noventa) dias desta.
A emenda constitucional teve a mesma finalidade que esse projeto de pesquisa, utilizando de forma equilibrada a divisão das receitas do ICMS como uma forma de anular os efeitos da disparidade econômica que ocorre no país e eliminar assim a guerra fiscal.
Essa linha de pesquisa foi iniciada antes da elaboração da EC 87/2015 e em princípio adotava o mesmo modelo, utilizando a fórmula da alíquota interna do Estado de origem subtraindo a alíquota interestadual da operação, independente de ser ou não o destinatário o consumidor final, ficando o Estado consumidor com o resto/diferença da subtração.
Porém, como isso não surtiria tanto efeito, se optou por uma entrega total da arrecadação ao Estado destinatário, assim como no modelo do ICMS monofásico incidente sobre combustíveis e lubrificantes, pois as unidades deficitárias do comércio interestadual são, em geral, as mais pobres.
A emenda uniu em uma única operação interestadual dois casos: o primeiro que o destinatário não é contribuinte, é adquirente da mercadoria como consumidor final; e o segundo caso que o destinatário é um comerciante, contribuinte do imposto uma vez que possui logística como uma empresa para o recolhimento.
Antes da alteração, o primeiro caso onde o destinatário não seria contribuinte, o imposto ficava integramente no Estado de origem, produtor, se aplicando a alíquota interna. Além de já possuir a empresa, podendo tributar seu lucro e gerir mais empregos na sua região, valorizando os profissionais preparados locais, mostrando ser mais equipado e capacitado para atração de investimentos ainda ficava com a receita da operação do ICMS, majorando as desigualdades regionais.
A respeito da capacidade para recolher a receita do imposto, caso o destinatário seja contribuinte, caberá ao Estado consumidor e quando não for contribuinte, caberá ao Estado de origem, produtor, exatamente igual à solução dada por esse projeto no modelo do ICMS monofásico que o tributo é recolhido antecipadamente na fonte, modelo de substituição tributária progressiva, e posteriormente repassada ao Estado destinatário, para assim evitar a sonegação fiscal.
Tendo em vista a solução lenta e gradual do modelo de ICMS apresentado pelo Governo Federal, reduzindo-se a alíquota progressivamente, foi acrescentado o artigo 99 no ADCT mostrando a evolução da porcentagem da receita do Estado de destino que para o ano de 2015 é de 20% majorando até 2019, que finalmente chegará nos 100%, transferindo todo o lucro da operação ao Estado mais necessitado da respectiva relação jurídica.
A regra prevista no artigo 99 do ADCT foi necessária para que os Estados de origem, produtores, não sintam bruscamente a perda da arrecadação num curtíssimo espaço de tempo. A emenda estipulou um prazo de 4 (quatro) anos a contar de 2015, para e total transferência de arrecadação a partir de 2019.
Uma conquista digna de aplauso para toda a sociedade, fruto dos protestos e movimentos da população em 2013 por uma reforma política e por uma tão sonhada reforma tributária, fazendo jus ao objetivo fundamental da república do Brasil de erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais, extinguindo as disparidades econômicas causadas aos Estados membros da federação.
Existe uma atual discussão entre os advogados tributaristas a respeito do prazo para nova regra do ICMS entrar em vigor. O art. 1° da EC 87/2015 de acordo com uma corrente doutrinária representa um aumento da carga tributária em algumas situações, o que requer a obrigatoriedade do princípio da anterioridade do exercício financeiro e da anterioridade nonagesimal ou noventena.
O art. 2° prevê que a regra já entra em vigor no próprio ano de 2015, uma vez que acrescenta o art. 99 no ADCT e já dispõe sobre o novo percentual em 2015, de 20% para o Estado de destinatário e 80% para o Estado de origem.
Para essa corrente, o art. 2° só entra em vigor a partir de 2016 também, respeitando ambas as anterioridades.
Para a corrente oposta, o art. 2° diz respeito, especificamente, aos casos do consumidor final não contribuinte, podendo a emenda vigorar desde 2015, pois não houve aumento ou criação de novo tributo.
Para uma melhor explicação, é necessário um maior detalhamento da mudança da nova emenda.
O art. 1 da EC 87/2015, que alterou o artigo 155, §2º, VII e da Constituição Federal, representa uma nova definição de hipótese de incidência do ICMS na operação interestadual, que incluiu duas operações distintas para destinatários contribuintes e não contribuintes em uma única hipótese, devendo assim respeitar a previsão do artigo 104 do CTN combinado com o artigo 150, III, B e C, da Constituição Federal, somente entrando em vigor 1° de janeiro de 2016.
Já com relação ao novo inciso VIII alterado pela emenda, apenas trata da responsabilidade pela cobrança, indicando o ente competente para cobrar em cada caso, tratando-se de uma mera norma explicativa e interpretativa do inciso anterior e como é exclusiva desse inciso, deve vigorar seus efeitos também em 1° de janeiro de 2016.
Com relação ao artigo 2° e a inclusão do artigo 99 no ADCT, o cerne da questão diz respeito ao seu inciso I, que já apresenta alíquotas devida na operação interestadual para o próprio ano de 2015 de 20% para os Estado destinatário e 80% para os Estados de origem, porém o artigo 3 da referida emenda afirma que a mesma só produzirá efeitos a partir de 1 de janeiro de 2016.
A inclusão do artigo 99 realmente não institui nem majora um novo tributo, mas traz uma nova hipótese de incidência, agora, com alíquotas diferentes e de forma progressiva, provocando inclusive alteração do montante da arrecadação dos entes públicos.