Em tempos de dólar alto, na economia do Brasil, acentua-se a meditação sobre o uso de moeda estrangeira nos contratos.
A lei do lugar da execução vigora no Brasil em dois casos: o primeiro deles concerne aos contratos exequíveis no Brasil, que corresponde a uma regra tradicional do direito brasileiro, em defesa dos interesses econômicos do país; em segundo caso, em que se aplica a lei do lugar da execução concernente da modalidade de execução das obrigações, princípio de origens do direito internacional privado.
A doutrina ensina que não se pode confundir exequibilidade e acionabilidade.
Exequível é sinônimo de exigível, cumprível. Lei do lugar onde a obrigação é exigível sempre foi o mesmo que lei do lugar ond eela é cumprivíel ou exequível.: lex loci solutionis vel lex loci executionis. Lex loci solutionis é definida como lei do lugar da execução da obrigçaão, do seu cumprimento. É a lição deixada por Teixeira de Freitas(Esboço, 1962 e 1963); Clóvis Beviláqua(Princípios elementares de direito internacional privado, §54, princ. e §55); Eduardo Espínola(Elementos, 662), dentre outros.
Acionável concerne à autoridade que vai julgar o caso, concerne ao foro de ação e não ao da obrigação, pois os contratos não exequiveis no Brasil, regem-se pela lei do páis em que deviam ser cumpridos, embora possam ser julgados pelas autoridades do Brasil, quando competentes. Essa a lição de Clóvis Beviláqua, obra citada, § 36, para quem, "exequíveis não quer dizer acionáveis; o contrato pode ter sido ajustado para executar-se fora da República e, no entanto, nela se tornar acionável".
O Decreto-lei n. 236, de 1938, mandava que nas dívidas em moeda estrangeira, que contenham cláusula-ouro, ficasse inválida a cláusula, mas permanecessem eficazes as obrigações em moeda estrangeira, determinando o seu pagamento pela moeda nacional, do correspondente ao débito da moeda estrangeira não do ouro. Condena-se a cláusula-ouro, permite-se o débito em moeda estrangeira. Assim, interpretava-se o decreto n. 23.501, de 27 de novembro de 1933, que declarava a nulidade de pagamento em ouro, em determinada espécie de moeda ou por qualquer meio tendente a recusar ou restringir, nos seus efeitos, o curso forçado do mil-réis papel, moeda da época.
O Decreto-lei n. 1.079, de 1939 veio declarar que, embora o valor da quantia mutuada haja sido expressa em moeda estrangeira, reputava-se convencionada em moeda-papel nacional, desde que nesta moeda tivesse sido fornecida a importância do mutuário, e, neste caso, o mutuário só é obrigado a restituir ao mutuante, nos termos e condições do contrato, a quantia em moeda nacional que houvesse recebido na data do contrato.
Pelo Decreto-lei n. 857, de 11 de setembro de 1969 foi prescrita a nulidade de pleno direito dos contratos, títulos e obrigações que “estipulem pagamento em ouro em moeda estrangeira, ou por alguma forma, restrinjam ou recusem, nos seus efeitos, o curso legal do cruzeiro, moeda da época.”
A Cláusula Ouro é a expressão dada à cláusula contratual que permite o pagamento de obrigações devidas em dinheiro, em moedas ou peças de ouro, ou observando a cotação de mercado daquele metal. No Brasil, a legislação sobre o assunto era o Código Civil de 1916, escrito nos pressupostos do liberalismo e da estabilidade monetária que já não refletia a realidade que o mundo viveria a partir da Primeira Guerra Mundial. Assim, foi consagrado o princípio da "Cláusula Ouro" pelo Código Civil em seus artigos 947, parágrafo 1º e 125.
Indagar-se-ia pela incidência da força maior nesses contratos.
A defesa da força maior rege-se pela lei do lugar da execução da obrigação, como ensinou Haroldo Valladão (Direito Internacional Privado, volume II, 2ª edição, pág. 196).
.A jurisprudência e a legislação posteriores — notadamente o Decreto-lei 857/1969, ainda em vigor — cuidaram de explicitar que essa vedação não se aplicava aos contratos internacionais, cumprindo registrar que, ao longo do tempo, a conceituação de “contrato internacional” foi sendo gradativamente ampliada, passando a abarcar não somente as operações objetivamente internacionais (exportações, importações, financiamento e garantias a exportações, compra e venda de câmbio), mas também aquelas subjetivamente internacionais (em que uma das partes é residente ou domiciliada no exterior), e, ainda, os contratos internos derivados daquelas operações (contratos internacionais por equiparação ou por acessoriedade, ex vi do contrato de repasse de recursos externos cf. Resolução n° 63 do Bacen).
Nesse sentido, determina o artigo 6° da Lei 8.880/94: “É nula de pleno direito a contratação de reajuste vinculado à variação cambial, exceto quando expressamente autorizado por lei federal e nos contratos de arrendamento mercantil celebrados entre pessoas residentes e domiciliadas no país, com base em captação de recursos provenientes do exterior”.
São nulas, em nosso ordenamento, as estipulações de pagamento ou reajuste de obrigação com base em ouro ou moeda estrangeira, ressalvados os casos previstos em lei. É exatamente o que prescreve o artigo 318 do atual Código Civil. Assim está prescrito: "Art. 318. São nulas as convenções de pagamento em ouro ou em moeda estrangeira, bem como para compensar a diferença entre o valor desta e o da moeda nacional, excetuados os casos previstos na legislação especial."
Serão nulas as cláusulas de pagamento em moeda nacional que estabeleçam equivalência com o montante em moeda estrangeira, porquanto representariam verdadeira burla à vedação legal acima debatida, indo de encontro, ainda, à norma contida no artigo 1°, inciso I, da Lei 10.192/01, que veda, sob pena de nulidade, quaisquer estipulações de “pagamentos expressas em, ou vinculadas, a ouro ou moeda estrangeira, ressalvado o disposto nos artigos 2° e 3° do Decreto-lei 857, de 11 de setembro de 1969, e na parte final do artigo 6° da Lei 8.880, de 27 de maio de 1994”
O STJ considera viável a contratação em moeda estrangeira, desde que o pagamento seja realizado em moeda nacional:
AGRESP 685804/RJ; AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL 2004/0119843-9. Ministra Nancy Andrighi. Terceira Turma. Data do Julgamento 16/2/2006. Data da Pub. 6/3/2006.
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AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. ARRENDAMENTO MERCANTIL. AÇÃO REVISIONAL. REAJUSTE PELA VARIAÇÃO CAMBIAL. CAPTAÇÃO DE RECURSOS NO EXTERIOR. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO. REEXAME DE PROVAS. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 07/STJ. DESPROVIMENTO.
(...)
2 – No que tange à manutenção da cláusula contratual que vincula o reajuste das prestações com base na variação cambial, no caso, o dólar Norte-Americano, conquanto seja lícita tal disposição no contrato de leasing, eis que expressamente autorizada em norma legal específica (art. 6º da Lei 8.880/94), o v. acórdão recorrido registrou a ausência de demonstração da efetiva captação de recursos em moeda estrangeira para aquisição do bem arrendado, reputando nula, pois, a aludida cláusula.(...)AGRG NO RESP 471057/ RS. AGRAVP REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. 2002/0127181-6. Ministro Jorge Scartezzinini. Quarta Turma. Data do Julgamento 28/6/2005. Data Pub. 15.8.05.
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COMERCIAL. VALIDADE DE CONTRATO CELEBRADO EM MOEDA ESTRANGEIRA. PAGAMENTO EM CRUZEIRO. EXEGESE DA NORMA CONTIDA NO ART. 1º DO DECRETO-LEI N.857/69.
I. Legítimo é o pacto celebrado em moeda estrangeira, desde que o pagamento se efetive pela conversão na moeda nacional.
II. O legislador visou evitar não a celebração de pactos ou obrigações em moedas estrangeiras, mas sim, aqueles que estipulassem o seu pagamento em outro valor que não o cruzeiro – moeda nacional – recusando seus efeitos ou restringindo seu curso lega. Inteligência do art. 1º do Decreto-Lei 857/69. Precedentes do STJ.
III. Recurso não conhecido.
JSTJ e TRF – LEX – 91, pág. 214