6. CONTRATOS: COMPRA E VENDA E DIREITO DE PREFERÊNCIA
Ante as constantes mudanças, sob as quais o homem está sujeito, sejam elas de ordem econômica, social, profissional, pessoal, ou qualquer outra, os contratos de compra e venda de bens é muito comum na sociedade contemporânea.
Nesse cenário, é relevante observar que numa compra e venda de um bem, sob o regime de time sharing, mesmo que não haja uma fração ideal de espaço, há uma fração ideal de tempo, viabilizando-a perfeitamente.
Reza o art. 504 do Código Civil de 2002, que se um dos condôminos quiser dispor de sua cota parte, este deverá, obrigatoriamente, oferecê-la a outro consorte, sob pena de nulidade do ato, nos termos da lei.
Art. 504. Não pode um condômino em coisa indivisível vender a sua parte a estranhos, se outro consorte a quiser, tanto por tanto. O condômino, a quem não se der conhecimento da venda, poderá, depositando o preço, haver para si a parte vendida a estranhos, se o requerer no prazo de cento e oitenta dias, sob pena de decadência.
Assim, na multipropriedade, na condição de condomínio, interpretada de forma analógica, ante a lacuna na legislação pátria, cada um possui sua cota parte. Neste cenário, o direito/obrigação de preferência ao outro co-proprietário é perfeitamente cabível, podendo incidir as penalidades legais sobre a venda (disposições do art. 504 do CC/02, supra).
Acaso nenhum dos outros proprietários se interesse, entende-se que a venda a terceiros pode ser concluída. O que ocorrerá, é que o comprador deverá se submeter ao regime do time sharing, assim como o vendedor o era.
7. DIREITO COMPARADO
O fenômeno da multipropriedade é comum em todo o mundo, onde é tratado das mais diversas maneiras.
Fazendo referência a levantamento realizado por Marcelo Augusto Santana de Melo, registrador imobiliário no município de Araçatuba/SP e especialista em Direito imobiliário pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC/MG), é possível verificar as distintas conotações de direitos e o tratamento jurídico direcionado a tal instituto, sendo agrupado no campo das obrigações, contratos e direitos reais. Vejamos:
País |
Natureza jurídica |
França |
A noção de multipropriedade se afasta completamente da noção de propriedade, configurando em um esquema societário e obrigacional. |
Itália |
Acionária e co-propriedade |
Áustria |
Direito real de uso de bens imóveis a tempo parcial |
Inglaterra |
Direito de uso de natureza contratual |
Portugal |
Direito real de habitação periódica |
Espanha |
Direito de natureza jurídico-real, embora com um fato diferenciado que é tempo de uso. |
Estados Unidos |
Sem distinção sobre a natureza jurídica, mas com ampla proteção dos adquirentes, prevalecendo a forma condominial. |
8. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante de todo o exposto, conclui-se que o instituto da multipropriedade, apesar de não regulamentado no nosso ordenamento jurídico, é uma opção cada vez mais frequente para aquisição de imóveis (pelo quesito tempo), principalmente em propriedades destinadas ao lazer, férias, turismos e afins.
Contudo, percebemos que como toda relação pessoal ou jurídica existente na vida em sociedade, poderá ocorrer conflito de interesses entre as pessoas. Diante disso, como resolvermos um possível conflito de interesse entre pessoas com direitos iguais, em uma situação jurídica não devidamente regulamentada?
Nossa proposta de solução para tal problema é justamente usar das normas que regem o instituto do condomínio, naquilo que for compatível, eis que devidamente regulamentado em nosso ordenamento para os possíveis conflitos entre os múltiplos proprietários.
Vimos que apesar dos institutos não serem os mesmos, uma vez que no condomínio a divisão se dá limites territoriais, e o uso, o gozo e a disposição da propriedade ocorrem simultaneamente entre todos os condôminos e na multipropriedade imobiliária a divisão ocorre de forma temporal, a aplicação das mesmas normas é possível, por analogia, o instituto que mais se assemelha com essa nova forma de aquisição de propriedade é o condomínio.
Assim, sempre que houver algum conflito de interesse relativo à multipropriedade imobiliária e enquanto o legislador não regulamenta o instituto, não pode o Judiciário deixar de julgar tais demandas, pois iria contra um dos princípios jurisdicionais fundamentais para a efetiva realização da justiça, qual seja, o princípio da inafastabilidade.
Dessa forma, toda norma relativa ao condomínio, no que tange às obrigações entre os multiproprietários, à compra e venda das respectivas parcelas temporais da propriedade, do dever de preferência, das benfeitorias realizadas no bem, dos critérios de locação, enfim, todo direito de uso, gozo e disposição do seu tempo na propriedade, poderá se aplicar a multipropriedade imobiliária, naquilo que não for contrário ao instituto em estudo.
9. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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