Símbolo do Jus.com.br Jus.com.br
Artigo Selo Verificado Destaque dos editores

A análise constitucional da atualização das faixas de incidência do imposto de renda da pessoa física sob a ótica do princípio da capacidade contributiva

Exibindo página 3 de 3

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Em se tratando de princípio constitucional orientador da instituição de tributos, o princípio da capacidade contributiva se relaciona intimamente com o Imposto sobre a Renda da Pessoa Física. Na própria instituição do referido imposto, diversos dos atributos e critérios da capacidade contributiva foram observados pelo legislador ordinário e, guardadas a hierarquia normativa do ordenamento jurídico e a supremacia da Constituição, não poderia ser diferente.

Ainda assim, é discutível a adequação do IRPF ao princípio da capacidade contributiva.

Conforme possível verificar ao longo deste estudo, ainda que o legislador ordinário tenha perseguido a graduação do IRPF segundo a capacidade contributiva do contribuinte através do critério da progressividade, a norma que estabelece as alíquotas do IRPF não atende plenamente ao mencionado critério. As faixas de incidência das alíquotas são poucas e estreitas, de modo que são insuficientes para graduar o imposto de acordo com a capacidade econômico-contributiva do cidadão. Além disso, o valor mínimo sobre o qual incide a alíquota máxima é relativamente reduzido, ocasionando a tributação sobre o mínimo existencial, além da renda disponível do contribuinte.

Não só não é adequadamente observado o critério da progressividade, como também não é possível dizer que a administração tributária leva em consideração o caráter pessoal dos contribuintes. Isto porque o aspecto pessoal considerado para determinar a capacidade econômica do contribuinte é o nível de renda e disponibilidade econômica, o que, por si só, não é capaz de demonstrar capacidade de contribuir. De outro lado, é impossível à administração tributária identificar por si só a riqueza real de cada contribuinte, bem como o seu volume de despesas necessárias e vitais.

A Declaração do Imposto de Renda da Pessoa Física (DIRPF) deveria servir à facilitação da identificação da renda disponível do contribuinte, uma vez que a Receita Federal tem poder de cruzar os dados ali fornecidos e homologar os lançamentos tributários. Sem que outros aspectos pessoais do indivíduo sejam considerados, contudo, jamais será aplicado corretamente o princípio da capacidade contributiva ao IRPF.

Condições pessoais como o número de dependentes, por exemplo, já são consideradas, mas os valores deduzidos são baixos, de modo que não são suficientes para evitar que o contribuinte seja tributado além do devido e tenha o seu mínimo existencial atingido. O mesmo acontece com as despesas com saúde e com educação, haja vista que somente ocorre a dedução até um determinado valor, independentemente do valor real gasto com as referidas despesas pelo contribuinte.

Ademais, como observado, os ajustes das alíquotas não acompanham a inflação ou mesmo os ajustes salariais. Se considerado o valor do salário mínimo necessário estimado pelo DIEESE em R$ 3.783,39, caso houvesse ajuste do salário mínimo nominal a fim de fornecer ao contribuinte a percepção justa e necessária para satisfazer às necessidades e direitos básicos constitucionalmente garantidos, a parcela da população que percebe um salário mínimo mensal teria incidência de alíquota de 15% do Imposto sobre a Renda Retido na Fonte (IRPF), principalmente se a defasagem na Tabela do IRPF continuar se perpetuando.

É claro que se trata de caso hipotético, mas a realidade não está muito distante disto, haja vista a crescente do valor do salário mínimo nominal, a estabilização do salário mínimo necessário e o congelamento do valor máximo da faixa de isenção pelos últimos três anos.

Desta forma, em vez de servir à justiça fiscal que visa garantir o princípio da capacidade contributiva, a legislação do IRPF e a não correção da Tabela do IRPF pelo índice de inflação acabam operando contra os mandamentos constitucionais relativos à dignidade da pessoa e às políticas sociais.


REFERENCIAIS BIBLIOGRÁFICOS

Assembleia Geral da ONU. (1948). Declaração Universal dos Direitos Humanos (217 [III] A). Paris. Disponível em: <https://www.unicef.org/brazil/pt/resources_10133.htm>. Acesso em: 31 out. 2018.

AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 13. ed. rev. São Paulo: Saraiva, 2007.

BECKER, Alfredo Augusto. Teoria geral de direito tributário. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1972.

BENEDITO, Luiz Antonio. Imposto Justo: uma Bandeira para a sociedade, Tributação em Revista, Brasília, ed. 64, pp. 10-17, 2013. Disponível em: <https://www.sindifisconacional.org.br/mod_download.php?id=aW1hZ2VzL3B1YmxpY2Fjb2VzL3RyaWJ1dGFjYW8vcGRmL3RyaWJ1dGFjYW82NC5wZGZ8MA>. Acesso em: 6 jun. 2018.

BRASIL. Código Tributário Nacional. Lei nº 5.172 de 25 Out. 1996. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L5172.htm>. Acesso em: 10 nov. 2018.

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

______. Constituição Política do Império do Brasil. 23 abr. 1824. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao24.htm>. Acesso em: 7 out. 2018.

______. Constituição dos Estados Unidos do Brasil. Rio de Janeiro, 18 set. 1946.  Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao46.htm>. Acesso em: 11 out. 2018.

______. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, 5 out. 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm>. Acesso em: 11 out. 2018.

______. Decreto nº 9.580, 22 de nov. 2018. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2018/decreto/D9580.htm>. Acesso em: 28 nov. 2018.

______. Receita Federal. Carga Tributária no Brasil 2016: Análise por Tributos e Bases de Incidência, p. 35. Disponível em: <http://idg.receita.fazenda.gov.br/dados/receitadata/estudos-e-tributarios-e-aduaneiros/estudos-e-estatisticas/carga-tributaria-no-brasil/carga-tributaria-2016.pdf>. Acesso em 24 nov. 2018

______. Receita Federal. IRPF (Imposto sobre a renda das pessoas físicas). Disponível em: <http://idg.receita.fazenda.gov.br/acesso-rapido/tributos/irpf-imposto-de-renda-pessoa-fisica>. Acesso em 26 nov. 2018

______. Supremo Tribunal Federal. ADI 5096. Disponível em: <http://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=4540023>. Acesso em: 30 nov. 2018.

______. Supremo Tribunal Federal. Ação pede reajuste da tabela de IRPF de acordo com a inflação real. Brasília, DF, 10 mar. 2014. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=261970>. Acesso em: 30 nov. 2018.

CARNEIRO, Claudio. Impostos federais, estaduais e municipais. 6. ed. São Paulo: SaraivaEducação, 2018.

COSTA, Regina Helena. Princípio da Capacidade Contributiva. São Paulo: Malheiros, 1993.

DIEESE. Pesquisa nacional da cesta básica de alimentos. Salário mínimo nominal e necessário. Disponível em: <https://www.dieese.org.br/analisecestabasica/salarioMinimo.html>. Acesso em: 24 nov. 2018.

HARADA, Kiyoshi. Direito financeiro e tributário. 25. ed. rev., atual. eampl. São Paulo: Atlas, 2016.

JOINT Committee on Taxation, The. Congress of the United States. Overview ofthe Federal Tax System as in effect for 2018. Disponível em: <https://www.jct.gov/publications.html?func=download&id=5060&chk=5060&no_html>. Acesso em: 26 nov. 2018.

MARTINS, Sérgio Pinto. Manual de direito tributário. 13. ed. São Paulo: Atlas, 2014.

SINDIFISCO Nacional. A Defasagem na Correção da Tabela do Imposto de Renda Pessoa Física. Brasília, DF, jan. 2018. Disponível em: < https://www.sindifisconacional.org.br/mod_download.php?id=aW1hZ2VzL3B1YmxpY2Fjb2VzL2JvbGV0aW5zLzIwMTgvMDEtamFuZWlyby9Cb2wyMDU1L0RlZmFzYWdlbV9JUl8xOTk2X18yMDE3X1ZmLnBkZnww>. Acesso em: 30 nov. 2018.

SOUSA, Rubens Gomes de. Compêndio de Legislação Tributária. ed. póstuma. São Paulo: Resenha Tributária, 1981.

TORRES, Ricardo Lobo. O mínimo existencial e os Direitos Fundamentais, Revista Brasileira de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, v. 177, pp. 29-49, 1989. Disponível em: <http://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/rda/article/download/46113/44271>. Acesso em: 4 nov. 2018.

TRADING Economics. Imposto de Renda da Pessoa Física – Lista de países. Disponível em: https://pt.tradingeconomics.com/country-list/personal-income-tax-rate. Acesso em: 26 nov. 2018.

YAMASHITA, Douglas; TIPKE, Klaus.  Justiça Fiscal e Princípio da Capacidade Contributiva. São Paulo: Malheiros, 2002.

Sobre os autores
Ricardo Simões Xavier dos Santos

Advogado. Fundador do escritório Ricardo Xavier Advogados Associados. Graduado em Direito pela Universidade Católica do Salvador - UCSal; Mestre e Doutorando em Políticas Sociais e Cidadania pela Universidade Católica do Salvador - UCSal; Especialista em Direito do Estado pelo Jus Podivm/Unnyahna e em Direito Tributário pelo IBET. Professor da Universidade do Estado da Bahia - UNEB , da Universidade Católica do Salvador - UCSal e da Escola Superior da Advocacia - ESA - Seccional da OAB/BA; Coordenador Curso de Pós-graduação em Direito Empresarial da Universidade Católica do Salvador - UCSal. Pesquisador do Núcleo de Estudos em Tributação e Finanças Públicas - NEF da Universidade Católica do Salvador - UCSal

Ingrid Dube Fraga

Advogada. Graduada em Direito pela Universidade Católica do Salvador - UCSal.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

XAVIER, Ricardo Simões Santos; FRAGA, Ingrid Dube. A análise constitucional da atualização das faixas de incidência do imposto de renda da pessoa física sob a ótica do princípio da capacidade contributiva. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 24, n. 5717, 25 fev. 2019. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/72283. Acesso em: 22 nov. 2024.

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!