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Responsabilização civil do assédio moral no trabalho

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Agenda 22/11/2018 às 14:30

3 RESPONSABILIDADE CIVIL DO EMPREGADOR NO COMETIMENTO DO ASSÉDIO MORAL

Apesar de ainda não existir legislação tipificando o assédio moral, a doutrina e a jurisprudência já estabeleceram os seus conceitos e punições para os ofensores, incluindo as empresas.

Assim, de maneira geral, para que haja responsabilização do empregador por dano causado ao empregado, deve aquele incorrer em culpa ou dolo, nos moldes da responsabilidade civil subjetiva adotada pela legislação civil.

Ao tratar-se de responsabilidade civil, tem em regra o ato ilícito, que constitui ação positiva ou negativa que violou os preceitos do ordenamento jurídico, ou uma obrigação assumida.

No Brasil, a sistemática do direito positivo trouxe a previsão de responsabilidade civil objetiva do empregador pelos atos dos seus prepostos, independentemente e sem prejuízo da possibilidade de responsabilização direta do agente causador do dano.

Relativamente à responsabilidade civil objetiva do empregador por ato de seus empregados, Pamplona Filho e Gagliano (2014, p. 263-264) explicam que:

A ideia de culpa, na modalidade in eligendo, tornou-se legalmente irrelevante para se aferir a responsabilização civil do empregador, propugnando-se pela mais ampla ressarcibilidade da vítima, o que se mostra perfeitamente compatível com a vocação de que o empregador deve responder pelos riscos econômicos da atividade exercida.

Seguindo a mesma linha de raciocínio, Guedes (2004, p. 119) ensina:

Graças à jurisprudência progressista dos tribunais, amparada na lição de Clóvis Beviláqua, se construiu a teoria da "presunção de culpa" - livrando a vítima da prova da culpa concorrente ou "in vigilando" do empregador. Assim, provado o dano e o nexo de causalidade entre este e o fato do agente, a pessoa jurídica é obrigada à reparação. [...] assim, na ocorrência de dano praticado por empregados ou prepostos no exercício do trabalho que lhes competir ou por ocasião deste, o empregador responde independentemente de culpa. Basta que reste provado o ato ilícito – ofensa a uma norma preexistente ou erro de conduta -, o dano e a relação de causalidade.

Este entendimento doutrinário encontra respaldo jurídico no art. 933 do CC/2002, o qual estabeleceu expressamente o caso de responsabilidade objetiva do empregador em face de atos praticados por seus empregados, em razão de seu trabalho: “As pessoas indicadas nos incisos I a V do artigo antecedente, ainda que não haja culpa de sua parte, responderão pelos atos praticados pelos terceiros ali referidos.”

A responsabilidade do empregador pelos atos de seus empregados decorre tanto de atos contra outros empregados, quanto de qualquer outra pessoa. Por sua vez, dispõe o art. 932, inc. III, do CC/2002 que: “São também responsáveis pela reparação civil: [...] o empregador ou comitente, por seus empregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele”.

Ademais, ainda que aplicada a responsabilidade subjetiva, o empregador responde em face do assédio praticado por seus prepostos, em razão de incorrer em culpa in omittendo e in eligendo.

Desse modo, em sendo praticado o assédio moral na empresa por qualquer empregado, gerente, preposto, contra qualquer pessoa, como empregado ou cliente, a empresa é responsável pela reparação civil, independentemente de culpa, podendo ser acionada judicialmente pela vítima.

3.1 A Conduta do Agressor e o Perfil da Vítima no Assédio Moral

O assédio moral, como já comentado, é uma forma de terror psicológico, humilhando a vítima que é inferiorizada e tem sua autoconfiança e autoestima abaladas. As ações do agressor são previamente articuladas para esse objetivo.

Hirigoyen (2001) divide as atitudes do agressor em duas etapas: a sedução perversa e a violência manifesta. A primeira fase ocorre no início do relacionamento, o agressor envolve a vítima com um processo de desestabilização e perda gradativa da autoconfiança. Já na segunda fase, já estando à vítima desestabilizada, o agressor começa a realizar estratégias de agressão e violência para eliminar a vítima de vez.

Para a estudiosa Barros (2007, p.909) esta traz o perfil do assediador como sendo: “O perfil do Assediador Moral, em princípio, é o de uma pessoa perversa. A provocação que exerce sobre a vítima leva-a a ultrapassar os seus limites. O perverso só consegue existir e ter uma boa autoestima humilhando os outros”.

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Embora não haja um perfil fixo da figura do assediador, algumas características revelam-se comuns nesse tipo de agressor. Segundo Barreto (2007, p. 56) normalmente são pessoas “[...] vaidosas, ferinas, hipócritas, levianas, narcisistas e, para completar, fracas e medrosas”.

Entretanto, apesar de possuir essas características, o assediador não aparenta tais desvios de caráter e se esconde sob máscaras, por isso se utiliza de subterfúgios como, por exemplo, armar tramas e espalhar boatos sorrateiramente para alcançar seus objetivos perversos.

Carvalho (2009, p. 72), ao citar o empregador como principal agente causador do assédio moral, faz uma relação com denominado poder de direção:

“Decorrência direta da subordinação jurídica a que está submetido o empregado (por força do contrato empregatício), este tem a obrigação de cumprir suas tarefas com zelo, diligência e boa-fé, submetendo-se assim ao poder de direção, devendo obedecer às ordens que lhe são destinadas pelo empregador diretamente ou por aqueles que exercem poderes delegados (superiores hierárquicos).

Não obstante a subordinação jurídica do empregado perante o empregador, essa condição não permite que este trate o trabalhador de modo desrespeitoso, humilhante, degradante, violando assim sua dignidade e condição de ser humano”.

Desta forma, o empregador ou aquele que exerce o poder de direção de forma delegada, não pode exagerar no exercício desse poder, sob pena de atingir a dignidade do seu empregado e caracterizar o assédio moral. 

Em relação à vítima do assédio moral, Aguiar (2005) afirma que nem todos os empregados se tornam vítimas do assédio moral. Para ele os alvos são pessoas “atípicas”, seja por sua competência excessiva, por sua diferença dos padrões, por seu desempenho abaixo do esperado, etc.

Para a estudiosa Ramirez (2011, p. 1), no seu entendimento: 

“[...] a pessoa assediada é escolhida porque tem características pessoais que perturbam os interesses do elemento assediador, com ganância de poder, dinheiro ou outro atributo ao qual lhe resulte inconveniente o trabalhador ou trabalhadora, por suas habilidades, destreza, conhecimento, desempenho e exemplo [...].”

Em suma, podemos notar que o assédio moral é um fenômeno complexo, onde o problema todo passa principalmente pela cultura organizacional, pois ele acontece no âmbito da relação entre dois seres humanos, onde um tenta dominar o outro, infligindo humilhações silenciosas que atingem diretamente a honra, desta maneira a vítima, quem sofre as consequências diretas do assédio, tem atingida sua dignidade, sua honra, pelos comportamentos do agressor.

3.2 A necessidade de uma Lei Federal para Assédio Moral

Não existe uma medida efetiva que vise a inibir a prática do assédio moral. Uma das causas deste mal é não haver uma legislação, no âmbito federal, específica, que preveja a prisão dos assediadores.

No Brasil, diversos projetos de leis tramitam no Congresso Nacional, com o objetivo de regular a questão do assédio moral ou, como preferem alguns legisladores, a coação moral. Dentre tais projetos destacam-se os que alteram o Código Penal; a Lei nº 8.112, a Lei nº 8.666 e um que propõe alteração na CLT.

Tramita, no Congresso Nacional, um Projeto de Lei nº 3.760, de 2012, que dispõe sobre o assédio moral nas relações de trabalho, que tem como justificação que não há nenhuma Lei federal, específica, sobre assédio moral nas relações de trabalho, que coíba de forma eficaz e eficiente esse instituto deletério, responsável pela desestruturação do meio ambiente do trabalho, além de configurar fator de desrespeito à dignidade humana do trabalhador brasileiro.

Nesta justificação à proposta de aprovação deste projeto de lei, informa, ainda, que embora seja difícil estabelecer uma conceituação para o assédio moral, podemos defini-lo como uma conduta abusiva e reiterada praticada contra o empregado pelo empregador, ou por algum de seus prepostos com poder de mando sobre a vítima, deixando sequelas na saúde física e psíquica do trabalhador, vulnerando o ambiente laboral, configurando inequívoca afronta à dignidade da pessoa humana do empregado.

Na concepção de Glöckner (2004, p. 57) tem-se que:

A existência de uma lei expressa sobre o assédio moral não tem o condão somente de punir, mas fará com que sejam trabalhados sistemas de prevenção no ambiente de trabalho das empresas, e, infelizmente, aqui no Brasil só existem mudanças nas condições de trabalho quando da existência de uma lei expressa que regulamenta determinada condição e que a infringência do dispositivo gera prejuízo ao empreendedor.

Mesmo não havendo uma legislação específica sobre assédio moral, o dano pessoal dele decorrente compete à Justiça do Trabalho apreciar. Hirigoyen (2002, p. 343) diz que: "... antes mesmo de existir uma legislação, a Justiça tinha começado a levar em conta os atos hostis ou ofensivos dirigidos de maneira evidente contra um empregado em seu local de trabalho."

Atualmente, é pacificado (EC 45/2004) o entendimento de que todo e qualquer dano pessoal, incluindo inclusive o assédio moral que é causador deste dano pessoal, ocorrido na relação de emprego ou em função desta, compete à Justiça do Trabalho a proteção.

Na ausência de uma legislação específica, a Jurisprudência constitui um instrumento eficaz para estabelecer o conceito de assédio moral, com as infrações e sanções nesse terreno, e as medidas para evitar essa prática, as Convenções Coletivas.

Mas em qual legislação irá embasar a vítima que tem seu contrato de trabalho regido pela CLT ou mesmo que não tenha carteira assinada para pleitear seus direitos? A vítima irá buscar amparo, primeiramente, na CRFB, que em seu art. 5º, V e X, lhe assegura o respeito à dignidade humana, à cidadania, à imagem e ao patrimônio do obreiro, com indenização por danos morais.

As práticas do assédio moral são, geralmente, enquadradas no artigo 483 da CLT, o qual elenca que o empregado poderá considerar rescindido o seu contrato de trabalho e pleitear a devida indenização quando, entre outros motivos, forem exigidos serviços superiores às suas forças, contrários aos bons costumes ou alheios ao contrato, ou ainda, quando for tratado pelo empregador ou por seus superiores hierárquicos com rigor excessivo ou ato lesivo da honra e boa fama.

O assédio moral também figura na esfera criminal, conforme o caso, a conduta do agressor poderá caracterizar crimes contra a honra, como a difamação e injúria, contra a liberdade individual, em caso, por exemplo, de constrangimento ilegal ou ameaça.

3.3 Competências à Justiça do Trabalho de processar e julgar Assédio Moral

A competência de processar e julgar os casos de assédio moral no ambiente de trabalho é da Justiça do Trabalho.

Durante muito tempo a doutrina e a jurisprudência discutiram sobre de quem seria a competência para processar e julgar os casos de assédio moral no ambiente de trabalho.

A divergência sobre de quem seria a competência para processar e julgar as ações de indenizações por danos morais e materiais decorrentes do assédio moral no ambiente de trabalho terminou com a chegada da EC nº. 45/2005, que atribuiu à Justiça do Trabalho a competência definitiva para julgar tais ações.

As súmulas 392 do TST e 736 do STF pacificam também o entendimento de ser da Justiça do Trabalho a competência para processar e julgar ações que descumpram normas trabalhistas e ações de indenização por dano moral derivadas da relação de trabalho.

Entende-se, finalmente, que o pedido de reparação de dano moral em virtude do assédio moral, decorrente da relação contratual-trabalhista, configurando descumprimento da obrigação contratual de respeito aos direitos de personalidade e dignidade do empregado, será de competência material da Justiça do Trabalho, embora, à primeira vista, a questão interesse ao direito civil, cujo assédio moral se enquadra no conceito de ato ilícito, previsto no art. 186 do CC.

Embora ainda não tipificado na legislação federal trabalhista, o assédio moral e seus efeitos indenizatórios derivam diretamente da Constituição da República, que firma como seus princípios cardeais o respeito à dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, CRFB), à vida e à segurança (art. 5º, caput, CRFB), ao bem estar e à justiça (Preâmbulo da Constituição), estabelecendo ainda como objetivos fundamentais do Brasil construir uma sociedade livre, justa e solidária (art. 3º, I, CRFB), promovendo o bem de todos (art.3º, IV, ab initio, CRFB) e proibindo quaisquer formas de discriminação (art. 3º, IV, in fine, CRFB). Ressalte-se, por cautela, que não se há falar em prova do dano moral, mas, sim, na prova do fato que gerou a dor, o sofrimento, o constrangimento físico ou moral, o que ocorreu na hipótese.

Segundo a doutrinadora Nascimento (2009, p. 176), com a entrada em vigor da EC nº. 45/2004, o STF quando do julgamento do Conflito de Competência determinou que todas as causas pendentes de julgamento sobre o assunto deveriam ser remetidas a Justiça do Trabalho.

Segundo Leite (2009, p. 217-8), no que tange ao dano moral, antes mesmo da Emenda Constitucional 45/04, a jurisprudência já vinha entendendo que o dano moral oriundo da relação de emprego, isto é, aquela com vínculo empregatício entre o empregador e empregado, deveria ser julgado pela Justiça do Trabalho, como diz a Súmula 392 do TST, antiga Orientação Jurisprudencial: “Nos termos do art. 114 da CF/1988, a Justiça do Trabalho é competente para dirimir controvérsias referentes à indenização por dano moral, quando decorrente da relação de trabalho”. Com a EC 45/04, a Justiça do Trabalho passou também a apreciar casos envolvendo dano moral decorrentes de trabalhadores não empregados, como é o caso, por exemplo, do eventual, avulso e autônomo. Com a entrada em vigor da referida Emenda, passou a julgar também dano patrimonial.

Portanto, cominando os art. 114 e o inciso X do art. 5º, ambos da CRFB, com o art. 8º da CLT, conclui-se que a Justiça do Trabalho é competente para julgar dissídios entre empregado e empregador que envolva, não apenas matéria trabalhista prevista na CLT, como também pedidos de indenização por dano moral, que tenha decorrido da execução do contrato de trabalho, face à ampla garantia constitucional de reparação de dano moral, sendo que o texto constitucional não distingue ou limita a reparação apenas na esfera civil, e face à inovação da subsidiariedade da aplicação do direito comum à relação de emprego.

Sobre o autor
Edvaldo do Carmo Silva

Advogado Civilista, atuante nas áreas de direito bancário, família, consumidor.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SILVA, Edvaldo Carmo. Responsabilização civil do assédio moral no trabalho. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 23, n. 5622, 22 nov. 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/63882. Acesso em: 28 dez. 2024.

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