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Implicações da desapropriação por utilidade pública do Decreto-Lei n.º 3.365/41 para grandes investimentos públicos

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4. Decreto-Lei Federal nº 3.365/41 – PRINCIPAIS PONTOS

O Art.1º do Decreto-lei nº 3.365/41 informa que é por esse instrumento legal que o instituto das desapropriações é regulado em todo o território nacional, pois trata-se de competência federal.

Assim, para a análise dos processos expropriatórios é condição necessária observar os dizeres deste dispositivo legal, além, é claro, dos princípios que regem o Direito Administrativo brasileiro e a Constituição Federal de 1988. O art. 4º do Decreto-lei n.º 3.365/41 determina que:

Art. 4º - A desapropriação poderá abranger a área contígua necessária ao desenvolvimento da obra a que se destina, e as zonas que se valorizarem extraordinariamente, em consequência da realização do serviço. Em qualquer caso, a declaração de utilidade pública deverá compreendê-las, mencionando-se quais as indispensáveis à continuação da obra e as que se destinam à revenda.

Parágrafo único.  Quando a desapropriação destinar-se à urbanização ou à reurbanização realizada mediante concessão ou parceria público-privada, o edital de licitação poderá prever que a receita decorrente da revenda ou utilização imobiliária integre projeto associado por conta e risco do concessionário, garantido ao poder concedente no mínimo o ressarcimento dos desembolsos com indenizações, quando estas ficarem sob sua responsabilidade.

Além disso, o Decreto-lei elenca em seu Art. 5º o rol de casos que são considerados de utilidade pública para fins de desapropriação. Entre os quais encontra-se “a criação de estádios, aeródromos ou campos de pouso para aeronave” (inciso n, grifo nosso).

Há ainda regulamentação para a forma com que o processo expropriatório deve ocorrer, sendo que a declaração de utilidade pública deve ser realizada mediante publicação de decreto pelo Presidente da República, Governador, Interventor ou Prefeito.

Além disso, há na legislação a previsão de que o pagamento seja justo, prévio e em dinheiro. Portanto, o Expropriante deve realizar avaliação do valor do bem e destinar os recursos necessários para a desapropriação. Caso o proprietário não concorde com o valor fixado pelo Poder Público, há a possibilidade de recorrer a Justiça, sendo que o expropriado pode levantar até 80% do valor avaliado pelo Poder Público, enquanto transcorre o processo na Justiça.

Quanto aos prazos para a desapropriação, o art. 10 do Decreto-lei é expresso em delimitar o prazo máximo de 5 (cinco) anos para que o Poder Público efetive a desapropriação:

Art. 10. A desapropriação deverá efetivar-se mediante acordo ou intentar-se judicialmente, dentro de cinco anos, contados da data da expedição do respectivo decreto e findos os quais este caducará. Neste caso, somente decorrido um ano, poderá ser o mesmo bem objeto de nova declaração.

A questão que surge, então, é relacionada aos casos dos grandes projetos de longo prazo que são implementados pelo Poder Público, pois a disponibilidade de recursos pode não ser imediata, mas o interesse público é existente. Nesses casos, no intervalo de 1 (um) ano após o prazo legal, não há o interesse público e transcorrido 1 (um) ano o interesse público para os mesmos fins prevalece.

Não é questão trivial o processo de desapropriação, pois exige uma série de atos administrativos e, principalmente, de disponibilidade de recursos para a sua efetivação (Carvalho Filho, 2014). Nesse sentido, o Decreto-lei nº 9.282, de 23 de Maio de 1946, suspendeu, por dois anos, no Distrito Federal, o disposto no artigo 10 do Decreto-lei nº 3.365 de 21 de Junho de 1941, que é o artigo que dispõem sobre os prazos para o poder público efetivar a desapropriação.

A justificativa para a suspensão por dois anos consubstanciadas no Decreto-lei n.º 9.282/46 foram as que seguem:

O Presidente da República, considerando que dentro no plano de urbanização e consequentes desapropriações no Distrito Federal, não foi possível ao Poder Público concluir, em muitos caso, as desapropriações decretadas;

Considerando que efetivamente tendo sido originariamente efetuado um estudo para execução do projeto a longo prazo, eis que a lei anterior de desapropriações fixava nenhum prazo de caducidade dos decretos chegou ainda a seu termo:

Considerando que, assim, projetos cuja execução prevista demandaria um período mais longo foram aprovados por decretos que, no entanto, até hoje, por carência de tempo e de recursos materiais para o financiamento das desapropriações, ficaram sem execução;

Considerando que muitos desses decretos, cuja execução continua a ser objeto dos planos urbanísticos em pleno desenvolvimento, tendo sido os mesmos expedidos no sentido expresso dessa finalidade, estão na iminência de caducar;

Considerando que o dispositivo novo do artigo 10 do Decreto-lei número 3.365, de 21 de Junho de 1941, considera caducos em cincos anos os decretos expedidos para as desapropriações e que dentro naquele prazo não tenham tido execução;

Considerando que a aplicação deste princípio, no caso especial do Distrito Federal, redundará, no momento, em graves prejuízos para a economia, da administração, atraso nas obras projetadas sem vantagem de qualquer espécie, quer para os particulares, quer para o Poder Público.

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Assim, tem-se no Decreto-lei nº 9.282/46 a ratificação de que o prazo estabelecido pelo Decreto-lei nº 3.365/41 não é exequível para todas as situações em que o Poder Público precisa realizar desapropriações, não sendo este fato uma questão nova na história das desapropriações para grandes projetos.


5. O CASE DO PROJETO DE EXPANSÃO DO AEROPORTO INTERNACIONAL TANCREDO NEVES - AITN

Nesse sentido, cumprindo o previsto no Decreto-lei 3.365/41, o Estado de Minas Gerais decretou, em 2009, de utilidade pública para fins de desapropriação a área necessária à expansão do Aeroporto Internacional Tancredo Neves, localizado nos Municípios de Lagoa Santa e de Confins. A decretação de Utilidade Pública se faz necessária para que o aeroporto tenha capacidade de comportar o volume de passageiros previstos para o longo prazo.

Contudo, após o transcurso de 5 (cinco) anos, o Estado de Minas Gerais não obteve êxito na desapropriação de toda a área de expansão. Dessa forma, pretende-se discutir a viabilidade de novo Decreto de Desapropriação para esta área, tendo em vista que o interesse público na expansão do Aeroporto Internacional permanece.

O Decreto Sem Número de 31 de Agosto de 2009 trouxe em seu conteúdo a área inicial prevista para a ampliação do aeroporto. No entanto, após estudos técnicos visualizou-se a necessidade de readequação da área para contemplar também a área do acesso viário norte ao Aeroporto Internacional Tancredo Neves – AITN –, que motivou assim a publicação do Decreto Sem Número de 05 de Março de 2010 para assim alterá-lo. Objetivando readequar o memorial descritivo e a redação do Decreto Sem Número de 2009, o Decreto Sem número de 2010 fora revogado pelo Decreto com Numeração Especial 646 de 19 de Novembro de 2013. No entanto, após vislumbrar novamente a necessidade de readequação do memorial descritivo, e por fim, o Decreto Sem Número de 31 de Agosto de 2009 foi readequado pelo Decreto com Numeração Especial 710 de Dezembro de 2013.

Analisando o histórico de decretos apresentado acima, podemos vislumbrar que o Expropriante mantém o interesse em tornar públicas as áreas decretadas 2009, tendo em vista as atualizações em procedimentos que foram realizadas.

Ademais, conforme apresentado abaixo, percebe-se que estão em curso diversos investimentos na área já pertencente ao Aeroporto, de acordo com informações da Secretaria de Estado de Desenvolvimento Econômico:

Projeto Aeroporto Industrial;

Nova Rodovia LMG 800;

Novo Terminal de Passageiros;

Terminal provisório de passageiros.

Além disso, o Aeroporto foi concessionado pelo Governo Federal no ano de 2013, sendo administrado por um consórcio chamado BH Airport, que é composto pelas seguintes empresas:

Companhia de Concessões Rodoviárias (CCR);

Zurich Airport  (operador aeroportuário internacional);

Infraero (Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária).

As duas empresas constituíram uma Sociedade de Propósito Específico – SPE –, que detém 51% da composição acionária do aeroporto, permanecendo os outros 49% da composição acionária com a Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária -Infraero. Esse consórcio restou responsável pela gestão do aeroporto pelos próximos 30 anos. (BH Airport).

O grupo BH Airport será responsável por uma série de investimentos para modernização e aumento de capacidade do aeroporto, conforme está previsto no contrato de concessão. Dentre os investimentos, destacam-se a construção de uma nova pista de pousos e decolagens até o ano de 2020, novo terminal de passageiros até o ano de 2016, novas áreas para estacionamento e aumento de capacidade do aeroporto para 20 milhões de passageiros, entre outras iniciativas (BH Airport).

Assim, fica latente que o interesse público na expansão do Aeroporto Internacional Tancredo Neves permanece, apesar de ainda não ter sido concluído o processo expropriatório. Nesse sentido, de acordo com informações da Secretaria de Estado de Desenvolvimento Econômico de Minas Gerais, parte das áreas necessárias para desapropriação já está em processo judicial para expropriação.

A Ação de Desapropriação de uma das fazendas necessárias à expansão é a de n.º 004016-24.2014.8.13.0210 e tramita na Comarca de Pedro Leopoldo. Foi realizado o depósito judicial e o Estado já possui a posse da fazenda, pois foi determinada a Imissão de Posse da área.

Há de se reforçar a premissa de que a utilidade pública da área de ampliação do AITN não foi alterada pelo decurso do tempo de 5 anos, conforme apresentado na seção anterior.

A redação do Decreto-lei n.º 3.365/41 disciplina:

Art. 10 A desapropriação, deverá efetivar-se mediante acordo ou intentar-se judicialmente, dentro de cinco anos, contados da data da expedição do respectivo decreto e findos os quais este caducará. Neste caso, somente decorrido um ano, poderá ser o mesmo bem objeto de nova declaração. (grifo nosso).

Dessa forma, a análise inicial sobre o tema parece nos remeter à caducidade do decreto que declara de utilidade pública a área de ampliação do AITN.

No entanto, tal raciocínio pode ser refutado se interpretarmos o Art. 10 do Decreto-lei 3.365/41 como não recepcionado pela Constituição de 1988.

A Constituição de 1988, em seu art. 5º, inciso XXIV prevê o seguinte mandamento:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...)

XXIV - a lei estabelecerá o procedimento para desapropriação por necessidade ou utilidade pública, ou por interesse social, mediante justa e prévia indenização em dinheiro, ressalvados os casos previstos nesta Constituição; (...) (grifos nossos).

Dessa forma, podemos perceber que o texto constitucional estabelece que a desapropriação ocorrerá sempre que existir a necessidade ou utilidade pública. Nesse sentido advoga Salles (1995):

Inúmeras vezes, editada a declaração de utilidade pública, fatores supervenientes criam sérios percalços à expropriação, tais como: falta de recursos orçamentários para a execução das obras ou serviços, prioridade na feitura de outras obras ou serviços, etc. A Administração vai, assim, procrastinando o início das obras que deram origem à declaração, até que, em determinado momento, se dá a caducidade do ato respectivo. Nessa altura, pode até mesmo ocorrer que o Poder Público já se tenha desinteressado inteiramente da execução dos planos iniciais, de modo que, com a caducidade do ato declaratório, a propriedade particular estará plenamente liberada. Há, pois, um interesse a justificar a fixação de um prazo de caducidade para o ato declaratório de utilidade pública.

Percebe-se que, no caso fático, não houve a mera desídia do Poder Público expropriante, pois a fim de garantir a prévia indenização, e atuar de forma coerente com a vontade do legislador constituinte, tornou-se imperativo a viabilização de verbas orçamentárias para iniciar o processo de desapropriação.

Outro fator que acarretou o retardo ao início do processo de desapropriação fora a reestruturação da área a ser desapropriada por conta do Plano Macroestrutural elaborado pelo Estado de Minas Gerais, sendo que o objetivo foi otimizar a área a ser desapropriada, reduzindo os custos do Estado, a luz do princípio da eficiência, e também minimizar a intervenção na propriedade privada (PEREIRA, 2015).

Em sentido diverso Carvalho Filho (2014, p. 852) leciona que a constituição conferiu à norma infraconstitucional a possibilidade de, ao regular o procedimento de desapropriação, estabelecer algumas restrições ao Poder Público.

Se tomarmos esse argumento como válido, uma alternativa que se faz viável, do ponto de vista jurídico, é a possibilidade dos poderes municipais envolvidos, in casu Lagoa Santa e Confins, ou até mesmo a União, procederem com a desapropriação por interesse público ou a desapropriação urbanística. Isto é possível porque a caducidade do decreto não vincula outro ente federado. Nesse sentido leciona Salles (1995):

Todavia, para os que consideram constitucional a parte final do art. 10 da Lei de desapropriações, o lapso de uma ano ali previsto não impede que outro setor da administração edite nova declaração no curso daquele prazo; Em outras palavras: se o ato declaratório atingido pela caducidade fixado pelo Poder Executivo Estadual, nada impede, p. ex., que o Presidente da República edite nova declaração de utilidade pública versando sobre o mesmo bem, ainda que no curso daquele prazo, se o considerar útil ou necessário à execução de obra ou serviço federal. A proibição constante da parte final do art. 10 só atinge, portanto, o setor da Administração que permitiu ocorresse a caducidade do ato declaratório, que seria, assim, como que punido pela desídia em que incidiu ou pela precipitação com que se houve ao declarar a utilidade pública de um bem para fins de desapropriação, sem estar certo da pronta conveniência de efetivá-la.

Dessa forma, percebemos que no plano pragmático seria possível outro ente federado (União ou os Municípios) não estão impedidos de emitir outro ato declaratório de utilidade pública. No entanto, esse procedimento mobilizaria um outro aparato técnico-administrativo para conduzir a desapropriação que manifestamente é de interesse local, regional e nacional.

Nesse sentido, podemos proceder com a argumentação de que o art. 10 do Decreto-lei 3.365/41 não está oferecendo garantia alguma ao particular, pois a sua propriedade é de relevante interesse público, visto que a ampliação do Aeroporto é considerada planejamento macroestrutural e de longo prazo. Assim, o poder público não só não desistirá da desapropriação, como não pode desistir sob pena de afrontar o interesse público.

Portanto, a aplicação do art. 10 do Decreto-lei 3.365/41 colide com o princípio da Supremacia do Interesse Público, pois com a necessidade de uma nova declaração expropriatória a indicação do estado em que se encontra o bem, que será objeto da desapropriação, para efeito de fixar a futura indenização, poderá sofrer uma atualização encarecendo o custo da desapropriação.

Ainda, a aplicação do referido dispositivo, no caso analisado, trará a necessidade de que outro ente federado proceda com a declaração expropriatória colidindo com os princípios da eficiência e da celeridade.

Dessa forma, tem-se que o art. 10 do Decreto-lei 3.365/41, não deveria ser aplicado, pois, tem-se que a desapropriação da área de ampliação do AITN é uma desapropriação anômala visto que reúne os requisitos da Desapropriação por Necessidade Pública e da Desapropriação Urbanística, porém em seara onde prevalece o interesse regional/metropolitano.

Sobre os autores
Paulo Mendes

Advogado, professor e Servidor Público estadual da carreira Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental de Minas Gerais. Doutorando em Ciência Política pela UFMG. Mestre em Administração Pública pela Escola de Governo da Fundação João Pinheiro, Especializado em Direito Público pela Universidade Católica Dom Bosco em 2011, Graduado em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais em 2008 e em Administração Pública pela Escola de Governo da Fundação João Pinheiro em 2007. Diretor de Planejamento Econômico e Articulação Institucional da Secretaria de Estado de Desenvolvimento Econômico de Minas Gerais e anteriormente Diretor de Fomento aos Consórcios Públicos e Assistência Técnica aos Municípios da Secretaria de Estado de Desenvolvimento Regional, Política Urbana e Gestão Metropolitana de Minas Gerais entre 2011 e 2015.

Daniel Ferreira de Souza

Advogado, servidor público estadual da carreira Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental em Minas Gerais, especialista em Direito Penal e Processual Penal pelo Centro Universitário Newton Paiva, graduado em Direito pela UFMG e em Administração Pública pela Escola de Governo Paulo Neves de Carvalho da Fundação João Pinheiro.

Frederico Amaral e Silva

Servidor público estadual da carreira Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental em Minas Gerais, especializado em Direito Administrativo pela Faculdade de Estudos Administrativos de Minas Gerais – FEAD, em Gestão de Projetos pela Fundação Dom Cabral e graduado em Administração Pública pela Fundação João Pinheiro.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MENDES, Paulo; SOUZA, Daniel Ferreira et al. Implicações da desapropriação por utilidade pública do Decreto-Lei n.º 3.365/41 para grandes investimentos públicos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 22, n. 4971, 9 fev. 2017. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/53600. Acesso em: 22 dez. 2024.

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