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A terceira onda de reforma do Código de Processo Civil.

Leis nº 11.232/2005, 11.277 e 11.276/2006

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Agenda 17/02/2006 às 00:00

4. Novos efeitos das sentenças

Uma vez prolatada a sentença há prestação do ofício judicial, [24] emergindo efeitos para o processo e também conseqüências extraprocessuais.

No tocante aos efeitos processuais da sentença, destaca-se sobremodo o término da instância, com a exceção recém criada dos atos executivos e cumprimento de sentença. Além disso, põe cabo à lide deduzida em juízo. É o que se extrai do magistério de João Bonumá [25]:

Assim, quanto ao processo; a) por ser ela o ato culminante, do qual todos os outros são preparatórios, termina a instância; b) exaure, em qualquer hipótese, a jurisdição do juiz que, pelo fato de sua prolação, se desobriga de continuar a oficiar no feito; c) é irretratável e imodificável pelo mesmo juiz que a proferiu, a não ser nos casos seguintes, expressamente previstos em lei (...) obriga o vencido, os interessados, nos casos de jurisdição graciosa, à satisfação das custas e despesas judiciais.

Quando à lide, o efeito normal e esperado de todas as sentenças é a sua final solução, pela cogente afirmação do direito aplicável à espécie, o que somente ocorre quando a sentença, pelo trânsito em julgado, adquire os característicos de incontestabilidade e imutabilidade, ou, por outras palavras, quando produz coisa julgada substancial.

Sem a preocupação de detalhar o tema, cabe dizer que neste propósito pode gerar efeitos meramente declaratórios, constitutivos ou condenatórios [26] em correspondência às ações em que são proferidas. Sua principal finalidade é a entrega da prestação jurisdicional, e neste desiderato se transparece numa destas modalidades.

Ao lado desta tripartição tradicional das sentenças, um número cada vez maior de autores coloca a ação mandamental como uma quarta modalidade. Por tal ação, busca-se uma ordem judicial, um mandado, dirigido a outro órgão do Estado ou a particulares. Antônio Carlos de Araújo Cintra, Ada Pellegrini Grinover e Cândido Rangel Dinamarco [27] assim a definem:

É o caso da sentença que concede mandado de segurança, ou da proferida contra oficial do registro público para retificação de nome, ou para cumprimento específico das obrigações de fazer ou não fazer. Para o descumprimento da ordem emanada pela sentença mandamental, o ordenamento prevê sanções de natureza material e processual, chegando até a eventual configuração de crime de desobediência (com a necessidade, para a sua caracterização, de processo criminal revestido de todas as garantias do devido processo penal).

Ainda, fala-se também da existência da sentença executiva como uma quinta modalidade. Mediante a ação judicial que busca um provimento executivo, tem-se em mira um processo de conhecimento em que sua decisão seja em muito análoga à condenatória, mas provida de uma especial eficácia consistente em legitimar a execução sem necessidade de novo processo subseqüente de execução ou qualquer incidente complexo, como o "cumprimento da sentença", sendo exemplo desta as possessórias e as ações de despejo [28]. A propósito, eis o teor da lição de Pontes de Miranda (Apud SILVA, Ovídio Batista da, ano: página) [29]:

Sentença executiva é toda aquela que contém, imanente em si mesma, como eficácia interna que lhe é própria, o poder de operar uma mudança no mundo exterior, compreendida tal mudança como correspondendo a uma transferência de valor jurídico do patrimônio do demandado pra o patrimônio do demandante, onde tal valor deveria estar (Pontes de Miranda, Tratado das ações, cit., p. 122 e 212).

Mais recentemente viu-se nas tutelas específicas e nas tutelas antecipadas, com as imposições das medidas coercitivas, alguns efeitos para a sentença no sentido de se fazerem cumprir.

No tocante às questões temporais, as sentenças podem ter efeitos retroativos – ex tunc – ou somente para o futuro – ex nunc. Por citar-se, as declaratórias, via de regra, possuem natureza retroativa, ao passo que as constitutivas detém caráter ex nunc.

Já quanto aos efeitos extraprocessuais, Ovídio Batista sugere a existência de dois destes: um a que dá o nome de eficácia direta ou natural, cujos efeitos produzem alcance erga omnes; outro, a que chama de eficácia reflexa da sentença, alcançando terceiros que possuem relação jurídica ligada ao objeto sub judice:

Sendo todas as eficácias que sejam imanentes à própria sentença, como virtualidade da demanda de que elas resultam. Esses efeitos diretos atingem tanto as partes como os terceiros e nada tem a ver com o fenômeno da coisa julgada [30]

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E exemplifica:

Se, numa ação possessória de reintegração de posse, cumulada com perdas e danos, o autor resulta vitorioso, obtendo a recuperação de sua posse legítima e mais a condenação do demandado a indenizar, esses efeitos naturais da sentença atingem não só as partes, mas igualmente aos terceiros, que não poderão desconhecer o fato da execução contra o esbulhador ou a sua condenação, sofrendo, eventualmente, prejuízos que de tais eficácias lhes possam advir, sem, por outro lado, encontrarem qualquer expediente processual capaz de torná-los imunes a tais efeitos. Se nessa demanda possessória, cumulada com perdas e danos, proposta por A contra o esbulhador B, um terceiro C com este contratara, digamos realizando com ele um contrato de arrendamento do imóvel cuja posse lhe seja retirada como conseqüência da sentença; ou um outro terceiro D haja emprestado dinheiro a B, tornando-se seu credor de soma avultada, sem qualquer garantia especial; tanto C quanto D sofrerão os efeitos da sentença, que influirá nas suas relações jurídicas com B, tornando-se, quanto ao primeiro, impossível o cumprimento do contrato de arrendamento por parte de B, já que a obrigação de transmitir a posse ao arrendatário tornou-se, com a sentença, impossível quanto a D, na medida em que, sendo ele credor quirografário de B, poderá ter seu crédito desfalcado, caso o montante da obrigação de ressarcimento de danos que a sentença reconheceu, torne B insolvente, ocasionando a instauração do concurso de credores.

Esse alcance da sentença em relação a terceiros é o que se usou chamar por Ovídio Batista, influenciado por Carnelutti, de efeito reflexo da sentença.

O mesmo autor [31] reconhece a existência de um outro efeito, ao qual dá o nome de "efeito anexo", decorrente da própria lei, como a hipoteca judiciária do art. 466, do CPC. Esse efeito, sequer incluído no pedido, decorre de uma fonte legal, e produz efeitos externos à demanda [32].

E é exatamente esse art. 466 que sofreu mudanças. Com a terminologia específica de efeitos da sentença, o Código resolveu tratar da questão precisa das ações onde se buscam declarações de vontade da parte ex adversa, como, por exemplo, naquelas onde se pretende a outorga da escritura do promitente vendedor de um imóvel; ou ainda naquelas onde se aguarda a manifestação por escrito de alguém, com vistas a realização de um negócio jurídico. Assim, manteve-se a redação do art. 466, e introduziu-se os arts. 466-A, 466-B, e 466-C:

Art. 466-A. Condenado o devedor a emitir declaração de vontade, a sentença, uma vez transitada em julgado, produzirá todos os efeitos da declaração não emitida.

Art. 466-B. Se aquele que se comprometeu a concluir um contrato não cumprir a obrigação, a outra parte, sendo isso possível e não excluído pelo título, poderá obter uma sentença que produza o mesmo efeito do contrato a ser firmado.

Art. 466-C. Tratando-se de contrato que tenha por objeto a transferência da propriedade de coisa determinada, ou de outro direito, a ação não será acolhida se a parte que a intentou não cumprir a sua prestação, nem a oferecer, nos casos e formas legais, salvo se ainda não exigível

As redações são interessantes e não deixam dúvidas. Se o contrato havido entre as partes impuser a uma delas a emissão de declaração de vontade, e esta não fizer, o prejudicado poderá obter uma sentença que a supra (art. 466-A). No mesmo talante, se houver condenação judicial do réu a emitir uma declaração de vontade, no seu silêncio a sentença fará suas vezes (art. 466-B).

É bem verdade que essas disposições não são propriamente inovações. De efeito, nosso CPC já detinha regra semelhante, estampada no art. 641 [33], que agora está revogado expressamente pela Lei nº 11.232/05.

Curioso ainda o art. 466-C, que nada mais fez do que contemplar a regra civilista da exceptio non adimplenti contractus, pela qual se alguém não cumpriu com sua parte num contrato, não poderá exigir que a outra execute a sua.

Retornando ao exemplo prático: Sócrates compra um imóvel de Platão, pagando por ele 06 (seis) parcelas mensais e sucessivas, com o comprometimento expresso de que Platão, ao final dos pagamentos, outorgue a escritura definitiva. Contudo, ao final do contrato não houve os pagamentos. Sendo assim, Sócrates interpõe a ação de outorga compulsória de escritura, podendo cominar inclusive medidas coercitivas como as astreintes, comprovando apenas que cumpriu com sua parte no avençado, anexando aos autos as cópias dos recibos de pagamentos. Se mesmo ante essas medidas coercitivas Platão se negar a outorga da escritura, o juiz proferirá uma sentença que valerá tanto quanto a escritura negada voluntariamente, podendo Sócrates levá-la a registro.


5. O novo procedimento da liquidação de sentença

Quando na sentença houver uma parte líquida e outra ilíquida, ao credor é lícito promover simultaneamente o cumprimento da sentença daquela e, em autos apartados, a liquidação desta [34].

A liquidação já era encarada como não integrante do processo executivo, mas sim como seu antecedente lógico, quando necessária, constituindo procedimento complementar do processo de conhecimento para tornar líquido o título judicial.

Outrora disposta nos artigos 603 a 611 do Código de Processo Civil, teve todos seus artigos expressamente revogados, sendo trazidos em seus lugares os vicejantes artigos 475-A a 475-H. Com isso, reforça-se a tese de que, doravante, a liquidação da sentença é um iter do processo de conhecimento.

Basicamente o procedimento assim será: quando a sentença não determinar o valor devido, procede-se à sua liquidação. Do requerimento de liquidação de sentença será a parte intimada, na pessoa de seu advogado.

De plano, o novo procedimento impossibilita que nos casos de ressarcimento por danos causados em acidente de veículo de via terrestre, e nos de cobrança de seguro relativamente aos danos causados em acidente de veículo, as sentenças sejam ilíquidas. Mesmo inexistindo subsídios apriorísticos, cumprirá ao juiz, se for o caso, fixar de plano, a seu prudente critério, o valor devido [35].

Interessante que agora a liquidação poderá ser requerida na pendência de recurso, evidentemente se o mesmo for recebido apenas no efeito devolutivo, processando-se em autos apartados, no juízo de origem, cumprindo ao liquidante instruir o pedido com cópias das peças processuais pertinentes.

Quando a determinação do valor da condenação depender apenas de cálculo aritmético, o credor o promoverá mediante memória discriminada e atualizada, determinando de imediato o cumprimento da sentença, oportunizando ao réu um prazo de 15 (quinze) dias para pronto pagamento, requerendo concomitantemente que em isso não ocorrendo que se dê a expedição de mandado de penhora e avaliação [36].

Se a elaboração da memória do cálculo depender de dados existentes em poder do devedor ou de terceiro, deverá o credor requerer ao juiz que determine a exibição num prazo de 30 (trinta) dias. Ao nosso ver, não se faz necessário a instauração de nenhum incidente apartado, bastando tão-somente um pedido simples, discriminado os documentos e apondo-lhes a importância devida, tudo por intermédio de petição incidental nos autos da própria liquidação.

A recusa injustificada na apresentação dos documentos acarretará, as conseqüências previstas para os incidentes formais de exibição de documentos: se a recusa for de ato imputável a outra parte, presume-se como verdadeiros os cálculos que o autor vier a apresentar posteriormente; se a recusa for de terceiro, poderão ser-lhe aplicadas as penas do art. 362, do CPC (expedição de mandado de busca e apreensão dos documentos), e, ao nosso ver, a aplicação de toda e qualquer medida coercitiva pelo ato atentatório à dignidade da Justiça [37], como multa diária e prisão por descumprimento de ordem judicial

Evidentemente que pelo princípio da persuasão racional do juiz, este não é obrigado a aceitar a liquidação trazida pelo autor, mesmo que o réu não se manifeste, ou que se lhe aplique a pena de confissão. Nos termos do art. 475-B, § 3º, poderá valer-se do Contador Judicial para dirimir-lhe as dúvidas [38].

Se isto ocorrer, discordando dos cálculos apresentados pelo Contador, o autor poderá impugná-los, valendo-se de todos os recursos cabíveis. Sem prejuízo, poderá de plano iniciar o cumprimento da sentença do valor incontroverso, inclusive com a penhora de bens, tendo "por base o valor encontrado pelo contador" [39].

A liquidação por arbitramento permanece devida quando determinada pela sentença ou convencionado pelas partes [40], ou o exigir a natureza do objeto da liquidação [41], mediante laudo apresentado por perito nomeado pelo juiz.

Mantém-se a regra de que se houver necessidade de prova de fatos novos, a liquidação será por artigos, que seguirá o rito comum [42].

Igualmente ficou assente a regra de que na liquidação é vedada a nova discussão da lide, ou a modificação do teor da decisão [43].

No entanto, profunda modificação diz respeito ao recurso cabível contra a decisão de homologação da liquidação. O antes cabível recurso de apelação é agora substituído pelo recurso de agravo [44].

Sobre o autor
Jesualdo Eduardo de Almeida Júnior

advogado sócio do escritório Zanoti e Almeida Advogados Associados; doutorando pela Universidade Del Museo Social, de Buenos Aires; mestre em Sistema Constitucional de Garantia de Direitos; pós-graduado em Direito Contratual;pós-graduado em Direito das Relações Sociais; professor de Direito Civil e coordenador da pós-graduação da Associação Educacional Toledo (Presidente Prudente/SP), professor da FEMA/IMESA (Assis/SP), do curso de pós-graduação da Universidade Estadual de Londrina – UEL, da PUC/PR, da Escola Superior da Advocacia, da Escola da Magistratura do Trabalho do Paraná.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ALMEIDA JÚNIOR, Jesualdo Eduardo. A terceira onda de reforma do Código de Processo Civil.: Leis nº 11.232/2005, 11.277 e 11.276/2006. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 11, n. 959, 17 fev. 2006. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/7982. Acesso em: 22 nov. 2024.

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