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Dos direitos e garantias fundamentais e a continuidade do serviço público essencial

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Agenda 29/11/2003 às 00:00

CONCLUSÃO

As necessidades básicas do homem evoluem de forma proporcional a evolução tecnológica. Necessidades dantes consideradas voluptuárias e sem importância, ganharam status de essencialidade.

O mundo atual, graças ao advento de novas tecnologias, mormente as digitais, evolui de forma flagrante, ostensiva. A inclusão digital deixou de ser luxo, passando a ser necessidade básica, primária.

Com essas premissas, os serviços de natureza pública, que retratam interesse social, passaram a ser considerados essenciais para a própria subsistência humana, devendo proporcionar, no mínimo, uma vida digna ao homem.

Pode-se entender que todo serviço público, pelo simples fato de retratar uma necessidade coletiva, é carimbado pela essencialidade.

No presente trabalho restou incontroverso que os serviços públicos, todos eles, a despeito de lacuna legal que defina o que venha a ser essencialidade, conforme discorrido ao longo da exposição, são necessários e indispensáveis para a vida do ser humano.

Veja-se, nesse sentido, que hodiernamente a água, o telefone, a energia elétrica, a educação, a saúde, a segurança pública, o transporte coletivo e a administração da Justiça são indispensáveis e essenciais para o homem e para a comunidade. Ser privado de quaisquer desses serviços pode até mesmo significar para o cidadão a falta de condições básicas de vida e de desenvolvimento.

Sem maiores dificuldades de entendimento, imagine-se o ser humano, nos dias de hoje, privado dos serviços de energia elétrica. Não sobreviveria. Seria como voltar à Idade Média, sem condições de lutar em igualdade de condições que disponha de desse serviço.

Assim sendo, "cortar" o fornecimento de um dos serviços públicos essenciais enumerados é afrontar a própria Constituição da República em seu mais importante capítulo que trata dos Direitos e Garantias Fundamentais.

Não se está defendendo o inadimplemento ou o "calote" generalizado. Ao revés. O que se defende é a proteção da vida humana e das condições para o seu desenvolvimento, que está acima, como sabido, dos lucros a serem alcançados pelas concessionárias e, porque não dizer, do próprio Poder Público. Se um consumidor não tem condições de arcar com as despesas atinentes à prestação do serviço público, que o Estado, observando-se, inclusive o princípio da razoabilidade, inclua-o num programa de assistência social que proporcione a sua subsistência.

Constitui-se em prática odiosa, verdadeiramente manu militari, a conduta das concessionárias, contando com a anuência e conivência do poder público, quando suspendem o fornecimento de um serviço público em face do inadimplemento do consumidor.

Além do mais, se há inadimplência, que se cobre do usuário pela via adequada, qual seja, a judicial. Neste aspecto, conforme julgados vistos em casos específicos já referidos, o ordenamento jurídico pátrio, há muito tempo, repeliu a prática de se fazer Justiça com as próprias mãos, ou mesmo o castigo para determinados comportamentos, no caso, a cobrança do inadimplente só pode ser realizada pelas vias legais, nunca pela ameaça ficta ou real, neste caso a suspensão do serviço essencial até então prestado.

As agências reguladoras editam normas autorizando a suspensão dos serviços públicos, impondo que os consumidores inadimplentes sejam notificados do corte com antecedência de pelo menos 15 dias. Tais normas, assim entendidas de forma genérica, são inconstitucionais, como já visto ao longo da tese.

Outro ponto importante considerado no presente trabalho asseverou que, em verdade, mesmo na prestação de serviço público, o Código de Defesa do Consumidor deve reger a relação. O usuário do referido serviço é, antes de mais nada, consumidor e como tal, goza de toda a proteção conferida por tal Diploma Legal.

Em reforço, o Código de Defesa do Consumidor, tendo em vista a hierarquia das leis, está acima das resoluções instituídas pelas agências reguladoras que autorizam a suspensão do serviço público em caso de inadimplemento. É a lei 8078/1990 que rege, como já dito e redito, a relação entre as concessionárias e os usuários dos serviços públicos.

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Repise-se que não é somente o corte do fornecimento do serviço público essencial que pode ser considerado ilegal/inconstitucional. Como visto, se o serviço for prestado de forma ineficiente, por exemplo, caberá ao consumidor ser ressarcido dos prejuízos, devendo o poder público adotar as providências legais que objetivem propiciar à coletividade a eficiência desejada.

O consumidor é sempre considerado parte mais fraca (hipossuficiente) numa relação frente a fornecedor de serviços, competindo ao poder público sua constante proteção, sob pena de ter, até mesmo, sua vida colocada em risco, de forma desnecessária. O Texto Constitucional, revelador de princípios basilares, deve ser sempre entendido de forma favorável ao homem, sob pena de inaceitável inversão de valores, desrespeitando-se, em última análise, o próprio estado democrático de direito.

Não foi por acaso que a Constituição da República, quando de sua promulgação, foi declarada a "Constituição Cidadã".


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NOTA

01. Texto pinçado do sítio jusnavegandi http://jus.com.br/revista/pecas/texto.asp?id=488

Sobre o autor
Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CONCEIÇÃO, Rodrigo. Dos direitos e garantias fundamentais e a continuidade do serviço público essencial. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 8, n. 146, 29 nov. 2003. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/4520. Acesso em: 15 nov. 2024.

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