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RPPS e integralidade mitigada: a desagradável surpresa da nova regra de transição da PEC 06/2019

Agenda 10/04/2019 às 14:35

O servidor só terá integralidade pura se tiver carga horária fixa, não receber adicionais de produtividade ou desempenho e não houver incorporado gratificações.

Em matéria de RPPS, a nova regra de transição da PEC 6/2019, cria uma nova forma de integralidade nunca antes vista: a integralidade com média aritmética simples. Pelo texto, a integralidade como a conhecemos hoje será atenuada, moderada, castrada. 

O art. 3º da PEC 06/19, estabelece, em seu §7º, inciso I, que o servidor público que tiver ingressado no serviço público, em cargo efetivo, até 31/12/03 e possua, no momento da aposentadoria, 62 anos de idade, se mulher, e 65, se homem, poderá se aposentar com a totalidade de sua remuneração no cargo efetivo (integralidade), observado o disposto no § 10 do mesmo artigo.

Este §10 conceitua o que seria a remuneração do servidor público no cargo efetivo, para fins de cálculo dos proventos de aposentadoria, como sendo o valor constituído pelo subsídio, pelo vencimento e pelas vantagens pecuniárias permanentes do cargo, estabelecidos em lei de cada ente federativo, acrescidos dos adicionais de caráter individual e das vantagens pessoais permanentes.

Até aqui tudo bem. Nenhuma novidade. Entretanto, este §10, na parte final de sua redação, traz uma inovação ao mandar que sejam observados alguns critérios que até então não existiam no cálculo da integralidade. Vamos a eles:

a) se o cargo estiver sujeito a variações na carga horária, as parcelas remuneratórias que refletem essa variação, serão consideradas para a confecção de um cálculo de média aritmética simples, levando-se em conta os últimos dez anos anteriores à concessão do benefício.

Ora, em regra, a jornada de trabalho do servidor público não é variável, é fixa. Entretanto, se houver variação, haverá um cálculo de média sobre as parcelas submetidas à esta carga horária variável, referente aos últimos 10 anos anteriores à aposentadoria.

Com a variação de carga horária, todas as parcelas remuneratórias atingidas, farão parte da base de cálculo da média e o valor a ser pago ao servidor será exatamente o resultado da média dessas variações ocorridas nos últimos 10 anos. 

Destarte, nestas circunstâncias, o servidor não mais se aposentará com integralidade, isto é, não se aposentará com a totalidade de sua atual remuneração no cargo efetivo.

Percebam que estão criando média na integralidade. Algo absolutamente inesperado, inusitado e rigoroso. 

b) se existirem vantagens pecuniárias permanentes variáveis, em razão de estarem vinculadas a indicadores de desempenho, produtividade ou situação similar, o valor dessas vantagens integrará o cálculo da remuneração do servidor público no cargo efetivo, estabelecido pela média aritmética simples do indicador nos dez anos anteriores à concessão do benefício de aposentadoria, que será aplicada sobre o valor atual de referência das vantagens pecuniárias permanentes variáveis.

Ora, em regra, não se contribui sobre parcelas variáveis, como gratificações de desempenho e produtividade, visto que são de natureza “propter laborem faciendo”, típicas de quem está em plena atividade e pagas a quem efetivamente alcançar indicadores (metas) de desempenho ou produtividade preestabelecidos em lei. Portanto, em face destas características, tratam-se de parcelas incompatíveis com o status de inativo, não se incorporando, em regra, aos proventos de aposentadoria. 

Entretanto, se, excepcionalmente, a lei local permitir a incorporação deste tipo de vantagem pecuniária nos proventos do servidor, pela nova regra, o valor destas vantagens deverá integrar o cálculo de uma média aritmética simples do indicador adotado, referente aos últimos 10 anos anteriores à concessão da aposentadoria, que será aplicada sobre o valor atual de referência das vantagens pecuniárias permanentes variáveis. 

Texto de difícil compreensão. Mas pelo que entendemos, na aposentadoria, as vantagens pecuniárias permanentes variáveis, pagas em razão de indicadores de desempenho ou produtividade, corresponderão a uma média do que foi pago nos últimos dez anos, que substituirá o valor atual dessas vantagens.

Perceba que aqui também, a integralidade está sendo mitigada, ao prevalecer o resultado de uma média quando houver variação de vantagens atreladas a índices de produtividade ou desempenho. 

c) se as vantagens pessoais permanentes ou os adicionais de caráter individual forem originados de incorporação à remuneração de parcelas temporárias ou exercício de cargo em comissão ou função de confiança, prevista em lei do ente federativo, o valor dessas vantagens que integrará o cálculo do valor da remuneração do servidor público no cargo efetivo em que se deu a aposentadoria respeitará a proporção de um trinta avos a cada ano completo de recebimento e contribuição, contínuo ou intercalado.

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Vejam só, aquelas gratificações temporárias, percebidas pelo exercício de cargo em comissão ou função de confiança, funções de direção, chefia e assessoramento, cuja incorporação na remuneração era prevista e permitida em lei do ente federativo, agora só poderão integrar o provento de aposentadoria, na proporção de 1/30 avos para cada ano completo em que o servidor recebeu e contribuiu sobre a mesma. 

Portanto, pelo texto da nova regra, o servidor não mais poderá incorporar integralmente as vantagens pessoais permanentes ou os adicionais de caráter individual que forem originados de incorporação à remuneração de parcelas temporárias ou exercício de cargo em comissão ou função de confiança. 

O valor dessas vantagens migrará paulatinamente para os proventos de aposentadoria na medida em que o servidor a perceber e sobre ela contribuir a cada ano completo, na proporção de 1/30 avos. Destarte, só poderá levar 100% da gratificação, se a perceber e sobre ela contribuir por longos 30 anos. Se não integralizar os 30 anos, a incorporará aos proventos proporcionalmente aos anos de percepção e contribuição.

Conclusão: a integralidade prometida no inciso I do §7º do art. 3º da PEC 6/19, nem de longe se assemelha com a integralidade das atuais regras de transição.

Trata-se aqui de uma regra de transição que oferece uma integralidade bastante mitigada, desidratada, pois só oferecerá uma integralidade completa, correspondente à totalidade de última e atual remuneração do servidor no cargo efetivo, se ele não estiver sujeito a variações de carga horária, se não perceber vantagens vinculadas a indicadores de desempenho e produtividade e se não existirem vantagens pessoais permanentes ou adicionais de caráter individual originados de incorporação à remuneração de parcelas temporárias ou exercício de cargo em comissão ou função de confiança.

Portanto, muita atenção à nova regra de transição trazida pelo art. 3º da PEC 6/19, que começa garantindo integralidade no inciso I do seu §3º, mas depois, em seu §10, cria uma série de dificuldades e situações que mitigam a tão sonhada integralidade, ao estabelecer cálculos de média e proporcionalidade, nas três hipóteses acima perfiladas. 

Assim, o servidor só fará jus à integralidade pura, completa, correspondente à sua atual remuneração, sem perdas, se tiver carga horária fixa, não receber adicionais de produtividade e desempenho e não houver incorporado gratificações pelo exercício de cargo em comissão ou função de confiança.

Não resta dúvidas de que a reforma proposta é muito mais dura com o servidor do que se imaginava.

Sobre o autor
Alex Sertão

Professor de RPPS.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SERTÃO, Alex. RPPS e integralidade mitigada: a desagradável surpresa da nova regra de transição da PEC 06/2019. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 24, n. 5761, 10 abr. 2019. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/72600. Acesso em: 24 nov. 2024.

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