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Taxa de desemprego e a Lei de Acesso à Informação:

paradigma entre cidadania e ideologia

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4. Conceituação tergiversadora

Inicialmente cabe ressaltar que o IBGE não conceitua desemprego ou desempregado segundo o entendimento próprio da expressão, utiliza sim, a expressão ocupação e desocupação. A utilização destas expressões serve para escamotear a realidade pela alteração do uso dos signos social e tecnicamente conhecidos e dominados.

A bem da verdade, esses parâmetros ocupação/desocupação não foram criados pelo Instituto, mas pela necessidade de referência internacional, a Organização Internacional do Trabalho-OIT, padronizou para parametrização as nações.

É relevante destacar que a metodologia adotada pelo IBGE apoiada nos princípios erigidos pela OIT foi estabelecida para mensuração dos países desenvolvidos. Nestes países existem políticas e mecanismos sociais de proteção ao trabalhador que no Brasil não existe ou comparativamente são mais acanhadas[25]. Apenas para exemplificar, as economias desenvolvidas da Europa disponibilizam para seus cidadãos-trabalhadores: Bolsa de estudo, gratuidade no ensino superior, auxilio econômico por filho nascido, complementação de renda e benefícios para família numerosa, entre outros[26].

Criticas são apresentadas pela utilização desses parâmetros. Por exemplo, para o IBGE, as pessoas que estão desempregadas, mas que trabalharam pelo menos uma semana nos últimos 358 dias, são consideradas como se estivessem ocupadas, conceituadas como Pessoas marginalmente ligadas à população economicamente ativa.[27]

São consideradas como se estivessem ocupados os desalentados, a saber, pessoas que na semana da

“pesquisa que estavam procurando trabalho ininterruptamente há pelo menos seis meses, tendo desistido por não encontrar qualquer tipo de trabalho, trabalho com remuneração adequada ou trabalho de acordo com as suas qualificações”[28].

Nota-se, segundo Menezes, que o posicionamento político e ideológico é que sustenta a própria metodologia estatística, “por meio do qual procura-se mascarar a realidade do mundo do trabalho, bem como ocultar a relação existente entre desemprego, precarização do trabalho e informalidade como tendências vinculadas as formas atuais da relação capital versus trabalho”[29].


5. Natureza dos termos

Na interpretação do direito, uma das regras básicas mais elementar é a que a lei não contém frase ou palavra inútil, supérflua ou sem efeito.[30] Moraes ao comentar a metafisica dos conceitos diz que algumas palavras acabam por ter seus conceitos esvaziados ou imprecisos de forma que não trazem a mente, de forma rápida e concreta o fato e o sentido da palavra, como é o caso da palavra conceito, que muitos confundem com definição. Alerta o autor que “definir não é conceituar, definir é delimitar algo ou estabelecer claramente aquilo que o distingue, enquanto conceituar é apreender ou conceber algo pela compreensão”.[31]

Conforme Koche, os conceitos, metodologicamente falando, são símbolos que expressam a abstração intelectualizada da ideia de uma coisa ou um fenômeno observado.[32] Já Prodanov, diz que todo “conceito possui uma intenção e uma extensão. A intenção indica a propriedade, as características que esse conceito diz representar. A extensão indica o conjunto de elementos reais que esse conceito designa”[33].

Etimologicamente o termo conceito vem do Latim conceptus, do verbo concipere, coisa concebida ou formada na mente. Conceito pode ser uma ideia, juízo ou opinião. Ex: A discussão começou porque nós temos conceitos muito diferentes de relacionamento aberto[34].

Assim sendo, entender como sinónimos os conceitos de desocupação e desemprego equivale a um equivoco de fundamento ou quanto à interpretação, teleológico, isto porque o conceito de desocupação esta ligada à pessoas aptas para o trabalho que na “semana de referência da pesquisa” não estavam empregadas, não tinham qualquer tipo de atividade mesmo que precária, como vendedor de balinhas em semáforo, e que estavam procurando emprego.

O IBGE conceitua Taxa de desocupação (ou desemprego aberto) como a “percentagem das pessoas desocupadas, em relação às pessoas economicamente ativas”. E pessoas economicamente ativas são “pessoas de 10 a 65 anos de idade que foram classificadas como ocupadas ou desocupadas na semana de referência da pesquisa”.[35]

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Por sua vez, para o IBGE, “entende-se como ocupação a tarefa ou função que uma pessoa desenvolve”[36].

Ocupação, portanto, remete à ideia de tarefa ou função econômica que necessariamente não se refere ao vínculo de emprego que tem por pressuposto lógico e léxico, desemprego. Mas o que é emprego?

Segundo o instituto de Matemática e Estatística da Universidade de São Paulo, relativo a emprego e trabalho, conceitua emprego:

“É a relação, estável, e mais ou menos duradoura, que existe entre quem organiza o trabalho e quem realiza o trabalho. É uma espécie de contrato no qual o possuidor dos meios de produção paga pelo trabalho de outros, que não são possuidores do meio de produção”. [37]

Conforme Camino:

“Relação de emprego é a relação de trabalho de natureza contratual, realizada no âmbito de uma atividade econômica ou a ela equiparada, em que o empregado se obriga a prestar trabalho pessoal, essencial à consecução dos fins da empresa e subordinado, cabendo ao empregador suportar os riscos do empreendimento econômico, comandar a prestação pessoal do trabalho e contraprestá-lo através do salário”.[38]

Nota-se que o conceito de empregado está expresso na Consolidação das Leis Trabalhistas-CLT em seus artigos:

“Art. 2º - Considera-se empregador a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviço.

§ 1º - Equiparam-se ao empregador, para os efeitos exclusivos da relação de emprego, os profissionais liberais, as instituições de beneficência, as associações recreativas ou outras instituições sem fins lucrativos, que admitirem trabalhadores como empregados.

§ 2º - Sempre que uma ou mais empresas, tendo, embora, cada uma delas, personalidade jurídica própria, estiverem sob a direção, controle ou administração de outra, constituindo grupo industrial, comercial ou de qualquer outra atividade econômica, serão, para os efeitos da relação de emprego, solidariamente responsáveis a empresa principal e cada uma das subordinadas.

Art. 3º - Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário.

Parágrafo único - Não haverá distinções relativas à espécie de emprego e à condição de trabalhador, nem entre o trabalho intelectual, técnico e manual”.

Relação de trabalho não se confunde com relação de emprego, pois esta é uma espécie daquela. Quem se obriga a trabalhar para ter um terceiro e espera um resultado econômico (contrato para pintura de parede) tem um contrato de trabalho, mas se trabalha vinculado a alguém (uma empresa de pintura) possuirá relação de emprego com aquele que o contratou.

Mesmo no Direito Previdenciário[39] que é mais amplo, equivalendo a empregado pessoas que exercem atividades remuneradas, apresenta um rol taxativo de situações em que em todas as vinte e uma hipóteses, se observa a presença de vinculo entre o trabalhador e uma pessoa equivalente ao empregador.

Resta, pois, certo que desemprego tem por representação intelectual ou conceitual o pressuposto perda de emprego ou de relação de emprego.

Quando o órgão governamental responsável pela informação estatística, IBGE, utiliza e veicula a taxa de desocupação como sinônimo ou equivalente à taxa de desemprego, não informa o cidadão, conforme a LAI, ou ainda, não informa um indicador, mas sim um paradoxo. Segundo Ferreira, paradoxo é a opinião contrária ao senso comum, o oposto daquilo que se pensa ser a verdade ou o contrário a uma opinião admitida como válida[40]. Efetivamente desemprego não é desocupação, mas situação de daquele que se encontra sem relação de emprego em sua forma mais ampla, portanto carente da política de assistência social, como por exemplo, seguro-desemprego. 


6. Desemprego e seguro-desemprego

Santos ao comentar a polissêmica conceituação para desemprego comenta que a expressão possui várias definições, assim “cada estatística irá ter diferentes abordagens e, consequentemente, diversificados resultados a partir da “concepção” em que se apoiar”[41].

Assim sendo, o conceito de desemprego irá variar no aspecto teórico-econômico, mas no sentido comum da informação prática para o cidadão, ela deverá significar conforme constam nos dicionários da língua portuguesa ou da ciência aplicada à administração, em que desemprego é “1. Inexistência de emprego, 2. Falta de ocupação laboral. 3. Situação de quem está desempregado[42].

Este conceito de desemprego é compatível com o utilizado para a assistência social que o Estado proporciona aos desempregados, materializada na Lei 7.998/90 e o Decreto 8.900/94 que regula o benefício do Seguro-Desemprego. Dispõe a lei que este benefício tem por finalidade:

“prover assistência financeira temporária ao trabalhador desempregado em virtude de dispensa sem justa causa, inclusive a indireta, e ao trabalhador comprovadamente resgatado de regime de trabalho forçado ou da condição análoga à de escravo”.[43]

Para fazer jus ao benefício, o interessado deve comprovar que esteve trabalhando para alguém nos moldes do Art. 3º da CLT[44] por um certo período (que varia conforme a crise econômica ou falta de recurso do Estado) ou ainda a aquela pessoa que de qualquer forma estivesse forçado ou sob condição análoga de escravo.

A regra de para utilização desse beneficio foi alterada. Nas regras de 2015 o trabalhador se provasse ter trabalhado entre 6 e mais de 24 meses, faria jus entre 3 a 5 parcelas.

Conforme a Lei 13.134/2015, a regra ficou mais restritiva, pois para solicitação do beneficio, passando de 6 para 12, nos últimos 18 meses para se habilitar, ou seja, dobrou o prazo. Quando a solicitação pela 2ª vez, deverá demonstrar ter trabalhado 9 nos últimos 12 meses e pela 3ª vez, 6 meses imediatamente à data de dispensa.

Observa-se que a mudança não alterou a concepção e conceito de desemprego que se abstrai da Lei do seguro-desemprego, ou seja, é um beneficio para a pessoa que não está empregada, embora esteja apta para trabalhar e integre a População Economicamente Ativa (PEA).

Fica claro, pois, que qualquer cidadão, por menor nível de escolaridade que possua entende com perfeição o conceito de desemprego a que a Lei do seguro-desemprego remete.

Sobre os autores
João Ernesto Paes de Barros

Professor Mestre, doutorando na Universidade de Lisboa, advogado em Portugal e no Brasil, porfessor de Direito das Obrigações, Contratos e Responsabilidade Civil.

Jessika Matos Paes de Barros

Advogada. Mestre. Doutoranda na Universidade de Lisboa. Assessor Jurídico da Fundación Cauce (Burgos, Espanha). Professora de Direito Empresarial, Falência e Propriedade Intelectual.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BARROS, João Ernesto Paes; BARROS, Jessika Matos Paes. Taxa de desemprego e a Lei de Acesso à Informação:: paradigma entre cidadania e ideologia. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4661, 5 abr. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/47860. Acesso em: 24 nov. 2024.

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