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Parcialidade do juiz em "Medida por Medida"

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4  METODOLOGIA

Para confecção deste artigo, foi utilizada a pesquisa com abordagem qualitativa, que consiste no aprofundamento da compreensão do assunto. Já quanto a natureza da pesquisa, utilizou-se a que gera conhecimentos para a aplicação prática, dirigidas à solução de problemas específicos, denominada pesquisa aplicada. Tivemos então, quanto aos objetivos, a pesquisa explicativa, que identifica os fatos que determinam ou que contribuem para o ocorrência dos fenômenos. E de acordo com os procedimentos, adotou-se pesquisas bibliográficas e documentais, em que se levantou referências já analisadas e publicadas tendo por base o google acadêmico.


5  A PARCIALIDADE DO JUIZ EM MEDIDA POR MEDIDA

Dentro da obra “Medida por Medida” de Shakespeare, a primeira ironia encontra-se no título do livro, pois, lendo a história percebemos que há o uso de dois pesos e duas medidas. Após Ângelo decidir sobre a execução de Cláudio, o seu próprio colega e conselheiro Escalo faz a seguinte afirmação,

Que lhe perdoe o céu, como a nós todos! Uns sobem pelos crimes; outros caem pela virtude. Alguns impunemente vivem sempre, nos vícios atolados, outros por uma falta são julgados. (SHAKESPEARE, 2000, p.33)

Percebemos pela fala de Escalo que aquela era uma sociedade em que duas pessoas que cometessem o mesmo crime poderiam ter dois pesos e duas medidas na hora do juiz impetrar pena de punição. Contudo, esse tipo de atitude desmerece a fala do caput do artigo 5º da Constituição Federal (1988), que diz que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza. Diante dessa afirmação constitucional, se todos são iguais, não há motivo para serem tratados com distinção diante de um tribunal.

Ângelo dá outra prova de que suas decisões não tinham apenas a característica de fazer justiça e cumprir o seu papel, e de que também não agia com imparcialidade, quando diz: “Para pôr medo às aves de rapina não podemos fazer um espantalho da lei, com a mesma forma sempre; acabam transformando-a em poleiro, sem receio mais revelarem”. (SHAKESPEARE, 2000, p.31)

Vemos claramente que o intuito de Ângelo era provar para a sociedade que era um juiz poderoso e que decidiria as lides da forma que melhor entendesse. Mas essa atitude não fazia justiça e abria mão da imparcialidade garantida nas decisões.

Quanto à imparcialidade do juiz, temos o que diz Cintra; Grinover e Dinamarco (2009, p. 53-55), que nos trazem clareza da posição do juiz diante da decisão. Entendem os autores que o juiz deve ficar em uma posição de mediador entre as partes, mas também de soberano no que se diz respeito à lide a ser resolvida. No caso de Ângelo, não houve imparcialidade, pois ele se colocou ferrenhamente contra Cláudio e mudou o discurso quando houve a intercessão de Isabela, irmã de Cláudio, que fez o papel de uma advogada no caso. Vejamos:

Isabela se achega a Ângelo e pede: “[...] mas, perdoa-lhe, certo, poderíeis sem ofensa nenhuma ao céu e aos homens”. (SHAKESPEARE, 2000, p.47) E o ápice do erro de Ângelo, dá-se quando ele barganha com Isabela a liberdade de seu irmão quando lhe responde da seguinte forma,

Admiti que não haja outro recurso para salvar-lhe a vida – não inculco semelhante medida ou qualquer outra; falo em termos gerais – a não ser este: que vós, sua própria irmã, vos encontrásseis requestada de influência junto ao juiz, e a vosso irmão pudesses libertar facilmente das algemas da lei que envolve a todos, e que meio terreno não houvesse de salvá-lo, exceto o de entregardes a mais rica joia do vosso corpo a essa pessoa. Sem isso, fatal fora a morte dele. (SHAKESPEARE, 2000, 64)

Vemos a repudia na lei da atitude de Ângelo no Artigo 95, parágrafo único, inciso II da Constituição Federal (1988) que diz: “II- Receber, a qualquer título ou pretexto, custas ou participação em processo”.

Para encerrar, observar-se o que diz Cintra; Grinover e Dinamarco (2009, p.54),

A imparcialidade do juiz é uma garantia de justiça para as partes. Por isso, têm elas o direito de exigir um juiz imparcial: e o Estado, que reservou para si o exercício da função jurisdicional, tem o correspondente dever de agir com imparcialidade na solução das causas que lhe são submetidas.

Ângelo não pediu pecúnia em troca da liberdade de Cláudio, mas pediu a virgindade de sua irmã como custa, ferindo o Princípio da Imparcialidade, pois deveria decidir a lide, independentemente de intercessão da irmã, ou muito menos do que a irmã lhe iria oferecer, mas apenas com justiça. Deveria decidir também sem o intuito de usar a punição de Cláudio como forma de fazer medo na sociedade, provando sua braveza. Deveria decidir de acordo com o imposto por lei, ou então, de acordo com analogia, observando como o Duque, seu antecessor, decidira os demais casos parecidos com aquele. Foi repudiável o governo de Ângelo e encontra-se no livro o aspecto jurídico do não cumprimento do Princípio da Imparcialidade.

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6  CONCLUSÃO

Após análise da obra e das demais fontes de pesquisa, conclui-se que Shakespeare é um autor de renome que fez um trabalho surpreendente ao unir o estudo de Direito e Literatura em sua obra. Dentro dessa crítica, pode-se observar uma falha que está deveras presente na sociedade brasileira quando o assunto é o julgamento: a parcialidade.

Ao analisar a parcialidade do juiz na obra, conjugando com doutrinadores jurídicos, conclui-se que a discussão levantada em “Medida por Medida”, pode servir de alerta para juristas, no que tange à aplicação das leis e à conclusão que esta traz, bem como para leigos, no conhecimento de um direito, que é o Princípio da Imparcialidade do Juiz.

Conclui-se ainda, que a literatura é uma forma descontraída e de alcance amplo para que haja divulgação do Direito, e o Direito uma forma sóbria para aplicação da Literatura. Após esse entendimento, vê-se que Direito e Literatura são completamente interligados e podem ser muito eficazes se aplicados em unidade.


7  REFERÊNCIAS

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2012.

BRASIL. Decreto-Lei n. 4.657 (1942). Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2012.

CINTRA, Antônio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini e DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria Geral do Processo. 25. ed. São Paulo: Editora Malheiros Editores, 2009. 385 p.

DINIZ, Bárbara. O Direito e a Moral na medida de Shakespeare. Revista dos Estudantes de Direito da Universidade de Brasília, n.4, p. 52-55, 2000.

DIREITO E LITERATURA – O PODER DAS PALAVRAS. Tv e rádio Unisinos, 2015. Lenio Streck gerencia o debate entre Mário Fleig, filósofo e psicanalista, Draiton Gonzaga de Souza, professor de filosofia da PUCRS e Henriete Karam, professora de Letras da UCS. Disponível em: <http://www.youtube.com/watch?v=aJIU5DbfjN4>. Acesso em: 27 nov. 2015.

MAGALHÃES FILHO, Glauco Barreira. Hermenêutica Jurídica Clássica. 2. ed. [s.l.: Editora Mandamentos], 2003. 92 p.

MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 15. ed. São Paulo: Editora Atlas, 2004. 863 p.

NADER, Paulo. Filosofia do Direito. 20. ed. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2011. 379 p.

RODRIGUES, Guylber Antônio. Direito e Literatura. 2011. 35 p. Monografia (Bacharelado em Direito) – Faculdade de Ciências Jurídicas, Universidade Tuiuti do Paraná, Curitiba, 2011.

SHAKESPEARE, William. Medida por Medida. Ridendo Castigat Mores. Rio de Janeiro: Ebooks Brasil, 2000. Disponível em: <http://www.ebooksbrasil.org/adobeebook/medida.pdf>

SILVA NETO, José Rodrigues da. Direito como literatura: “O Romance em Cadeia” de Ronaldo Dworkin. A retórica “Lítero-interpretativa” do Direito. 2009. 121 p. Dissertação (Mestrado em Direito) – Centro de Ciências Jurídicas da Universidade Federal de Pernambuco, Recife, 2009.

Sobre as autoras
Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LOPES, Aylene Periard; RIZ, Valquíria Aquino. Parcialidade do juiz em "Medida por Medida". Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4843, 4 out. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/52526. Acesso em: 2 nov. 2024.

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