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O processo penal e o princípio da dignidade da pessoa humana

A relação do Processo Penal e o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana com o filme "O Poder e a Lei".

1. INTRODUÇÃO

O presente artigo tem como objetivo relacionar a Dignidade Humana ao Processo Penal, trazendo como base o filme “O poder e a Lei”, o qual narra a historia de um advogado criminal Mickey Haller, que passou a maior parte de sua carreira defendendo uma variedade de criminosos comuns.

O princípio da Dignidade da Pessoa Humana é assegurado a todo ser humano, apenas pelo fato de sua existência, ou seja, tão-somente ter vida o Humana é dotado de direitos que devem ser preservados, a dignidade constitui um valor universal, sem observar as diferenças físicas, psicológicas, intelectuais e até mesmo as condutas de cada um, sendo estas, erradas ou certas.

No filme mencionado, a dignidade Humana mostra-se violada em vários momentos, como por exemplo: No momento em que o inocente Jesus Martines, que é preso injustamente pelo crime de homicídio, cometido contra uma garota de programa e o mesmo tem que assumir a autoria do crime ou caso contrario, seria sujeito a pena de morte.

A partir do momento que se submete um inocente ao sistema carcerário, retirando assim o direito à liberdade, o direito de ir e vir, ferindo sua honra, está golpeando cruelmente a Dignidade da pessoa Humana.


2. PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA

O homem só por fazer parte do gênero humano, já é possuidor de dignidade, é uma qualidade inerente ao indivíduo decorrente da própria condição de ser humano. A dignidade constitui um valor universal, está acima de qualquer diversidade sócio cultural, não importando as diferenças físicas, psicológicas, intelectuais ou mesmo econômicas para que um indivíduo seja detentor de igual dignidade. E o respeito à dignidade constitui um princípio fundamental.

No Brasil, a Constituição Federal de 1988 surgiu numa conjuntura pós ditadura e de abertura política em que se buscava a realização e a defesa de direitos fundamentais em toda sua extensão. Com ela surge então o Estado Democrático de Direito, que visa a garantia dos direitos sociais e individuais, bem como o desenvolvimento, a igualdade, o bem estar e a justiça social. Desse modo, a dignidade da pessoa humana consagrou-se como princípio máximo, como fundamento da República, sendo introduzido no art. 1º, III da Carta Magna.

Art. 1º - A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamento:

III – a dignidade da pessoa humana;

É na própria Constituição que o processo penal vai alcançar seu alicerce, uma vez que nela estão legitimados os princípios do regime adotado por toda a nação, podendo-se dizer que o sistema brasileiro revela uma diretriz inequívoca de valorização da pessoa humana. No que tange à descrição dos delitos e à aplicação das penas, busca-se resguardar a integridade do indivíduo como pessoa, no entanto, é no processo que essa preocupação se revela mais abrangente visto que no processo penal o que se julga não é somente um fato delituoso, mas também uma pessoa.

Considerando essa ideia, o que se tem hoje em dia é o oposto, o Direito Penal e o processo penal tem funcionado como mecanismos de coisificação do homem, negando a condição de ser humano ao acusado e tratando-o como verdadeiro objeto do processo.

No processo penal brasileiro, onde vigora o superado dogma da busca da verdade real, de origem totalitária, a pessoa humana é transformada em um verdadeiro objeto do processo, com prisões preventivas que visam muito mais uma antecipação de pena do que a segurança do Juízo, sob as estritas condições do artigo 312 do Código de Processo Penal.

A dignidade da pessoa humana, valor básico embasador de todos os outros direitos humanos, vem sendo incessantemente violada em prol de uma tão sonhada segurança e da pela busca verdade real na esfera do processo penal. Dentro dessa linha de raciocínio, imprescindível se faz reconhecer que os direitos existenciais componentes da dignidade humana, pertencem aos indivíduos na mesma proporção. Assim sendo, não há que se falar em mais ou menos dignidade, ou seja, um homem não perde a sua dignidade, por pior que seja a sua conduta.


3. A EVOLUÇÃO DA PROVA PENAL

Na busca pela apuração do delito, sua autoria e materialidade, a prova é instrumento necessário para que sejam provados os fatos alegados no processo. A prova tem como principal finalidade a busca pela verdade real e o convencimento do juiz. A apresentação dos fatos trazida pelo autor ao processo e a resistência réu à pretensão do autor, é definido como conjunto de atos ordenados e legalmente constituídos, ou seja, prova.

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O direito penal define os crimes e suas respectivas penas, enquanto o direito processual penal coordena a forma como o fato típico será provado pelas partes do processo. Assim sendo, a relevância da prova pode ser visualizada desde a antiguidade, e pela necessidade do homem de viver em sociedade, nasce o direito penal para promover uma coletividade pacífica e harmônica.

Como exemplo de prova utilizada antigamente, na época medieval era utilizada a ordáliaque significa “sentença divina”. A sua utilização tinha como finalidade a investigação da inocência ou culpa do acusado. As partes eram submetidas a testes de resistência, que hoje em dia seriam definidos como tortura e a que saísse ilesa seria considerada abençoada pelo divino, logo considerada inocente. A exemplo de ordáliaque eram aplicadas, era a marcação com ferro e brasa, ingestão de substâncias tóxicas, combate corpo a corpo, entre outras.

Na Babilônia, no Código de Hamurábi, no capítulo I afirmava que:

Art. 1º - Se alguém acusa um outro, lhe imputa um sortilégio, mas não pode dar prova disso, aquele que acusou deverá ser morto.Art. 3º - Se alguém em um processo se apresenta como testemunha de acusação e não prova o que disse, se o processo importa perda de vida, ele deverá ser morto.

Esses são alguns exemplos de como a prova existe desde sempre e a sua importância é única para a eficácia do direito penal e processual penal. Porém é possível perceber que todos esses exemplos vão de encontro ao que o ordenamento jurídico atual busca.

A sociedade contemporânea já passou por inúmeras tragédias, guerras e desastres e tudo que já aconteceu serviu para chegar a situação que vivenciamos hoje, com a busca incansável pelos direitos humanos guiados pelo consolidado princípio da dignidade da pessoa humana.

Na lição de Nestor Távora:

‘’Busca-se o melhor resultado possível, a verdade viável dentro daquilo que foi produzido nos autos. Por isso a importância de processos com qualidade, pois só poderá haver condenação em face da certeza de culpabilidade, e esta não é obtida através de conjecturas ou suposições, e sim por intermédio de um escorço probatório sólido.’’

Com isso, é possível perceber que o processo penal deve ser fundamentado no princípio da legalidade, a fim de que as decisões sejam justas e através das provas, que é o instrumento mais eficaz na busca da verdade real. O autor, Greco Filho explica de forma exemplar tudo o que foi debatido:

‘’Não se terá a certeza matemática ou mesmo a científica, mas espera-se que a análise do processo de convencimento sirva para nos tranquilizar quanto à possível ou desejável verdade jurídica ou histórica, com a relatividade de Justiça dos homens, uma vez que o devido processo legal e a prova para a aplicação de sanções também decorrem do fundamento constitucional da dignidade da pessoa humana.’’

O processo penal, como um todo deve ser pautado no princípio da dignidade da pessoa humana, uma vez que o tal princípio e a Justiça caminham juntas. No que diz respeito as provas, não poderia ser diferente. Culpar alguém ou inocentar por algum delito é uma tarefa complexa que requer o máximo de cuidado e respeito para com a vida humana e seus direitos. A falta de um ordenamento jurídico fundamentado na dignidade da pessoa humana, levaria toda sociedade a viver num caos, sem respeito para com o próximo.


4. A DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E SUA RELAÇÃO COM O FILME “O PODER E A LEI”

De forma nítida o princípio da dignidade da pessoa humana expressa aquele que há de ser considerado como fonte suprema do Direito e o maior de todos os valores, o ser humano. Torna-se muito prático fundamentar-se acerca do reconhecimento da dignidade do ser humano, isto é, do seu superior valor, que o distingue do restante da natureza, pois tal preceito é transcendente.

É de comum conhecimento que ao homem não se pode atribuir valor, assim como ser inadmissível que o ser humano trate a um semelhante como coisa. Diante disso, prescreve A Declaração Universal dos Direitos do Homem que "o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo consiste no reconhecimento da dignidade de todos os seres pertencentes à família humana e dos seus direitos iguais e inalienáveis".

Partindo-se para o processo penal, no Estado Democrático de Direito, este se trata de um instrumento de direitos e garantias destinado ao cidadão sobre o qual recai a persecução penal. A princípio, o acusado deve receber tratamento digno por parte do Estado.

Ademais, a sanção penal somente poderá ser aplicada após o esgotamento de todas as fases previstas na legislação processual, devendo ser observada de forma estrita todo o seu conteúdo, sob pena de nulidade. Contudo, o que se tem observado rotineiramente é um verdadeiro processo de desumanização do ser humano, o que gera, consequentemente, a completa devastação de sua dignidade.

Devido a dimensão do princípio em questão, fica difícil sintetizá-lo em um conceito. Portanto, antes mesmo de relacioná-lo com o roteiro do filme utilizado para o presente trabalho, “O Poder e a Lei”, faz-se necessário apresentar uma das melhores conceituações encontradas, sendo esta nas palavras de Ingo Wolfgang Sarlet (apud FAVORETTO, 2012, p.37) que ensina

(...) temos por dignidade da pessoa humana a qualidade intrínseca e distintiva reconhecida em cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando, neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições existenciais mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa e corresponsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão com os demais seres humanos, mediante o devido respeito aos demais seres que integram a rede da vida.

Portanto, diante das cenas vistas no filme, é possível notar de forma clara que, Michael Haller, o advogado de defesa criminal, parecia não conhecer limites quando queria ganhar dinheiro. O mesmo tratava de inventar despesas diante dos seus clientes, realizava pagamento de perícias, contratava outros profissionais, e dentre outras várias artimanhas que foram observadas para que, de certa forma, seus clientes fossem enganados. Sendo este, o lado obscuro da advocacia a qual é mostrada na trama.

Todavia, uma importante reflexão a ser extraída da trama se relacionada com a Dignidade Humana merece atenção na questão do preconceito e, contudo, no quesito da atribuição de valor do ser humano.

A influência que o preconceito exerce no julgamento é bem notada na sociedade, assim como é bem retratada no filme, sendo durante o teor de uma sentença, quanto a declaração de culpa ou inocência, este dependerá do conceito que o julgador tem acerca de cada um dos litigantes. Como na situação demonstrada a vítima, Reggie Campo, era uma prostituta que procurou e ofereceu os seus serviços ao próprio Roulet, foi mais prático que ela omitisse tais informações, pois sabia que diante de sua reputação seria claramente desacreditada, justamente devido ao preconceito existente. Portanto, de fato, quando sua profissão vem à tona, é evidente a mudança de postura tomada pelos julgadores diante do caso, que assim sendo, ao ser vista como uma prostituta, sua suposta intenção de aproveitar-se financeiramente de Roulet seria maior de que qualquer outra evidência.


5. CONCLUSÃO

Diante do que foi exposto, percebe-se uma grande proteção por parte do processo penal, ao principio da Dignidade da pessoa Humana, primeiramente ao admitir e considerar um acusado de inocente até que transite em julgado a sentença condenatória, prevenindo assim, transtornos contra a honra de algum acusado que não tenha envolvimento com o delito e evitando o contato com o cárcere, fazendo deste, a última medida a ser imposta.

Justamente por esse motivo, com o intuito de que não submeta um inocente ao cárcere, temos uma evolução constante das provas admitidas no Processo Penal, trazendo como base a busca da verdade real, até mesmo pela parte que tem a responsabilidade de acusar, que é o ministério público.

Outrossim, importante mencionar, que o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, norteia o respeito ao próximo, defende a honra, a integridade e a imagem dos seres Humanos, portanto, o processo penal, deve está sempre conglomerado com o que traz este Princípio.


FONTES BIBLIOGRÁFICAS

1 Curso de Direito Processual Penal, Nestor Távora (2016)

2 https://jus.com.br/artigos/8323/a-dignidade-da-pessoa-humana-e-as-provas-no-processo-penal

3 https://diegobayer.jusbrasil.com.br/artigos/121943155/principios-fundamentais-do-direito-processual-penal-parte-01

4 https://www.jurisciencia.com/artigos/o-poder-e-a-lei-the-lincoln-lawyer-uma-breve-demonstracao-da-impureza-do-direito/843/

5 https://www.grecofilho.com.br/wwwroot/files/18/A_prova_penal_no_contexto_da_dignidade_da_pessoa_humana.pdf

6 https://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=7830

7 https://www.tjrj.jus.br/c/document_library/get_file?uuid=5005d7e7-eb21-4fbb-bc4d-12affde2dbbe

8 https://jus.com.br/artigos/8323/a-dignidade-da-pessoa-humana-e-as-provas-no-processo-penal

Sobre os autores
Savio Pinheiro de Araújo

Acadêmico de Direito na Faculdade de Ilhéus – CESUP

Marcos Almeida Nascimento

Estudante na Faculdade de Ilhéus-CESUPI

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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