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Movimentos sociais à luz dos princípios fundamentais

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Agenda 23/06/2016 às 13:52

Os movimentos sociais contemporâneos são expressão da pluralidade. As suas novas formas de organização e articulação tendem a ser cada vez menos rígidas e hierarquizadas e favorecidas pelas redes de comunicação digital.

1 INTRODUÇÃO

A sociedade se constrói e se transforma continuamente e por si mesma, mas as mudanças demoram e muitas só acontecem quando há mobilização. Transformações na ordem estabelecida são geralmente reivindicadas por grupos que se sentem, por algum motivo, desprivilegiados no contexto social em que estão inseridos. Essas reivindicações, quando perfilhadas coletivamente e com algum nível de organização, compõem a estrutura dos movimentos sociais.

Embora estejam relacionados de modo que nem sempre seja possível identificar onde começa um e termina o outro, sociedade e Estado não se confundem[1]. A primeira, mais dinâmica, é mutável e mutante ao passo que o último, menos flexível, procura oferecer estabilidade através da ordem.

Os movimentos sociais na contemporaneidade não se revestem apenas de ambições políticas, pois eles afetam a sociedade como um todo. As ações coletivas constituem também campo de atividades e experimentação social e nem todos os resultados são previsíveis. Trazendo a marca do antagonismo, os movimentos sociais, independentemente do resultado de suas ações[2], alteram a lógica das sociedades complexas.

Segundo Gohn (2011, p.336), “eles expressam energias de resistência ao velho que oprime ou de construção do novo que liberte. Energias sociais antes dispersas são canalizadas e potencializadas por meio de suas práticas em “fazeres propositivos”.

As práticas dos movimentos sociais não passam – e nem pretendem passar – despercebidas. A visibilidade é fundamental para o seu potencial transformador. Contudo, essas práticas podem causar prejuízos ou, no mínimo, desconfortos, o que leva a sociedade e a grande mídia a uma tendência de maniqueização e “criminalização” dos coletivos.

O que se pretende neste trabalho é identificar quais as características dos movimentos sociais na contemporaneidade e avaliar se sua atuação e seus objetivos são/estão legitimados pela Constituição da República brasileira.


2 MOVIMENTOS SOCIAIS E SEUS PARADIGMAS NA CONTEMPORANEIDADE

2.1 CONCEITO

Numa acepção reducionista, os movimentos sociais podem ser definidos como quaisquer ações sociais coletivas reivindicativas de alguma mudança. São muitas e variadas as abordagens sobre o tema, mas, em geral todas referem à organização e ao engajamento de um determinado grupo de pessoas com interesses comuns, com o objetivo de definir e orientar formas de atuação para a realização desses interesses.

Alain Touraine[3] observa que a ação dos movimentos sociais não é necessariamente dirigida contra o Estado e não pode ser identificada como uma ação política para a conquista do poder; trata-se uma ação coletiva contra um adversário estritamente social.

Nesse mesmo sentido, Machado (2007, p.252) afirma que:

Tais formas de ação coletiva têm como objetivo, a partir de processos freqüentemente (sic) não-institucionais de pressão, mudar a ordem social existente, ou parte dela, e influenciar os resultados de processos sociais e políticos que envolvem valores ou comportamentos sociais ou, em última instancia, decisões institucionais de governos e organismos referentes à definição de políticas públicas.[4]

Gohn também destaca o caráter sociopolítico e cultural dos movimentos sociais, sendo estes formas de expressão das mais diversas demandas. Ela observa, ainda, que essas demandas não são necessariamente de natureza reativa, mas podem ser fruto de uma reflexão sobre a própria experiência.[5]

De um modo geral, os movimentos sociais caracterizam-se pela identidade entre seus atores e a consequente solidariedade entre eles, pela demanda que gera a sua mobilização e, por fim, pela existência de um opositor e o desenvolvimento de um conflito. Um movimento social não pode se organizar sem uma definição consciente da identidade, mas a formação do movimento pode preceder essa consciência.

A ação coletiva precisa também identificar seu adversário dentro do modelo cultural central da sociedade considerada[6]. É daí que nasce o conflito.

O conflito, porém, não deve ser compreendido simplesmente como desestabilizador da ordem social. Na visão de Touraine, a sociedade deve ser sempre representada como um campo de conflito criativo. O conflito é o coração da produção da sociedade por ela mesma[7].

 Castells também compreende o conflito como produtor da própria sociedade. Para ele, a “verdadeira configuração do Estado e de outras instituições que regulam a vida das pessoas depende dessa constante interação entre poder e contrapoder.”[8] É preciso ressaltar aqui que o poder referido não se resume ao poder político, uma vez que, segundo o autor, a construção de significados na mente das pessoas é que determina a configuração das de instituições, valores e normas de organização social.

Melucci também retira a política do eixo central dos movimentos sociais: “A confrontação com o sistema político e com o Estado é apenas um fator mais ou menos importante na ação coletiva”.[9]

Assim, em resumo, um movimento social pode ser definido a partir de sua característica de ação coletiva na qual a identidade/solidariedade, o conflito e a ruptura com determinada lógica social se inter-relacionam.

2.2 CARACTERÍSTICAS E ESPECIFICIDADES DOS MOVIMENTOS SOCIAIS NA CONTEMPORANEIDADE

No mundo contemporâneo é possível identificar sociedades cada vez mais complexas e multiculturais. Surgem os contornos de uma ordem nova e diferente em que os indivíduos sentem-se cada vez mais à vontade para expressar e afirmar sua individualidade dentro de um contexto plural. Assim, enfraquecem-se as tradições e modificam-se costumes, hábitos e expectativas e a conformação da sociedade vai sendo remodelada a partir dela mesma.

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A defesa da cidadania passa pela transversalidade de direitos e inclui questões étnicas, de gênero, de classe, de opções políticas e de valores (igualdade, liberdade, diversidade, sustentabilidade social e ambiental etc.), entre outras pautas. É a modernidade reflexiva, que estimula a autoconfrontação transformadora.

Até um passado ainda muito próximo (meados dos anos 70), os movimentos sociais eram analisados predominantemente sob o enfoque marxista, apresentados como expressão da luta de classes resultante das contradições estruturais do sistema de produção capitalista, voltados para a ruptura das condições de opressão e emancipação econômica das classes trabalhadoras [10].

Mas nas sociedades contemporâneas, as contradições estruturais não se restringem ao sistema econômico-industrial; como observa Melucci, “eles afetam a identidade pessoal, o tempo e o espaço na vida cotidiana, a motivação e os padrões culturais da ação individual”.[11] Desse modo, a abordagem marxista revela-se insuficiente para contextualizar e explicar as ações coletivas, que passaram a lutar por diferentes causas.

Ainda segundo Melucci,

Os atores nos conflitos são cada vez mais temporários e sua função é revelar os projetos, anunciar apara a sociedade que existe um problema fundamental numa dada área. Eles têm uma crescente função simbólica [...].Eles não lutam meramente por bens materiais ou para aumentar sua participação no sistema. Eles lutam por projetos simbólicos e culturais, por um significado e uma orientação diferentes da ação social. Eles tentam mudas as vidas das pessoas, acreditam que a gente pode mudar nossa vida cotidiana quando lutamos por mudanças mais gerais na sociedade. [12]

A formação de movimentos sociais com novas pautas coincide com o fortalecimento da experiência democrática em sociedades ocidentais capitalistas, composta por forças sociais heterogêneas, e é fruto do desenvolvimento da reflexividade na modernidade. Cada indivíduo ocupa múltiplas posições de sujeito nas diversas relações sociais que estabelece. Essas relações estão ligadas não apenas aos meios de produção, mas também a gênero, etnia, regionalidade, entre outros. Cada uma dessas relações permite múltiplas construções e o indivíduo não pode ser reduzido a nenhuma delas.

Tais mudanças históricas na direção da pluralidade levam “cada ator social a lutar simultaneamente pelo bem comum e pela defesa de interesses particulares” (MACHADO, 2007, p.258). As práticas sociais cotidianas adquirem, assim, significação política e facilitam a formação de pequenos grupos que compartilham de valores vinculados aos direitos das minorias, à liberdade de expressão e à diversidade. A construção de novas identidades[13] e valores, portanto, também pode ser tomada como uma característica essencial dos chamados novos movimentos sociais.

Segundo Gohn,

O paradigma dos Novos Movimentos Sociais parte das explicações mais conjunturais, localizadas em âmbito político ou dos microprocessos da vida cotidiana, fazendo recortes na realidade para observar a política dos novos atores sociais. As categorias básicas desse paradigma são: cultura, identidade, autonomia, subjetividade, atores sociais, cotidiano, representações, interação política etc. Os conceitos e noções analíticas criadas são: identidade coletiva, representações coletivas, micropolítica do poder, política de grupos sociais, solidariedade, redes sociais, impactos das interações políticas etc. (2007, p. 15)

Assim, mais do que por poder político, os novos movimentos sociais lutam por campos de autonomia. Essas lutas são marcadas principalmente pela solidariedade e pela participação direta e suas demandas têm forte carga simbólica. Os atores dos movimentos sociais rompem com a serialidade e consciência reificada[14], construindo relações de contrapoder[15].

Na era da sociedade em rede, os movimentos sociais com suas pautas diversificadas se articulam e se conectam uns com os outros – com base e seus denominadores comuns – buscando alcançar visibilidade, produzir impacto na esfera pública e obter conquistas concernentes a direitos e cidadania.

Nesse contexto, se reforçam mutuamente e ajudam a constituir legitimamente mecanismos de pressão para o aperfeiçoamento das instituições democráticas.

2.2.1 Novas formas de articulação e organização: as modernas tecnologias de  informação

Como visto, no final do século XX, os movimentos sociais assumiram relevo como atores político-sociais na busca pela afirmação da democracia, portadores legítimos de reivindicações de diferentes setores da sociedade civil.

A mudança nas ideologias que inspiram os movimentos – agora plurais e não mais restritas às questões do proletariado – afetaram também a sua forma de articulação. Os sindicatos perderam o protagonismo e as relações hierárquicas também se enfraqueceram, conforme explica Gohn:

A mudança do eixo das demandas para um patamar mais cultural refletiu-se na organização dos Novos Movimentos Sociais fazendo com que se apresentem mais descentralizados, sem hierarquias internas, com estruturas colegiadas, mais participativos, abertos, espontâneos e fluidos. As lideranças continuam a ter importante papel no esquema de análise das correntes de opiniões. Não há lugar nesta estrutura para os velhos lideres oligárquicos, que se destacavam-se por sua oratória, por seu carisma e poder sobre seus liderados. Disto resulta que os movimentos passaram a atuar mais como redes de troca de informações e cooperação em eventos e campanhas. Mas há também conflitos entre eles, internos e externos, e este aspecto, na teoria dos Novos Movimentos Sociais, é visto como parte do processo de construção da identidade. Melucci fala da pluralidade de orientações presente em cada movimento e Taylor e Wittier (1992) afirmam que a preocupação com a identidade coletiva decorre do crescente aumento da fragmentação e pluralidade da realidade social, sendo portanto quase uma estratégia para construir uma unidade do possível. (2007, p.126)

Os novos movimentos sociais, portanto, tendem a ser cada vez mais horizontais, menos hierarquizados, mais flexíveis e com múltiplos nós, facilitados pela comunicação digital.

Atualmente, as ferramentas tecnológicas potencializam enormemente a articulação e organização das ações coletivas pelos meios virtuais. A informação se prolifera rapidamente e de forma autônoma pela rede, alcançando milhões de pessoas conectadas. Para ilustrar as possibilidades abertas pela comunicação digital, tomem-se dois exemplos, distantes entre si mais de vinte anos no tempo: Primeiro, o projeto pioneiro da cidade de Santa Monica, o PEN (Public Electronic Network). A rede, criada em 1989, destinava-se primeiramente a conectar os moradores à Prefeitura, fornecendo informações e respondendo a perguntas, mas a maior utilização pelos moradores foi da área de conferência, onde era possível discutir os problemas da cidade, antes da tomada de decisão pela administração pública. O fórum gerou alguns resultados positivos decorrentes da reivindicação coletiva, como, por exemplo, a instalação de chuveiros e armários para que as pessoas sem-teto pudessem ter acesso a banho e roupas limpas e, assim, tentar minimizar a dificuldade de encontrar emprego.[16] O segundo exemplo, bem mais recente, foi a divulgação na rede da autoimolação de Mohamed Bouazizi, em dezembro de 2010 na Tunísia, como forma de protesto contra os constantes abusos de agentes do governo. A divulgação do protesto desencadeou uma série de manifestações de solidariedade, facilitadas pela comunicação estabelecida através de redes sociais como Twitter, YouTube e Facebook e reprimidas com violência. O fato acabou se tornando o gatilho da onda de protestos e lutas sociais posteriormente chamadas de primavera árabe.[17]

Percebe-se, destarte, que a tecnologia da informação se torna um dos principais instrumentos, se não o principal, de articulação dos novos movimentos sociais[18]. É preciso destacar, porém, esse caráter de instrumentalidade, uma vez que a utilização das redes não é um fim em si mesma. Conforme sinaliza Castells,

o espaço público dos movimentos sociais é construído como um espaço híbrido entre as redes sociais da internet e o espaço urbano ocupado: conectando o ciberespaço com o espaço urbano numa interação implacável e constituindo, tecnológica e culturalmente, comunidades instantâneas de práticas transformadoras. (2013, p.20)

Embora na sociedade globalizada e conectada o horizonte de muitos movimentos sociais seja também global (como acontece com questões relativas à sustentabilidade, igualdade de gênero, entre outras), também existe uma forte preocupação com o espaço circundante, como acontece, por exemplo com a questão da violência e da mobilidade urbana.

Desse modo, a ocupação do espaço público é imprescindível para a visibilidade necessária, bem como para despertar empatia[19] e promover o processo de consciência, através da exposição das contradições latentes.

2.2.2 A ocupação dos espaços urbanos

Para Touraine, os movimentos sociais nas sociedades de mercado são movimentos urbanos; sua base é a cidade ou região e seu principal objetivo a liberdade do cidadão[20] e, portanto, dos habitantes e da cidade contra o senhor, o príncipe ou o mercado (1978, p.136). Desse modo, ensina Castells que os movimentos sociais da atualidade, embora “se iniciem nas redes sociais da internet, eles se tornam um movimento ao ocupar o espaço urbano, seja por ocupação permanente de praças públicas seja pela persistência das manifestações de rua” (2013, p.164).

Em outras palavras, as redes da internet não são suficientes para a atuação do movimento social, é preciso que haja sua interação com o espaço urbano para que seja externada sua força transformadora. A cidade é o locus ideal para isso, pois, como sinaliza Harvey, “vivemos, na maioria, em cidades divididas, fragmentadas e tendentes ao conflito” (2013, p.49) e “os desenvolvimentos desiguais traçam o cenário para o conflito social” (ibidem, p. 51). Para ilustrar, aduz o autor:

Foi nas ruas que os tchecos se libertaram em 1989 de opressivas formas de governança; foi na Praça da Paz Celestial que o movimento estudantil chinês buscou estabelecer uma definição alternativa de direitos; foi através de massivos comícios que a Guerra do Vietnã foi forçada a terminar; foi nas ruas que milhões protestaram contra o prospecto de uma intervenção imperialista norte-americana no Iraque em 15 de fevereiro de 2003; foi nas ruas de Seattle, Gênova, Melbourne, Quebec e Bangkok que os direitos inalienáveis à propriedade privada e da taxa de lucro foram desafiados. (ibidem, p.58)

Segundo Gladwell (2010), embora úteis, as redes sociais da internet não são capazes de sustentar movimentos com grande poder de transformação. Para ele, os vínculos estabelecidos através das redes são vínculos fracos, o que permite que essas conexões sejam fonte de informação e inovação mas não de verdadeiro ativismo. Para ele, ainda, a ausência de hierarquia que existe nas articulações promovidas nas plataformas digitais também colabora para que esses vínculos sejam afrouxados, mas são os vínculos fortes que ajudam os militantes a “a perseverar diante do perigo”. Diz ele:

[o ativismo da internet] Transfere nossas energias das entidades que promovem atividades estratégicas e disciplinadas para aquelas que promovem flexibilidade e adaptabilidade. Torna mais fácil aos ativistas se expressarem e, mais difícil, que essa expressão tenha algum impacto.

Vê-se, pois, que as cidades é que são o espaço mais propício à mobilização, pelas suas inúmeras possibilidades de interação, aproximação e visibilidade. Ao ocupar a cidade, os cidadãos experimentam a sensação do empoderamento – causada pela indignação que virou ação – e transformam o espaço público em “um espaço de deliberação que, em última instancia, se torna um espaço político” (CASTELLS, 2013, p. 20).

2.2.3 A violência nas manifestações e a criminalização dos protestos

Quando a indignação dos manifestantes sai da rede e ganha as ruas, por mais que se busque uma cultura de paz, a violência é sempre uma possibilidade a ser considerada. E, quando há a necessidade do enfrentamento, é inevitável.

Quando “coerção e intimidação, baseadas no monopólio estatal de exercer a violência, são mecanismos essenciais de imposição da vontade dos que controlam as instituições da sociedade”[21], o conflito se instala, pois os movimentos são, em sua essência, emocionais.

Segundo Harvey, “na história urbana, calma e civilidade são exceções, e não a regra. A única pergunta interessante é se os resultados são criativos ou destrutivos. Normalmente são ambos: a cidade tem sido por muito tempo um epicentro de criatividade destrutiva.” (2013, p.51)

Para Silvia Viana, a violência, no contexto do protesto, é legítima. Para a autora, a manifestação pacífica, desengajada, é “protesto sem protesto”, uma subversão na qual o meio se torna o próprio fim. A autora, inclusive, ironiza a proposta de restringir o espaço das manifestações, no Rio de Janeiro, ao sambódromo:

Rezava o script que manifestação só é legítima quando não atrapalha, do contrário é violência. E a lógica da ordem parecia tão impecável que já se debatia seriamente a possibilidade de trancafiar quaisquer formas de ato público no sambódromo da cidade. (2013, p.96).

O efeito provocado pela violência nos protestos depende muito da sua apropriação pela mídia. A ênfase colocada na repressão policial – longa manus do Estado – desperta a solidariedade da sociedade aos manifestantes. Quando, entretanto, o foco é direcionado às práticas dos movimentos, o efeito é inverso.

Como adverte Gladwell (2010), a opção pela não violência é arriscada:

Boicotes, protestos e confrontos não violentos – armas preferenciais do movimento pelos direitos civis – são estratégias de alto risco. Deixam pouca margem para conflito e erro. No momento em que um único manifestante abandona o roteiro e reage a uma provocação, a legitimidade moral de todo o protesto fica comprometida.

Como dito alhures, quando há necessidade de enfrentamento, a violência é inevitável. Como as manifestações populares costumam afetar a ordem pública, seja pela obstrução do trânsito, seja pela ocupação de um prédio público ou outras hipóteses, o enfrentamento está mais para regra do que para exceção. A forma como esses confrontos são transmitidos pela grande mídia geralmente tendem a marginalizar os movimentos sociais e seus líderes.[22] Somando-se a isso, os incômodos causados pelas ações coletivas produzem, muitas vezes, o sentimento de que as lutas ostensivas por um direito são um crime contra a ordem social. Dessa forma, a responsabilização pelos atos de intransigência, intolerância e violência recai sempre sobre os movimentos que passam a carregar a pecha de arruaceiros, desordeiros e criminosos.

Vale aqui lembrar Thoreau: “Todos reconhecem o direito à revolução, ou seja, o direito de negar lealdade e de oferecer resistência ao governo sempre que se tornem grandes e insuportáveis a sua tirania e ineficiência.” (1999, p.9). O problema reside na compreensão dos limites dessa resistência.

Sobre a autora
Paloma Braga Araújo de Souza

Possui mestrado em Direito pela Universidade Federal da Bahia (2016), especialização em Direito do Estado pelo Juspodivm / Unyahna (2007) e é aluna especial do doutorado em Direito pela Universidade Federal da Bahia. Atualmente é membro do Instituto Brasileiro de Direito de Família e conselheira seccional da Ordem dos Advogados do Brasil, Seção Bahia. Sócia do Braga Cartaxo Carvalho & Matos Escritório de Advocacia. Professora na Faculdade Apoio/Unifass e de cursos preparatórios para concursos.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SOUZA, Paloma Braga Araújo. Movimentos sociais à luz dos princípios fundamentais. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4740, 23 jun. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/49836. Acesso em: 22 dez. 2024.

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