RESUMO
O presente artigo versa sobre o limbo jurídico previdenciário trabalhista, tema este nada incomum e de enorme discussão na doutrina e jurisprudência, tendo em vista não existir legislação clara e específica sobre o assunto. Apresenta-se a conceituação do benefício previdenciário de auxílio doença e suas conseqüências perante o contrato de trabalho. Discorre sobre a alta previdenciária e reabilitação profissional, bem como sobre o polêmico sistema de alta programada, tido como ilegal e inconstitucional pelos Tribunais, e que, na maioria das vezes, coloca o laudo médico do INSS em discordância com o laudo médico do trabalho, causando o comentado limbo jurídico. Conceitua o limbo jurídico, delimitando o entendimento da jurisprudência majoritária e da doutrina quanto à responsabilização da empresa, trazendo as conseqüências deste instituto na seara trabalhista e previdenciária. Por fim, busca demonstrar as possíveis soluções para os casos em concreto com efetiva análise dos Princípios previstos na Carta Magna: Princípio Constitucional da Dignidade Humana e Princípio do Direito Fundamental ao Trabalho.
Palavras-chave: Limbo Jurídico Previdenciário Trabalhista. Auxílio Doença. Reabilitação Profissional. Sistema de Alta programada.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO .................................................................................................... 5
1. AUXÍLIO DOENÇA E SUSPENSÃO DO CONTRATO DE TRABALHO.......... 6
1.1 – AUXÍLIO DOENÇA: CONCEITO........................................................... 6
1.2 - DA SUSPENSÃO DO CONTRATO DE TRABALHO PELO GOZO DO AUXÍLIO – DOENÇA. .................................................................................... 7
2. ALTA PREVIDENCIÁRIA E A POSTERIOR REABILITAÇÃO PROFISSIONAL. 9
2.1 – ALTA PREVIDENCIÁRIA....................................................................... 9
2.2 – ALTA PROGRAMADA ........................................................................... 11
2.3 – REABILITAÇÃO PROFISSIONAL.......................................................... 13
3. LIMBO JURÍDICO PREVIDENCIÁRIO TRABALHISTA.................................. 16
3.1 – CONCEITO............................................................................................. 16
3.2 – RESPONSABILIDADE DA EMPRESA E ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL ACERCA DO TEMA....................................................... 17
3.3 - CONSIDERAÇÕES FINAIS...................................................................... 22
CONCLUSÃO........................................................................................................ 27
REFERÊNCIAS ..................................................................................................... 29
INTRODUÇÃO
Nos últimos anos tem sido freqüente a situação do trabalhador que, após retornar da alta previdenciária, alta esta feita pelo Sistema de Alta programada, ainda encontra-se incapacitado para o retorno às suas atividades laborais. Ou seja, o segurado tem o auxílio doença cessado, entretanto, o médico do trabalho não o avalia como apto para retornar ao trabalho. Sendo assim, o empregado encontra-se no denominado limbo jurídico Previdenciário onde não recebe a remuneração do benefício previdenciário, tão pouco os salários, devido à falta de prestação de serviço.
Referida situação é extremamente rotineira, vez que não há legislação específica e clara para quando o narrado fato acontece. Quando se há divergência entre laudo médico do INSS e laudo médico do trabalho, o primeiro é dotado de presunção de veracidade e legitimidade, entretanto, nem sempre analisadas de forma correta.
Isto porque, atualmente o INSS utiliza o sistema de Alta programada, que é o exame pericial no início da incapacidade que delimitará um tempo razoável para sua recuperação, dependendo de evento futuro e incerto. Deste modo, nem sempre no momento da alta o segurado encontra-se efetivamente recuperado para o retorno às suas atividades habituais.
É neste contexto que este artigo buscará delimitar as conseqüências do auxílio doença no contrato de trabalho, demonstrando a responsabilidade da empresa no limbo jurídico previdenciário, trazendo as considerações da jurisprudência acerca do tema, bem como demonstrando os desafios do trabalhador diante da indevida alta previdenciária.
Por fim, o intuito da presente pesquisa é trazer soluções para a empresa visando impedir o abandono do empregado, em situação de completo desamparo, evitando a violação dos Princípios Constitucionais da dignidade Humana e Direito Fundamental ao trabalho.
1. AUXÍLIO DOENÇA E SUSPENSÃO DO CONTRATO DE TRABALHO
1.1 – AUXÍLIO DOENÇA: CONCEITO
Em resumo, o auxílio doença é o benefício que o segurado tem direito, após cumprir a carência, quando ficar incapaz para o trabalho, ainda que temporariamente, por doença, por mais de 15 dias consecutivos.
Tem-se, portanto, conforme preleciona o caput do artigo 59 da Lei de Benefícios (Lei 8.213/91), alguns requisitos para o gozo do referido benefício. Senão, vejamos:
Art. 59. O auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o período de carência exigido nesta Lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos.
Parágrafo único. Não será devido auxílio-doença ao segurado que se filiar ao Regime Geral de Previdência Social já portador da doença ou da lesão invocada como causa para o benefício, salvo quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento dessa doença ou lesão.
A referida Lei determina, ainda, que o empregador pagará o salário ao empregado até o décimo quinto dia de afastamento. Nos dias subseqüentes, fica na responsabilidade do INSS o pagamento do benefício:
Art. 60. O auxílio-doença será devido ao segurado empregado a contar do décimo sexto dia do afastamento da atividade, e, no caso dos demais segurados, a contar da data do início da incapacidade e enquanto ele permanecer incapaz.
§ 3o Durante os primeiros quinze dias consecutivos ao do afastamento da atividade por motivo de doença, incumbirá à empresa pagar ao segurado empregado o seu salário integral.
Assim sendo, nos termos do parágrafo 4º do artigo 60 da Lei 8.213/91, somente após o décimo quinto dia, o empregador poderá encaminhar o empregado à perícia médica da Previdência Social. Portanto, constatada a incapacidade, a partir do 16º dia de afastamento, o empregado estará em gozo de auxílio doença.
Importante ressaltar, ainda, que o Auxílio Doença é um benefício temporário, com duração enquanto perdurar a incapacidade do trabalhador, estando o obreiro sujeito a avaliação do seu estado de saúde, de forma periódica.
Neste aspecto, o artigo 78, parágrafos 1º e 2º do Decreto 3.048/99, regulamenta sobre o assunto:
Art. 78. O auxílio-doença cessa pela recuperação da capacidade para o trabalho, pela transformação em aposentadoria-por-invalidez" data-type="category">aposentadoria por invalidez ou auxílio-acidente de qualquer natureza, neste caso se resultar seqüela que implique redução da capacidade para o trabalho que habitualmente exercia.
§ 1º O INSS poderá estabelecer, mediante avaliação pericial ou com base na documentação médica do segurado, nos termos do art. 75-A, o prazo que entender suficiente para a recuperação da capacidade para o trabalho do segurado.
§ 2º Caso o prazo concedido para a recuperação se revele insuficiente, o segurado poderá solicitar a sua prorrogação, na forma estabelecida pelo INSS.
Nota-se, portanto, que o benefício de auxílio doença é provisório, cessando-se pelo término da incapacidade, pela conversão em aposentadoria por invalidez ou auxílio-acidente.
1.2 – DA SUSPENSÃO DO CONTRATO DE TRABALHO PELO GOZO DO AUXÍLIO – DOENÇA.
O contrato de trabalho, conforme artigo 476 da CLT descreve que durante a vigência do benefício de auxílio doença, o contrato de trabalho está suspenso. Senão, vejamos:
Art. 476 - Em caso de seguro-doença ou auxílio-enfermidade, o empregado é considerado em licença não remunerada, durante o prazo desse benefício.
Entende-se como contrato suspenso, pois, conforme doutrina preleciona a palavra “suspensão”, significa que o serviço não será prestado, de forma temporária, bem como, não haverá o pagamento de salários. Ou seja, ficam suspensa as obrigações, deveres e direitos, tanto do empregado, como do empregador. Neste aspecto:
Na suspensão o empregado não trabalha temporariamente, porém nenhum efeito produz em seu contrato de trabalho. São suspensas as obrigações e os direitos. O contrato de trabalho ainda existe, apenas seus efeitos não são observados. Na interrupção, apesar de obreiro não prestar serviço, são produzidos efeitos em seu contrato de trabalho. É mister diferenciar a própria existência do contrato de trabalho e sua execução, inclusive em relação a seus efeitos, daí a necessidade de distinção entre as duas hipóteses. (PINTO, 2009, p. 325).
Portanto, diante desta assertiva sobre a diferença entre contrato de trabalho suspenso e interrompido, tem-se que, nos primeiros quinze dias de afastamento, o contrato do empregado estará interrompido, já que não há a prestação do serviço por parte do obreiro, mas há a obrigação da empresa em pagar o salário integralmente, nos termos da Lei. Conquanto, após o décimo sexto dia de afastamento, o contrato de trabalho estará suspenso, estando o obreiro em gozo de auxílio doença, suspendendo-se as obrigações salariais do empregador e transferindo-as ao INSS para o pagamento do Benefício.
Reafirmando tal declaração, a Lei dos Benefícios (Lei 8213/91), reafirma que, estando o empregado em gozo de auxílio doença, o contrato de trabalho estará, nos termos da Lei, “licenciado”, que se denota a suspensão do mesmo:
Art. 63. O segurado empregado, inclusive o doméstico, em gozo de auxílio-doença será considerado pela empresa e pelo empregador doméstico como licenciado.
Sendo assim, após o término do benefício previdenciário de auxílio doença, diante da recuperação da capacidade para o trabalho, cessa-se a suspensão do contrato de trabalho, devendo, o empregado, apresentar-se à empresa para retornar ao trabalho.
Aliás, a Súmula 32 do TST (nova redação – Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003), afirma que, no caso de não retorno injustificado do empregado ao trabalho, no prazo máximo de 30 dias após a cessação do benefício previdenciário, presumir-se-á o abandono de emprego, sob pena seu contrato ser rescindido por justa causa, nos termos do artigo 482, alínea “i”, da CLT.
2. ALTA PREVIDENCIÁRIA E A POSTERIOR REABILITAÇÃO PROFISSIONAL
2.1 – ALTA PREVIDENCIÁRIA
Conforme já dito, o benefício previdenciário será cessado após o retorno da capacidade laborativa do empregado, denominando-se alta previdenciária. Sendo assim, ao analisar os documentos relacionados à doença incapacitante, o Médico do INSS estabelecerá um prazo que entender suficiente para a recuperação do empregado o que é chamado de alta programada.
Passado referido período, o empregado se encontrará de alta previdenciária, podendo, caso o tempo estabelecido se mostrar insuficiente para o retorno da capacidade, solicitar a prorrogação do benefício previdenciário, conforme o artigo 78, § 2º do Decreto 3.048/99.
Portanto, após a alta previdenciária, o empregado deve retornar à empresa onde será encaminhado ao médico do trabalho para verificar sua aptidão de retorno às atividades laborativas, bem como a recuperação da sua capacidade de trabalhar. Referido exame médico é obrigatório, tendo em vista a imposição da Norma regulamentadora NR7 e, ainda, diante do artigo 168 da CLT que determina que o exame é obrigatório nos casos determinados pelo Ministério do Trabalho por meio das instruções complementares:
7.4.3.3. No exame médico de retorno ao trabalho, deverá ser realizada obrigatoriamente no primeiro dia da volta ao trabalho de trabalhador ausente por período igual ou superior a 30 (trinta) dias por motivo de doença ou acidente, de natureza ocupacional ou não, ou parto.
Neste momento é onde se inicia a problemática do empregado e do empregador. Isto porque, o laudo médico do trabalho pode ser diferente do laudo médico do INSS. Ou seja, o médico do trabalho entende que o empregado está inapto ao retorno do trabalho, mesmo existindo a alta previdenciária.
Neste caso, a legislação define certa hierarquia nos laudos médicos, dando preferência ao laudo apresentado pelo Médico Perito do INSS. Senão vejamos o que preleciona o artigo 6º, §2º da Lei de nº 605/1949:
§ 2º A doença será comprovada mediante atestado de médico da instituição da previdência social a que estiver filiado o empregado, e, na falta deste e sucessivamente, de médico do Serviço Social do Comércio ou da Indústria; de médico da empresa ou por ela designado; de médico a serviço de representação federal, estadual ou municipal incumbido de assuntos de higiene ou de saúde pública; ou não existindo estes, na localidade em que trabalhar, de médico de sua escolha. (Redação dada pela Lei nº 2.761, de 26.4.56)
Embora a legislação acima identificada seja antiga e, de certa forma, considerada defasada, o Tribunal Superior do Trabalho, pacificou a questão ao editar a súmula de nº 15, mantendo a hierarquia do laudo médico do INSS prevista em lei:
Súmula nº 15 do TST
ATESTADO MÉDICO (mantida) - Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003
A justificação da ausência do empregado motivada por doença, para a percepção do salário-enfermidade e da remuneração do repouso semanal, deve observar a ordem preferencial dos atestados médicos estabelecida em lei.
Portanto, não há dúvidas que o laudo médico do INSS possui maior preponderância nas decisões relacionadas ao auxílio doença e alta previdenciária. Ademais, é válido lembrar que a alta médica previdenciária é um ato administrativo e, por sua própria natureza, dotado de presunção de veracidade e legitimidade.
Neste ínterim, Celso Antônio Bandeira de Mello (2003, p. 382) discursa:
“É a qualidade, que reveste tais atos, de se presumirem verdadeiros e conformes ao Direito, até prova em contrário. Isto é: milita em favor deles uma presunção “juris tantum” de legitimidade; salvo expressa disposição legal, dita presunção só existe até serem questionados em juízo. Esta, sim, é uma característica comum aos atos administrativos em geral; as subsequentes referidas não se aplicam aos atos ampliativos”.
Sendo assim, verificando que a alta previdenciária possui presunção de veracidade é ônus do empregador, em caso de discordância entre os laudos médicos, INSS e médico do trabalho, comprovar que o empregado ainda encontra-se inapto para o retorno do trabalho, devendo permanecer sob a égide do benefício de auxílio doença.
Enquanto o empregador ou o empregado recorrem da alta previdenciária, seja administrativamente ou judicialmente, permanece válido o laudo médico do INSS. Portanto, deverá o médico do trabalho buscar, de todas as formas, a reabilitação do profissional na empresa, ainda que seja este o entendimento contrário ao seu, sem que isso prejudique, obviamente, ainda mais o estado de saúde do trabalhador, já que se presume como verdadeira sua capacidade para laborar.
2.2 – ALTA PROGRAMADA
Conforme já visto, o médico do INSS, após avaliar o segurado, designará um tempo que entende ser razoável para a recuperação da capacidade do mesmo em voltar a trabalhar. A chamada alta programada, tendo em vista que só há um primeiro atendimento (perícia), para designação do período de auxílio doença.
Ocorre que, para muitos doutrinadores, a alta programada ofende o Princípio Constitucional da Dignidade Humana, tendo em vista que, em não havendo novo exame pericial, não há como saber se o prazo concedido no auxílio doença foi ou não suficiente para a recuperação do empregado.
Juliana Gurgel de Medeiros (2013, online), em seu artigo veiculado via internet, reafirma o que foi dito, no seguinte sentido:
O fato é que ao conceder a “alta programada” ao segurado, ainda incapacitado para o retorno ao trabalho, obrigando-o a reassumir seu labor para manutenção de sua subsistência e de sua família, em face da cessação do pagamento do benefício, o INSS afronta a Constituição Federal, que estabelece em seu artigo 1º os fundamentos que regem a República Federativa do Brasil, especificamente o princípio da dignidade da pessoa humana.
É que o princípio da Dignidade da Pessoa Humana é um princípio constitucional da seguridade social que visa garantir aos hipossuficientes a proteção social, com a devida contribuição dos mesmos, posto que a contribuição para o sistema só é necessária quando atende os anseios da proteção social, expresso no art. 1º, III, da Constituição Federal [...]. Nesse sentido, não há que se falar em recuperação do segurado quando o benefício é cessado arbitrariamente pelo INSS, sem a devida realização de nova perícia médica, sob pena de afrontar ao ferindo princípio da dignidade da pessoa humana.
A alta programada é, diante do narrado, prejudicial ao empregado que recebe a alta previdenciária, podendo ainda não estar completamente reabilitado, bem como ao empregador que deverá receber o empregado, diante da presunção de veracidade do referido ato administrativo, conforme já visto, reabilitando-o em alguma função compatível com a sua redução na capacidade de laborar.
Foi neste sentido o julgado do TRF da 1ª Região (2012, online), que entendeu ser impossível presumir a recuperação do segurado baseando-se em evento futuro e incerto:
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. DEERIMENTO DE TUTELA ANTECIPADA EM SENTENÇA. INOCORRÊNCIA DE PRECLUSÃO PRO JUDICATO. CESSAÇÃO DE AUXÍLIO DOENÇA ATRAVÉS DA "ALTA PROGRAMADA". OFENSA AO ARTIGO 62 DA LEI 8.213/91.
1. Não prospera a preliminar do INSS de preclusão pro judicato do deferimento de tutela antecipada na sentença proferida. Estando presentes os pressupostos legais (artigo 273 do CPC), deve ser deferido o pedido de antecipação de tutela, sendo, em princípio, incompatível preclusão com o regime das tutelas de urgência, sobretudo no caso, que se trata de verba alimentar. É admitido o deferimento da medida por ocasião da sentença, conforme precedentes do E. STJ.
2. Para que ocorra a cessação do benefício de auxílio-doença, o segurado deverá submeter-se a nova perícia médica para que seja comprovada a cessação da incapacidade, em respeito ao artigo 62 da Lei 8.213/91, que prescreve que não cessará o benefício até que o segurado seja dado como habilitado para o desempenho de nova atividade que lhe garanta a subsistência.
3. A autora faz jus ao benefício de auxílio - doença desde a data da sua indevida suspensão.
4. As parcelas em atraso devem ser atualizadas monetariamente a partir do vencimento, nos termos da Lei nº 6.899, de 8 de abril de 1981, conforme Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal.
5. No que respeita à taxa de juros moratórios, cedendo à orientação desta c. Turma, os juros moratórios são devidos no percentual de 1% a.m. até a edição da Lei nº. 11.960/2009, quando então serão devidos no percentual de 0,5% a.m. conforme são aplicados nas cadernetas de poupança. Contam-se da citação, para as parcelas eventualmente vencidas anteriormente a ela, e do respectivo vencimento, para as que lhe são posteriores
6. Os honorários de advogado são devidos na ordem de 10% sobre o valor da condenação, correspondente às parcelas vencidas até o momento da prolação da sentença, de acordo com a Súmula n. 111 do Superior Tribunal de Justiça e artigo 20, § 3º, do CPC.
7. Apelação desprovida e remessa parcialmente provida para esclarecer o critério de cálculo da correção monetária e dos juros moratórios (itens 4 e 5), e alterar os honorários sucumbenciais (item 6).
A C Ó R D Ã O. Decide a Turma, à unanimidade, negar provimento à apelação e dar parcial provimento à remessa. 2ª Turma Suplementar do TRF-1ª Região. Brasília, 21 de março de 2012. (TRF1 - APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO N. 2003.01.99.033487-6/MG, DOU publicado em 12 de abril de 2012) (grifo nosso)
Entretanto, ainda que a jurisprudência majoritária entenda de forma contrária, a alta programada é um instituto utilizado pela autarquia previdenciária, ainda que afronte princípios basilares do direito, conforme foi demonstrado.
Deste modo, da forma como ocorre, ainda que seja esta considerada indevida, passado o período de concessão do auxílio doença, com a alta programada, o empregado retornará ao empregador para sua reabilitação profissional, prevista no artigo 89 da Lei 8213/91.
2.3 – REABILITAÇÃO PROFISSIONAL
A reabilitação profissional é um instituto que encontra amparo na Constituição Federal, artigos 6º e 203, em razão de estar relacionada aos direitos sociais previstos na Carta Magna.
Ademais, o assunto está devidamente legislado na Lei de Planos de Benefícios da Previdência Social, (Lei 8213/91), em seu artigo 18, III, “c”, sendo possível ao segurado e também ao dependente. E mais, o artigo 89 e seguintes da referida Lei narra os serviços a serem prestados pela Previdência Social, dando destaque à reabilitação profissional.
Para Alencar (2009, p. 557), reabilitação profissional é basicamente:
É um serviço que a Lei de Benefícios coloca à disposição de seus segurados, inclusive os aposentados e, ainda, na medida da disponibilidade do órgão da Previdência Social, aos dependentes. Não é exigida carência para a reabilitação profissional.
O objetivo é proporcionar aos segurados e dependentes incapacitados (parcial ou totalmente), os meios indicados para a (re)educação e (re)adaptação profissional e social, de modo que possam voltar a participar do mercado de trabalho.
[...]
A reabilitação profissional compreende, sempre que indispensável ao desenvolvimento do processo de reabilitação profissional, o fornecimento em caráter obrigatório, de prótese e órtese, e instrumentos de auxílio para a locomoção, o respectivo reparo ou substituição e, ainda, transporte urbano e alimentação.
Deste modo, a reabilitação profissional é extremamente importante e de grande valia, tanto para o indivíduo, quanto para a sociedade, retirando a pessoa da improdutividade e inatividade e impedindo que a mesma se torne ainda mais onerosa para os cofres públicos.
A legislação é clara ao dar a responsabilidade pela reabilitação profissional do indivíduo ao INSS, entretanto, devido às claras e notórias deficiências da autarquia previdenciária, o Decreto 3.048/99, artigo 139, autorizou que os cursos fossem desenvolvidos na comunidade, por meio de contratos, acordos e convênios com instituições e empresas públicas ou privadas.
Após a reabilitação, ainda que o segurado se encontre com alguma limitação, deverá retornar à empresa, em função compatível com a diminuição da sua capacidade de laborar. Neste sentido:
Quando o empregado encontra-se reabilitado, ainda que com alguma limitação pessoal, precisará ser novamente inserido no mercado de trabalho e retornará à empresa em função compatível com a natureza e as causas da inaptidão. A partir daí, cessará o benefício previdenciário e a correlata suspensão do contrato de trabalho, reativando-se o pacto laboral. Neste momento então, finda a suspensão do contrato de trabalho, com a certificação de reabilitação profissional pelo INSS (art. 92 da Lei 8.213/91), o empregado segurado retornará à empresa, a qual se obriga a recebê-lo e a submetê-lo à readaptação. (MASSONI, online)
Ocorre que, não se pode fechar os olhos para uma situação de razoável freqüência e de difícil resolução que é quando o trabalhador recebe a alta médica do INSS, ressalta-se: alta programada, entretanto, conforme já explanado, referida alta não é compatível com o entendimento do médico do trabalho que ainda o considera inapto a retornar às atividades laborais.
Wladimir Novaes Martinez (2012) ressalta que diante da cessação do benefício ou em virtude do fim da reabilitação, uma primeira medida da empresa é orientar o trabalhador a recorrer dessa decisão (art. 126 da Lei 8213/91) na esfera administrativa, mediante recurso à Junta de Recursos, ou então socorrer-se da via judicial perante a Justiça Federal (Portaria MPS n. 548/11), o que levaria um tempo maior para a solução. De regra, a empresa tem o dever jurídico de readaptar o trabalhador, afirma Martinez, pois se o INSS expediu o certificado e Reabilitação Profissional e deu alta ao trabalhador, ele cumpriu com a determinação da Lei, encerrando o programa de reabilitação.
Para o caso em que, mesmo após o certificado de Reabilitação Profissional, o empregado permaneça incapaz para retornar ao trabalho, o que é comum no caso de alta programada, deverá de qualquer forma retornar a empresa. Teremos aí um problema ainda maior, que foge da seara apenas previdenciária e trabalhista e generaliza em comprometimento da saúde pública:
É claro o problema antes adstrito à seara previdenciária assume agora contornos de comprometimento da saúde pública, isto porque a cessação do benefício em decorrência do transcurso do prazo de recuperação e tratamento estimado sem que o segurado esteja efetivamente apto ao retorno à sua atividade laboral acarreta, invariavelmente, o exercício do trabalho de forma a agravar sua enfermidade ou lesão, piorando seu estado de saúde. (MEDEIROS, online)
Deste modo, empregado e empregador se encontrarão em um impasse. Isto porque o obreiro verifica que não possui condições para retornar ao trabalho e o empregador se vê obrigado a recebê-lo na empresa. Constata-se, portanto, uma situação delicada, pois se o médico do trabalho não aconselha o retorno do empregado ao labor, ou pior, afirma que seu retorno poderá prejudicar seu estado de saúde, o obreiro estará sem receber auxílio doença, tão pouco salários, diante da real incapacidade em laborar. Chegamos, portanto, ao ponto de grande discussão que vem assoberbando o judiciário, diante da falta de legislação específica sobre o assunto. O chamado: Limbo Jurídico Previdenciário Trabalhista.
3. LIMBO JURÍDICO PREVIDENCIÁRIO TRABALHISTA
3.1 – CONCEITO
O limbo jurídico previdenciário trabalhista, ou conhecido também apenas como limbo jurídico previdenciário, ocorre quando, após o período concedido para o benefício de auxílio doença do trabalhador e, recebida a alta previdenciária, o empregado, visando, retornar as suas atividades laborais, constata, por intermédio do laudo médico do trabalho, que ainda se encontra incapaz para retornar às suas atividades.
Verifica-se, portanto, a divergência entre laudo médico do INSS e laudo médico do trabalho. Ou seja, o trabalhador encontra-se no verdadeiro “limbo”, pois para o INSS, encontra-se de alta, tendo sido seu benefício de auxílio doença cortado, e para o empregador, encontra-se ainda sem possibilidades para exercer suas atividades laborais. Sendo assim, a empresa não pode receber o empregado que se encontra inapto, e, consequentemente, não pagará seus salários, lado outro, não receberá o benefício do auxílio doença, pois é considerado, pelo INSS como apto e capaz de laborar, ficando sem qualquer tipo de rendimento.
Juliano de Angelis (2014, online), conceitua o limbo jurídico previdenciário da seguinte forma:
O “limbo jurídico previdenciário” ocorre quando o empregador, ao realizar o exame de retorno do empregado (após a alta do auxílio-doença), verifica, por meio de exame médico, que o obreiro está “incapaz”, apesar do perito-médico do INSS ter posição contrária (reconhece que ele está em condições de retornar ao trabalho).
O trabalhador, então, fica na seguinte situação: o INSS não paga o benefício de auxílio-doença, pois entende que o segurado pode trabalhar; o empregador, por sua vez, não paga salário pois entende que é o INSS quem deve pagar o benefício de auxílio-doença, o qual foi, segundo o médico da empresa, incorretamente cessado. Sendo assim, a parte mais sensível na relação, fica desguarnecida.
A divergência entre laudos médicos pode ocorrer também com o laudo pericial da autarquia previdenciária e do médico particular do trabalhador, que, com exames e procedimentos mais detalhados, verifica que o empregado não possui, ainda, condições de retornar às atividades laborais.
Aliás, o limbo jurídico previdenciário tem bastante relação com a alta programada, procedimento, conforme já explanado, utilizado pelo INSS. Ou seja, ao colocar um prazo pré-estabelecido para a recuperação do segurado, contando com algum tipo de evento futuro e incerto, a autarquia previdenciária “libera” o empregado para o trabalho sem efetivamente verificar sua capacidade de laborar. Assim, deve retornar à empresa, visando, obviamente, evitar o abandono de emprego, no entanto, a empresa não o recebe, pois percebe claramente que não há condições de trabalho para aquele indivíduo. Aliás, neste caso, a busca pela reabilitação do trabalhador pode até ser prejudicial à saúde do mesmo.
A dificuldade de solução ao limbo jurídico previdenciário é o fato de não existir norma, lei, ou diretriz que regulamente de forma clara e específica o presente caso, deixando a resolução do assunto para a discussão na via judicial, necessitando que os Tribunais, de certa forma, “legislem” sobre o tema.
3.2 – RESPONSABILIDADE DA EMPRESA E ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL ACERCA DO TEMA
Diante da lacuna da Lei, restou aos juristas, doutrinadores e operadores do direito, interpretar as normas de forma a buscar uma solução para o limbo jurídico previdenciário.
O artigo 476 da CLT é claro, conforme já narrado, que o contrato de trabalho permanecerá suspenso, enquanto o obreiro permanecer no gozo do benefício de auxílio doença, o que é ratificado pelo artigo 63 da Lei de Benefícios (Lei 8213/91). Sendo assim, conclui-se que, ao se encerrar o prazo concedido para o benefício de auxílio doença, e em não havendo decisão, administrativa ou judicial, para o seu restabelecimento, o contrato de trabalho deixa de estar suspenso, devendo o obreiro retornar ao trabalho e o empregador pagar os salários.
Ocorre que, estando o trabalhador inapto para retornar ao trabalho, diante do laudo médico do trabalho, não pode ser considerado a retornar ao labor e correr o risco de prejudicar ainda mais sua saúde, entretanto não retira a obrigação do empregador em pagar sua remuneração. Pode-se dizer então que o empregador concederia ao empregado o gozo da licença remunerada.
E mais, não se pode alegar que não há pagamento de salários sem que haja a devida prestação do serviço, pois o artigo 4º da CLT afirma que “Considera-se como de serviço efetivo o período em que o empregado esteja à disposição do empregador, aguardando ou executando ordens, salvo disposição especial expressamente consignada.”
Neste diapasão, o empregado está a disposição do empregador após a alta previdenciária, entretanto, impedido de retornar ao trabalho por ser considerado inapto pelo médico do trabalho. Aliás, cumpre reiterar: a decisão administrativa que cessou o benefício de auxílio doença possui presunção de veracidade e legitimidade, portanto, até que se prove o contrário (ônus do empregador), o empregado está apto a trabalhar. Não o aceitando de volta ao trabalho, fica a disposição da empresa, e mesmo que não haja prestação do serviço, deve haver o pagamento dos salários.
Tem sido este o entendimento da jurisprudência majoritária, bem como dos doutrinadores. Aliás, a jurisprudência do TST tem firmado a tese de que “a alta médica atestada pelo INSS é ato administrativo, com presunção de veracidade, não passível de descumprimento pelo particular. A impugnação do ato deve ocorrer em instância própria e, enquanto não desconstituída por prova em contrário, é válida. Trata-se de medida que visa à garantia de direitos fundamentais dos trabalhadores. A recusa do empregador, em permitir o retorno do trabalhador ao emprego para desenvolvimento de suas atividades rotineiras, não o desonera do pagamento dos salários e consectários legais” (RR - 740-37.2011.5.15.0128, Relator Ministro Emmanoel Pereira, Data de Julgamento 11/03/2015, 5ª Turma, Data de Publicação DEJT 20/03/2015). (grifo nosso).
E mais, diversos Tribunais têm decidido da mesma forma, sendo portanto, pensamento majoritário, que leva em consideração o Princípio da Dignidade Humana e do Direito Fundamental ao trabalho, sendo considerada conduta ofensiva a referidos princípios, a empresa que deixa de receber o empregado que encontra-se com alta previdenciária.
Acerca do tema, cumpre colacionar os julgados de algumas das diversas regiões que já firmaram seu posicionamento ao responsabilizar a empresa ao pagamento dos salários após a alta previdenciária, ainda que não haja prestação do serviço:
LIMBO JURÍDICO PREVIDENCIÁRIO TRABALHISTA. RESPONSABILIDADE DO EMPREGADOR PELOS SALÁRIOS E DEMAIS VANTAGENS DECORRENTES DO VINCULO DE EMPREGO. DANO À MORAL. Após a alta médica do INSS, a suspensão do pacto laboral deixa de existir, voltando o contrato em tela a produzir todos os seus efeitos. Se o empregador impede o retorno ao labor, deve tal situação ser vista como se o empregado estivesse à disposição da empresa esperando ordens, onde o tempo de trabalho deve ser contado e os salários e demais vantagens decorrentes o vinculo de emprego quitados pelo empregador, nos termos do art. 4º da CLT. Além disso, o mero fato de ensejar ao trabalhador a famosa situação de "limbo jurídico previdenciário trabalhista" - quando o empregado recebe alta do INSS, porém ainda está inapto para o labor segundo a empresa - configura o dano à moral, posto que o trabalhador fica à mercê da própria sorte, sem meios para a própria sobrevivência e de seus dependentes. (TRT-2 - RO: 00018981120135020261 SP 00018981120135020261 A28, Relator: MAURILIO DE PAIVA DIAS, Data de Julgamento: 03/03/2015, 5ª TURMA, Data de Publicação: 09/03/2015) (grifo nosso)
EMENTA: RECURSO ORDINÁRIO INTERPOSTO PELA RECLAMADA. ALTA MÉDICA DO INSS. RECUSA DA EMPRESA EM ACEITAR O EMPREGADO APÓS A CESSAÇÃO DO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. DIREITO À REMUNERAÇÃO. 1. Se o empregado, após a alta médica do INSS, apresenta-se ao empregador, deve este, caso não concorde com a sua total habilitação, readaptá-lo para função compatível com o seu estado de saúde, salvo se reformada a decisão da autarquia previdenciária, administrativa ou judicialmente. Por outro lado, caso a empresa impeça o retorno do trabalhador ao emprego, assumirá a responsabilidade pela remuneração durante o período de afastamento em que não houve gozo de auxílio previdenciário. Precedentes do C. TST. 2. No caso em exame, contudo, a reclamada, cumprindo a ordem de reintegração deferida por meio de antecipação de tutela, entrou em contato com a autora, para fins de reativação do pacto laboral, não tendo a mesma, contudo, voltado a trabalhar, por se considerar inapta para tanto. 3. Desse modo, desde a recusa da trabalhadora em permitir o cumprimento da determinação judicial de retorno ao emprego, não se pode imputar à empresa qualquer responsabilidade pela remuneração a ela devida, ante a inexistência de provas de que o afastamento, desde então, tenha se dado por licença médica ou gozo de benefício previdenciário, e, tampouco, de que a decisão do INSS quanto à sua capacidade laboral, com a qual não mais concordava, tenha sido contestada administrativa ou judicialmente. Recurso ordinário patronal parcialmente provido. (TRT-6 - RO: PROC. Nº TRT - 0001425-94.2013.5.06.0008, Relator: ANDRÉ GENN DE ASSUNÇÃO BARROS, Data de Julgamento: 25/02/2016, 4ª TURMA) (grifo nosso)
LIMBO JURÍDICO TRABALHISTA - PREVIDENCIÁRIO AFASTAMENTO PREVIDENCIÁRIO POR DOENÇA. ALTA MÉDICA. TEMPO À DISPOSIÇÃO DO EMPREGADOR. RECUSA DO EMPREGADOR EM FORNECER TRABALHO, SOB ESPEQUE DE INCAPACIDADE DO TRABALHADOR NÃO PROVADA POR PERICIA OFICIAL. OBRIGAÇÃO DO EMPREGADOR PAGAR OS SALÁRIOS. INTELIGENCIA DO ARTIGO 1º, INCISO III e IV, da CF; ART. 59, parágrafo 3º, DA LEI 8213/91 E ARTIGO 4º, DA CLT. Nos termos do artigo 1º, incisos III e IV da Carta Federal a dignidade da pessoa humana e o valor social do trabalho são fundamentos da ordem jurídica (constitucional e infraconstitucional). Deste modo, nos termos do artigo 59, parágrafo 3º, da Lei 8213/91, o empregador é responsável pelo pagamento dos salários de seus empregados, afastados por motivo de doença, pelos primeiros 15 dias. Após tal período e, enquanto durar a causa incapacitante para o labor, faz jus o trabalhador ao correspondente benefício previdenciário, ficando suspenso o contrato de emprego até a alta médica. Após a alta médica o contrato de trabalho volta a produzir todos os seus efeitos legais, e o trabalhador é considerado à disposição do empregador aguardando ordens, com o respectivo cômputo do tempo de trabalho e direito aos salários e demais vantagens próprias do vínculo empregatício, tudo por conta do empregador (art. 4º, CLT). Ao empregador não é dado recusar o retorno do trabalhador às suas atividades, após a alta médica do INSS, sob o fundamento de que o médico do trabalho da empresa considerou-o inapto. Se a empresa não concorda com a alta médica previdenciária do trabalhador deve recorrer da decisão da autarquia previdenciária e, destruir a presunção de capacidade atestada pelo médico oficial, fazendo valer a posição do seu médico. Não pode o empregador ficar na cômoda situação de recusa em dar trabalho e, carrear aos ombros do trabalhador uma situação de limbo jurídico trabalhista-previdenciário, deixando-o à própria sorte, sem receber salários e tampouco beneficio previdenciário. Tal conduta não se coaduna com os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e do valor social do trabalho (art. 1º, III e IV, CF). Recurso ao qual se nega provimento. (TRT-2 - RO: 00020953720125020087 SP 00020953720125020087 A28, Relator: IVANI CONTINI BRAMANTE, Data de Julgamento: 05/08/2014, 4ª TURMA, Data de Publicação: 15/08/2014) (grifo nosso)
Nota-se, portanto, que a ampla jurisprudência, bem como a maioria dos doutrinadores, é enfática ao tentar proteger a parte da clara hipossuficiência na relação de emprego que é o trabalhador. Não se pode permitir que o mesmo seja “jogado” numa situação de limbo, estando sem trabalho, sem salário, tão pouco sem benefício previdenciário. E mais, não se pode permitir que o empregador permaneça na “confortável” situação de delegar a responsabilidade tão somente ao INSS.
Alguns doutrinadores entendem ainda que o fato de o empregador se recusar a receber o empregado no trabalho, diante da consideração de estar inapto às atividades laborativas, é um abuso de direito, sendo considerado, portanto ato ilícito, haja vista que, reitera-se: a alta previdenciária goza de presunção de legitimidade e veracidade.
Juliano de Angelis (2014, online) é claro e enfático ao afirmar que “comete abuso de direito a empresa em, se valendo da NR 7, considera o empregado inapto ao trabalho e o joga – sem se preocupar – na situação dramática do “limbo jurídico previdenciário”, vislumbrando, neste caso, uma possível condenação em danos morais pelo ilícito praticado.
Não se pode olvidar da situação temerária da empresa que deve receber um trabalhador, que, a seu ver, está sem capacidade para retornar ao trabalho, podendo, ao recebê-lo de volta ao trabalho, até mesmo piorar sua situação de saúde. A preocupação da empresa, neste caso, é natural, pois o artigo 157 da CLT traz como seu dever proteger a saúde e segurança do trabalhador.
Entretanto, deve-se levar em consideração, principalmente, a situação do empregado, que em uma situação de limbo jurídico previdenciário, estará com sérias dificuldades até mesmo para sua própria subsistência. Ou seja, diante da falta legislação específica sobre o assunto, mister se faz buscar soluções que diminuam os efeitos drásticos da situação que é tão rotineira, evitando o completo desamparo do trabalhador, impedindo ainda que se viole o princípio da Dignidade da Pessoa Humana (art. 1º, III, da CF), do direito fundamental ao trabalho (arts. 1º, IV, e 170 caput da CF), bem como da responsabilidade social das empresas (arts. 3º, I, 170, CF).
3.3 - CONSIDERAÇÕES FINAIS
Conforma já explanado, o limbo jurídico previdenciário – trabalhista é um tema que não possui legislação específica e clara a respeito, dependendo dos juristas e operadores do direito solucionar os problemas práticos que surgem costumeiramente no dia a dia de quem trabalha na área.
Como primeira alternativa a ser adotada, que, de certa forma, supriria a lacuna da Lei a respeito do Tema, seria por meio de negociação coletiva. Sendo assim, em casos como este, a empresa e empregado cumpriria com o disposto em convenção coletiva ou acordo coletivo, que, com a participação do sindicato, seria benéfico para ambas às partes.
Aliás, a participação sindical na reabilitação do empregado após a alta previdenciária e reinserção na seara trabalhista é de grande importância. Neste aspecto Massoni (2012, online) assevera:
As vantagens da participação das entidades sindicais são evidentes: a proximidade para o acompanhamento dos casos de forma individualizada, o relato das dificuldades, o conhecimento dos envolvidos mais diretamente para a qualificação adequada direcionada às atividades atualmente desenvolvidas pela empresa (pois muitos empregados ficam longos anos afastados, o que exigiria um curso de reciclagem). Com isso, a probabilidade de o trabalhador desempenhar funções compatíveis com sua qualificação será exponencialmente maior, com o que se sentirá valorizado e terá resgatada a sua auto-estima, eis que o desempenho de funções muito inferiores à sua antiga qualificação lhe trará um sentido de rebaixamento indesejável, para além das restrições impostas pelo seu atual estado de saúde. E do lado das empresas, treinamentos mais focalizados permitirão que a reinserção ocorra de forma mais adequada e eficiente, ampliando o leque de possibilidades de serviços que o empregado readaptando poderá desenvolver, sempre, claro, dentro dos limites que suas condições de saúde permitirem.
Outra possibilidade para a busca de solução do imbróglio seria que, após o retorno do empregado, a empresa, em total desacordo com a alta previdenciária oferecida pelo INSS ao segurado e, verificando que o estado de saúde do trabalhador o impossibilita de retornar às suas atividades habituais, deverá reabilitá-lo e reintegrá-lo em função diversa da sua habitual. Isto é, colocá-lo em função diversa na empresa, necessitando de extrema sensibilidade por parte dos profissionais dos Recursos Humanos e médico do trabalho, sem que, referida função venha a prejudicar ainda mais o seu estado de saúde. E mais, a readaptação funcional é medida extremamente complexa a ser tomada, vez que, deve, na medida do possível, ser adequada e equiparada a antiga função, para que evite que o trabalhador se sinta humilhado, depreciado ou inativo, podendo, neste caso, vir, a empresa, até mesmo, a responder um processo por Assédio Moral.
Deste modo, tem-se que a reabilitação funcional, dentro da empresa, deve ser feita com bastante cautela, sempre evitando que o trabalhador possa piorar seu estado de saúde, seja ele físico ou mental.
Neste aspecto, entende Juliano de Angelis (2014, online):
O que deve ocorrer nessas situações - em que há divergência entre a autarquia previdenciária e o médico indicado pela empresa quanto às condições de saúde do obreiro - é colocá-lo provisoriamente em outra função, a qual deverá ser compatível com a sua limitação funcional (que existe, até então, pelo único olhar do médico da empresa). Com essa medida harmônica, pensamos que é possível conciliar todos os direitos envolvidos (do trabalhador e do empregador).
Como terceira opção na busca por solução aos casos de limbo jurídico previdenciário, tem-se que, em não existindo convenção coletiva na classe que mencione a respeito do tema, e diante da impossibilidade de reabilitação funcional, a empresa, tendo em vista entender que o empregado ainda não se encontra capaz para o retorno às atividades laborais, e, diante do término da suspensão do contrato de trabalho, deverá pagar a remuneração mensal do trabalhador, concedendo ao mesmo a licença remunerada. Esta solução tem sido a encontrada pelos diversos Tribunais Regionais do Trabalho, bem como pelo Tribunal Superior do Trabalho, conforme já demonstrado com os julgados e jurisprudências apresentados acerca do tema.
Neste caso, visando evitar que a empresa fique em desvantagem por estar pagando salários sem a devida prestação do serviço, poderá recorrer da alta previdenciária, via administrativa ou judicial, sendo seu ônus desconstituir o ato administrativo (alta), e requerendo, de forma indenizatória, a reparação de danos pelo pagamento dos salários, que pela empresa foram arcados, e deveriam ter sido pagos na forma de benefício de auxílio doença. Ou seja, a chamada Ação regressiva em desfavor do INSS.
Com este mesmo entendimento, o mestre em direito do trabalho e da seguridade pela Universidade São Paulo, Marcelo Pallotta Rodrigues (2016, online), entende que, se o INSS pode entrar com ação regressiva para reaver das empresas os valores pagos como auxílio doença, desde que reste comprovada que a incapacidade laboral se deu por culpa do empregador, a empresa também poderá insurgir contra o INSS sobre a “ação regressiva reversa”, buscando o pagamento dos salários que deveriam ser pagos a título de auxílio doença:
Assim, fazendo uma leitura contrario sensu, a empresa possui interesse processual e legitimidade para se opor ao ato administrativo manifestamente ilegal que lhe acarreta prejuízos financeiros (pagamento de licença remunerada decorrente de incapacidade laborativa), sendo possível a propositura de ação regressiva contra o INSS para reaver a título de perdas e danos o valor da remuneração paga ao empregado que recebeu indevidamente a alta oficial do INSS e foi equivocadamente considerado apto para o retorno ao mercado de trabalho. É, portanto, facilmente demonstrável a existência do ato ilícito praticado pela autarquia-previdenciária, do dano (prejuízo financeiro) e do nexo de causalidade.
Portanto, no ponto de vista jurídico e social esta se mostra a melhor alternativa, onde o empregado não fica desamparado e a empresa poderá reaver tudo aquilo que por ela foi desembolsado pela indevida alta previdenciária do trabalhador, a título de perdas e danos.
Por último, como derradeira opção, em verificando que não há a possibilidade de reabilitação funcional do empregado, e se recusando a empresa em pagar os salários sem obter a contrapartida da prestação do serviço, deverá o empregador, desde que não haja estabilidade profissional, demitir o funcionário, arcando com todas as despesas da rescisão do contrato de trabalho.
Nesta opção, considera-se que a alta previdenciária, novamente: ato administrativo dotado de legitimidade e veracidade; cessou o benefício previdenciário de auxílio doença e, portanto, o contrato de trabalho não mais se encontra - se suspenso, podendo, assim, ser rescindido. Assim, a rescisão, de imediato, após a alta previdenciária, evitará que o empregador arque com os salários, sem que o trabalhador efetivamente preste qualquer serviço, entretanto, força o pagamento das verbas rescisórias, impedindo a demissão por justa causa.
Com este mesmo entendimento há jurisprudências acerca do tema que, em havendo a rescisão contratual, deverá o empregador efetuar o pagamento de todas as verbas rescisórias a que o empregado faz jus:
EMENTA: RECURSO ORDINÁRIO - ALTA PREVIDENCIÁRIA - RECUSA DO EMPREGADOR QUANTO AO RETORNO AO TRABALHO - PAGAMENTO DOS SALÁRIOS. 1. A alta previdenciária tem como efeito a retomada do vínculo de emprego, com a garantia do pagamento dos salários desde a cessação do benefício. Portanto, se por qualquer motivo a empresa não pretender a continuação da relação, e não havendo estabilidade acidentária, deve ela arcar com o ônus da rescisão contratual, não deixando o empregador numa espécie de "limbo jurídico", sem poder trabalhar nem receber o benefício previdenciário. Se assim não preceder, terá de pagar os salários do período em que, involuntariamente, o obreiro permaneceu em inatividade. 2. Recurso ordinário desprovido. (TRT-6 - RO: 0001733-25.2014.5.06.0161, Relator: Milton Gouveia da Silva Filho, Data de Julgamento: 18/02/2016, 1ª TURMA, Data de Publicação: 23/02/2016) (grifo nosso)
Sendo assim, diante das hipóteses elencadas, a empresa deverá buscar alternativas que impeça o empregado de permanecer no limbo jurídico previdenciário - trabalhista, sob pena de, em o fazendo, ou seja, não o aceitando de volta para empresa após o encerramento do período de afastamento, ser condenada ao pagamento da totalidade de salários, bem como todas as verbas rescisórias, da alta previdenciária até o pedido de Rescisão Indireta feito na Justiça do Trabalho.
CONCLUSÃO
A dramática situação do limbo jurídico previdenciário trabalhista carece de uma legislação que normatize a situação de forma clara e específica. Isto porque, o trabalho, antes de ser uma obrigação ou dever, é um direito do ser humano, previsto constitucionalmente.
Sendo assim, após o retorno da alta previdenciária, não pode o empregador impedir que o empregado retorne ao seu trabalho, deixando-o completamente desamparado, sem o pagamento dos salários, jogando a responsabilidade ao INSS, sob o risco de violar o Princípio Constitucional da Dignidade Humana.
Nota-se que o grande causador do limbo jurídico previdenciário é o sistema de Alta Programada que evidentemente é inconstitucional e ilegal, afrontando a Constituição Federal e demais Leis. Entretanto, o obreiro é a parte frágil da situação e não pode ser “jogado de lado”, conforme tem sido o entendimento justo da jurisprudência majoritária nos casos de limbo jurídico.
Enquanto os legisladores se mantêm inertes e não resolvem a situação que já é de grande incômodo no país, a solução inicial é que as empresas, em parceria com os sindicatos, decidam a respeito da legislação em convenções e acordos coletivos. Desta forma, empresa e empregado estarão juntos, sem que um lado saia mais prejudicado que outro.
Em não havendo convenção ou acordo coletivo, deve a empresa procurar readaptar o funcionário em função compatível com a sua atual situação de saúde, evitando que isto o prejudique ainda mais ou que venha a humilhá-lo, tornando inativo dentro da empresa.
Outra plausível possibilidade, entendida como, em uma visão jurídica e social, a melhor das opções, seria que a empresa concedesse licença remunerada ao trabalhador, enquanto perdurar a incapacidade e enquanto recorre da alta previdenciária, requerendo, judicialmente, a título de perdas e danos os valores despendidos, enquanto o trabalho dever estar sob a égide do benefício de auxílio-doença.
Por fim, o empregador tem a possibilidade de optar, diante do término do auxílio-doença e consequente fim da suspensão do contrato de trabalho, em demitir, sem justa causa o funcionário, desde que não haja estabilidade, arcando com a totalidade das verbas rescisórias.
Conclui-se, portanto, que o importante é realmente evitar que o empregado fique no limbo jurídico, sem recebimento de salários sem a cobertura do benefício de auxílio doença e sem rescisão do contrato de trabalho, ou seja, deixar o contrato de trabalho em aberto, pois o risco da empresa, em arcar com a totalidade dos salários neste período, vem crescendo cada vez, com o atual entendimento da jurisprudência brasileira a respeito do tema.
REFERÊNCIAS
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ANGELIS, Juliano De. O empregado e a situação de "limbo jurídico previdenciário". Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 02 dez. 2014. Disponivel em: <http://www.conteudojuridico.com.br/?artigos&ver=2.51096&seo=1>.
MARTINEZ, Wladimir Novaes. Controvérsias sobre a reabilitação profissional. Revista LTr n. 76-02, p. 135-141, fevereiro de 2012.
MASSONI, Tulio de Oliveira. Os desafios do trabalhador em face da (indevida) alta previdenciária. 2012. Disponível em: <http://revbprev.unifesp.br/index.php/edic/ 9-um/14-osdesafios>
MEDEIROS, Juliana Gurgel de. Auxílio-doença: carência, alta programada, reabilitação e direitos do segurado. Revista Jus Navigandi, Teresina, ano 18, n. 3731, 18 set. 2013. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/25332>. Acesso em: 7 ago. 2016.
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo, São Paulo, Malheiros, 15. ed., 2003.
PINTO, Sérgio. Direito do Trabalho. 25ª Edição. São Paulo: Editora Atlas, 2009.