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A proteção da pessoa portadora de deficiência pelo Estado brasileiro

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Agenda 17/02/2004 às 00:00

SUMÁRIO: INTRODUÇÃO; 1.NOÇÕES GERAIS SOBRE ESTADO; 2.A DEFINIÇÃO DE ESTADO E ALGUMAS CONSIDERAÇÕES; 3.ENTENDENDO O ESTADO LIBERAL E O NEOLIBERAL; 4.A POLÍTICA SOCIAL E O ESTADO MODERNO (NEOLIBERAL); 5.A PROTEÇÃO DA PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA PELO ESTADO BRASILEIRO; CONCLUSÃO; BIBLIOGRAFIA


INTRODUÇÃO

É sabido que os direitos fundamentais apresentam como pressupostos a existência de uma esfera individual de atuação frente ao Poder Público, a existência de uma comunidade política integrada e de uma Constituição que a regulamente, tanto no âmbito da estrutura do Estado como no âmbito do reconhecimento dos direitos fundamentais.

Uma analise dos direitos fundamentais na atualidade, por mais superficial que possa ser, exige também um breve estudo sobre o Estado moderno, suas características sócio-político-econômica e jurídica – o que despretenciosamente nos dispomos a fazer neste trabalho.

Concentrando forças nos direitos sociais fundamentais, especificamente no tocante aos direitos da pessoa portadora de deficiência, buscamos a verificação, em face do modelo econômico e político-jurídico de Estado adotado pelo Brasil, da existência de uma política social voltada para essas pessoas e suas necessidades especiais, sem questionar de sua eficácia.

O grande questionamento a ser respondido é se a política econômica adotada pelo Brasil permite que se pratiquem políticas sociais que possibilitem o efetivo exercício dos direitos fundamentais de seus indivíduos, tanto direitos de cunho individual como de cunho social; residindo mais especificamente na preocupação com os direitos sociais das pessoas portadoras de deficiência.

A resposta a essa indagação não é tão simples quanto possa parecer, se consideradas as peculiaridades de um país como o Brasil, cuja educação básica ainda não é acessível a todos, tal como a educação qualificada, a moradia, a alimentação, o trabalho, a saúde. E perpassa por um olhar sobre as disposições do ordenamento jurídico, especificamente sobre a previsão Constitucional de proteção dos direitos sociais fundamentais, frente ao Estado e mesmo aos interesses particulares.


1.NOÇÕES GERAIS SOBRE ESTADO

Vulgarmente utiliza-se a expressão de que o Estado é "a nação politicamente organizada" [1]; o que vem significar que a nação sai de seu estado natural, formado pela simples reunião e convivência dos homens em sociedade, e entre em estágio em que se estabelecem, além daquele vínculo social, vínculos políticos e jurídicos.

A essência desse Estado reside na soberania, ou seja, no seu poder de criar, executar e fazer com que sejam executadas leis que garantam a harmonia social, sem subordinar-se a nenhum outro órgão superior – o que de certa forma vem sendo questionado face à nova ordem mundial em que se estabelecem órgãos supranacionais para atender e intermediar os interesses comuns de Estados distintos. Há, porém, quem defenda que a existência desses órgãos deriva diretamente desse poder soberano que cada Estado possui e através do qual delega atribuições, competências para que aquele órgão possa atuar submetendo-o, na realidade, aos seus próprios interesses; donde não se justificaria questionar se sua soberania persiste ou não como elemento constitutivo daquele Estado.

Essa concepção de um Estado organizado não tem origem precisa, mas historicamente o que se sabe é que as comunidades primitivas não atendiam a esses elementos, sendo na sua maioria guiadas pelos costumes, e não por leis, onde a justiça era privada, numa noção absolutamente oposta a atual.

A origem teria sido determinada por uma série de fatores que vão do desenvolvimento da agricultura, ao crescimento e complexidade sociais, que exigiram medidas de controle social às quais os indivíduos estariam obrigados a se submeter, para o quê precisou criar-se uma entidade cuja autoridade fosse reconhecida como sendo a que regula a conduta social e exige a submissão daquela sociedade à lei: o Estado.

Apesar da organização de Roma e da Grécia, referenciais históricos do direito e da teoria geral do Estado, nos moldes característicos do Estado, essa designação só passou a ser utilizada por Ulpiano, quando definia Direito Público. E a institucionalização do poder, que passou a ser visto independentemente de quem o exercia, serviu grandemente ao seu fortalecimento.

Há, porém, uma concepção teleológica, segundo a qual o Estado tem origem divina; concepções contratualistas, segundo as quais o Estado é oriundo da vontade humana; além dessa concepção social, de origem histórico-evolutiva.

Dizer que o Estado estabelece vínculos políticos, é dizer que há relações entre o Estado e seus indivíduos no que toca à nacionalidade, ao poder de participar na escolha do governante, etc. E que estabelece vínculos jurídicos é dizer que as relações estabelecidas entre os particulares e entre eles e o Estado produzem efeitos jurídicos, tendo caráter coercitivo, quando celebradas de acordo com o ordenamento jurídico.

O Estado funciona ao mesmo tempo como fonte institucionalizadora de regras jurídicas, por ser ele que detém o poder de legislar, de criar o direito positivo, e como ente que garante a eficácia desse direito, assegurando a submissão social da regra, por meio de instrumentos de coerção, dos quais o particular não dispões diretamente, mas somente por sua intervenção.


2.A

DEFINIÇÃO DE ESTADO E ALGUMAS CONSIDERAÇÕES

Faz-se necessário compreender, então, qual a concepção que a denominação Estado tem. E é Pedro Salvetti Netto apud Filomeno [2] que oferece o seguinte conceito:

Estado é a sociedade necessária em que se observa o exercício de um governo dotado de soberania a exercer seu poder sobre uma população, num determinado território, onde cria, executa e aplica seu ordenamento jurídico, visando ao bem comum.

Filomeno concorda com essa concepção e acentua que o Estado possui como elementos constitutivos: o material, o formal e o teleológico, exatamente como referencia o autor por ele citado, no trecho supra.

Essa, porém, não é uma concepção aceita pela totalidade dos publicistas; posto que o conceito varia conforme seja enfatizado o aspecto político, jurídico ou sociológico. Apesar de o mais correto ser definí-lo com base em todos os aspectos e não a partir de um ou outro exclusivamente.

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Ilustrando a diversidade de conceitos referida, José Hermílio Ribeiro Serpa [3] cita alguns autores que valem a pena mencionar:

O Estado é uma "ordenação jurídica na qual um complexo de normas gerais e coercitivas regulam os órgãos e os poderes do próprio Estado, bem como a relação dos cidadãos entre si e deles com o próprio Estado" (Groppalli, apud Aderson Menezes, Teoria Geral do Estado, 1984).

"É uma comunidade de homens fixada sobre um território próprio e que possui uma organização da qual resulta para o grupo considerado em suas relações com seus membros, uma potestade superior de ação, de mando e coerção" (Malberg, apud Menezes, Aderson, Teoria Geral do Estado, 1984)

É uma sociedade permanente de homens, que habitam um território fixo e determinado e tem um governo soberano. (Azambuja, 1973, Ed. Globo)

É uma associação política de base territorial, com capacidade jurídica interna e externa, cujo governo é dotado de poder originário, de sanção direta e incondicionada, bem como da atribuição de conferir a pessoas e bens a condição de nacionalidade, que os distingue na órbita internacional. (Sampaio, Nelson de Souza. Forense, 1960)

O próprio Serpa afirma que o Estado é "a força a serviço da efetivação e realização de um conjunto de valores dominantes, num espaço geográfico dado, regulado por um conjunto coerente de normas jurídicas que, hodiernamente, denomina-se sistema jurídico" [4].

Desde Roma e Grécia, passando pela Idade Média, pelo Estado Absolutista, até o advento do Estado Liberal, a verdade é que havia grande confusão entre o monarca e a soberania e não havia direitos individuais definidos, declarados, alguns apenas eram conhecidos por meio de pactos. Mas, com a independência das colônias americanas, institucionalizou-se um Estado Constitucional, submetido a uma Lei Fundamental que passou a assegurar aqueles direitos individuais, limitando o poder do próprio Estado. E, com a Revolução Francesa, admitiram-se os chamados direitos naturais do ser humano, intronizando-se o Estado de Direito.

Esse novo Estado está comprometido com a liberdade absoluta, como primado, e tem nos princípios da subsidiariedade, do Estado mínimo e da neutralidade, seu pilar; que em resumo significam que a intervenção do Estado na vida do particular é restrita a interesse público, conforme os limites estabelecidos na Constituição que o regula, estabelecendo-o, conferindo-lhe poderes de um soberano, mas impondo-lhe restrições quanto ao uso desses poderes sobre aquilo que deve resguardar, proteger, assegurar, respeitar.

Ao final da Primeira Guerra Mundial, as Constituições de Weimar e a Mexicana instituiram o Estado de Direito Social, também denominado Estado Social Democrata ou Estado Precidência, como forma de mediar as pretensões da burguesia e do proletariado, de modo que o Estado intervém na relação de produção garantindo direitos tais como: aposentadoria, férias, duração da jornada de trabalho, etc.

Esse Estado tem suas características apontadas por Serpa [5]:

a)princípio de compromisso conformador, cabendo ao Estado intervir na sociedade para melhor assegurar as formas de existência social;

b)princípio da democratização da sociedade que obriga as intervenções de caráter econômico e social tendente à prossecução do princípio da igualdade;

c)princípio do Estado de Direito formal, racionalizadores e limitadores das medidas intervencionistas.

Porém, o próprio liberalismo, hoje conhecido como Neoliberalismo vem atacar esse Estado, no dizer de Norberto Bobbio apud Serpa [6]: um ataque puro e simples à democracia ao "grande compromisso histórico precedente entre o trabalho organizado, do qual nasce direta ou indiretamente a democracia moderna (através do sufrágio universal, da formação dos partidos de massa)" (Bobbio, in Futuro da Democracia, 1986, p. 127)

É até incoerente esse ataque neoliberal à democracia, vez que parece haver uma relação de interdependência entre liberalismo e democracia. Porém, Liberal é o Estado cujos poderes e funções são limitados, contrapondo-se tanto ao Estado Absoluto, como dito alhures, quanto ao Estado Social. Enquanto que a Democracia é uma forma de governo plural, pelo qual não apenas um, como na monarquia, ou alguns, como na oligarquia, detêm o poder; mas o poder é conferido por uma maioria aos seus representantes eleitos.

Bobbio explica que:

Um Estado Liberal não é necessariamente democrático: ao contrário, realiza-se historicamente em sociedades nas quais a participação no governo é bastante restrita, limitada às classes possuidoras. Um governo democrático não dá vida necessariamente a um Estado Liberal: ao contrário, o Estado Liberal clássico foi posto em crise pelo progressivo processo de democratização produzido pela gradual ampliação do sufrágio até o sufrágio universal. [7]

Mas, então, como justificar o uso da expressão liberal-democracia? Explica o autor:

Não só o liberalismo é compatível com a democracia, mas a democracia pode ser considerada como natural desenvolvimento do Estado Liberal apenas se tomada não pelo lado de seu ideal igualitário, mas pelo lado da sua fórmula política, que é, como se viu, a soberania popular. [8]

Essa soberania popular é expressada pelo sufrágio universal, cuja extensão em nada contraria o Estado de Direito ou o Estado Mínimo. De tal forma, que já não se pode conceber um Estado Liberal não-democrático, nem Estados Democráticos que não sejam liberais, pelo simples fato de que a democracia se faz necessária à salvaguarda dos direitos fundamentais, instituídos por uma Constituição que determina as premissas sobre as quais o Estado vai se pautar. Desse modo, o liberalismo parte de uma teoria econômica, que defende a economia de mercado e da livre iniciativa econômica, enquanto a democracia parte de uma teoria política.

Citando Friederich von Hayek, Bobbio adverte que o liberalismo e a democracia respondem a problemas diversos do Estado: "o liberalismo aos problemas das funções do governo e em particular à limitação de seu poderes; a democracia ao problema de quem deve governar e com quais procedimentos." [9]

Por fim, Bobbio faz uma afirmativa contundente, segundo a qual:

Hoje apenas os Estados nascidos das revoluções liberais são democráticos e apenas os Estados democráticos protegem os direitos do homem: todos os Estados autoritários do mundo são ao mesmo tempo antiliberais e antidemocráticos. [10]


3. ENTENDENDO O ESTADO LIBERAL E O NEOLIBERAL

Tomando a última afirmativa de Norberto Bobbio, citada ao final do tópico anterior, de que Estados autoritários são antiliberais e antidemocráticos, vamos melhor compreender o que é o Estado Liberal; já que a democracia parece de mais fácil compreensão, enquanto uma forma de governo, antiga, oriunda do pensamento político grego, que garante o governo do povo, de muitos em substituição ao governo de apenas um ou de alguns poucos.

A única variante dessa forma de governo ao longo do fator tempo é a forma como esse governo do povo deve ser exercido, outrora diretamente pelo povo, atualmente por meio de representantes eleitos pelo povo, em face do crescimento populacional e de tudo o mais da vida moderna, que inviabilizaria o exercício direto do poder.

A forma democrática de governo é pautada modernamente em uma Constituição que a institui e determina como será aferida essa representação popular, sistematizando seu exercício, conforme o interesse geral, em garantia da soberania popular.

Quanto ao Liberalismo, José Geraldo Brito Filomeno afirma ser o oposto do autoritarismo e do absolutismo, presumindo-se haver uma "descentralização" do poder político, de modo a confundi-lo com a própria noção de democracia. Mas o distingue daquela por afirmar que aqui há uma concepção pessoal, e não política, cujo sentido é de "liberdade-autonomia", a faculdade de exercer liberdades individuais, como: ir, vir e permanecer.

Para Enrique de La Garza Toledo, "o Estado liberal caracteriza-se, principalmente pela separação entre Estado e economia e pela tentativa de reduzir a política a chamada sociedade política, isto é, por tentar despolitizar as relações econômicas e sociais" [11]

Quanto ao liberalismo econômico, trata-se de um regime econômico que postula a "livre iniciativa e a livre concorrência, em princípio sem qualquer interferência do Estado" [12], afastando o Estado como um concorrente na exploração da atividade econômica.

Essa limitação ao poderio do Estado é imposta pela Constituição, como já se disse, separando o campo privado do campo de atuação do poder público; impondo também limites ao exercício das atividades dos particulares, garantindo a harmonia social e jurídica.

Na realidade, quando se vislumbram controles necessários à manutenção da ordem para que sejam evitados abusos pelos particulares, já se está falando em Neoliberalismo e não mais em liberalismo, como afirma Filomeno, ao comentar o art. 170 [13] da vigente Constituição Federal Brasileira, que estabelece um liberalismo formal e enumera como princípios, além da existência digna de todos e da justiça social, a soberania nacional, a propriedade privada, e etc.

Claus Off apud Filomeno [14] afirma que "o neoliberalismo quer um Estado que interfira quase nada na economia e, se possível, cobre pouco imposto"; e adverte que "o excesso de poder do mercado afeta a confiança na democracia. Um Estado fraco começa a fazer o que as empresas quiserem...".

Nesse sentido Miguel Reale apud Filomeno [15] defende que o Estado não pode ser destituído de poder normativo para que possa garantir a subsistência de sua nacionalidade frente à globalização, de modo que o social-liberalismo se apresenta como a melhor solução política.

Mas a Constituição Brasileira, como dito alhures, impõe limites para que seja preservada a ordem social, jurídica e, por que não, econômica, fixando limites para que não se cometam abusos por parte dos particulares, nem por parte do Estado, que intervém no interesse social, obedecendo aos limites constitucionalmente impostos, adotando uma política neoliberal, e não liberal formal, como se infere da leitura dos dispositivos infra:

"Art. 173. Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei.

...

§ 4º A lei reprimirá o abuso do poder econômico que vise à dominação dos mercados, à eliminação da concorrência e ao aumento arbitrário dos lucros

§ 5º A lei, sem prejuízo da responsabilidade individual dos dirigentes da pessoa jurídica, estabelecerá a responsabilidade desta, sujeitando-a às punições compatíveis com sua natureza, nos atos praticados contra a ordem econômica e financeira e contra a economia popular"

Inegavelmente o caput do art. 173 da Constituição Federal adota a política econômica neoliberal, ao passo que os parágrafos terceiro e quarto estabelecem os limites constitucionais a que nos referimos.

Nesse diapasão, Filomeno conclui que:

a)o neoliberalismo pressupõe, em princípio, a ampla liberdade de iniciativa e o exercício de atividade ou profissão;

b)referida liberdade, porém, não pode comprometer a justiça social, um dos pressupostos do próprio bem comum do Estado;

c)dessa forma, impõem-se-lhe limites, com a regulação do mercado, quer através do exercício da própria atividade econômica pelo Estado, ou, então pela permissão ou concessão de atividades reputadas essenciais e, por fim, pela repressão dos desvios ou abusos verificados" [16]

Voltando à questão do liberalismo, urge esclarecer, que seu fracasso em manter o crescimento econômico sem grandes crises e manter a ordem social com a pouca intervenção do Estado foi determinante para sua transposição, ladeado pelo movimento socialista ascendente e a derrocada do assistencialismo cristão; e a alternativa encontrada foi o Estado Social, surgido por volta dos anos 20 e mantido até os anos 70 do século passado.

O Estado Social, na concepção de La Garza Toledo, "é, em parte, investidor econômico, em parte regulador da economia e dos conflitos, mas também Estado benfeitor que procura conciliar crescimento econômico com legitimidade da ordem social" [17]; com a intervenção do Estado na economia, transcendência da democracia parlamentar oportunizando a participação direta da sociedade organizada através de pactos corporativos.

Esse Estado Social capitalista, que teve uma vida curta, pois durou aproximadamente quarenta anos, representou alto índice de crescimento, ordenamento social e permitiu a concretização de algum socialismo.

Fato é que também esse modelo de Estado entrou em crise, cujas causas são inúmeras, havendo talvez uma sucessão de pequenas crises (crise fiscal, crise da acumulação, crise de produtividade...) que determinou seu abandono e substituição por um novo modelo, o Estado Neoliberal, ainda em consolidação.

O Estado Neoliberal tem como característica o empirismo de mercado, pois é o mercado livre que determina as ações a serem tomadas pelo Estado; é o mercado quem tem o domínio e promove o dirigismo do Estado, da própria ordem social. Numa real inversão de papéis, em que não será mais o Estado a traçar os caminhos de sua economia; mas, esta é que o fará, que determinará os rumos que esse Estado e todo seu ordenamento político-sócio-jurídico praticamente irá tomar. Isso oferece um sem número de consequências e perigos que adiante trataremos.

São apontadas como suas características: a superioridade do livre comércio, o individualismo metodológico (liberdade, privatização e menor incidência na previdência social), as contradições entre liberdade e igualdade, desregulação estatal e privatizações (expressão abstrata de liberdade).

Especificamente quanto às contradições entre liberdade e igualdade Hayek apud La Garza Toledo [18] diz que a desigualdade não é justa ou injusta já que o mercado não é voluntário, o que depõe contra a justiça social, retirando os benefícios sociais da esfera de atuação do Estado.

Continuando em sua análise, La Garza Toledo aponta, porém, algumas contradições do Estado Neoliberal e afirma que o neoliberalismo não existe sob a forma de nenhuma de suas doutrinas puras, razão pela qual despontam novos conceitos como o de liberalismo social, no caso do Estado Neoliberal Autoritário Mexicano.

São contradições desse modelo neoliberal:

1.Possibilidade de crescimento limitada da economia ou a redução da inflação às custas da polarização produtiva social. A desregulamentação e a privatização cumprem a promessa de igualdade no mercado, mas descuida dos monopólios que potencializam seu poder com as políticas adotadas por esse modelo.

2.A liberalização do mercado reflete no bolso do assalariado que não tem compensações pela política de redução dos salários reais.

3.A substituição do "ator internacional otimizador" pelos "magos das finanças" e seu conhecimento privilegiado do mercado e da política estatal.

Quanto ao liberalismo social adotado pelo México, em 05/03/1992, pelo Presidente C. Salinas de Gortari, caracteriza-se pela regulamentação estatal do mercado em favor do grande capital (transnacional); pela privatização acelerada; abertura ao mercado externo, etc., cujas consequências do crescimento são muito temidas por aquele autor.

O que de fato parece acontecer em países como o Brasil e o México é ainda uma transição do Estado de Direito Social para o Estado Neoliberal, por suas peculiaridades internas, ou talvez um Estado Neoliberal Social, um Estado híbrido, que concilia as pretensões capitalistas do neoliberalismo com a pretensão de bem-estar social, como forma de minimizar as consequências da política neoliberal.

Sobre a autora
Márcia Cristina dos Santos Rêgo

Advogada, Professora dos Cursos de Direito da Universidade Federal do Pará - Campus de Santarém: disciplina Direito Civil, e do ILESS/ULBRA.Mestranda em Direito pela Universidade Federal do Pará (Mestrado Interinstitucional UFPA/FIT/ULBRA)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

RÊGO, Márcia Cristina Santos. A proteção da pessoa portadora de deficiência pelo Estado brasileiro. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 9, n. 224, 17 fev. 2004. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/4834. Acesso em: 23 dez. 2024.

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