4. RESPONSABILIDADE CIVIL E A INDENIZAÇÃO
O tema abandono afetivo tem sido discutido em todas as instâncias do judiciário brasileiro, onde o tema principal se baseia na grande repercussão do abandono por parte dos seus genitores, onde poderá acarretar ao filho sérios prejuízos para sua vida, podendo até gerar transtornos em um dos maiores bens do ser humano, que é a saúde psicológica, e assim ocasionando o pedido de indenização por danos morais.
Os pais são os legalmente responsáveis pela formação de seus filhos, onde nesse mister, tanto o pai quanto a mãe, devem prestar as condições suficientes para garantir que a criança tenha um desenvolvimento pleno, bem como uma educação de qualidade.
Insta salientar que, na maioria dos casos, o abandono afetivo ocorre após a separação dos genitores, quando o filho passa a conviver apenas com um dos pais, onde geralmente essa incumbência recai sobre a mãe.
Ocorre que ainda existe uma mentalidade por parte dos genitores, que sua única responsabilidade é apenas a prestação de alimentos, deixando de contribuir na formação da personalidade da criança, sendo o pai, figura inimitável de referência e exemplo.
Esse abandono é fortalecido ainda mais pela constituição de uma nova família por parte do genitor, o qual passa a negligenciar os deveres de afetividade, assistência moral e psíquica que deveria ter com a criança, tornando isso um ato ilícito, passível de indenização. Sobre a reparação por dano moral, assim corrobora Branco 12 :
Havendo violação dos direitos da personalidade, mesmo no âmbito da família, não se pode negar ao ofendido a possibilidade de reparação por dano moral, não atuando esta como fator desagregador daquela instituição, mas de proteção da dignidade dos seus membros. A reparação, embora expressa em pecúnia, não busca, nesse caso, qualquer vantagem patrimonial em benefício da vítima, revelando-se na verdade como forma de compensação diante da ofensa recebida, que em sua essência é de fato irreparável, atuando ao mesmo tempo em seu sentido educativo, na medida em que representa uma sanção aplicada ao ofensor, irradiando daí seu efeito preventivo.
Existem já entendimentos em tribunais superiores no judiciário brasileiro que a falta de convívio salutar entre os pais da criança é capaz de gerar consequências psicológicas irreversíveis ao filho, sendo plausível o acionamento do genitor por dano moral, conforme segue:
CIVIL. EMBARGOS INFRINGENTES. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. ABANDONO AFETIVO. 1. A indenização por danos morais decorrente de abandono afetivo somente é viável quando há um descaso, uma rejeição, um desprezo pela pessoa por parte do ascendente, aliado ao fato de acarretar danos psicológicos em razão dessa conduta. 2. O fato de existir pouco convívio com seu genitor não é suficiente, por si só, a caracterizar o desamparo emocional a legitimar a pretensão indenizatória. 3. Embargos desprovidos. (TJDF, 2015, on-line)
INDENIZAÇÃO DANOS MORAIS – RELAÇÃO PATERNOFILIAL – PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA – PRINCÍPIO DA AFETIVIDADE. O dor sofrida pelo filho, em virtude do abandono paterno, que o privou do direito à convivência, ao amparo afetivo, moral e psíquico, deve ser indenizável, com fulcro no princípio da dignidade da pessoa humana. (TJMG, 2004, on-line)
A título de conhecimento, podemos observar a seguir alguns julgados do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul sobre o assunto em epígrafe:
INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - ABANDONO AFETIVO - DANO NÃO CONFIGURADO - CARÁTER SUBJETIVO DA LIBERDADE AFETIVA PATERNAL - RECURSO IMPROVIDO. Não há como reconhecer o abandono afetivo como passível de reparação indenizatória, considerando o caráter subjetivo da liberdade afetiva do genitor. (TJ-MS - AC: 22400 MS 2009.022400-9, Relator: Des. Rêmolo Letteriello, Data de Julgamento: 08/09/2009, 4ª Turma Cível, Data de Publicação: 17/09/2009)
Observa-se que a grande parte dos magistrados entendem que a indenização por dano moral em virtude de abandono afetivo não são passíveis de reparação indenizatória, considerando o caráter subjetivo da liberdade afetiva do genitor. Decisão do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul foi amplamente divulgada no ano de 2012, na internet, através do site UOL13 :
Justiça condena pai a pagar R$ 200 mil aos filhos por abandono afetivo em Mato Grosso do Sul Celso Bejarano Do UOL, em Campo Grande 18/10/2012 20h29 Em decisão divulgada nesta quinta-feira (18), a 4ª Turma Cível do TJMS (Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul) decidiu que o pai de duas crianças indenize com R$ 100 mil cada uma por abandono afetivo. O réu separou-se da mulher e, segundo o processo, não quis mais ver os meninos. Ainda cabe recurso. A corte não acatou o argumento do pai, que alega ter assumido outra união conjugal, mudado de Estado, e afastado da família por imposição da ex-mulher. O episódio ocorreu em Campo Grande (MS) e, na primeira instância, a Justiça havia negado o pedido das crianças. De acordo com o processo, que corre em segredo de Justiça, o primeiro filho, ainda adolescente, tentou se aproximar do pai, que recusou o diálogo O filho mais novo diz que o pai separou-se da mãe quando ele tinha apenas 45 dias e que, aos 5 anos, por acaso viu o pai num shopping por apenas 10 minutos. Consta ainda no processo, por conta do abandono, que os dois meninos tiveram de ser internados em clínicas psiquiátricas e o diagnóstico médico apontou que eles ficaram com depressão e déficit de atenção. Já o pai sustenta que a separação foi traumática, longa e "a distância física não o impediu de buscar a convivência e presença na vida dos filhos, sendo impedido pela mãe das crianças". Ele diz também que nunca deixou de pagar a pensão alimentícia aos dois filhos, hoje no valor de R$ 8.200. O relator do processo, desembargador Dorival Renato Pavan, afirmou que "o direito de visita aos filhos não é uma faculdade do pai, mas um direito subjetivo impostergável do filho, de ter consigo a presença do pai, essencial para a formação de sua personalidade e de seu caráter" Segue o magistrado "a privação da visita, por ato voluntário, não é suprida pelo pagamento da pensão alimentícia, que tem outra natureza jurídica e outra finalidade e não supre a ausência voluntária do pai na vida dos filhos" Já no fim do despacho, o desembargador fez apelo emotivo: "negar o afeto é negar um direito fundamental, é ofender a integridade e a dignidade do filho, ser humano em processo de formação da personalidade, na medida em que a presença regular e efetiva do pai em sua vida é essencial e indispensável ao seu pleno desenvolvimento rumo à maturidade, formação pessoal, social e moral". Como o processo corre em sigilo, o tribunal não divulgou o nome da mãe das crianças tampouco o do pai ou de seu advogado. A corte ainda não sabe se o homem pretende recorrer.
Desta feita, percebe-se que não basta apenas a falta de convivência com um dos seus genitores para que o requerente tenha direito à indenização por dano moral, mas cada caso será analisado minuciosamente com a ajuda de profissionais capacitados para que tenhamos um diagnóstico preciso do dano psicológico causado por esse abandono.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O amor não se compra, o amor não se vende. Amor é incondicional, é sentimento de carinho e demonstração de afeto. Não há de se falar em valor pelo amor que um pai deixou de dar ao seu filho. Amar é faculdade, cuidar é dever.
O presente artigo trouxe à baila as consequências jurídicas do abandono afetivo por parte daquela pessoa que deve ser o alicerce na formação da personalidade do ser humano: o pai.
Desprende-se dos fatos que o que está em jogo não é o valor do amor que o pai pode pagar por ser ausente na vida da criança, mas sim o direito da criança (no caso sua representante/genitora) de acionar o judiciário visando uma reparação pelo fato do abandono afetivo.
O ser humano é um ser complexo e a problemática envolve muito mais que dinheiro, envolve também o amor, ou melhor, a falta de amor que foi deixado de lado pela figura paterna.
O simples fato do judiciário determinar o valor de baixas ou elevadas quantias em dinheiro à título de reparação por dano moral, pela falta de presença paterna jamais vai preencher o coração dessa ou daquela criança, mas estamos no caminho certo para tentar diminuir essas injustiças, por ser direito de todos que recorrem ao judiciário.
Grande parte dos tribunais superiores têm se posicionado favorável à indenização por dano moral quando o assunto é abandono do genitor. Acredito que seja uma tendência. Não se deve deixar a criança desamparada, está no Estatuto da Criança e do Adolescente! Está na Carta Magna de 1988! É um direito constitucional! É dever do Estado!
A criança é um ser frágil, necessita de cuidados especiais, bem como de carinho, amor e atenção. A partir do momento que o pai “vira as costas” para seu filho e deixa todo o encargo para a mãe, por mais que o judiciário tente reparar essa perda, infelizmente não vai conseguir. Criança precisa de amor e isso, não cabe ao judiciário, cabe em toda à sua essência, aos pais.
REFERÊNCIAS
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_______https://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2012/10/18/justicacondena-pai-a-pagar-r-200-mil-aos-filhos-por-abandono-afetivo-em-mato-grosso-dosul.htm Acesso em 07 de outubro de 2018.
Citações - Referências enumeradas.
1 SILVEIRA BUENO, Francisco. Minidicionário da Língua Portuguesa. 3ª ed. São Paulo: Editora Lisa S.A, 1989. p. 288.
2 SILVA BRITO. Bruna Ohana. Família e Afetividade: a Evolução Legislativa da Família e o Vínculo Afetivo nas Relações Familiares. 2016. p. 47. 3 MARTINS. Geisiane Oliveira. A família socioafetiva. As novas tendências do conceito de filiação. Disponível em http://ambito-juridico.com.br/site/?artigo_id=10202&n_link=revista_artigos_leitura Acesso em 02 de julho de 2018.
3 MARTINS. Geisiane Oliveira. A família socioafetiva. As novas tendências do conceito de filiação. Disponível em http://ambito-juridico.com.br/site/?artigo_id=10202&n_link=revista_artigos_leitura Acesso em 02 de julho de 2018.
4 Constituição da República Federativa do Brasil. 1988. p. 58. 5 DINIZ, Maria Helena. Código Civil Comentado. 10ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 103. 6 ROBERTO GONÇALVES, Carlos. Responsabilidade Civil: de acordo com o novo Código Civil. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 80.
5 DINIZ, Maria Helena. Código Civil Comentado. 10ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 103.
6 ROBERTO GONÇALVES, Carlos. Responsabilidade Civil: de acordo com o novo Código Civil. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 80.
7 RODRIGUES. Patrícia Matos Amatto. A nova concepção de família no ordenamento jurídico brasileiro. Disponível em: http://www.ambitojuridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigo. Acesso em 29 de agosto de 2018. questões meramente materiais e abordando com mais atenção ás relações afetivas entre pais e filhos.
8 EIZIRIK. Mariana. A ausência paterna e sua repercussão no desenvolvimento da criança e do adolescente: um relato de caso. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pi.10. Acesso em 10 de setembro de 2018.
9 COSTA. José Fernando. Ordem médica e norma familiar. 2ª ed. Rio de Janeiro: Graal; 1989
10 PUPO. I. O papel do pai na família. Disponível em: http://pt.shvoong.com/humanities/1646481- papel-pai-na-familia/ Acesso em 20 de setembro de 2018.
11 PERONI. Edylene Bellini. A importância da figura paterna para o desenvolvimento infantil. Disponível em http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-84862011000100007 Acesso em 20 de setembro de 2018.
12 BRANCO. Bernardo Castelo. Dano Moral no Direito de Família. São Paulo. Ed. Método. 2006. p. 116.
13 Disponível em https://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2012/10/18/justica-condena-pai-apagar-r-200-mil-aos-filhos-por-abandono-afetivo-em-mato-grosso-do-sul.htm Acesso em 07 de outubro de 2018.