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O crime de prevaricação na Administração Pública: uma prática inaceitável a ser combatida

Agenda 02/11/2015 às 22:58

O Título XI do Código Penal trata dos crimes funcionais, praticados por determinado grupo de pessoas no exercício de sua função, associado ou não com pessoa alheia aos quadros administrativos, impregnando o correto funcionamento dos órgãos do Estado.

A reminiscência da prevaricação iniciou-se com o surgimento do fenômeno jurídico na antiguidade e a origem de uma compilação de 282 leis da antiga Babilônia (atual Iraque), reconhecida como Código de Hamurabi, composto por volta de 1772 a.C. O código se fundamentou na casuística. Estruturava-se em um rol oriundo do cotidiano, ou seja, fatos e situações do cotidiano instituindo-lhes correspondentes sanções. No conteúdo da compilação o capítulo II, Art. 5º, notabiliza-se pela aplicação da imparcialidade do juiz, quando prevê penalidades para o que já chamavam de prevaricação:

“Se um juiz julgou uma causa, deu uma sentença e exarou um documento selado e depois alterou seu julgamento, comprovarão contra esse juiz a alteração feita e ele pagará até doze vezes a quantia que estava em questão. Além disso, fá-lo-ão levantar-se do seu trono de juiz da assembléia e não tornará a sentar-se com os juízes em um processo." (VIEIRA, 2002, p. 11).

O termo prevaricação vem do latim "praevaricare" e significa faltar com os deveres do cargo, torcer a justiça. Paulo José da Costa Jr. ensina que é o ato de andar tortuosamente, desviando do caminho certo. Para os romanos, prevaricação era conhecida por patrocínio infiel. No Código Criminal do Império (1830) a conduta era prevista no artigo 129 e o Código Penal Republicano, a conduta era prevista no artigo 207, mas sempre presente o elemento normativo do tipo, consubstanciado pelo interesse ou sentimento pessoal, estudado na doutrina no campo do elemento subjetivo especial do tipo.

O conceito da prevaricação no âmbito da Administração Pública consiste no fato de o funcionário público "retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa de lei para satisfazer interesse ou sentimento pessoal, conforme é descrito no CP:

Art. 319 - Retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal:

Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa.

Art. 319-A.  Deixar o Diretor de Penitenciária e/ou agente público, de cumprir seu dever de vedar ao preso o acesso a aparelho telefônico, de rádio ou similar, que permita a comunicação com outros presos ou com o ambiente externo: (Incluído pela Lei nº 11.466, de 2007).

Pena: detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano.

É importante evidenciar a necessidade de o sujeito ativo ser funcionário público, e de compor o tipo subjetivo, além do dolo, o elemento subjetivo do tipo, expresso no especial fim de agir “para satisfazer interesse ou sentimento pessoal”, o chamado dolo específico na doutrina tradicional. Na prática do fato o funcionário se abstém da realização da conduta ; que está obrigado no exercicio de suas funções, ou a retarda ou a concretiza contra a lei, com a destinação específica de atender a sentimento ou interesse próprios. Trata-se diretamente de um crime próprio, que consiste em um delito que ofende a Administração Pública, causando dano ou perturbando o normal desenvolvimento de sua atividade. O funcionário não mercadeja sua função, o que ocorre na corrupção passiva, mas a degrada ao violar dever de ofício para satisfazer objetivos pessoais.

Prevaricação é um crime funcional, ou seja, praticado por funcionário público contra a Administração Pública, onde o Sujeito Ativo: É o funcionário público, na acepção do art. 327 do CP. Admite a participação de particular. E o Sujeito Passivo: É o Estado, embora o particular também possa ser lesado pela conduta típica.

A primeira conduta é a de retardar, atrasar, adiar, protelar, protrair, procrastinar o ato de ofício que deve ser executado em prazo prescrito, se existe, ou em tempo útil para que produza seus efeitos normais. A segunda conduta típica é a de deixar de praticar o ato, a omissão de quem não tem intenção de executa-lo. Por fim, a terceira é praticar o ato de forma ilegal. Em qualquer caso, porém, é necessário que o agente infrinja disposição expressa de lei, não bastando a violação do princípio da moralidade. Não se pode falar em ato ilegítimo quando o funcionário tem certa disposição na escolha da conduta a tomar, uma certa discricionariedade que lhe é atribuída no exercício de suas funções.

                O objeto de delito é o ato de ofício. É necessário que o funcionário seja responsável pela função relacionada ao fato, que esteja em suas atribuições ou competência. Se o ato foge ao âmbito da competência funcional do servidor não se caracteriza o ilícito. É também irrelevante para a lei penal que o ato deva merecer confirmação ou dele caiba recurso.

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Tipo Subjetivo: O dolo é a vontade de retardar, omitir ou praticar ilegalmente ato de ofício, mas se exige o elemento subjetivo do tipo que é o intuito de satisfazer interesse ou sentimento pessoal. O interesse pode ser patrimonial, material ou moral. O sentimento, estado efetivo ou emocional, poder derivar de uma paixão ou emoção (amor, ódio, piedade, avareza, cupidez, despeito, desejo de vingança, etc.) O crime caracteriza-se ainda que se trate de sentimento social, moral ou nobre, embora tais motivações possam influir na fixação da pena.

Consumação e Tentativa: Consuma-se o crime com o retardamento, a omissão ou a prática do ato. Nas formas omissivas, não há que se falar em tentativa. 

Tipo Qualificado: Tratando-se de funcionário público ocupante de cargo em comissão ou de função de direção ou assessoramento, de aplicar-se a causa de aumento de pena prevista no art. 327, § 2º, do Código Penal.

A prevaricação é um crime funcional, isto é, um dos crimes que o agente público pode praticar contra o funcionamento regular da administração pública em geral. O ato de ofício é definido pela lei como o decorrente de trabalho do agente público, isto é, ato que deve ser praticado pela própria natureza do trabalho do agente, mesmo que não seja provocado para isso de forma específica. Seu retardamento, omissão ou a prática desvirtuada, ou seja uma prática em desconformidade com as normas legais, do ato devem ocorrer para a satisfação de interesse ou sentimento pessoal do agente público. 

“Crime funcional é uma definição que existe no direito brasileiro, que a define como a infração da lei penal cometida intencionalmente (com exceção do peculato culposo) por quem se acha investido de um ofício ou função pública,praticada contra a administração pública. Está previsto nos artigos 312 a 327 do código penal brasileiro. Todo o tipo de crime funcional equivale a um ato de improbidade administrativa”.

Tal retardamento do trabalho para prejudicar um desafeto ou para beneficiar alguém de seu interesse é a conduta fundamental que caracteriza o delito de prevaricação. Podendo esta ser deliberada, movida por dolo, isto é, por vontade livre e consciente de agir ou omitir-se. Caso o agente retarde a decisão de um processo administrativo pela razão de necessidade do documento relevante para sua análise, por exemplo, o retardamento é justificado, e não há configuração do crime. Se o agente público não pratica ato de sua função ou o atrasa por simples impossibilidade, também não há crime de prevaricação, bem como a inação devido ao excesso de trabalho, sem que o funcionário haja dado causa à situação.

Conclusão: 

Destarte, é obrigação do Estado manter a ordem interna estabelecendo normas que dizem respeito a sua própria organização ou às relações que mantém com os indivíduos; fazendo com que essas normas sejam tuteladas e executadas, promovendo o fim a que elas visam. Em face disso como o Estado é uma Pessoa Jurídica de Direito Público e suas atividades têm de ser desempenhadas pela Administração Pública, esta terá o papel de governar a sociedade com o fito de obter resultado harmônico em face aos princípios constitucionais que cerceiam a Administração Pública, quais sejam, a legalidade, a impessoalmente, a moralidade, a publicidade e a eficiência.

É cediço que vivemos num Estado, este que é um governo político do povo constituído em nação. Os representantes do povo, exercem suas funções com o propósito de alcançar o bem comum através da Administração Pública e reprimir as anomalias que surgem em seu decorrer. No âmbito da Administração Pública, o crime de prevaricação reflete e afeta diretamente todos os cidadãos dependentes do serviço publico, colocando em crédito e a prova a credibilidade das instituições públicas, para apenas satisfazer o egoismo e egocentrismo de interesses individuais, ou seja, trata da administração pública como viés de singuralidade, quando na realidade é fundamentalmente essencial para a coletividade. Tais mecanismos de combate devem ser aplicados com rigor e aperfeiçoados para que estes desviantes do serviço publico, tenham suas praticas de errôneas coibidas e extintas, podem assim fortalecer as instituições publica e valorizar os servidores probos.

Bibliografia:

CAPEZ, Fernando. Direito Penal Parte Especial. ed. Saraiva 2004, volume 3;

FAZZIO JUNIOR, Waldo. Corrupção no Poder Público: Peculato, concussão, Corrupção Passiva e Prevaricação. ed. Atlas. 2002, São Paulo.

FREITAS, Gilberto Passos de ; FREITAS, Vladimir Passos de ; Abuso de Autoridade. 9. ed. São Paulo, Revista dos Tribunais, 2001.

JESUS, Damásio E. de , Direito Penal Anotado. 12 ed. Saraiva. 2002. São Paulo.

JESUS, Damásio E. de. Direito Penal Parte Especial. 8. ed. Saraiva. 1997, volume 4.

MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de Direito Penal: Parte Especial. 21. ed. Atlas, 2006, São Paulo.

PAGLIARO, Antonio. Dos Crimes Contra a Administração Pública. ed. Malheiros, 1997. São Paulo.

Sobre o autor
Alexis Gabriel Madrigal

Pós-graduado em Administração Pública e Gerência de Cidades e articulista de assuntos jurídicos.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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