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Justificação interna e externa das decisões judiciais no novo CPC

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Agenda 31/05/2016 às 11:23

6. CONCLUSÕES

Do desenvolvimento do tema, foram extraídas as seguintes conclusões:

1. O legislador processual civil de 2015 inovou em relação a outros diplomas legais ao estabelecer, de maneira detalhada, nos incisos do art. 489, § 1º, do novo CPC, os requisitos para que as decisões judiciais sejam consideradas fundamentadas.

2. Houve, porém, certa atecnia na redação legal de mencionado texto legal, seja em relação a alguns vocábulos, seja por não se pautar pelas diretrizes firmadas pela Teoria da Argumentação Jurídica, notadamente no que alude à justificação interna e à justificação externa das decisões judiciais. Se houvesse atentado para isto, não seriam necessárias tantas minúcias no texto legal, as quais mais confundem do que elucidam.

3. O excesso de detalhes e as impropriedades terminológicas no texto legal, em vez de contribuírem para o aprimoramento da fundamentação das decisões judiciais, podem dificultar seu cumprimento. Mais: podem abrir margem para argumentos sofísticos e recursos protelatórios sob a alegação de falta de fundamentação nas decisões judiciais.

4. Para impedir tais desvios e, ao mesmo tempo, cumprir os ditames legais, inicialmente, é essencial não confundir “explicação” e “justificação” da decisão judicial, ambos empregados no novo CPC. Explicação é algo interno do juiz e diz respeito ao processo decisório; diz respeito ao ato de decidir. Justificação, por outro lado, refere-se à exposição racional da decisão nos autos. O juiz somente está obrigado a justificar sua decisão nos autos, e não a explicá-la. 

5. A justificação das decisões judiciais se divide em justificação interna e justificação externa.

6. Justificação interna da decisão consiste na exposição do raciocínio silogístico da decisão. Para tanto, o juiz deve indicar a premissa maior (Direito); a premissa menor (Fato), a fim de ser aquilatar a possibilidade de inferência entre ambas em sede de conclusão (decisão). O método é dedutivo, portanto.

7. Na justificação externa da decisão, o magistrado deve demonstrar a veracidade das premissas adotadas na justificação interna. Não basta apontar premissas decisórias, é preciso demonstrar (justificar) a veracidade de cada uma delas.

8. Argumento consiste no conjunto de proposições (premissas) encadeadas entre si por inferências. Se a inferência (subsunção) entre as premissas for possível, diz-se que o argumento é válido. Se a inferência não for possível, diz-se que o argumento é inválido.

9. Para o argumento ser considerado válido e consistente, não basta a inferência (subsunção) entre as premissas. É preciso, inclusive, que as premissas sejam verdadeiras.

10. O que interessa para o Direito, quando se visa aferir a fundamentação da decisão judicial, é saber se foi demonstrada a validade ou não dos argumentos a partir de premissas verdadeiras. Se for possível a identificação das premissas fáticas e jurídicas, como também conhecer os argumentados empregados para justificar a veracidade de tais premissas, então a decisão será inteligível e passível de sindicância. Em suma: a decisão judicial será considerada fundamentada.


REFERÊNCIAS

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Notas

[1] Ao empregar os vocábulos “pré-compreensão” e “pré-juízo”, Gadamer quer destacar a perspectiva de mundo do sujeito; suas significações da realidade; sua recepção e compreensão da vida, motivadas, em grande medida, pelo meio que o cerca. Para Gadamer o ser humano é um ser histórico. De consequência, no ser adulto não há grau zero de interpretação (significação). Sempre existirão juízos prévios, “pré-conceitos” (conceitos pré-constituídos). Sobre este ponto, conveniente transcrever as palavras de Gadamer: “A compreensão implica sempre uma pré-compreensão que, por sua vez, é prefigurada por uma tradição determinada em que vive o intérprete e que modela seus preconceitos.” GADAMER, Hans-Georg. O problema da Consciência Histórica. Tradução de Paulo César Duque Estrada. 3ª ed. “In” Pierre Fruchon (Org.) Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 2006, p. 13. 

[2] Para o Realismo Jurídico Estadunidense o juiz primeiro decide e depois busca fundamentos jurídicos para conferir uma roupagem formal à sua decisão. Mais do que isso: o teor da decisão, em visão extremada e metafórica, é influenciada por aquilo que ele tomou no café da manhã, aspecto também conhecido como a “dieta do juiz”, e que procura realçar não só as preferências e opiniões do juiz na tomada de decisões, mas a repercussão de seu estado de ânimo no momento de decidir. Vem do Realismo Jurídico Estadunidense a frase “o Direito é aquilo que os Tribunais dizem”. Trata-se de uma corrente do pensamento jurídico que se desenvolveu no fim do Séc. XIX e primeira metade do Séc. XX, nos Estados Unidos. Teve como principais representantes John Chipmann Gray, Karl Llewellyn e Jerome Frank. COELHO, Luíz Fernando. Lógica Jurídica e Interpretação das Leis. Rio de Janeiro: Forense, 1979, p. 133-137.

[3] MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e Aplicação do Direito. 11ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1991, p. 59.

[4] A verdade consensual, nos termos ora propugnados, funda-se no pensamento de Jürgen Habermas. HABERMAS, Jürgen. Direito e Democracia. Entre facticidade e validade. Vol. 1. Tradução de Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1997.

[5] Sobre o Círculo Hermenêutico, Gadamer assinala: “(...) compreender é sempre um mover-se nesse círculo, e por isso é essencial o constante retorno do todo às partes e vice-versa”. GADAMER, Hans-Georg. Verdade e Método: traços fundamentais de uma hermenêutica filosófica. Tradução de Flávio Paulo Meuer. Petrópolis, RJ: Vozes, 1997, p. 297.

[6] De acordo com Robert Alexy: “os problemas ligados à justificação interna têm sido amplamente discutidos sob o nome de ‘silogismo jurídico’. Atualmente, há uma série de publicações em que se trata dos problemas relativos ao tema, aplicando-se os métodos da lógica moderna”. ALEXY, Robert. Teoria da Argumentação Jurídica. A Teoria do Discurso Racional como Teoria da Justificação Jurídica. Tradução de Zilda Hutchinson Schild Silva. São Paulo: Landy Editora, 2005, p. 218.

[7] É importante averbar que as expressões justificação interna e justificação externa devem ser creditadas a Jerzy Wrobléwski. WROBLÉWSKI, Jerzy. Sentido y hecho en el Derecho. Tradução de Iguartúa Salaverria. México: Fontamara, 2003, p. 52.

[8] COELHO, Fábio Ulhoa. Roteiro de Lógica Jurídica. 3ª ed. São Paulo: Max Limonad, 2000, p. 21.

[9] REALE, Miguel. Filosofia do Direito. 20ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 87 e 141-147.

[10] LAKATOS, Eva M. e MARCONI, Marina A. Metodologia Científica. São Paulo: Atlas, 1991, p. 47.

[11] CHALMERS, Alan Francis. What is this Thing Called Science? What is This Thing Called Science? 3ª ed. Brisbane: University of Queensland Press, 1999, p. 43.

[12] COELHO, Fábio Ulhoa. “Op.cit.”, p. 14.

[13] Conforme acentua Robert Alexy “para a fundamentação de uma decisão jurídica deve-se apresentar pelo menos uma norma universal”, daí por que se fala em método dedutivo. ALEXY, Robert, “Op. cit”, p. 219.

[14] Veja, a propósito, as palavras de Montesquieu sobre este tema: “O poder de julgar, tão terrível entre os homens, não estando ligado nem a uma certa situação nem a uma certa profissão, torna-se, por assim dizer, invisível e nulo.” (...) “Poderia acontecer que a lei, que é ao mesmo tempo clarividente e cega, fosse em certos casos muito rigorosa. Porém, os juízes de uma nação não são, como dissemos, mais que a boca que pronuncia as sentenças da lei, seres inanimados que não podem moderar nem sua força nem seu rigor.” MONTESQUIEU, Charles-Louis de Secondat, Baron de la Brède et de. De L’Esprit des Lois. Livre XI, Chapitre IV. Paris: Librairie Ch. Delagrave, 1892, p. 238 e 239.

[15] Norberto Bobbio critica essa postura. Afirma que, sob esse ponto de vista, a lei seria para o juiz como um prontuário que ele deveria se utilizar infalivelmente e do qual não poderia jamais se afastar. Haveria, pois, um verdadeiro “fetichismo da lei”, o que é incompatível com a realidade social.  BOBBIO, Norberto. Teoria do Ordenamento Jurídico. 10ª ed. Tradução de Maria Celeste Cordeiro Leite dos Santos. Brasília: UNB, 1999, p. 121.

[16] GRAU, Eros Roberto. Ensaio e discurso sobre a interpretação/aplicação do Direito. São Paulo: Malheiros, 2002, p. XXVIII.

[17] Segundo Robert Alexy: “na justificação interna deve ficar claro quais premissas devem ser justificadas externamente.“ ALEXY, Robert. Op. cit., p. 226.

[18] MACCORMICK, Neil. Legal Reasoning and Legal Theory. Oxford University Press, 1994, p. 68-72.

[19] Sobre este ponto, Larenz assim se pronuncia: “qualificamos de lacuna ‘oculta’ o caso em que uma regra legal, contra o seu sentido literal, mas de acordo com a teleologia imanente à lei, precisa de uma restrição que não está contida no texto legal. A integração de uma tal lacuna efetua-se acrescentando a restrição que é requerida em conformidade com o sentido.” LARENZ, Karl. Metodologia da Ciência do Direito. 5ª ed. Tradução José Lamego. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2009, p. 556.

[20]GRAU, Eros Roberto. “Op. cit.”, p. X.

[21] MACCORMICK, Neil.“Op.cit”, p. 93.

[22] Para a solução desse caso ficou estabelecido pela Corte Julgadora que, para a configuração de adultério, deve haver pelo menos duas pessoas fisicamente presentes e estas devem praticar ato sexual entre si. Além disso, não é necessário que haja interação entre esperma e óvulo respectivos. Dessa maneira, inseminação artificial não configura adultério. Não obstante o entendimento do Tribunal, a senhora MacLennan não conseguiu demonstrar que realizara inseminação artificial e o pedido de divórcio foi acolhido.  DWORKIN, Roger B. Limits: The Role of the Law in Bioethical Decision Making. Indiana University Press, 1996, p. 62

[23] KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. 6ª ed. Tradução de João Baptista Machado. São Paulo: Martins Fontes, 2000, p. 395.

[24] Preocupado com os riscos deste caráter subjetivo em aquilatar o justo, Herbert Wechsler adverte: “O que caracteriza as decisões judiciais, em contraste com os atos dos outros Poderes, é a necessidade de que sejam fundadas em princípios coerentes e constantes, e não em atos de mera vontade ou sentimento pessoal.” WECHSLER. Herbert. Towards Neutral Principles of Constitucional Law. Harvard Law Review. v. 73, n. 1, Nov. 1959, p. 10, “apud” BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e Aplicação da Constituição. 3ª ed. São Paulo: Saraiva, 1999, p. 273

[25] ALEXY, Robert. “Op. cit.”, p. 226.

[26] MACCORMICK, Neil.“Op.cit”, p. 93.

[27] Optou-se por não declinar o nome das partes por se tratar de aspecto irrelevante ao exame do tema.  De qualquer modo, o julgado é público e está disponível, na íntegra, na internet. BRASIL – Tribunal de Justiça do Paraná - 1ª Turma Recursal – Recurso nº 0000876-44.2012.8.16.0088/1 – Relator Leo Henrique Furtado Araújo. Curitiba, 24 de março de 2015.

[28] Para Richard Posner, nas decisões judiciais, “o objetivo apropriado do juiz é um resultado razoável, e não um resultado objetivamente certo.” POSNER, Richard. The Problems of Jurisprudence. Cambridge: Harvard University Press, 1993, p. 26.

Sobre o autor
José Ricardo Alvarez Vianna

Juiz de Direito no Paraná. Doutor pela Universidade Clássica de Lisboa. Mestre pela UEL. Professor da Escola da Magistratura do Paraná.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

VIANNA, José Ricardo Alvarez. Justificação interna e externa das decisões judiciais no novo CPC. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4717, 31 mai. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/48372. Acesso em: 4 dez. 2024.

Mais informações

Texto originalmente publicado na Revista Pensamento Jurídico. São Paulo, v. 7, n. 1, p. 113-129, dez. 2015.

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