6 A RESPONSABILIDADE CIVIL NOS CASOS DE ALIENAÇÃO PARENTAL
A responsabilidade civil no direito de família deixou de ter cunho meramente patrimonial com as inovações trazidas pela constituição federal de 1988, visto que esta cuidou de estabelecer o principio da dignidade da pessoa humana no âmbito das relações familiares.
O instituto da responsabilidade civil no direito de família está cada vez mais presente, ante a possibilidade de surgir situações de conflitos no seio familiar que venham a causar danos e assim surgir uma obrigação de reparação.
Como bem coloca Venosa (2014) “toda atividade que acarreta prejuízo gera responsabilidade ou dever de indenizar”. O direito de família atualmente desde a promulgação da Constituição Federal prima pela proteção da dignidade da pessoa humana, onde se inclui os direitos personalíssimos de todos os membros de uma família. Desta forma, é possível ocorrer a reparação civil decorrente de conflitos familiares, seja referente a danos materiais ou morais.
Como estudado anteriormente, o ordenamento brasileiro adota como regra a responsabilidade civil subjetiva, este sendo utilizado diante de demandas do direito de família, que trás quatro requisitos para a configuração do dever de reparação civil: a conduta de um agente, o nexo de causalidade, o dano e a culpa.
6.1 A CARACTERIZAÇÃO DO DEVER DE INDENIZAR NOS CASOS DE ALIENAÇÃO PARENTAL
A prática da alienação parental fará surgir o dever de responsabilizar o genitor alienador, pois a conduta alienadora trás em seu bojo, todos os pressupostos que caracterizam a responsabilidade civil previstos no art. 186 do CC/02. Para DIAS (2010) quando flagrada a prática de alienação parental é cabível a responsabilização civil, por configurar abuso do poder familiar que prejudica tanto o genitor alienador como os filhos.
Conforme destacado em capitulo anterior a responsabilidade civil tem como um dos elementos, a conduta voluntária do agente, seja ação ou omissão, que causa um dano, sendo ainda necessário haver um liame entre a conduta do agente e o dano. Desta forma percebe-se que a conduta do genitor alienador por si só já configura ato ilícito, que vai contra todos os deveres do poder familiar.
O próprio conceito de alienação parental trazido na Lei nº 12.318 de 2010 estabelece a ilicitude do ato, colocando sanções (art.6º) para essas condutas que visam por meio da implantação de mentiras e desqualificação do outro genitor neutralizar o convívio social do filho com o genitor alienado, de forma que com uma única conduta atinge tanto os direitos das criança e adolescentes, como o exercício do poder familiar.
O dano é evidente, podendo ser destacado tanto o dano moral como o patrimonial nos casos de Alienação Parental.
No âmbito dos direitos personalíssimos está o abalo moral e social sofrido pelo genitor alienado que é impedido de ter o relacionamento familiar com o filho, sendo a sua honra atingida por meio de diversas ações difamatórias e até caluniosas, bem como os traumas psicológicos suportados pelo filho alienado que decorreram das "falsas memórias" embutidas pelo alienador, considerado com abuso do poder familiar, induzindo na maioria dos casos a SAP.
O princípio constitucional da dignidade da pessoa humana é frontalmente violado, atingindo os direitos dos filhos menores que tem como basilar o princípio da absoluta proteção e integral das crianças e adolescentes. e ainda o pai ou mãe alienado, existindo a possibilidade de indenização por danos morais previsto no art. 5º da Constituição Federal e Código Civil, que tem natureza jurídica compensatória, mas principalmente punitiva para o alienador.
Quanto aos danos materiais, também se tornará possível desde que o genitor alienante demonstre perda patrimonial decorrente da conduta alienante, como por exemplo, os gastos advindos de tratamentos psicológicos.
Neste sentido entende Costa ( 2012, p.22):
"Tanto o genitor alienado quanto o menor podem vir a fazer acompanhamentos médicos, psicológicos, tomar remédios, antidepressivos, etc. Tudo em virtude da Alienação Parental. Assim, todo esse gasto configura dano material, passível de valoração certa".
Muitos não se atentam ao dano material que também pode ser sofrido. que sendo comprovado pode ser cumulativo com o dano moral, como preceituado na Súmula 37 do STJ " são cumuláveis as indenizações por dano material e dano moral oriundos o mesmo fato".
O nexo causal que é o liame entre a conduta e o dano, está presente em todas as situações que caracterizam a alienação parental, pois é constatado que os danos, sejam morais ou patrimoniais , tem direta ligação com a conduta do alienador
A culpa é caracterizada pela ação positiva do genitor alienador em utilizar de todos os meios para afastar a criança ou adolescente do convívio do ex- cônjuge, configurando a culpa, ou seja, a intenção de causar um prejuízo.
Assim a alienação parental é exercida pelo alienador de forma pensada e calculada objetivando o afastamento total do filho com o outro genitor, caracterizando mais um dos pressupostos da responsabilidade civil subjetiva que é a culpa. Portanto o ato de alienação parental gera ao genitor alienador o dever de reparação civil, sem prejudicar ainda a possibilidade de responsabilidade penal.
6.2 RESPONSABILIDADE CIVIL DO GENITOR ALIENADOR
Configuradas todos os pressupostos de alienação parental, o genitor alienado poderá propor ação de responsabilidade civil pleiteando indenização pelos danos morais e materiais.
Medeiros(2014) explica que quando configurada a alienação parental e,ocorram danos provenientes desta conduta, responderá civilmente o alienante, por danos morais, a título de reparação ao dano causado, ao menor e ainda ao genitor também vítima de alienação.
Tais ações devem ser ajuizadas na vara de família pelo genitor aliado, não impedindo que o ministério público e o próprio juiz de ofício interponha a medida, tendo em vista que a mesma procura além de indenizar o genitor vítima, também resguardar os direito das crianças adolescentes.
Quanto a indenização por danos morais, assim como a de danos materiais é pecuniária. No entanto, o quantum indenizatório moral é impossível de ser mensurado pelo fato da alienação parental violar direito de personalidade, por isso esta modalidade de indenização não tem o condão de exterminar a dor e sofrimento, mas tem a natureza punitiva, para que o alienador não venha a cometer os mesmo atos.
A própria lei de alienação parental não estipula o valor da multa imposta como sanção, cabendo ao juiz, de acordo com o caso mensurar o valor a ser imposto ao alienador, pois na verdade, o principal objetivo é o restabelecimento do convívio familiar entre genitor e filho alienados.
Já na indenização pelos danos materiais ocorridos devem ser levados em conta todos os prejuízos econômicos decorrentes da alienação parental., onde neste caso o valor pecuniário em natureza satisfativa e o julgador poderá recompor todo o dano integralmente
Comporta destacar que a conduta do agente alienador e o dano ocasionado servirão de base para a estipulação da indenização por parte do juiz , conforme o que dispões no art. 944 caput, e parágrafo único do CC/02: “A indenização mede-se pela extensão do dano”, cabendo ao julgador ainda avaliar a proporcionalidade da culpa e o dano.
6.3 POSICIONAMENTO DOS TRIBUNAIS BRASILEIROS
Com os inúmeros casos de alienação parental que chegavam ao judiciário até mesmo antes da Lei nº 12.318/10 os juízes passaram a ter de tomar um posicionamento, diante das consequências trazidas por esta conduta ilícita. Com a Lei de Alienação Parental, o juiz passou inclusive a ter um dispositivo norteador das condutas que se caracterizariam como a AP, em rol exemplificativo no parágrafo único do art. 2º , como já explanado anteriormente na análise desta lei específica.
As jurisprudências dos tribunais pátrios, hoje entendem que é cabível a reparação civil decorrente da alienação parental quando comprovado o dano, bem como os demais pressupostos que caracterizam a responsabilidade civil, sendo as decisões embasadas nos dispositivos tanto da Constituição Federal como também na lei nº 12.318/10 e lei nº 8.069 de 1990 .
Cumpre enfatizar o papel importantíssimo que tem o juiz ao averiguar se uma conduta realmente configura alienação parental, tendo que se valer muito mais do que por meros indícios e sim com provas cabais, que comprovem a conduta alienante e a síndrome de alienação parental.
A reparação civil diante de alienação parental é fato que a jurisprudência já se mostra favorável considerando tanto o dano moral como material quando comprovados os requisitos necessários. O dano material é cabível também em algumas situações quando gera ao genitor alienado prejuízos econômicos diante da possibilidade de gastos com sua saúde psicológica e também do filho(a), afinal de contas, falsas denúncias como um abuso sexual, para afastar ooutro cônjuge, prejudica a reputação da vítima na sociedade, ainda mais quando uma falta denúncia é reputada a um genitor.
7. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante do estudo realizado, vê-se que o conceito de família veio se alterando com o tempo e que como entidade protegida pelo Estado exerce fundamental importância da formação do ser humano. Atualmente, destaca-se que a família não é mais aquela patriarcal constituída somente com o casamento, e o princípio da afetividade é o que rege o vínculo familiar, além dos princípios da igualdade e a dignidade da pessoa humana previstos constitucionalmente.
Com os divórcios aumentando após a EC/10 e o maior anseio de liberdade social e profissional da mulher, a discussão sobre a alienação parental e síndrome da alienação parental passaram a ser mais enfatizadas em virtude de ser, na maioria das vezes, no contexto familiar de dissoluções conjugais e disputas de guardas o foco desse problema alarmante.
A alienação parental é um conjunto de atitudes realizadas por um dos genitores ou até mesmo demais membros da família com o intuito de denegrir a figura do outro genitor, chamado de genitor vítima ou alienado para a criança ou adolescente, filho(s) da antiga relação, objetivando a desconstrução da relação familiar entre estes, que são as vítimas desta conduta.
É certo que o maior prejudicado é a criança e adolescente, pelo abalo emocional e a vivência conturbada entre os seus genitores tendo seus direitos extremamente violados. Os direitos fundamentais como a dignidade da pessoa humana, a convivência familiar saudável e o dever de proteção integral e absoluta aos menores, estabelecidos na CF/88 e Lei 8.069/90 acabam sendo esquecidos pelos pais em face de uma disputa pessoal, deixando aquele pelo qual diz querer cuidar e amar sofrerem com as consequências de um poder familiar mal exercido.
Nesse contexto, é que pode surgir no filho a Síndrome da Alienação Parental, constituindo as consequências e indícios de transtornos psicossomáticos oriundos da AP realizada por um de seus genitores, atrapalhando o desenvolvimento social e intelectual, que se não cuidado a tempo, refletirá na sua vida adulta.
Decorrente de inúmeros casos que chegavam ao poder judiciário é que o poder legislativo não poderia se abster de regulamentar a alienação parental, o que ocorreu com a promulgação da Lei nº 12.318/10, com a função de proteger a criança e adolescente vítima de alienação parental e punir o alienador, fortalecendo os dispositivos constitucionais e o Estatuto da Criança e do Adolescente, bem como contribuindo com as demandas judiciais.
A partir do momento que se percebe que uma conduta como a alienação parental pode prejudicar tanto o genitor alienante como a criança ou adolescente é que surge o questionamento proposto por este trabalho em identificar a possibilidade de responsabilidade civil nos casos de alienação parental por parte do genitor alienador e em que medida se tornaria cabível.
O fato é que a responsabilidade civil é oriunda de um dano, porém este deve ser comprovado pela existência de uma conduta humana voluntária (ação ou omissão) que tenha nexo de causalidade com o dano ocasionando quatro pressupostos formais: conduta, nexo de causalidade, dano e culpa. Desta forma, desde que existentes todos esses elementos estudados neste trabalho, não há óbice para ser configurado um dever de reparação civil, tanto na esfera moral como patrimonial, afinal a própria lei específica de Alienação parental considera a prática como um ato ilícito.
Atualmente este é também o entendimento majoritário da doutrina e jurisprudência, sendo possível o ingresso de ação indenizatória do genitor alienado pelos danos causados tanto a si como para o filho. Apesar da possibilidade de indenização, o que deve ser levado em maior consideração é o direito do alienado em reestabelecer o convívio familiar saudável com o filho, sendo a indenização apenas um meio de amenizar o abalo psicológico e ainda ser uma forma de punir o alienador.
Portanto, é latente que a prática da alienação parental deva ser combatida, e destaca-se o papel do poder judiciário em utilizar dos meios mais eficazes, como psicólogos, psiquiatras e assistentes sociais, com a finalidade de proteger os direitos personalíssimos das vítimas, objetivando o direito do genitor vítima exercer seu poder familiar e sempre o melhor interesse para a criança e adolescente.