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Garantias nas contratações públicas: como utilizar títulos da dívida pública?

Agenda 01/05/2018 às 15:10

Títulos da dívida pública podem ser utilizados como uma das opções para garantia de contratos administrativos. No entanto, são pouco usados por falta de compreensão da norma e do funcionamento.

É dúvida muito comum no universo das contratações públicas e assunto pouquíssimo abordado na doutrina a utilização de títulos da dívida pública como garantia em contratos administrativos. Quais são e como se reconhecem os títulos prescritos na norma que servem para o fim da garantia, isso é o que se pretende abordar nas linhas que seguem.

A Administração Pública, ao realizar processo de contratação, direta ou por licitação, poderá exigir garantia contratual, no valor de até 5% do valor do contrato, conforme art. 56, caput, e parágrafo segundo da Lei nº 8666/93:

Art. 56. A critério da autoridade competente, em cada caso, e desde que prevista no instrumento convocatório, poderá ser exigida prestação de garantia nas contratações de obras, serviços e compras.

(...)

§ 2º A garantia a que se refere o caput deste artigo não excederá a cinco por cento do valor do contrato e terá seu valor atualizado nas mesmas condições daquele, ressalvado o previsto no parágrafo 3º deste artigo.

O ente público deverá prever tal obrigação em instrumento convocatório, sendo que caberá ao contratado escolher, a seu critério, a forma de garantia dentre aquelas previstas na própria lei, quais sejam: I) caução em dinheiro ou em títulos da dívida pública; II) seguro-garantia e; III) fiança bancária.

No entanto, a opção pela garantia por meio de títulos da dívida pública acaba sendo inviabilizada por falta de conhecimento e de compreensão da disposição normativa.

Não raramente, empresas que possuem tais títulos e têm interesse em oferece-los em garantia, não o fazem por desconhecer o procedimento para tanto. Pior, ao questionarem os agentes responsáveis pelo processo de contratação pública, não recebem desses uma resposta satisfatória, já que eles próprios não detêm compreensão da norma. Diante dessa realidade, dificilmente se tem notícia da utilização desses títulos como garantia de contrato.

Vale transcrever o dispositivo legal em comento:

I - caução em dinheiro ou em títulos da dívida pública, devendo estes ter sido emitidos sob a forma escritural, mediante registro em sistema centralizado de liquidação e de custódia autorizado pelo Banco Central do Brasil e avaliados pelos seus valores econômicos, conforme definido pelo Ministério da Fazenda; (Destacamos.)

Da simples leitura do dispositivo, percebe-se que não é qualquer tipo de título da dívida pública que poderá ser oferecido em garantia, mas somente aqueles a) emitidos de forma escritural; b) mediante registro autorizado pelo Banco Central do Brasil e; c) avaliados pelos seus valores econômicos.

Pois bem, resta compreender melhor os referidos requisitos, que é o que efetivamente gera dúvida aos atores dos processos de contratação pública.

Primeiramente, a lei determina que o título deve ser emitido na forma escritural. Pois bem, os títulos de dívida pública podem ser emitidos na já referida forma escritural ou cartular.

A cartular era a forma tradicional de emissão de títulos, feita em papel esses dependem da apresentação do documento físico para fazer valer o crédito ali especificado.

Já na escritural, o crédito deverá ser registrado ao beneficiário em centrais de liquidação e custódia autorizados pelo Bacen (segundo requisito exigido no inciso I do art. 56). Mais especificamente, SELIC/BACEN – Sistema Especial de Liquidação e de Custódia, CETIP – Câmara de Custódia e Liquidação e CBLC/BOVESPA – Companhia Brasileira de Liquidação e Custódia.[1]

À primeira vista, pode parecer uma restrição indevida a Lei de Licitações proibir o recebimento em garantia de títulos apenas por serem na forma cartular. No entanto, tal restrição faz todo sentido ao saber que esses títulos estão prescritos, com exceção dos Títulos da Dívida Agrária – TDA.[2]

Ademais, a partir da década de 80, o Tesouro Nacional passou a emitir todos os títulos na forma escritural. Além disso, os créditos são registrados no dito sistema de centralização de liquidação e custódia autorizado pelo Bacen. Em suma, os títulos atuais e válidos são emitidos na forma prescrita pela Lei nº 10.179/2001, regulamentada pelo Decreto nº 3.859/01.

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Veja o que prescreve o art. 5º da referida lei:

Art. 5º A emissão dos títulos a que se refere esta Lei processar-se-á exclusivamente sob a forma escritural, mediante registro dos respectivos direitos creditórios, bem assim das cessões desses direitos, em sistema centralizado de liquidação e custódia, por intermédio do qual serão também creditados os resgates do principal e os rendimentos.

São três os títulos nominalmente referidos na norma: I) Letras do Tesouro Nacional – LTN; II) Letras Financeiras do Tesouro – LFT e; III) Notas do Tesouro Nacional – NTN. Esses são títulos cuja emissão ocorre por meio de oferta pública, tal como leilões.

Ainda, existem os títulos com emissão direta, tais como certificados, previstos no parágrafo único do art. 2º da Lei nº 10.179, preferencialmente para operações com finalidades específicas definidas em lei.

Segundo o próprio sítio do Tesouro Nacional, os principais títulos emitidos de forma direta são:

Pode-se dizer, então, que a maioria dos títulos da dívida pública em circulação, não prescritos, podem ser utilizados como garantia em contratações públicas, com exceção clara ao TDA, já que se trata de título emitido na forma cartular.

Percebe-se, agora, que temos subsídios mais adequados para verificar quais são os títulos da dívida pública que atendem aos requisitos legais para fins de garantia contratual. Lembre-se, títulos emitidos na forma escritural, com créditos registrados em sistema central autorizado pelo Bacen.

Cabe ao agente público, ao receber os títulos nessas condições, verificar qual o seu efetivo valor econômico e se esse é suficiente para cobrir a garantia contratual (terceiro requisito).

Para tanto, é possível verificar a legislação básica, Decreto nº 3.859/2001, que oferece os valores nominais de referência, a data do resgate e a forma de rendimento entre o período de emissão e resgate do título.

Ademais, o próprio sítio do Tesouro Nacional [4] traz tabela com as características dos principais títulos em circulação, bem como tabelas com os valores nominais dos títulos em determinado período [5], além de cadernos de fórmulas utilizadas para os cálculos.

Diante disso, possuímos bastantes subsídios a dar efetividade à lei no que se refere à utilização de títulos de dívida pública para garantia de contratos administrativos. Pode o agente público, ao formular o instrumento convocatório, além de transcrever os requisitos já dispostos na lei, trazer os exemplos de títulos, anteriormente referidos, que poderão ser aceitos para fins de garantia, além de definir que os valores serão considerados conforme as regras definidas pelo Ministério da Fazenda, constantes do sítio oficial do Tesouro Nacional.


Notas

[1] http://www.tesouro.fazenda.gov.br/titulos-publicos-antigos

[2] http://www.tesouro.fazenda.gov.br/titulos-antigos-faq

[3] Vale destacar que acima referimos que os títulos LFT e NTN são emitidos por oferta pública, mas é possível, por meio de series específicas, a emissão direta dessas modalidades.

[4] https://www.tesouro.fazenda.gov.br/titulos-da-divida-interna

[5]http://www3.tesouro.gov.br/legislacao/download/divida/decretos/Bonds_Versao_portugues_atualizado_Revisado.pd

Sobre o autor
Adriano Biancolini

Advogado em Curitiba (PR) no escritório Biancolini D'Ambrosio e Menzel Vieira Advogados, com experiência em atuação consultiva em licitações e contratos administrativos e funcionalismo público. Graduado pela Faculdade de Direito de Curitiba. Administrador do site Convir - A sua consultoria jurídica virtual (http://convir-adv.blogspot.com.br/)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BIANCOLINI, Adriano. Garantias nas contratações públicas: como utilizar títulos da dívida pública?. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 23, n. 5417, 1 mai. 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/65727. Acesso em: 5 nov. 2024.

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