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Ação civil pública e a efetivação do direito ao meio ambiente do trabalho equilibrado

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Agenda 02/10/2018 às 13:00

3. DIREITOS METAINDIVIDUAIS

Antes de adentrar no estudo dos direitos metaindividuais, importa esclarecer que no presente trabalho não se pretende fazer distinção entre os termos “interesses” e “direitos”, o que deixou de ter relevância jurídica após o advento do interesse de massas.

Nesse sentido, o CDC também utiliza os dois termos sem distinção, assim como José dos Santos Carvalho Filho e Marcelo Abelha (2007, p.267), o qual ressalta que

Certamente que direito não é a mesma coisa que interesse e isso fica evidente no próprio texto legal, aliás, diz-se, normalmente, que direito é o interesse juridicamente protegido. Entretanto, por ficção jurídica, o legislador fez com que os interesses ali discriminados fossem equiparados a direitos, permitindo a sua tutela. Essa equiparação tem raízes fincadas na dificuldade de se definir e separar um instituto do outro; para aumentar o rol de interesses juridicamente tuteláveis; para concretizar a existência de direitos que não são apenas normas instituidoras de programas na nossa constituição, tais como o direito do ambiente, o direito ao desporto, o direito à saúde, o direito à informação, entre outros direitos sociais que apresentam espectro difuso (público propriamente dito). É de se notar que a antiga distinção entre interesse e direito parte da noção individualista, portanto, privatista de todo o Estado, onde este último tinha por função precípua ‘não violar direitos e garantias individuais. Hoje a sua função é menos negativa e mais positiva, na medida em que deve prestar, implementar e executar politicas públicas que indiquem os interesses sociais a serem perseguidos’.

Os direitos difusos são, segundo o art. 81, I do CDC, aqueles de “natureza indivisível de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstancia de fato”.

Alguns doutrinadores também conceituam este direito, a exemplo de Mancuso (2004) ao afirmar que

São interesses metaindividuais, que, não tendo atingido o grau de agregação e organização necessários à sua afetação institucional junto a certas entidades ou órgãos representativos dos interesses já socialmente definidos, restam em estado fluido, disperso pela sociedade civil como um todo (v.g., o interesse à pureza do ar atmosférico), podendo, por vezes, concernir a certas coletividades de conteúdo numérico indefinido (v.g., os consumidores). Caracterizam-se: pela indeterminação dos sujeitos, pela indivisibilidade do objeto, por sua intensa litigiosidade interna e por sua tendência à transição ou mutação no tempo e no espaço.

Direitos coletivos, por sua vez, são os “transindividuais de natureza indivisível de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contraria por uma relação jurídica base”, conforme preceitua o art. 81, II do CDC.

Na doutrina, temos a definição de Mancuso (2004, p.106), segundo o qual

 (...) não se trata da defesa do interesse pessoal do grupo; não se trata, tampouco, de mera soma ou justaposição de interesse dos integrantes do grupo; trata-se de interesses que depassam esses dois limites, ficando afetados a um ente coletivo, nascido a partir do momento em que certos valores, individuais, atraídos por semelhanças e harmonizados pelo fim comum, se amalgamam no grupo. É síntese, antes que mera soma.

Desse modo, a diferença existente entre direito difuso e o coletivo é que neste último existe uma relação jurídica-base ligando os sujeitos afetados, os quais também são determinados ou determináveis.

 Temos, ainda, os interesses individuais homogêneos, que segundo o art. 81, III do CDC, são aqueles decorrentes de origem comum.

Pedro Lenza (2005, p.69-70) o caracteriza da seguinte forma:

(...) transindividualidade artificial (ou legal) e instrumental; determinabilidade dos sujeitos; divisibilidade; disponibilidade (quando a lei não disponha o contrario); núcleo comum de questões de direito ou de fato a unir os sujeitos; irrelevância da unanimidade social; organização-ótima viável e recomendável; reparabilidade direta, com recomposição pessoal dos bens lesados (LENZA, 2005).

Por fim, Hugo Mazzilli (2004, p.53) diferencia esses três tipos de direitos transindividuais, afirmando que

Tanto interesses difusos como coletivos são indivisíveis, mas se distinguem não só pela origem da lesão como também pela abrangência de grupo. Os interesses difusos supõem titulares indetermináveis, ligados por circunstancias de fato, enquanto os coletivos dizem respeito a grupo, categoria ou classe de pessoas determinadas ou determináveis, ligadas pela mesma relação jurídica básica.

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Os interesses coletivos e os interesses individuais homogêneos têm também um ponto de contato: ambos reúnem grupo, categoria ou classe de pessoas determináveis; contudo, distinguem-se quanto à divisibilidade do interesse: só os interesses individuais homogêneos são divisíveis, supondo uma origem comum.

Isto posto, passemos ao estudo do direito fundamental ao meio ambiente do trabalho sadio, uma espécie direito difuso.


4. MEIO AMBIENTE DO TRABALHO EQUILIBRADO COMO DIREITO FUNDAMENTAL

Meio ambiente, segundo a resolução 306/2002 do CONAMA, é o “conjunto de condições, leis, influencia e interações de ordem física, química, biológica, social, cultural e urbanística, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas”.

Hoje, consolidou-se o entendimento de que a preservação do meio ambiente é direito fundamental de terceira geração, consagrado pela Carta Maior, pois, embora previsto no Capítulo VI do Título VIII – da ordem social - , trata-se de direito humano fundamental da pessoa do trabalhador, uma vez que o art. 5º, §2º dispõe que este artigo não traz um rol exaustivo. Nesse sentido, podemos dizer que os direitos fundamentais são:

Situações jurídicas sem as quais a pessoa humana não se realiza, não convive e, às vezes, nem mesmo sobrevive, fundamentais do homem no sentido de que a todos, por igual, devem ser, não apenas formalmente reconhecidos, mas concreta e materialmente efetivados (SILVA, 1996). 

É o que se vê da leitura do artigo da Constituição abaixo:

Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

Desta forma, o meio ambiente do trabalho, por consistir em uma das múltiplas facetas do meio ambiente, também goza desta proteção e do status de direito fundamental. O art. 7º, VIII da Constituição Federal corrobora esta afirmação ao dispor que “ao sistema único de saúde compete, além de outras atribuições, colaborar na proteção do meio ambiente, nele compreendido o do trabalho”.

Por possuir características específicas e objeto próprio, qual seja, a proteção do homem em seu habitat laboral contra as formas de degradação da sadia qualidade de vida, é que se faz necessário conceituar o meio ambiente do trabalho que, segundo Edwar Abreu Gonçalves, é o

espaço físico no qual são desenvolvidas atividades profissionais produtivas e onde se fazem presentes os agentes físicos, químicos, biológicos, mecânicos, ergonômicos e outros, naturais ou artificiais que, associados ou não, podem desencadear reações biopsicofisiológicas e sociais com repercussões na saúde, na integridade física e na qualidade de vida do trabalhador (2010, p.9).

Por tamanha repercussão na vida do trabalhador, a Constituição passou a protegê-lo, dando ao meio ambiente laboral o status de direito fundamental do trabalhador, oponível contra o empregador.

Vislumbra-se ainda a indeterminabilidade proposital deste conceito, pois o legislador teve o intuito de evitar que diversas situações não fossem abrangidas por este. Isso porque ao se falar em lesões causadas pelo meio ambiente insalubre, não se resume apenas aos danos físicos que podem ser sofridos pelo trabalhador, mas outros de cunho psicológico, como stress, fadiga, assédio moral e sexual. 

De fato, a importância do estudo do meio ambiente do trabalho deve-se ao fato de que é nele que o homem passa boa parte de sua vida, sendo por isso um dos fatores que mais influencia na qualidade de vida – ou não – dos trabalhadores.

Sua proteção é, em última instância, a defesa da humanização do trabalho, e rege-se pela visão de que o homem esta à frente dos meios de produção, sendo a garantia de um local de trabalho salubre uma das formas de efetivação do princípio da dignidade da pessoa humana, que é um dos fundamentos da República (art. 1º, III da CF) e o norteador de toda a atividade econômica (art. 170 da CF). Infere-se daí que o lucro não pode estar acima do homem enquanto trabalhador sob pena de ser considerado inconstitucional.

Quando o habitat laboral não apresenta condições mínimas que garantam a qualidade de vida do trabalhador, ocorrerá aí uma lesão ao meio ambiente do trabalho.

É importante ressaltar que a proteção ao meio ambiente do trabalho é diferente da proteção do direito do trabalho, pois enquanto a primeira visa à saúde e segurança do trabalhador e não se restringe a relações empregatícias de subordinação, o segundo aplica-se às relações regidas pela CLT.

A integridade física do trabalhador é, portanto, um direito da personalidade oponível contra o empregador.  Ao ser admitido, o empregado goza de bens jurídicos como a vida, saúde, capacidade de trabalho e outros, que, por serem tutelados pela Carta Maior, devem ser protegidos também pelo empregador, através da adoção de medidas de segurança e higiene para prevenção de doenças e acidentes de trabalho.

Um ambiente insalubre pode causar acidentes, fadiga, tensão e insatisfação, além de doenças provocadas pela exposição a agentes químicos, duração excessiva de jornada, falta de repouso suficiente, trabalhos em turno de revezamento, tarefas repetitivas, trabalho penoso, esforço físico, ambiente hostil, posturas inadequadas, ritmo de trabalho e tensão constante.

Desta forma, para assegurar a vida humana deve-se, acima de tudo, garantir sua qualidade, o que implica necessariamente em condições de trabalho dignas e salubres. Nesse sentido, as políticas de prevenção de acidentes e de fatores de risco merecem destaque, deixando-se em segundo plano o adicional de insalubridade pago em tais casos.

O meio ambiente do trabalho passa, assim, a ser concebido como uma variável dos direitos humanos, e o trabalhador tem, a partir de então “direito [...] de ser tratado como ser humano e não como instrumento de produção” (SERVAIS, 2001, P.83).

4.1. Ação civil pública como forma de efetivação do direito fundamental ao meio ambiente do trabalho equilibrado

Como visto, premido da necessidade de emprego e por ignorar muitos dos direitos que possui, o trabalhador submete-se a condições degradantes de trabalho e não denuncia por medo de represálias em razão da condição de subordinação a que está sujeito.

Ocorre que, o meio ambiente do trabalho, por ser um direito de terceira dimensão possui como uma de suas características a proteção de grupos, tendo, portanto, titularidade difusa ou coletiva.

Ressalta-se que em razão da sua natureza difusa, não se limita à relação obrigacional entre empregador e empregado, uma vez que a poluição resultante do ambiente laboral acompanha o obreiro após o expediente ]e pode se expandir para populações externas, pois segundo Jose Afonso da Silva (SILVA, 2007), a expansão é uma das características próprias da poluição.

Por isso, é cada vez mais importante a atuação preventiva mais abrangente do direito, em oposição à apresentação de soluções às situações concretas ou reparação a danos perpetrados.

Nesse sentido, os princípios norteadores do direito ambiental, prevenção e precaução ganham destaque aqui. O primeiro consiste na adoção de medidas que possam evitar a ocorrência de um dano provável, quando se tem conhecimento de um risco concreto. Já o princípio da precaução aponta para adoção de medidas acautelatórias gerais, visando evitar o risco abstratamente considerado.

Assim, a aplicação destes princípios permite concluir que a iminência do dano é suficiente para mobilizar os órgãos responsáveis pela salvaguarda deste direito. Desta forma, dentre outros instrumentos de proteção deste direito, temos a ação civil pública como uma das mais eficazes formas de tutela preventiva deste direito, isso porque abrange todas as dimensões em que o direito ao meio ambiente do trabalho sadio possa ser considerado, qual seja difuso, coletivo ou individual homogêneo.

Além disso, a lei que a regula traz instrumentos acessórios que auxiliam e por vezes resolvem o conflito sem a necessidade de intervenção do judiciário, de forma célere e eficaz. São eles o inquérito civil e termo de ajustamento de conduta.

No primeiro caso, o caráter intimidatório do inquérito civil acaba por impedir a ocorrência do dano. Édis Milaré (1998) ressalta que

O inquérito civil é eficaz meio de prevenção de futuros danos ecológicos, em razão não só de seu caráter intimidativo, mas também porque o resultado das diligências nele encetadas pode dissuadir o agente quanto à consecução de atos potencialmente lesivos ao meio ambiente.

Quanto ao termo de ajuste de conduta, previsto no art. 5º, §6º da LACP, temos uma espécie de acordo a ser cumprido, mediante cominação de multa, com eficácia de título executivo extrajudicial, que impõe aos que aderem à observância de normas legais, permitindo a execução em caso de descumprimento da obrigação de fazer, não fazer e/ou pagar quantia.

Na Justiça do Trabalho, merece destaque a atuação do parquet trabalhista no manejo da ACP como forma de humanização do trabalho e promoção da cidadania, uma vez que a LC 75/93 estabelece sua legitimidade para “promover a ação civil pública no âmbito da justiça do trabalho, para a defesa dos interesses coletivos, quando desrespeitados os direitos sociais constitucionalmente garantidos”.

Através do uso deste instrumento, o MPT vêm “educando” muitos empregadores que não observam as normas atinentes ao meio ambiente laboral sadio por ignorância, ao mesmo tempo em que fiscalizam outras que descumprem no intuito de baratear os custos da produção, por exemplo.

Alia-se a isso o fato de o MPT gozar de independência institucional, e, ao assumir a titularidade da ação, evitar a discriminação sofrida pelos trabalhadores que lutam por seus direitos.

Nesse sentido, podemos citar alguns julgados que representam o uso da ACP como repressão ao dano causado direito ao meio ambiente laboral sadio, e como a jurisprudência vem se posicionando:

PROCESSO: RO 00599-2010-103-22-00-9

Relator (a): Desembargadora Enedina Maria Gomes dos Santos

Órgão julgador: 1ª Turma.

Julgamento: 11/7/2011

Publicação: DJT 18/7/2011 p. não indicada

Ementa

RECURSO ORDINÁRIO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. VIOLAÇÃO ÀS NORMAS DE SAÚDE, HIGIENE E SEGURANÇA DO TRABALHO. COMPETÊNCIA TERRITORIAL. Não há que se confundir a competência territorial com os limites subjetivos da coisa julgada. A competência territorial é definida pelo local da ocorrência do dano, embora os efeitos da sentença possam atingir cidadãos fora dos limites deste território, por se tratar de decisão que visa a tutelar direitos coletivos, cujos efeitos podem ser "erga omnes" ou "ultra partes". No caso dos autos, o dano é de extensão local, posto que envolve apenas o Município reclamado, sendo competente para apreciar o feito o Juízo do foro local, o que implica dizer que a ação deve ser proposta perante a Vara do Trabalho da cidade onde esteja ocorrendo o dano. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CONCESSÃO DE MEDIDA LIMINAR "INAUDITA ALTERA PARS". VIOLAÇÃO AO ART. 2º DA LEI 8.437/92 NÃO CARACTERIZADA. Em situações como a dos autos, em que o direito ameaçado clama por uma solução urgente em face da gravidade do caso, a presença do "fumus boni iuris" e do "periculum in mora", justificam a concessão da liminar sem a audiência prévia do representante judicial da pessoa jurídica de direito público.CARÊNCIA DE AÇÃO NÃO EVIDENCIADA. Ao contrário do que alega o recorrente, o binômio utilidade-necessidade do processo encontra-se presente, no vertente caso, na medida em que as condições indignas de trabalho somente foram afastadas em decorrência do cumprimento da decisão liminar, de caráter provisório, sendo inegável a necessidade tanto do autor como do réu de um provimento judicial definitivo que confirme ou que casse os efeitos da tutela de urgência anteriormente deferida. VIOLAÇÃO À CLÁUSULA DA "RESERVA DO POSSÍVEL" E AUSÊNCIA DE PREVISÃO ORÇAMENTÁRIA. INOCORRÊNCIA. No presente caso, tornou-se visível a ausência de justo motivo objetivamente aferível que autorize o Estado a deixar de implementar as políticas públicas que visem à saúde, à higiene e à segurança dos trabalhores da Central de Flagrantes de Picos, não podendo o Estado exonerar-se do cumprimento de suas obrigações constitucionais escorado no argumento de violação à "cláusula da reserva do possível" e de ausência de previsão orçamentária, sobretudo porque já havia no Município reclamado um prédio novo, construído com a finalidade específica de abrigar as delegacias de polícia, o que faz cair por terra qualquer argumento de impossibilidade de cumprimento da decisão judicial por ausência de receitas públicas.

PROCESSO: RR 1738009520015220002 173800-95.2001.5.22.0002

Relator(a): Aloysio Corrêa da Veiga

Julgamento: 18/03/2009

Órgão Julgador: 6ª Turma

Publicação: 27/03/2009

Ementa

RECURSO DE REVISTA. NULIDADE DO V. ACÓRDÃO REGIONAL POR NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. Não se vislumbra a nulidade, bem como a alegada violação dos artigos 93, IX, da Constituição Federal, pois, mediante decisão amplamente fundamentada, foi entregue a prestação jurisdicional. Recurso de revista não conhecido. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. SEGURANÇA BANCÁRIA. O ponto principal da ação diz respeito ao meio ambiente de trabalho e a preservação da integridade física do trabalhador. A Ação Civil Pública foi ajuizada na defesa dos direitos coletivos, visando à instalação de portas giratórias e outros sistemas de segurança em todas as agências da Reclamada na cidade de Teresina. Desta forma, trata-se de interesse coletivo de natureza trabalhista, relativo à segurança, prevenção e meio ambiente do trabalho, haja vista a notória ocorrência de assaltos a Bancos no país e o risco a que estão sujeitos os trabalhadores que exercem as suas atividades nas agências bancárias. Assim, é competente a Justiça do Trabalho para apreciar a matéria. Recurso de revista não conhecido. LITISPENDENCIA. A verificação da existência dos requisitos legais autorizadores para a declaração de litispendência, implicaria, necessariamente, a revisão de fatos e prova, procedimento impossível nesta instância de natureza extraordinária, nos termos da Súmula nº 126 desta C. Corte. Recurso de revista não conhecido. LEI MUNICIPAL QUE OBRIGA OS ESTABELECIMENTOS BANCÁRIOS A INSTALAREM PORTAS ELETRÔNICAS DE SEGURANÇA. INCONSTITUCIONALIDADE DA LEI MUNICIPAL Nº 2.192/93. Não se vislumbra a inconstitucionalidade da Lei Municipal nº 2.192/93, em razão do entendimento pela constitucionalidade da norma municipal indicada, nos exatos termos do artigo 30, I e II, da Constituição Federal, no sentido de que, em se tratando da instalação de portas eletrônicas de segurança em agências bancárias, o Município age dentro de sua competência legislativa suplementar dispondo sobre assunto de interesse local, na medida em que tratar-se da responsabilidade que é atribuída ao empregador pela proteção à saúde e segurança do trabalhador. Recurso de revista não conhecido.

PROCESSO: RO 794200900223005 MT 00794.2009.002.23.00-5

Relator(a): Desembargadora Leila Calvo

Julgamento: 10/11/2010

Órgão Julgador: 2ª Turma

Publicação: 25/11/2010

Ementa

PRELIMINARMENTE - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - LEGITIMIDADE ATIVA DO MPT - O Ministério Público do Trabalho é parte legítima para interpor ação civil pública visando a observância das normas de segurança e saúde dos trabalhadores e do meio ambiente do trabalho, pois emerge de tal fato um interesse coletivo da categoria, contudo, não detém legitimidade para buscar proteção de direito individual não homogêneo, e que depende de dilação probatória própria, não sendo este o caso dos presentes autos. Assim, considerando-se que o bem que o Autor visa tutelar - integridade física l dos empregados da Ré - caracteriza-se como norma de saúde pública, constitui atribuição do Ministério Público sua proteção e defesa. Dessa feita, não há se falar em sua ilegitimidade ativa. MÉRITO RECURSO DA 1ª RECLAMADA (TELEMONT) DA JORNADA DE TRABALHO - DSR - INTERVALO INTRAJORNADA - Nenhuma reforma merece a r. sentença, no particular, pois comprovado o descumprimento pela Reclamada das respectivas normas. Nego provimento. NÃO CUMPRIMENTO DE NORMAS DE SEGURANÇA E SAÚDE DO TRABALHADOR - EMPRESA TERCEIRIZADA DE TELEFONIA - Se a atividade desenvolvida pelo trabalhador, de alguma forma, pode gerar riscos à sua saúde e segurança, a empresa deve tomar todas as medidas de proteção para obstar qualquer ato inseguro, devendo seguir as normas pertinentes, conforme consagra o art. 157 da CLT, quando disciplina caber às empresas cumprir e fazer cumprir as normas de segurança e medicina do trabalho e adotar as medidas que lhe sejam determinadas pelo órgão regional competente. Assim, constatando que a 1ª Reclamada não atendia todas as normas de segurança e saúde do trabalhador determinada pelo Ministério do Trabalho, nenhuma reforma merece a r. sentença. Nego provimento. RECURSO DA 2ª RECLAMADA (BRASIL TELECOM) RESPONSABILIDADE DA TOMADORA DE SERVIÇOS - O art. 7º, XXII, da CF garante a redução dos riscos do trabalho e os incisos I e IV do art. 1º da CF impõem como direitos fundamentais a dignidade da pessoa humana e os valores sociais do trabalho, não se podendo dar interpretação restritiva ao art. 157daCLT que estabelece caber às 'empresas' cumprir e fazer cumprir as normas de segurança e medicina do trabalho. Dessa feita, não apenas o empregador direto é responsável em garantir um ambiente seguro ao seu empregado, mas também o tomador de serviços o qual deve fiscalizar o cumprimento das normas de segurança pelas empresas contratantes. Conduzindo à tal conclusão temos a NR 5 a qual não deixa dúvidas quanto ao dever da contratante, juntamente com a contratada, implementar as medidas prevenção de acidentes e doenças do trabalho, tudo para possibilitar o cumprimento do preceito constitucional consagrado no art. 7º, XXII, da CF o qual assegura ser direito do trabalhador a 'redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança'. Ademais, a própria Lei 9.742/97, mencionada pela 2ª Reclamada como amparo legal para a contração lícita da 1ª Reclamada para realização de serviços de telecomunicações (art. 94), não se presta a amparar seus fundamentos, pois estabelece no § 1º que 'Em qualquer caso, a concessionária continuará sempre responsável perante a Agência e os usuários'. Portanto, se a lei teve o cuidado de manter a responsabilidade da contratante até mesmo perante o órgão público por intermédio das agências reguladoras e os usuários, quanto mais deve-se entender que tal garantia também se estende ao dever de fiscalizar e exigir da contratada meio ambiente de trabalho seguro, responsabilizando-se por tal fato. Nego provimento. FISCALIZAÇÃO DO CUMPRIMENTO DAS NORMAS REGULAMENTADORAS - Considerando que restou constatado que realmente a 1ª Reclamada não atendia às disposições normativas quanto ao treinamento e emissão de ordens de serviço, bem como a responsabilidade da 2ª Reclamada em fiscalizar e exigir o cumprimento das normas para a manutenção de um meio ambiente de trabalho seguro, nenhuma reforma merece a r. sentença. Nego provimento. DSR - INTERVALOS E JORNADA LEGAL - Considerando-se que foi mantida a decisão que determinou o cumprimento das normas respectivas, bem como quanto à responsabilidade da tomadora de serviços fiscalizar o cumprimento das aludidas normas, a r. sentença não merece reforma, no particular. Nego provimento. RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO CONDENAÇÃO DA 1ª RECLAMADA - TELEMONT - Restou constatado que a 1ª Reclamada não atendia às disposições normativas no concernente aos exames médicos admissionais, bem como na indicação dos riscos a que estão submetidos os trabalhadores no Atestado de Saúde Ocupacional e a entrega da 2ª via ao trabalhador. Da mesma forma, não submetia os respectivos empregados a treinamento de segurança em rede aérea, ou observava dispositivos legais pertinentes ao intervalo interjornada e registros de empregado, motivo pelo qual acrescento à condenação o deferimento das alíneas 'u', 'w', 's', 'z', 'dd' e 'ee' do item 7.1 da inicial. Dou parcial provimento. CONDENAÇÃO DA 2ª RECLAMADA - BRASIL TELECOM - A tomadora de serviços deve adotar todas as medidas necessárias para, de forma integrada com as empresas contratadas, implementar medidas de prevenção de acidentes e doenças do trabalho, bem como adotar as devidas providências para acompanhar o cumprimento, pelas contratadas, das medidas de segurança e saúde no trabalho, motivo pelo qual dou parcial provimento ao Apelo do Autor para deferir os pleitos da alínea 'b', 'g' e 'h' do item 7.2 da inicial. Dou parcial provimento. DANO MORAL COLETIVO - Mesmo se considerada repreensível a conduta da Ré que ensejou no óbito de um empregado, não constato a existência de dano moral coletivo, pois um de seus elementos é a ocorrência de fato grave apto a desencadear ofensa que ultrapasse os diretamente envolvidos e atinja a coletividade como um todo, o que não se verifica no caso em tela. Dessa feita, nego provimento ao apelo do Autor. RECURSOS DAS RECLAMADAS E DO AUTOR MULTA - A multa pelo não cumprimento da obrigação de fazer deve ter valor expressivo, sob pena de ineficácia do cumprimento da obrigação, obstando, assim, que a parte desista de qualquer intento de não cumpri-la. Dessa feita, verificando que o valor arbitrado pela r. sentença é suficiente para garantir o cumprimento da obrigação pelas Reclamadas, mantenho-a, no particular. Nego provimento aos Recursos das Reclamadas e do Autor.

Sobre a autora
Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LUSTOSA, Andreia. Ação civil pública e a efetivação do direito ao meio ambiente do trabalho equilibrado. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 23, n. 5571, 2 out. 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/68737. Acesso em: 24 nov. 2024.

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