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Da importação de partes, peças e componentes de mercadorias sujeitas a medidas de antidumping

Diante da decretação de medidas antidumping, algumas empresa optam por importar partes, peças e componentes dos produtos sujeitos a tais medidas para montá-los no Brasil, surgindo a dúvida sobre a legalidade de tal prática.

O dumping é caracterizado quando determinada empresa exporta para o Brasil um produto com preço inferior àquele que esta empresa exportadora pratica quando comercializa este mesmo produto dentro de seu país (mercado interno), o que caracterizaria, em última análise, uma prática desleal de comércio, conforme inclusive alerta o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC).

Assim, após o término das investigações, restando caracterizado o dumping, são impostas as medidas antidumping no intuito de proteger o mercado interno desta prática abusiva.

Porém, existem algumas operações que buscam frustrar a eficácia das medidas antidumping vigentes. Esta prática é chamada de circunvenção e se caracteriza quando uma empresa nacional realiza a importação de um dos seguintes produtos (art. 121 do Decreto 8058/2015):

I - partes, peças ou componentes originários ou procedentes do país sujeito a medida antidumping, destinadas à industrialização, no Brasil, do produto sujeito a medida antidumping;

II - produto de terceiros países cuja industrialização com partes, peças ou componentes originários ou procedentes do país sujeito a medida antidumping resulte no produto sujeito a medida antidumping; ou

III - produto que, originário ou procedente do país sujeito a medida antidumping, apresente modificações marginais com relação ao produto sujeito a medida antidumping, mas que não alteram o seu uso ou a sua destinação final.

Ao se constatar a ocorrência de uma destas três práticas, a CAMEX tem a opção de estender a estas operações as medidas antidumping por meio de ações antincircunvenção.

Essa possibilidade é trazida pelo art. 10-A da Lei 9019/1995:

Art. 10-A.  As medidas antidumping e compensatórias poderão ser estendidas a terceiros países, bem como a partes, peças e componentes dos produtos objeto de medidas vigentes, caso seja constatada a existência de práticas elisivas que frustrem a sua aplicação.

Porém, verifica-se que não se trata de uma medida automática (“poderão ser”), sendo que estas medidas só serão tomadas após uma análise prévia pela CAMEX, que analisará as seguintes informações, de acordo com o art. 123 do Decreto 8058/2013:

Art. 123.  A existência de circunvenção será determinada pela análise conjugada de informações relativas tanto aos países de origem das exportações dos produtos ou das partes, peças ou componentes quanto aos produtores ou exportadores destes países, ou ainda aos importadores brasileiros de partes, peças ou componentes, nos termos do art. 121.

§ 1º A análise de informações relativas aos países de origem das exportações dos produtos ou das partes, peças ou componentes a que faz referência o caput será feita para os países como um todo, de maneira a verificar se:

I - em razão de alterações nos fluxos comerciais destes países ocorridas após o início de investigação original ou de revisão, a eficácia de uma medida antidumping vigente estiver sendo frustrada, avaliada em termos do preço e da quantidade importada do produto objeto da revisão; e

II - as alterações nos fluxos comerciais destes países ocorridas após o início de investigação original ou revisão são decorrentes de processo, atividade ou prática sem motivação ou justificativa econômica outra do que frustrar a eficácia de medida antidumping vigente.

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Especificamente com relação à importação de partes, peças e componentes, para a caracterização da circunvenção é necessário que se constate as seguintes situações (art. 123, §2º, inc. I do Decreto 8058/2013):

a) a revenda, no Brasil, do produto sujeito à medida antidumping industrializado com partes, peças ou componentes originários ou procedentes do país sujeito à medida antidumping se deu a valores inferiores ao valor normal apurado para o produto sujeito a medida antidumping;

b) as partes, as peças ou os componentes originários ou procedentes do país sujeito à medida antidumping não apresentam utilização distinta da industrialização do produto sujeito a medida antidumping;

c) o início ou o aumento substancial  da industrialização no Brasil ocorreu após o início da investigação que resultou na aplicação de medida antidumping; e

d) as partes, as peças ou os componentes originários ou procedentes do país sujeito a medida antidumping representam sessenta por cento ou mais do valor total de partes, peças ou componentes do produto industrializado no Brasil.

Ressalte-se, ainda, que o §3º do art. 123 estabelece que não se caracterizará circunvenção quando o valor agregado nas operações de industrialização das partes, peças e componentes importados for superior a 35% do custo de manufatura deste produto.

É importante notar que se tem notícia de apenas duas investigações de caso de circunvenção pela Secretaria de Comércio Exterior, ambas ocorridas no ano de 2011:

1) uma relacionada à importação de cobertores de fibra sintética da China, pois existia a suspeita de que se estava importando rolos de tecido para a fabricação do cobertor e também existia a suspeita de que os cobertores da China estavam sendo vendidos para o Brasil por meio do Paraguai e do Uruguai; e

2) outra de importação de partes e componentes para a fabricação de calçados.

Verifica-se, portanto, que a medida antidumping decretada em relação à importação de um produto não é estendida, automaticamente, para a importação de partes e peças para a industrialização deste produto em território nacional. É necessária uma análise previa dos órgãos competentes e, caso estes entendam que se trata de prática de circunvenção, decretarão medidas anticircunvenção com relação à importação destas partes e peças.

Sobre a autora
Milene Regina Amoriello Spolador Ribeiros

advogada atuante nas áreas tributária e empresarial na cidade de Curitiba (PR), vogal do Conselho de Contribuintes e Recursos Fiscais do Estado do Paraná nos mandatos 2011/2013 e 2013/2015, graduada em direito pela Faculdade Estadual de Direito do Norte Pioneiro e pós graduada em Direito Empresarial com ênfase em Direito Tributário pela PUC/PR, autora de artigos jurídicos e pareceres, coordenadora da obra “Guia Prático Alianças Estratégicas com empresas Brasileiras: uma visão legal”.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

RIBEIROS, Milene Regina Amoriello Spolador. Da importação de partes, peças e componentes de mercadorias sujeitas a medidas de antidumping. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4809, 31 ago. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/51488. Acesso em: 22 dez. 2024.

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