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Princípio da imutabilidade do nome da pessoa natural.

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Agenda 02/12/2017 às 16:25

5. Princípio da Imutabilidade do Nome. 

O nome – tome-se como princípio específico – é imutável, pois a singela vontade de modificação não pode colocar em risco a estabilidade das relações sociais e a indispensável segurança jurídica.

Admite a Lei de Registros Públicos seja o nome da pessoa natural modificado em decorrência de alguns fatos justificadores, mas o princípio comum é o de sua imutabilidade. Conquanto o entendimento jurisprudencial fosse no sentido de que a “imutabilidade do prenome permanece ante à evolução do direito para a consagração do princípio da perpetualidade dos registros públicos”, houve sensível alteração da interpretação do dispositivo da Lei de Registros Públicos que permite a alteração do nome da pessoa natural.[15] Desta maneira, muito embora a inalterabilidade seja a regra, deve ceder ante circunstâncias imperativas, principalmente quando se impõe a correção de equívocos prejudiciais à vida do indivíduo ou quando se mostrar viável a alteração do nome quando submete seu titular à chacota, ao escárnio, ao desprezo, fazendo-se seu titular envergonhar e buscar ocultamento da própria identidade. Em todos os casos, entretanto, deve haver sempre a preocupação de preservar os apelidos de família e de não causar prejuízo a outrem ou à ordem jurídica, como por exemplo, causar fraudes em detrimento de credores ou proporcionar embaraço à aplicação da Lei e da Justiça.[16]

O artigo 55 da Lei de Registros Públicos dispõe que quando o declarante não indicar o nome completo, o oficial lançará adiante do prenome escolhido o nome do pai, e na falta, o da mãe, se forem conhecidos e não o impedir a condição de ilegitimidade, salvo reconhecimento no ato e que fica expressamente proibido aos oficiais do registro civil prenomes suscetíveis de expor ao ridículo os seus portadores. Quando os pais não se conformarem com a recusa do oficial, este submeterá por escrito o caso, independente da cobrança de quaisquer emolumentos, à decisão do Juiz competente.

O enredo de nomes diferentes – e que submetem seu titular ao vexame, ao riso e ao escárnio - é grande e só se iguala com a inventividade brasileira sobre o tema. A literatura especializada indica alguns nomes com esse naipe.

O artigo 56 da Lei de Registros Públicos oportuniza ao interessado, no primeiro ano após ter atingido a maioridade civil, poderá, pessoalmente ou por procurador bastante, alterar o nome, desde que não prejudique os apelidos de família, averbando-se a alteração que será publicada pela imprensa.                  

Mais importantes para a presente abordagem são os artigos 57 e 58 da aludida Lei de Registros Públicos, que assim dispõem:

“Art. 57.  A alteração posterior de nome, somente por exceção e motivadamente, após audiência do Ministério Público, será permitida por sentença do juiz a que estiver sujeito o registro, arquivando-se o mandado e publicando-se a alteração pela imprensa, ressalvada a hipótese do art. 110 desta Lei.  (Redação dada pela Lei nº 12.100, de 2009)

[...]

§ 2º A mulher solteira, desquitada ou viúva, que viva com homem solteiro, desquitado ou viúvo, excepcionalmente e havendo motivo ponderável, poderá requerer ao juiz competente que, no registro de nascimento, seja averbado o patronímico de seu companheiro, sem prejuízo dos apelidos próprios, de família, desde que haja impedimento legal para o casamento, decorrente do estado civil de qualquer das partes ou de ambas.  (Incluído pela Lei nº 6.216, de 1975).

§ 3º O juiz competente somente processará o pedido, se tiver expressa concordância do companheiro, e se da vida em comum houverem decorrido, no mínimo, 5 (cinco) anos ou existirem filhos da união. (Incluído pela Lei nº 6.216, de 1975).

[...]

§ 7o Quando a alteração de nome for concedida em razão de fundada coação ou ameaça decorrente de colaboração com a apuração de crime, o juiz competente determinará que haja a averbação no registro de origem de menção da existência de sentença concessiva da alteração, sem a averbação do nome alterado, que somente poderá ser procedida mediante determinação posterior, que levará em consideração a cessação da coação ou ameaça que deu causa à alteração. (Incluído pela Lei nº 9.807, de 1999)

§ 8o  O enteado ou a enteada, havendo motivo ponderável e na forma dos §§ 2o e 7o deste artigo, poderá requerer ao juiz competente que, no registro de nascimento, seja averbado o nome de família de seu padrasto ou de sua madrasta, desde que haja expressa concordância destes, sem prejuízo de seus apelidos de família. (Incluído pela Lei nº 11.924, de 2009)

Já o artigo 58 estatui:

“Art. 58. O prenome será definitivo, admitindo-se, todavia, a sua substituição por apelidos públicos notórios. (Redação dada pela Lei nº 9.708, de 1998)

Parágrafo único. A substituição do prenome será ainda admitida em razão de fundada coação ou ameaça decorrente da colaboração com a apuração de crime, por determinação, em sentença, de juiz competente, ouvido o Ministério Público.  (Redação dada pela Lei nº 9.807, de 1999)

Conquanto a imutabilidade do nome da pessoa natural deva ser considerado como um princípio, tal não se mostra absoluto, haja vista que nem mesmo no rol dos direitos e garantias individuais existem direitos absolutos, como já decidiu o Supremo Tribunal Federal.


6. Princípio da Mutabilidade Controlada do Nome.

Reverso da medalha do princípio da imutabilidade do nome da pessoa natural é o princípio da mutabilidade controlada do nome da pessoa natural. Nada mais salutar e necessário para a segurança jurídica, para a concretização do princípio da dignidade humana e o bem-estar de seu titular.

A flexibilização do princípio da imutabilidade do nome da pessoa natural se motiva, na linguagem da Ministra Nancy Andrigy, no voto condutor do REsp 1412260/SP, “pelo próprio papel que o nome desempenha na formação e consolidação da personalidade de uma pessoa”. Entretanto, a possibilidade de alteração do nome não é desconhecedora de limites, pois o “respeito aos apelidos de família e a preservação da segurança jurídica são sempre considerados antes de se deferir qualquer pedido de alteração de nome”.[17]

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Assim, vê-se que o princípio da imutabilidade do nome não é absoluto, uma vez que a “regra geral, no direito brasileiro, é a da imutabilidade ou definitividade do nome civil, mas são admitidas exceções. Nesse sentido, a Lei de Registros Públicos prevê, (i) no art. 56, a alteração do prenome, pelo interessado, no primeiro ano após ter atingido a maioridade civil, desde que não haja prejuízo aos apelidos de família e (ii) no art. 57, a alteração do nome, excepcional e motivadamente, mediante apreciação judicial, e após oitiva do MP.” STJ, 3ª Turma, REsp 1412260/SP, Relatora: Ministra Nancy Andrighi, julgado em 15/5/2014, DJe 22/5/2014. De forma muito parecida, agora sob a relatoria do Ministro Paulo de Tarso Sanseverino no julgamento do Recurso Especial 1304718/SP, decidiu a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça que o “princípio da imutabilidade do nome não é absoluto no sistema jurídico brasileiro. 2. O nome civil, conforme as regras dos artigos 56 e 57 da Lei de Registros Públicos, pode ser alterado no primeiro ano após atingida a maioridade, desde que não prejudique os apelidos de família, ou, ultrapassado esse prazo, por justo motivo, mediante apreciação judicial e após ouvido o Ministério Público”.[18]

Autoriza-se a alteração do nome civil em razão da aplicação da Lei de Proteção à Testemunha, em decorrência de cirurgia para redesignação sexual ou para fins de filiação socioafetiva. Segundo restou decidido no REsp 1008398/SP, Relatora: Ministra Nancy Andrighi: E a tendência mundial é a de alterar-se o registro adequando-se o sexo jurídico ao sexo aparente, ou seja, à identidade sexual, formada também por componentes psicossociais. Analisada a questão com base no direito comparado, constata-se, por exemplo, a existência de lei alemã regulando o registro dos transexuais desde 10 de setembro de 1980 (Lei dos Transexuais – Transsexuellengesetz – TSG). Essa norma permite tanto a alteração do prenome do transexual (kleine Lösung – “pequena solução”), quanto a modificação do gênero sexual em seu assento de nascimento, desde que tenha sido submetido à cirurgia de redesignação sexual (groâe Lösung – “grande solução”)”.[19] 

Segundo Rolf Madaleno: “Não obstante a codificação em vigor não reconheça a filiação socioafetiva, inquestionavelmente a jurisprudência dos pretórios brasileiros vem paulatina e reiteradamente prestigiando a prevalência da chamada 'posse do estado de filho', representando em essência o substrato fático da verdadeira e única filiação, sustentada no amor e no desejo de ser pai ou de ser mãe, em suma, de estabelecer espontaneamente os vínculos da cristalina relação filial. A noção de posse do estado de filho vem recebendo abrigo nas reformas do direito comparado, o qual não estabelece os vínculos parentais com o nascimento, mas sim na vontade de ser genitor, e esse desejo é sedimentado no terreno da afetividade, e põe em xeque tanto a verdade jurídica como a certeza científica no estabelecimento da filiação”.[20]

Para que ocorra a mudança de nome e de designação sexual nos registros públicos em decorrência de transexualismo – mediante ato cirúrgico praticado mediante exercício do consentimento livre e esclarecido - há necessidade de estrita observância à Resolução 1.652/2002, editada pelo Conselho Federal de Medicina, que exige o atendimento aos critérios de: (a) desconforto com o sexo anatômico natural; (b) desejo expresso de eliminar os genitais, perder as características primárias e secundárias do próprio sexo e ganhar as do sexo oposto; (c) permanência desses distúrbios de forma contínua e consistente por, no mínimo, dois anos; (d) ausência de outros transtornos mentais. Além disso, a seleção dos pacientes para cirurgia de transgenitalismo obedecerá a avaliação de equipe - multidisciplinar - constituída por médico psiquiatra, cirurgião, endocrinologista, psicólogo e assistente social, obedecendo os critérios definidos, após, no mínimo, dois anos de acompanhamento conjunto: (a) diagnóstico médico de transgenitalismo; (b) ser maior de 21 (vinte e um) anos de idade; (c) ausência de características físicas inapropriadas para a cirurgia. “Sob a perspectiva dos princípios da Bioética – de beneficência, autonomia e justiça –, a dignidade da pessoa humana deve ser resguardada, em um âmbito de tolerância, para que a mitigação do sofrimento humano possa ser o sustentáculo de decisões judiciais, no sentido de salvaguardar o bem supremo e foco principal do Direito: o ser humano em sua integridade física, psicológica, socioambiental e ético-espiritual”.[21]


7. Remédios Jurídicos

Se o erro no nome civil não exigir maiores indagações para sua constatação e correção, poderá realiza-lo o oficial do registro público, após manifestação do Ministério Público. A alteração será feita mediante petição assinada pelo interessado, representante legal ou procurador, independentemente de pagamento de selos e taxas, após manifestação conclusiva do Ministério Público.         

Nos casos em que exista a necessidade de dilação probatória em razão de eventual indagações para a constatação imediata de necessidade de sua correção, a forma apropriada para alteração posterior do nome civil da pessoa natural é por ação específica. O pedido deverá ser realizado mediante apresentação de razões que levam seu titular a pleitear a mudança. Após será colhida manifestação do Ministério Público, que atua como fiscal da ordem jurídica. Sendo autorizada a mudança, por sentença, a que estiver sujeito o registro, deverá ser arquivado o mandado judicial e publicando-se a alteração pela imprensa. 

A zombaria, o menoscabo, o desrespeito, o achincalhe ao nome da pessoa natural – e isso independentemente da pretensão de sua alteração do nome por seu titular – é conduta proibida pela Lei, sujeitando seus autores e agentes à recomposição dos danos morais e materiais daí decorrentes. Aliás, é claríssima a disposição do Código Civil de que pode ser exigido – judicial ou extrajudicialmente, entendemos - que cesse a ameaça, ou a lesão, bem como a de pleitear perdas e danos, sem prejuízo de outras sanções previstas em Lei.  No caso de nome de morto, possuirá legitimação para requerer a proteção legal o cônjuge sobrevivente ou qualquer parente em linha reta, ou colateral até o quarto grau.

O Código de Processo Civil dispõe no parágrafo único do artigo 497 que para concessão da tutela específica destinada a inibir a prática, a reiteração ou a continuação de um ilícito, ou a sua remoção, é irrelevante a demonstração da ocorrência de dano ou da existência de culpa ou dolo. Nesse sentido: “É absurdo imaginar que alguém, para corrigir ou evitar um ilícito, tenha que demonstrar culpa. O direito de evitar a propagação dos efeitos concretos do ilícito e de inibir o ilícito logicamente não depende de culpa. Ninguém pode impedir a concessão de qualquer destas tutelas afirmando não ter culpa Exemplificando: ninguém pode alegar, para descaracterizar a tutela de remoção do ilícito, que não agiu com culpa ao colocar produto com composição proibida no mercado, ou afirmar que não sabia que determinada marca comercial pertencia a outrem para ver denegada a tutela inibitória”.[22]

Com foco no artigo 461 do Código de Processo Civil de 1973, mas aplicável ao Processo Civil inaugurado pela Lei 13105/2015, Joaquim Felipe Spadoni ensina que: "O ajuizamento de uma ação inibitória objetiva evitar a violação de um direito do autor, pelo réu, ser efetivada pelos atos que estejam em desacordo com o existente dever de conduta. Tem em vista atos futuros do sujeito passivo da obrigação, desejando que esses atos, quando praticados, o sejam na forma devida e legal. Em suma, pretende-se ver garantidos a integridade e o respeito ao direito afirmado, que depende, a princípio, de uma conduta lícita do devedor, prevista em lei ou contrato. O que tem o autor de uma ação inibitória em vista é, assim, impedir que um ato ilícito seja praticado, ou fazer cessar uma conduta ilícita já iniciada, mas que continua ou que pode se repetir."[23] O comportamento de terceiro que viole o direito ao nome, ainda que seja vexatório e exponha seu titular ao escárnio público, não afasta que o órgão jurisdicional "constatando um sério perigo de prática de ato violador de interesse merecedor de tutela específica, expede ordem ao réu para que cumpra a determinação judicial e não viole o direito do autor, ou, então, adota as medidas sub-rogatórias que conduzem a resultado prático equivalente ao devido adimplemento da obrigação".[24]

Sobre o autor
Horácio Eduardo Gomes Vale

Advogado Público em Brasília (DF).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

VALE, Horácio Eduardo Gomes. Princípio da imutabilidade do nome da pessoa natural.: Princípio da mutabilidade controlada do nome da pessoa natural. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 22, n. 5267, 2 dez. 2017. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/59871. Acesso em: 5 nov. 2024.

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