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Cooperação x celeridade no novo CPC

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Agenda 05/06/2018 às 16:30

A solução para o morosidade processual reside na estruturação devida do Poder Judiciário. E, para isso, é imperioso que coexistam o princípio da cooperação e o princípio da celeridade processual.

RESUMO: Este estudo tem por objetivo abordar e discutir os princípios da cooperação e celeridade no âmbito do novo Código de Processo Civil brasileiro, tendo em vista a aparente incompatibilidade entre ambos. No Brasil, o princípio da cooperação foi consagrado recentemente pelo Código de Processo Civil de 2015, em seu artigo 6º, enquanto o princípio da celeridade já estava estabelecido no artigo 5º, inciso LXXVIII, da Constituição Federal de 1988, ratificado agora pelo artigo 4º do supracitado diploma legal. O presente trabalho analisa, primeiramente, a possibilidade do princípio da celeridade ser prejudicado pelo da cooperação processual, sob o argumento de que a participação mais efetiva das partes no processo acabaria por torná-lo mais lento. Posteriormente, dá um enfoque social, filosófico e jurídico à questão da celeridade processual, sob o ponto de vista do direito constitucional a um processo célere, problema de estrutura do judiciário nacional. Este artigo foi elaborado por pesquisa bibliográfica em livros, códigos, periódicos e internet acerca do tema em debate. Em que pese à argumentação em sentido contrário, verifica-se, de maneira categórica, não só a possibilidade como o dever de coexistência entre o princípio da cooperação e o da celeridade processual, conforme se verifica nas alegações abaixo delineadas. Percebe-se que a solução para o morosidade processual reside na estruturação devida do Poder Judiciário para assegurar o pleno cumprimento dos mandamentos constitucionais e processuais.  

Palavras-chave: cooperação; celeridade; novo CPC.

SUMÁRIO:1 INTRODUÇÃO..2 METODOLOGIA..3 RESULTADOS...4 DISCUSSÃO..5 CONCLUSÃO..REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICAS.                  


INTRODUÇÃO

 O equilíbrio entre os princípios da cooperação (previsto no artigo 6º do Código de Processo Civil de 2015) e o da celeridade processual (estabelecido no artigo 4º do Código de Processo Civil de 2015) é essencial para que o novo Código de Processo Civil cumpra com o seu dever de conduzir as demandas sociais de forma justa.

O artigo 4º do Código de Processo Civil de 2015 preceitua que os litigantes têm o direito de receber a solução total do mérito, o que também inclui a atividade satisfativa, em tempo aceitável.

Já o artigo 6º do Código de processo Civil de 2015 estabelece que todos aqueles envolvidos no processo têm o dever de cooperação mútua para que a resolução de mérito justa e efetiva ocorra em prazo satisfatório.    

 A questão toma ampliação principalmente devido à adoção do princípio da cooperação pelo Código Civil de 2015, considerando-se a notória morosidade do sistema judiciário brasileiro, o que provocou uma grande celeuma entre a comunidade jurídica nacional.

A Constituição Federal de 1988 já havia estabelecido o princípio da celeridade processual em seu artigo 5º, inciso LXXVIII, de acordo com o qual a duração razoável do processo e os meios garantidores da rapidez para seu trâmite são garantidos a todos nas searas judicial e administrativa.

 Tal princípio serve para viabilizar às partes um tempo satisfatório de tramitação processual, caso seja levado em consideração apenas aquilo que está dito de forma expressa na Carta Magna.

Muitas vezes, durante a tramitação do processo judicial, uma ou ambas as partes utilizam-se de artifícios escusos para retardar o mesmo, como a interposição de recursos manifestamente protelatórios.

Esta prática, além de congestionar o já abarrotado sistema judiciário brasileiro, fere o princípio da cooperação processual, o qual é tão caro para o novo Código de Processo Civil e, portanto, não pode mais ser admitida pelo direito processual moderno.

É importante ressaltar que a aplicação do princípio da cooperação pelos operadores do direito no novo Código de Processo Civil não agravará a morosidade do sistema judiciário brasileiro, pois é um conjunto de fatores que provoca tal situação.

 Por exemplo, advogados que se servem dos vários recursos previstos e sobrecarregam os Tribunais, o Estado (maior litigante de todos), a falta de aparelhamento estatal, juízes que não são capazes de atender às milhares de demandas que têm sob sua incumbência, entre outros.

O princípio da celeridade, adotado pelo artigo 5º, inciso LXXVIII, da Constituição Federal de 1988, por si só, é efetivo em países com aparelhamento estatal adequado, além de promover segurança jurídica pela expectativa de que o processo tenha uma duração razoável.

Contudo, revela-se inapropriado no Brasil sem a aplicação de outros princípios para efetivar um processo que tenha durabilidade compatível com a necessidade das partes, servindo apenas para dar legitimidade a um ditame constitucional, mesmo que no plano material seja inócuo.

O grave quadro de lentidão na prestação jurisdicional exige a combinação dos princípios da celeridade e cooperação processual para possibilitar a aplicação de regras que rompam com o formalismo processual.

Consequentemente, isso efetivará os referidos princípios, garantindo, assim, o direito a um processo cooperativo e dentro do limite de tempo razoável, em homenagem aos artigos 5º, inciso LXXVIII, da Constituição Federal de 1988, 4º e 5º do Código de Processo Civil de 2015.


METODOLOGIA

 Trata-se de um estudo descritivo inserido no campo da revisão sistemática da literatura, sendo voltado para a avaliação crítica da aplicação pelos operadores de Direito dos princípios da celeridade e da cooperação processual no novo Código de Processo Civil, com enfoque na possibilidade de que a utilização deste princípio prejudicaria a celeridade processual em um sistema judiciário já marcado pela morosidade.

Foram encontrados 123 títulos e selecionados 104 resumos, sendo o critério de inclusão para tais estudos a existência de qualquer referência ao tema celeridade x cooperação no novo Código de Processo Civil e dos textos analisados 6 foram selecionados por abordarem de forma crítica a celeridade x cooperação no novo Código de Processo Civil.

O estudo foi realizado entre maio e setembro de 2016 utilizando a base de dados Scielo\br. Trata-se de um tema relativamente escasso e de difícil acesso, já que o novo Código de Processo Civil só entrou em vigor recentemente, no dia 18 de março de 2016.


RESULTADOS

  O princípio da cooperação processual, estabelecido no artigo 6º do Código de Processo Civil de 2015, dá margem à interpretação de que a partir de agora o autor, réu e juiz caminharão de mãos dadas, rumo a um processo célere, efetivo e capaz de produzir resultados justos. Contudo, tal modelo de cooperação não é passível de cogitação, devido à própria natureza da lide, que é marcada pelo conflito de interesses.

Portanto, a aplicação do princípio da cooperação pelos operadores do Direito não configura a busca pelo processo civil inalcançável, mas um limite ao exercício de direitos processuais, como ao contraditório.

Cunha foi feliz ao afirmar que a cooperação:

Impõe deveres para todos os intervenientes processuais, a fim de que se produza, no âmbito do processo civil, uma ¨eticização¨ semelhante à que já se obteve no direito material, com a consagração de cláusulas gerais como as da boa fé e do abuso de direito (CUNHA, 2013).

Brêtas também se posiciona sobre o tema, utilizando os seguintes termos:

O contraditório, princípio componente do devido processo legal, na atualidade, não mais pode ser entendido na concepção restritiva de ciência bilateral e contrariedade aos atos e termos do processo. Seu alcance técnico-científico é bem maior, devendo-se compreender como garantia fundamental das partes de participação e manifestação efetivas em todos os atos e fases do procedimento, sem exceções de quaisquer espécies, possibilitando-lhes influírem na geração de um pronunciamento decisório favorável aos seus interesses. Somente assim, ter-se-á decisão gerada democraticamente pela comparticipação dos sujeitos do processo (partes contraditoras e juiz), com a implementação técnica dos direitos e garantias constitucionais ostentados pelas partes (BRÊTAS, 2012, p. 175).

Logo, o litigante deve receber informações para que tenha a possibilidade de reagir e de influenciar o juiz, embora tais direitos de informação-reação possam ser exercidos apenas se estiverem em sintonia com os escopos do processo. Além de proibir a litigância de má-fé, a cooperação exige comportamento, à luz do homem médio, baseado em padrões aceitáveis de comportamento, que considerem as expectativas legítimas definidas em relação às demais partes processuais.

Conforme preceitua Machado e Oliveira:

O juiz, do mesmo modo, tem deveres a observar em sua participação no contraditório. Decerto, tem o poder-dever de impulsionar o processo, de proferir e de efetivar ume decisão, mas, ao fazê-lo, deve privilegiar uma comunicação clara com os litigantes e usar de modo racional o formalismo processual (MACHADO e OLIVEIRA, 2015).

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Ademais, não se pode negar o prestígio de que o princípio da cooperação processual goza nos dias atuais, tanto nacional quanto internacionalmente, pela necessidade que o cidadão tem de receber a prestação jurisdicional da forma mais célere e eficaz possível.

 Didier Júnior afirma sobre o assunto que:

Atualmente, prestigia-se no Direito estrangeiro – mais precisamente na Alemanha, França e em Portugal – e, já, com algumas repercussões na doutrina brasileira, o chamado princípio da cooperação, que orienta o magistrado a tomar uma posição de agente-colaborador do processo, de participante ativo do contraditório e não mais a de um mero fiscal de regras (DIDIER JÚNIOR, 2006, p. 75).

Por ser um preceito tácito no ordenamento jurídico brasileiro, a cooperação é baseada no devido processo legal e promove a interação entre os sujeitos da relação processual. De acordo com tal princípio, caso seja identificada questão de ordem pública pelo julgador, a manifestação dos litigantes deve ser solicitada, a fim de que colaborem para sua solução.

Dando prosseguimento à sua explicitação, Didier Júnior argumenta que:

[...] O magistrado deve adotar uma postura de diálogo com as partes e com os demais sujeitos do processo: esclarecendo dúvidas, pedindo esclarecimentos quando estiver com dúvidas e, ainda, dando as orientações necessárias, quando for o caso. Encara-se o processo como produto de atividade cooperativa: cada qual com as suas funções, mas todos com o objetivo comum, que é a prolação de um ato final (DIDIER JÚNIOR, 2006, p. 76).

Consequentemente, não só os litigantes como o juiz devem auxiliar para a compreensão da norma mais adequado à hipótese, não se manifestando sempre de forma contrária ao processo como se este fosse um inimigo cuja destruição deve ocorrer o quanto antes. A cooperação e o entendimento entre as partes deve ser algo corriqueiro e pregresso, pois se trata do direito de outrem e não apenas de simples suposições acadêmicas doutrinárias difundidas em livros de proposições puramente acadêmicas.

Silva preconiza sobre o tema em questão que:

[...] qualquer procedimento não poderá jamais oferecer uma solução absolutamente ideal e imune a qualquer ¨ inconveniente¨ , ou seja, independentemente do rito utilizado para se dirimir todas as lides existentes, ainda assim o juiz nunca poderá assegurar em todos os casos que está imune de cometer qualquer injustiça  (SILVA, p. 166).

A contemporização do processo é um resultado óbvio da cooperação, o que provoca insegurança jurídica no entendimento do referido autor:

[...] um processo extremamente seguro, mas excessivamente lento é tão inadequado quanto outro bastante rápido, mas sem nenhuma segurança, tendo que se buscar formas de equilibrar a balança, garantindo um processo rápido quanto possível, para obter uma maior segurança nos provimentos jurisdicionais (SILVA, p. 167).

O significado do princípio da cooperação pode ser demonstrado a partir de alguns exemplos de regras diferentes criadas para o Código de Processo Civil de 2015, como também os motivos pelos quais o princípio da celeridade não deve se sobrepor àquele, mas ser aplicado em conjunto:

1. Proibição do conhecimento de matéria ex oficio sem que seja concedida oportunidade de manifestação das partes anteriormente (art. 10, CPC\2015). A cooperação se apresenta conforme cabe ao juiz decidir e conhecer de ofício sobre matérias de ordem pública (entre outras), porém tal poder-dever de decidir limita-se pela obrigação de antes ouvir as partes, a fim de evitar as denominadas ¨ decisões surpresa ¨ ou ¨ juízos de terceira via ¨, já que, se as partes não forem ouvidas, em vários casos aspectos importantes da relação litigiosa podem ser ignorados (direito material e processual);

2. Aviso sobre o prazo para a apresentação de defesa, no mandado de citação, sob pena de revelia (art. 250, II, CPC\2015). De acordo com o artigo 344 do Código de Processo Civil de 2015, ninguém pode esquivar-se do conhecimento da lei e esta indubitavelmente já estabelecia ser possível que o réu sofra as consequências da revelia caso este se omita em responder à demanda no prazo legal. Teoricamente não seria necessário o dever de alertar a parte adversa sobre um risco derivado da própria lei, mas o mesmo já estava previsto no Código de Processo Civil de 1973, inspirado na ideia de cooperação. A obrigação de avisar é primordial para favorecer um contraditório mais eficaz pois, mesmo que ninguém possa alegar o desconhecimento da lei para não cumpri-la, a norma processual muitas vezes é demasiadamente técnica, sendo por isso desarrazoado exigir de todos que tenham um conhecimento minucioso sobre as regras processuais.

3. Comunicado acerca da distribuição do ônus da prova (art. 357, III, CPC\2015). Tal dispositivo, que já estava previsto no Código de Defesa do Consumidor e no Código de Processo Civil de 1973, visa a evitar surpresas no processo, pois o juiz se dirige diretamente às partes, exigindo-lhes que apresentem as provas conforme a facilidade da sua respectiva obtenção, além de esclarecer, desde logo, que a omissão de qualquer das partes no cumprimento da obrigação que lhe foi imposta pode acarretar uma sentença desfavorável.

4. Prioridade do julgamento de mérito e instrumentalidade das formas (art. 282, § 2º e art. 317, CPC\2015).  Tal diretriz não é uma inovação do Código de Processo Civil de 2015, embora ressalte um dos aspectos fundamentais da cooperação na perspectiva do julgador, pois a norma vigorava nos Códigos anteriores e sua interpretação, guiada pela Constituição, mostra que o juiz não pode utilizar as formas processuais de modo arbitrário, deixando de servir ao escopo jurídico do processo. A finalidade da jurisdição é aplicar o direito material e, por sua vez, este é alcançado apenas quando ocorre o julgamento de mérito, já que, de acordo com Dinamarco: ¨a sentença terminativa é símbolo do fracasso da atividade processual¨. A doutrina e a jurisprudência produzidas abundantemente sobre o tema durante a vigência do Código de Processo Civil de 1973 indicam não se tratar mais de nenhuma novidade.

5. A provação do calendário processual pelas partes (art. 191, § § 1º e 2º, CPC\2015). É inequívoco que o calendário processual dá às partes poder de autorregulação, mas a intensidade desse poder causa preocupação pois, caso o juiz proponha calendário com datas de audiência, perícia e sentença, a fim de evitar a demora das intimações e dos procedimentos cartorários, a parte poderia simplesmente se recusar a cumprir o calendário, alegando motivo absurdo ou até mesmo sem nenhuma razão, sendo a cooperação um limite ao poder de autorregulação das partes sob este prisma. Afinal, os litigantes podem se manifestar propondo datas, alegando compromissos judiciais, dificuldades para obter informações, assistentes técnicos, documentos ou outra justificativa pertinente para recomendar mudanças nas sugestões de calendário ao juiz. Mas a simples recusa, sem nenhuma razão aparente ou por motivo escuso, configura claro abuso de tal poder, sendo a intervenção estatal na estabilização obrigatória do calendário totalmente legítima, pois é o juiz o gestor da unidade judiciária a qual preside, sendo toda dele a responsabilidade, inclusive administrativa, porque dela não participam as partes, seus advogados, o perito ou outros auxiliares da Justiça.

6. Saneamento compartilhado do processo (art. 357, § 3º, CPC\2015). Tal qual o calendário processual, esse dispositivo também prevê a autorregulação dos litigantes, mas com o diferencial da participação do juiz no ato processual e, pelas mesmas razões já mencionadas, a indicação dos pontos controvertidos e do objeto da prova a ser produzida deve considerar a vontade manifestada pelas partes. Entretanto, esta deve ser motivada, não sendo permitido à parte abusar do seu direito de autorregulação, além de insistir na produção de prova ou na fixação de ponto controvertido que não tenha explicação plausível para o processo. Mais uma vez, o responsável pelo equilíbrio dessa balança é o julgador, pois é dele a incumbência de restringir diligências inúteis, além da possibilidade de responder perante a Corregedoria do próprio tribunal ou perante o Conselho Nacional de Justiça pela determinação de movimentos processuais desnecessários, evidentemente protelatórios ou sugestivos do desejo puro e simples de se desfazer uma conclusão tardia em seu gabinete. Declarar que a direção do processo deve ser executada em clima de cooperação não quer dizer que o poder decisório dessa direção tenha se espalhado, dividindo-se circularmente entre o magistrado, os litigantes e seus advogados. As partes têm a faculdade de argumentar e de serem ouvidas em ambiente de diálogo aberto, embora o poder decisório sobre a melhor solução no que diz respeito à direção do feito pertence somente ao juiz, bem como as punições disciplinares por falhas cometidas eventualmente durante a prática desse poder-dever.

7.  Obrigação da parte de prestar esclarecimentos efetivos e claros em depoimento pessoal, sob pena de confissão (arts. 385 e 386, CPC\2015). Para atender ao objetivo da cooperação, não é suficiente que a parte compareça ao juízo   para prestar depoimento pessoal. É preciso que faça mais, como responder questões formuladas sem usar termos evasivos, que dê respostas claras e não dificulte o esclarecimento dos fatos. Se o juiz perceber a quebra da cooperação, tem a possibilidade de decretar a pena de confissão na sentença, bem como o faria no caso de recusa ou não comparecimento.

8.  Dever de exibição de documentos (art. 396 e 399, CPC\2015).  Se há muita coisa antiga na cooperação, talvez esse seja o mais velho de seus aspectos, pois estava presente nos artigos 216 a 218 do Código de Processo Civil de 1939 e nos artigos 355 a 358 do Código de Processo Civil de 1973. A ideia sempre foi a de que os litigantes têm de apresentar em juízo as coisas e os documentos que possuem e que, por algum motivo, sejam importantes para o julgamento da causa. A faculdade de brigarem por uma decisão favorável é claramente restrito pelo interesse estatal em proferir uma decisão adequada, logo, existe uma limitação ao contraditório definida pelo interesse público na boa prestação da tutela jurisdicional.

9.  Encargo de manter informações acerca de endereço eletrônico no cadastro da Justiça (art. 246, § 1º, CPC\2015). Os litigantes são livres e têm a faculdade de serem informados regularmente sobre a existência de um processo em seu desfavor. Entretanto, essa sim uma novidade, estão impossibilitados de contar com a morosidade ou com dificuldades eventuais das modos comuns de citação, devendo entregar à Justiça informações atualizadas a fim de facilitar a citação, até mesmo por meio eletrônico. Tal dispositivo mostra claro compromisso com a celeridade e com a economia processual, com a imposição de uma ¨obrigação anexa¨ no processo.

10. Dever do advogado de informar e intimar a testemunha arrolada por ele da audiência (art. 455, CPC\2015). Trata-se de mais uma novidade interessante, pois a comunicação dos atos processuais, em regra, é encargo do Estado-juiz. Porém, em certos casos, diante da proximidade das partes com e de seus advogados com as testemunhas indicadas por estes, aquela função estatal pode direcionada ao litigante e ao seu patrono. Com a adoção de tal conduta, o processo adquire celeridade e economia processual.

11. Obrigação de esclarecer ou explicitar o fundamento que levou à determinação da emenda da petição inicial (art. 321, CPC\2015). Por mais evidente que seja, às vezes é conveniente que certas obviedades sejam mencionadas, porque não basta que o juiz designe de modo enigmático a emenda da petição, mas é necessário, mas é preciso indicar aquilo que ele considera passível de ser emendado, esclarecendo ao demandante o defeito formal a seu ver cometido.

Estes são apenas alguns exemplos que o Código de Processo Civil de 2015 concretizou, mas, justamente por ser um princípio, a cooperação processual deve ocorrer na prática cotidiana dos litigantes, dos magistrados e dos auxiliares da Justiça. A especificação infraconstitucional dessa importância do contraditório denominada cooperação ou colaboração conseguiu chamar atenção para o tema, pois evidencia a urgência de observação dos deveres impostos pelo princípio do devido processo legal e, ao fazê-lo, conecta todos os sujeitos processuais à indispensável obediência às suas regras.

Machado e Oliveira assevera que:

O importante é ressaltar que esse princípio não exige das partes nem do juiz o inexigível. Não traz a ficção de que as partes se desgarrarão de seus objetivos privados, econômico-financeiros e egoísticos (egoísticos sim, claro, mal nenhum há nisso!), para buscarem juntos o etéreo ideal de justiça. O princípio tampouco indica que o juiz deve ter expectativas de que o processo se desenvolva desse modo (MACHADO e OLIVEIRA, 2015).

O ponto debatido em questão é o de restrições ou modulações ao exercício de faculdades e de poderes-deveres processuais, sendo que muitos já existiam no ordenamento jurídico pátrio e cuja aplicação era feita há muito tempo. Além de uma ou outra função importante e, obviamente, a explicação da ideia como princípio (conjuntura que é capaz de trazer a cooperação para o núcleo da discussão e, dessa forma, cria uma hermenêutica construtiva sobre o teor normativo do preceito), a ideia de cooperação é uma das inovações fundamentais do Código de Processo Civil de 2015.

Nunes ressalta a relevância de um processo baseado em uma estrutura cooperativa (ou comparticipativa, como o autor prefere denominar) e policêntrica nos seguintes termos:

Vislumbra-se que o processo estruturado na perspectiva comparticipativa e policêntrica, ancorado nos princípios processuais constitucionais impõe um espaço público no qual se apresentam as condições comunicativas para que todos os envolvidos, assumindo a responsabilidade de seu papel, participem na formação de provimentos legítimos que permitirá a classificação discursiva das questões fáticas e jurídicas.

No pêndulo por-juiz de um lado e, e pro-parte e advogado do outro, a comparticipação e o policentrismo buscam o dimensionamento e o equilíbrio das concepções liberais em face das nuanças de aplicação normativa, de modo que a assunção de responsabilidade de todos os agentes processuais e a mudança de sua mentalidade no exercício das respectivas funções venham a representar um verdadeiro horizonte para a almejada democratização processual  (NUNES, 2012, p. 240).

Porém, deve-se ressaltar que o princípio da cooperação está longe de ser unanimidade entre a doutrina, pois sofre críticas de autores como Lenio Streck, o qual defende que a cooperação processual prevista no artigo 6º do Código de Processo Civil é incompatível com a Constituição Federal de 1988 e está ¨ normatizando uma porta de entrada para o já superado socialismo processual, modo de retorno ao mito ¨ Oskar Bulow¨ , um salto em direção ao passado que se quer definitivamente suplantar ¨.

O renomado jurista destaca que: ¨ O novo Código de Processo Civil é a primeira grande regulamentação brasileira sobre Processo Civil a ser aprovada em período democrático. Isso porque os códigos anteriores o foram em períodos de exceção (1939 e 1973). Ponto para a doutrina, que espero que volte a doutrinar! E que não transforme o NCPC em um emaranhado de ¨ dribles da vaca¨. O novo CPC tem problemas? Sim. Muitos. Por exemplo, uma ¨coisa¨ chamada ¨ colaboração processual¨, que, longe de ser um princípio, corre o risco de jogar o processo civil nos braços do antigo socialismo processual.

Feito o introito, cabe indagar: o que é isto – a cooperação processual? Estando a resposta no arranjo previsto no novo CPC, o que se pode dizer, com segurança, é que se trata de algo que não se encaixa bem com o que diz a Constituição e sua principiologia. Insistimos, de pronto: cooperação não é princípio. Posto no novo CPC, o art. 6º diz que ¨ todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para que se obtenha, em tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva ¨. Sugere o dispositivo, numa primeira leitura, que a obtenção e decisões justas, efetivas e em tempo razoável – diretrizes relacionadas umbilicalmente com o que está previsto nos incisos XXXV e LXXVIII do artigo 5º da Constituição – não seria propriamente direito dos cidadãos brasileiros e estrangeiros residentes no país, mas também deveres a eles impostos. É o legislador, de modo sutil, depositando sobre as costas do jurisdicionado parcela imprevisível do peso Da responsabilidade que compete ao Estado por determinação constitucional. Uma ¨ katchanga processual ¨. Você quer uma decisão justa, efetiva e tempestiva? Então, caro utente, para o fim de consegui-la deverá cooperar com o juiz e sobretudo com a contraparte, e esperar igual cooperação de ambos¨ (STRECK, 2014, p. 1).

Ainda, para Mitidiero, a colaboração no processo civil funciona por meio da instituição de normas de conduta para o magistrado, pois é importante desde logo deixar claro:

O juiz do processo cooperativo é um juiz isonômico na condução do processo e assimétrico no quando da decisão das questões processuais e materiais da causa. Desempenha duplo papel, pois, ocupa dupla posição: paritário no diálogo, assimétrico na decisão. Visa-se alcançar, com isso, um ¨ ponto de equilíbrio¨ na organização do formalismo processual, conformando-o como uma verdadeira ¨ comunidade de trabalho¨ entre as pessoas do juízo. A cooperação converte-se em prioridade no processo  (MITIDIERO, 2011, p. 81).

Entretanto, Theodoro Júnior expressa opinião divergente ao afirmar que:

O Princípio da Cooperação tende a ¨ transformar o processo civil numa comunidade de trabalho ¨, na qual se potencializa o franco diálogo entre todos os sujeitos processuais – partes, juiz e intervenientes – a fim de alcançar ¨ a solução mais adequada e justa ao caso concreto ¨. A cooperação não se restringe à relação parte-juiz, tampouco se limita ao relacionamento entre as partes. Dela se extraem ¨ deveres a serem cumpridos pelos juízes e pelas partes ¨, de sorte que, na verdade, deve haver ¨ a cooperação das partes com o Tribunal, bem como a cooperação do Tribunal com as partes  (THEODORO JÚNIOR, 2011).

Seguindo a mesma linha de raciocínio, Oliveira preceitua que:

Entretanto, não somente o juiz deve colaborar para a tutela efetiva, célere e adequada. O novo direito processual defende a necessidade de uma ¨ democracia participativa ¨ no processo, com o consequente exercício mais ativo da cidadania, inclusive de natureza processual  (OLIVEIRA, 1993, p. 71).        

Do mesmo modo, Marinoni esclarece que:

Encarar o processo civil como uma comunidade de trabalho regida pela ideia de colaboração, portanto, é reconhecer que o juiz tem o dever de cooperar com as partes, , a fim de que o processo civil seja capaz de chegar efetivamente a uma decisão justa, fruto de efético ¨ dever de engajamento¨ do juiz no processo. Longe de aniquilar a autonomia individual e auto-responsabilidade das partes, a colaboração apenas viabiliza que o juiz atue para o obtenção de uma decisão justa com a incrementação de seus poderes de condução no processo, responsabilizando-o igualmente pelos seus resultados. A colaboração não apaga obviamente o princípio da demanda e suas consequências básicas: o juízo de conveniência a respeito da propositura ou não da ação e a delimitação do mérito da causa continuar tarefas ligadas exclusivamente à conveniência das partes. O processo não é encarado nem como coisa exclusivamente das partes, nem como coisa exclusivamente do juiz – é uma coisa comum ao juiz e às partes (chose commune des parties et du juge) ¨ (MARINONI, 2015, pp. 74-75).

Já Carneiro adverte oportunamente que:

O princípio da cooperação não se limita aos participantes tradicionais do processo: autor e réu. Deve o juiz, sempre que necessário, especialmente nos processos cujo resultado possa alcançar um grande número de pessoas, permitir a intervenção de pessoas, órgãos ou de entidades com interesse, ainda que indireto, na controvérsia.

Assim, promover a realização de audiências públicas (art. 927, § 2º; art. 983, § 1º; art. 1.038, II; v.g.), e até mesmo permitir o ingresso de outros personagens que possam colaborar para a realização da justiça, caso do amicus curiae (arts. 138 e 1.038, I), são corolários lógicos de uma das formas de cooperação do juiz com o deslinde da causa. Quanto maior for a participação e, portanto, os elementos de informação, maior será a legitimidade democrática da decisão¨ (CARNEIRO, 2015, p. 71).  

Quanto ao princípio da cooperação, Dinamarco afirma que:

Esse princípio busca também legitimar o procedimento, pois o que legitima os atos de poder não é a mera observância formal de procedimentos, mas a participação que o correto cumprimento das normas procedimentais possibilita aos destinatários – pedindo, alegando ou provando (DINAMARCO, 2013, p. 230).

Logo, Donizetti esclarece que:

Assim, o ativismo do juiz deve ser estimulado e ao mesmo tempo conciliado com o ativismo das partes, para que atenda à finalidade social do processo moderno. Torna-se necessário, pois, renovar mentalidades com o intuito de afastar o individualismo do processo, de modo que o papel de cada um dos operadores do direito seja o de cooperar com boa-fé numa eficiente administração da justiça. O processo deve, pois, seu um diálogo entre as partes e o juiz, e não necessariamente um combate ou um jogo de impulso egoístico (DONIZETTI, 2012).

Logo, a doutrina processual definiu certas obrigações recíprocas que devem ser implantadas de forma efetiva pelo magistrado no cotidiano forense:

a)   Obrigação de esclarecimento: dever do juiz de esclarecer com os litigantes acerca de determinadas dúvidas que tenha sobre alegações, posições ou pedidos feitos em juízo, avisando à outra parte sobre a diligência;

b)  Obrigação de consulta: o julgador deve ouvir antes os litigantes quanto às questões de fato ou de direito que poderão interferir na apreciação da demanda;

c)   Obrigação de prevenção: incumbe ao magistrado indicar as carências postulatórias dos litigantes, a fim de que sejam sanadas;

d)   Obrigação de auxílio: dever do juiz de colaborar com a parte para a superação de eventual obstáculo que suprima a prática de seus encargos ou deveres processuais;

e) Obrigação de urbanidade e correção: o julgador deve exercer uma conduta apropriada, ética e respeitosa em sua atividade jurisdicional.

Dentre os deveres de cooperação já citados, o dever de consulta ganha destaque sob o ângulo de materializar institutos constitucionais pela imposição de manifestação das partes antes da decisão do juiz, o qual as convoca para que esclareçam certo fato ou questão de direito intrínseca ao seu pronunciamento, mesmo tendo a faculdade de fazê-lo de ofício.

Pois, com tal atitude, reprime-se a denominada decisão-surpresa, avessa ao devido processo legal e à democracia, onde reside a missão certificadora desse novo padrão processual.

O órgão julgador, de acordo com Gouveia, de fato:

Deve consultar as partes sempre que pretende conhecer da matéria de fato ou de direito, de rito ou de mérito, sobre qual aquelas que não tenham tido a possibilidade de pronunciarem, seja porque o tribunal enquadra juridicamente a situação de forma diferente daquele que é a perspectiva das partes ou porque esse órgão pretende conhecer oficiosamente certo fato relevante para a decisão da causa (GOUVEIA, 2009, p. 34).   

Segundo Andreassa Júnior:

Não obstante as críticas sofridas por parte dos juristas, percebe-se um enorme avanço no novo Código de Processo Civil, o qual contribui, e muito, para o princípio da razoável duração do processo. A diminuição da esfera de compreensão dos fatos e a leitura estreita acerca das alterações processuais, indubitavelmente, pouco contribuem para o que realmente importa: o respeito ao que fora determinado pelo Poder Legislativo. O momento não é de questionar algo que já foi aprovado, mas sim de contribuição para a maior efetividade possível do novo diploma legal (ANDREASSA JÚNIOR, 2015).

Sobre a autora
Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SANTOS, Mirna Letycia Seabra. Cooperação x celeridade no novo CPC. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 23, n. 5452, 5 jun. 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/65683. Acesso em: 21 nov. 2024.

Mais informações

Artigo apresentado à Faculdade Guanambi como requisito parcial para a obtenção do título de Pós-Graduação lato sensu em Direito e Processo Civil, sob orientação do Prof. Me. Cristiano Chaves de Farias.

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