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Dos reflexos jurídicos, políticos, sociais e ambientais da constitucionalização do direito à moradia

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Agenda 26/09/2005 às 00:00

4. DOS REFLEXOS JURÍDICOS, POLÍTICOS, SOCIAIS E AMBIENTAIS DA CONSTITUCIONALIZAÇÃO DO DIREITO À MORADIA

            Em decorrência da adesão a inúmeros tratados internacionais e da recente constitucionalização do direito à moradia, bem como, das reivindicações populares, o Brasil passou a adotar uma postura diferenciada em relação à problemática da moradia. Ainda que os problemas estejam longe de serem resolvidos, pois o déficit habitacional total do Brasil é estimado em sete milhões e duzentas e vinte três mil moradias (7.223.000), sendo que o déficit urbano é de cinco milhões e quatrocentas e setenta mil unidades (5.470.000), enquanto que nas áreas rurais o déficit é de um milhão e setecentos e cinqüenta e duas mil unidades (1.752.000); e que 5.8% dos domicílios urbanos apresentam inadequação fundiária; que existem 3.3 milhões de domicílios no Brasil sem banheiro; com carência de qualquer dos itens de infra-estrutura são 12.1 milhões de domicílios particulares urbanos no Brasil; com carência simultânea de abastecimento de água e esgotamento sanitário são 2,3 milhões de moradias; e dos 5.560 municípios brasileiros mais de 40% possuem loteamentos irregulares e que aproximadamente 25% das cidades brasileiras possuem favelas e as cidades com mais de 500.000 habitantes apresentam assentamentos irregulares; deve-se ressaltar a articulação dos entes públicos e organizações civis, bem como, dos movimentos particulares com a problemática. Importante ratificar que as problemáticas do déficit habitacionais e da inadequação das moradias não são problemas restritos ao Brasil.

            Depois de muito tempo de favelização e em não havendo soluções factíveis que não envolvam recursos avultosos, insurgências populares, desgaste político, consolidou-se um quadro irreversível. Ainda que alguns dos moradores das favelas, dos morros, consigam sair destes locais o seu lugar será imediatamente ocupado por outras famílias que estão a espera de um lar. E assim vai se perpetuando e se agravando a situação. Não se pode esquecer que há uma mercantilização dos espaços nas favelas, inclusive através de mercado imobiliário formal, conforme ressalta Baltrusis (in FERNANDES E AFONSIN, 2003).

            Os governos não conseguem alocar toda esta massa de pessoas em outros lugares, sem um desgaste político frente ao seu colégio eleitoral e até porque em grande parte dos casos, os moradores das favelas não aceitam sair. Diversas experiências realizadas no Brasil, onde a população da favela foi transferida para conjuntos habitacionais, falharam, pois os moradores acabam voltando às favelas, por diversos motivos, mas principalmente porque ali o acesso à cidade é mais fácil (SAULE JUNIOR, 1999). Já as ações e políticas públicas inovadoras realizadas ainda nas décadas de 80 e 90, em Belo Horizonte, Recife e Porto Alegre foram propulsoras de mudanças sociais e legais (FERNANDES in SAULE JUNIOR, 1999; AFONSIN in FERNANDES E AFONSIN, 2003).

            No entanto, no contexto geral qual a posição do Estado frente a falta de moradia ou à moradia em locais ilegais e inapropriados? Não se pode dizer que o Estado não faz nada, pois inúmeros municípios têm promovido assentamentos e outras ações públicas visando a construção de casas populares à população de baixa renda. Muitas famílias foram beneficiadas com o instituto do "Direito de Uso" através do qual as famílias que habitam terrenos públicos por mais de 5anos foram agraciadas com o direito de ali permanecerem. Todavia, tendo em vista que são terrenos públicos não lhes foi conferido o direito de propriedade e sim o direito de uso, conforme dispõe o Decreto-lei 271/67.

            O Brasil criou um ministério dedicado exclusivamente as questões urbanas, ou seja, o Ministério das Cidades, e através deste ministério vem sendo propostas inúmeras ações e programas visando a facilitar a aquisição de moradias para as classes com baixa renda e para a classe média.

            Dentre as ações e programas federais executados nos últimos anos, conforme dados do Ministério das Cidades (in site oficial do Ministério das Cidades) destacam-se: 1) Apoio à Melhoria das Condições de Habitabilidade de Assentamentos Precários - programa voltado principalmente ao apoio a estados, Distrito Federal e municípios para melhorar as condições de habitabilidade de populações residentes em assentamentos humanos precários, reduzir riscos mediante sua urbanização, integrando-os ao tecido urbano da cidade; 2) Apoio ao Poder Público para Construção Habitacional destinada a Famílias de Baixa Renda - programa voltado principalmente ao apoio a estados, Distrito Federal e municípios para viabilizar o acesso à moradia de famílias de baixa renda, que vivem em localidades urbanas e rurais; 3)Programa Habitar Brasil BID – HBB - programa destina recursos para o fortalecimento institucional dos municípios e para a execução de obras e serviços de infra-estrutura urbana e de ações de intervenção social e ambiental, por meio, respectivamente, do Subprograma de Desenvolvimento Institucional (DI) e do Subprograma de Urbanização de Assentamentos Subnormais (UAS); 4) Programa de Subsídio à Habitação de Interesse Social – PSH - programa que objetiva oferecer acesso à moradia adequada a cidadãos de baixa renda por intermédio da concessão de subsídios.Os subsídios são concedidos no momento em que o cidadão assina o contrato de crédito habitacional junto às instituições financeiras habilitadas a operar no programa; 5) Programa Carta de Crédito Individual - programa que objetiva conceder financiamentos a pessoas físicas para fins de aquisição, construção, conclusão, ampliação, reforma ou melhoria de unidade habitacional, propiciando ainda a aquisição de cesta de material de construção ou a aquisição de lote urbanizado; 6) Programa Carta de Crédito Associativo - programa que objetiva conceder financiamentos a pessoas físicas, associadas em grupos formados por condomínios, sindicatos, cooperativas, associações, Companhias de Habitação (COHAB) ou empresas do setor da construção civil. O programa permite a produção de lote urbanizado, a construção de unidade habitacional ou a aquisição de unidade nova produzida no âmbito do próprio programa; 7) Programa de Apoio à Produção de Habitações – programa que objetiva conceder financiamentos a empresas do ramo da construção civil, voltadas à produção de imóveis novos, com desembolso vinculado à comercialização prévia de, no mínimo, 30% das unidades do empreendimento; 8) Programa Pro-Moradia - financia, com recursos do FGTS, estados, municípios, Distrito Federal ou órgãos das respectivas administrações direta ou indireta, para oferecer acesso à moradia adequada à população em situação de vulnerabilidade social e com rendimento familiar mensal preponderante de até três salários mínimos; 9)Programa de Arrendamento Residencial (PAR) tem por objetivo propiciar moradia à população de baixa renda, sob a forma de arrendamento residencial com opção de compra.

            Percebe-se que, apesar dos esforços da sociedade civil e dos entres públicos, em nível geral a ação é insignificante em relação a situação habitacional, déficit habitacional brasileiro de 7.223.000. Todavia, as ações, programas e mobilizações são bons começos, mas enquanto não há respostas efetivas para os problemas do acesso à moradia, o mercado imobiliário de acordo com seus interesses vem promovendo a regulação do mercado imobiliário e assim sem grandes esforços consegue agravar ainda mais o acesso à moradia para as pessoas desprovidas de recursos financeiros ou perpetuar a sua exclusão. Importante ratificar que, o mercado imobiliário também está presente nas transações imobiliárias das favelas, ou seja, do mercado informal de imóveis, conforme ressalta Baltrusius:

            Os quartos em cortiços irregulares, os lotes, os barracos, ou as casas de alvenaria em loteamentos clandestinos, favelas, ocupações de terras, ou em loteamentos em áreas de mananciais são tipos de mercadoria mais freqüente e podem ser adquiridos no mercado imobiliário informal. Cada uma dessas mercadorias atende a um determinado segmento de mercado da população de baixa renda. (in FERNANDES e AFONSIN, 2003, p.216-217).

            Em sete anos a população da favela cresceu cerca de 300%. Nesse período surge a primeira imobiliária na favela, a imobiliária da Dona Helena, fundada em 1990. Atualmente, encontramos na favela três imobiliárias que são responsáveis por parte das transações que lá ocorrem.Essa demanda, provocada pela política de desfavelamento, profissionalizou os agentes do mercado imobiliário na favela. (in FERNANDES e AFONSIN, 2003, p.221).

            [...] existe uma rede de comercialização nas favelas que não se limita à informalidade, "muitas imobiliárias com CRECI comercializam imóveis localizados nas favelas e AEIS". São os agentes do mercado que realmente definem o preço e as condições de comercialização. (in FERNANDES e AFONSIN, 2003, p.227).

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            Acredita-se que em razão do insucesso das ações públicas, o Estado tem fechado os olhos para as ocupações ilegais, e por isso tem flexibilizado a adequação dos assentamentos, loteamentos e outras formas de moradias ilegais. Neste diapasão, Turra afirma que:

            O tratamento dado aos moradores da favela variou historicamente de acordo com os fatores políticos, sociais e culturais. Pouco a pouco, a favela foi deixando de ser um território de bandidos, de caos e desordem para ser tolerada, tendo, por fim, sido reconhecido aos seus habitantes o direito de nela permanecerem.(in FERNANDES e AFONSIN, 2003, p.34).

            Também, deve-se destacar que o movimento internacional visando a "segurança da posse" tem influenciado as ações estatais, principalmente no pertinente à flexibilização da legislação. Neste sentido Fernandes destaca:

            [..] a promoção de regularização fundiária é hoje vista por instituições financeiras internacionais, como o Banco Mundial, como sendo a condição essencial para ampliação do mercado nas cidades e para a reativação da economia urbana. De fato, o Banco Mundial tem imposto a outorga de títulos de propriedade como condição para liberação de recursos, inclusive em vários países da América Latina, com base no argumento de que, entre outros efeitos, a segurança da posse e conseqüente acesso ao crédito formal farão com que os moradores invistam em seus lotes e casa, assim reativando a economia urbana como um todo. (in FERNANDES, 2001, p.37). (grifo nosso).

            Como na maioria das vezes o Estado não consegue cumprir com seu dever constitucional e com os compromissos assumidos internacionalmente ou impostos por organismos externos o País vem seguindo um movimento de flexibilização da lei visando a amenizar a situação. Assim sendo, o Código Civil de 2002, proporcionou a ampliação do acesso à moradia através da aquisição do direito de propriedade através da usucapião cujos prazos de aquisição foram sensivelmente reduzidos para as espécies de usucapião que visarem a assegurar o acesso a moradia, vejamos:

            Art.1238 – Aquele que, por quinze anos, sem interrupção, nem oposição, possuir como seu um imóvel, adquirir-lhe a propriedade, independentemente de título e boa-fé; podendo requerer ao juiz que assim o declare por sentença, a qual servirá de título para o registro no Cartório de Registro de Imóveis.

            Parágrafo único – O prazo estabelecido neste artigo reduzir-se-á a dez anos se o possuidor houver estabelecido no imóvel a sua moradia habitual, ou nele, realizado obras ou serviços de caráter produtivo. (grifo nosso).

            O CC também adotou a usucapião urbana constitucional prevista no artigo 183, da CF/88, em seu artigo 1.240 que assim prescreve:

            Art.1.240 – Aquele que possuir, como sua, área urbana de até duzentos e cinqüenta metros quadrados, por cinco anos ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural. (grifo nosso).

            Outro caso de acesso à moradia flexibilizado pelo CC, é a posse-trabalho, ou seja, a possibilidade dos possuidores de um imóvel o adquirirem, mas neste caso pagando indenização ao proprietário, a ser fixada judicialmente se não houver acordo, conforme o artigo 1228, § 4º.

            O Estatuto da Cidade, instituído pela Lei 10.257/2001, que tem como escopo conforme o art. 2º, I, ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade urbana, visando a garantir o direito às cidades sustentáveis, entendido como o direito à terra urbana, à moradia, ao saneamento ambiental, à infra-estrutura urbana, ao transporte e aos serviços públicos, ao trabalho e ao lazer, para as presentes e futuras gerações, criou outra espécie de usucapião, a usucapião coletiva visando a aquisição do domínio do imóvel pela população de baixa renda que o possuir por 5 anos, vejamos:

            Art. 10. As áreas urbanas com mais de duzentos e cinqüenta metros quadrados, ocupadas por população de baixa renda para sua moradia, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, onde não for possível identificar os terrenos ocupados por cada possuidor, são susceptíveis de serem usucapidas coletivamente, desde que os possuidores não sejam proprietários de outro imóvel urbano ou rural. (grifo nosso).

            Leitão e Lacerda refletem percucientemente a respeito do princípio da função social das ocupações ilegais "Quando o problema se tornou demasiado grande para ser ignorado - não apenas do ponto de vista urbanístico, mas também político -, o princípio da função social da propriedade veio resgatar a idéia de que a ocupação é também uma forma legítima e, portanto, legal, de acesso ao lote urbano". (in FERNANDES E AFONSIN, 2003, p.74).

            Henkes (2004, p.133) ao discorrer sobre o princípio da função socioambiental leciona que:

            [...] inúmeros institutos cíveis, ambientais, urbanísticos e constitucionais prescrevem a imprescindibilidade do efetivo cumprimento da função socioambiental da propriedade no século XXI, inclusive adotando instrumentos coercitivos com sérias repercussões patrimoniais ao proprietário, a fim de resguardar os direitos difusos e coletivos, bem como a dignidade da pessoa humana.

            E relevante destacar que a posse visando a assegurar a moradia materializa o princípio da função socioambiental da propriedade, razão pela qual, em diversos julgados os possuidores têm conseguido a manutenção de posse nos casos de invasão e ocupação, mesmo que em locais ilegais, irregulares e ainda que contra o legítimo proprietário.

            Nos últimos anos, tem-se admitido a urbanização de favelas, bem como, a implantação de serviços de abastecimento de água e coleta de esgoto em loteamentos ilegais instalados em "áreas de preservação de manancial". Importante salientar que em favelas e outras moradias e assentamentos ilegais é comum a urbanização e a implantação de serviços públicos, escolas, creches, praças, saneamento, mas ultimamente tem-se admitido, inclusive em áreas de preservação permanente ante a relevância do caso. Neste sentido, Saule Júnior e Pinho em parecer retratam a viabilidade jurídica da implantação de serviço de abastecimento de água e coleta de esgoto num loteamento "ilegal" instalado numa "área de preservação de manancial", pelo Estado de São Paulo, através da Companhia Estadual de Saneamento de São Paulo - SABESP:

            A conclusão positiva deste grupo de cidadãos ter o direito ao serviço de abastecimento de água e da SABESP estar autorizada a prestar este serviço e o de coleta de esgoto, em razão da responsabilidade do Poder Público é extraída dos fundamentos dos direitos da pessoa humana na ordem internacional e interna e das responsabilidades e obrigações estabelecidas ao Estado Brasileiro a partir da Constituição de 1988. (in SAULE JÙNIOR, 1999, p.264)

            A obrigação do Poder Público implantar este serviço é derivada dos compromissos assumidos nas declarações, tratados, convenções e programas internacionais de direitos humanos do qual o Estado Brasileiro é parte, [...].(in SAULE JÙNIOR, 1999, p. 270).

            Se cidadãos que cometem crimes e são devidamente condenados a cumprir penas de detenção, tem o seu direito de sobrevivência assegurados no sentido de suas necessidades básicas serem supridas pelo Estado, como alimentação, vestuário e saúde, incluindo o saneamento básico, este mesmo direito de sobrevivência que é parte essencial da dignidade de qualquer pessoa humana e do direito à vida, deve ser assegurado a qualquer grupo de cidadãos que por motivo de boa fé ou por necessidade social estejam residindo num loteamento considerado irregular. A negação por parte do Poder Público de fornecer água e coletar o esgoto pela situação de irregularidade do loteamento configura uma discriminação que não atende o princípio da igualdade. (in SAULE JÙNIOR, 1999, p. 287).

            Em síntese, os autores concluem que:

            A existência de favelas, assentamentos urbanos carentes decorrentes do processo informal de ocupações coletivas [...], cortiços, conjuntos habitacionais abandonados, ocupados, loteamentos periféricos sem equipamento e infraestrutura urbana, a degradação ambiental com poluição dos rios, lagos, represas e das marés, a destruição das áreas verdes, a deteriorização da qualidade de vida na cidade consolida o princípio da função social como paradigma para o regime da propriedade e para o desenvolvimento da política urbana e ambiental nas cidades brasileiras. (in SAULE JÙNIOR, 1999, p. 288).

            Com a concessão dos serviços estatais de água, esgoto e iluminação pública, além da instalação de equipamentos públicos, em favelas e loteamentos irregulares o Estado tem flexibilizado a aplicação da norma legal, ou seja, legalizado a moradia ilegal. Todavia, conforme mencionado o Estado tem flexibilizado a aplicação da norma legal, ou seja, legalizado a moradia ilegal em áreas de preservação permanente, onde, via de regra, a utilização é restrita visando o equilíbrio do meio ambiente pela especificidade do local, e assim o acesso deveria ser restrito, ou seja, jamais para a moradia. E o Estado autoriza, em razão da impossibilidade de promover o acesso à moradia de outras formas, ao teor do que já foi exposto. Mas este caso de flexibilização ou legalização do ilegal merece uma análise mais acurada.

            Trata-se de área de preservação permanente, a qual como bem ambiental pertence à coletividade, ou seja, as presentes e futuras gerações, então, entende-se que quando o local objeto de regularização ou de flexibilização de normas é de domínio difuso como são os espaços ambientais protegidos não se deve aceitar as referidas medidas, sob pena de se infringir direitos difusos intergeracionais e de se propiciar uma avalanche de novas ocupações nestas áreas que são de vital importância para o equilíbrio ambiental. Todavia, se já houver uma descaracterização da função destas áreas é de se aceitar as medidas em comento.

            Estudos demonstram que a degradação ambiental está diretamente ligada a pobreza e marginalidade, de fato, grande parte das favelas e assentamentos ilegais estão localizados em áreas de preservação permanente ou em áreas cujo solo e meio ambiente não são viáveis à construção de moradias em larga escala, principalmente por estarem destituídas de serviços de infraestrutra mínima necessária.

            Deve-se ter em mente que o acesso à moradia é um direito fundamental de 2ª dimensão, enquanto que as áreas protegidas integram os direitos fundamentais de 3ª dimensão, ou seja, os direitos difusos, intergeracionais, de fraternidade, enfim de preservação ambiental, portanto, deve-se prevalecer estes, tendo em vista que afetam um número indefinido e indeterminado de pessoas, presentes e futuras gerações. Neste caso, deve-se assegurar o direito à moradia das pessoas atingidas, mas em outros locais, a menos que o local "protegido" tenha perdido a característica ou finalidade para o qual foi constituído.

            Imprescindível destacar que em termos de direitos sociais, deve-se obedecer ao princípio da proibição do retrocesso social, ou seja, posteriormente a adoção de direitos sociais pela legislação brasileira, os mesmos não podem sofrer mitigações, supressões e restrições, sob pena de se infringir o princípio em tela. Assim sendo, o acesso à moradia deve ser efetivado, desde que não violados outros direitos, sob pena de violação deste princípio, além dos demais já analisados. Os casos de colisões entre direitos fundamentais devem ser resolvidos de acordo com a proporcionalidade dos valores em confronto, razão pela qual, o direito ao meio ambiente equilibrado pertencente às presentes e futuras gerações, número indeterminado de pessoas, deve prevalecer sobre o direito dos moradores da área de preservação de manancial, número determinado, no que tange a sua permanência naquele local, não obstante, a efetivação do direito à moradia deve se dar em outro local, sob pena de lesar o direito à moradia prescrito no art. 6º, da CF/88.

Sobre a autora
Silviana Lúcia Henkes

advogada em Santa Catarina, especialista pela UFPEl, mestre e doutoranda pela UFSC e bolsista do CNPQ.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

HENKES, Silviana Lúcia. Dos reflexos jurídicos, políticos, sociais e ambientais da constitucionalização do direito à moradia. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 815, 26 set. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/7327. Acesso em: 23 nov. 2024.

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