O ordenamento juridíco brasileiro foi consideravelmente modificado com a edição da Lei 12.846/93, também conhecida como Lei Anticorrupção - LAC. Sendo uma das principais ferramentas no combate à corrupção, a Lei Anticorrupção (Lei 12.846/93) permite a punição de pessoas jurídicas que corrompam agentes públicos, fraudem licitações e contratos ou dificultem atividade de investigação ou fiscalização de órgãos públicos, entre outras irregularidades.
Considerada uma das mais modernas e duras leis do mundo quanto ao tema da repressão da corrupção, principalmente pela previsão da responsabilização objetiva, a Lei Anticorrupção (Lei 12.846/93) aplica-se às sociedades empresárias e às sociedades simples, personificadas ou não, independentemente da forma de organização ou modelo societário adotado, bem como quaisquer fundações, associações de entidades ou pessoas, ou sociedades estrangeiras, que tenham sede, filial ou representação no território brasileiro, constituídas de fato ou de direito, ainda que temporariamente.
Com a vigência da Lei Anticorrupção (Lei 12.846/93), é possível responsabilizar administrativa e civilmente pessoas jurídicas por prática de atos lesivos contra a Administração Pública, nacional e estrangeira – o denominado suborno transnacional.
Assim, criou-se um novo paradigma de relacionamento entre o setor público e o setor privado, em que a transparência deve nortear as condutas de ambos.
Como elemento de destaque, o tipo de responsabilização previsto na Lei Anticorrupção (Lei 12.846/93) é de natureza objetiva. Desta forma, a pessoa jurídica infratora responderá pelos delitos a ela atribuídos sem que se precise comprovar a culpa ou dolo das pessoas físicas que agiram por meio dela, bastando a comprovação do nexo de causalidade entre o fato ocorrido e o resultado obtido.
Reportando à responsabilização objetiva das pessoas jurídicas, prevista no art. 1º da Lei Anticorrupção (Lei 12.846/93), vale mencionar algumas considerações importantes. No Brasil, prevalece a responsabilidade civil subjetiva como regra, sendo a responsabilidade civil objetiva a exceção. Nesse sentido, veja se o teor do parágrafo único do artigo 927 do Código Civil:
Art. 927. (...) Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.
Portanto, no Código Civil, a responsabilização civil objetiva, a qual independe de culpa do agente, tal como a teoria da responsabilização civil derivada do risco da atividade desenvolvida pelo agente, é a exceção, ficando como regra geral a responsabilização civil subjetiva, ou seja, aquela que depende da demonstração da culpa do autor.
Observe-se que o próprio Código Civil prevê que a responsabilidade objetiva não é presumida, e deve ser observada exclusivamente nos casos especificados em lei.
Como principal marco atual da responsabilização civil objetiva, é o Código de Defesa do Consumidor Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990 que, no seu artigo 14, previu que “O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos”.
São quatro os pressupostos para a responsabilização subjetiva, a saber: uma conduta do agente, que pode ser uma ação ou uma omissão; o nexo de causalidade; o dano; e a culpa. Já na responsabilização objetiva, excluída a culpa, mantendo-se os demais: conduta, nexo de causalidade e dano.
Vale ressaltar que o art. 2º da Lei Anticorrupção (Lei 12.846/93) prescreve, como condição para a responsabilização objetiva dos entes privados, a comprovação de que os atos lesivos à Administração Pública tenham sido praticados em seu interesse ou benefício, exclusivamente ou não.
Tal comando relativiza a severidade da Lei Anticorrupção (Lei 12.846/93) ao afastar a possibilidade de imputação automática de responsabilidade ao ente privado pelo simples fato de figurar em uma relação, contratual ou não com a Administração Pública.
Assim, a Administração Pública deve comprovar que o ato lesivo teve como fim beneficiar a pessoa jurídica, ainda que esse benefício não tenha se materializado.
Então, para que uma pessoa jurídica seja responsabilizada no âmbito da Lei Anticorrupção (Lei 12.846/93), é necessário comprovar, considerando o devido processo legal, o cometimento de um ou mais dos atos lesivos previstos no art. 5º, bem com a comprovação de que a prática de tal ato lesivo pela pessoa jurídica foi em seu interesse ou benefício, exclusivo ou não.
Apesar da responsabilidade ser objetiva, observa-se que a demonstração do interesse ou benefício é um elemento subjetivo que deve ser necessariamente comprovado pela Administração Pública. Sem esta comprovação, não pode sobressair a aplicação da Lei Anticorrupção (Lei 12.846/93) ao caso concreto.
Em outras palavras, o art. 2º da Lei Anticorrupção (Lei 12.846/93) não se limita à demonstração do liame entre uma pessoa jurídica e a Administração Pública, sendo necessário que a prática de tal ato lesivo tenha ocorrido no seu interesse ou benefício, exclusivamente ou não.