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O princípio da proporcionalidade e sua aplicabilidade na problemática das provas ilícitas em matéria criminal

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Agenda 27/03/2006 às 00:00

4 PROVA PENAL

O processo penal se constitui de uma relação jurídica integrada por um complexo de atos que tem por escopo primordial a decisão final, e, no processo penal condenatório, faz-se indispensável o recolhimento de elementos hábeis (provas) a fim de que o magistrado profira uma sentença baseada na verdade real e realizando, efetivamente, a justiça.

Consoante, MITTERMAYER,

Todas as vezes que um indivíduo aparece como autor de um fato, que é por força de lei, de conseqüências aflitivas, e que se trata de lhe fazer a aplicação devida, a condenação repousa sobre a certeza dos fatos, sobre a convicção que se gera na consciência do juiz. A soma dos motivos geradores dessa certeza se chama prova...O impulso que se produz em nós diante da prova, e que comunica o movimento ao que chamaremos fiel da balança da consciência, pode ser mais ou menos poderoso. Quanto menos vigoroso, apenas produz suspeita, gera só uma pura e simples presunção, quando, porém, violento e irresistível, faz descer e conserva em baixo a concha: é a certeza que pesa. [43]

Neste viés, percebe-se que a prova é o cerne do processo, mormente, o processo penal, uma vez que é por meio de provas que as partes demonstrarão ao juiz a ocorrência ou não de um determinado fato, bem como a forma como aludido acontecimento de fato se procedeu.

Em outros termos, no processo penal a prova é utilizada visando a busca da verdade real no caso concreto, objeto de uma determinada relação processual.

E nesta acepção, cumpre conceituá-la, a fim de melhor elucidar a problemática do presente trabalho.

4.1 CONCEITO DE PROVA

Posto que já tenha se descrito, de forma sucinta e abrangente a finalidade das provas no âmbito do processo penal, é de bom alvitre, consceituá-las, segundo os ensinamentos da doutrina.

Consoante o eminente doutrinador GOMES FILHO:

Na terminologia processual, o termo prova é empregado com variadas significações: indica, de forma mais ampla, o conjunto de atividades realizadas pelo Juiz e pelas partes na reconstrução dos fatos que constituem o suporte das pretensões deduzidas e da própria decisão; também pode aludir aos instrumentos pelos quais as informações sobre os fatos são introduzidas no processo (meios de prova); e, ainda, dá o nome ao resultado dessas atividades. [44]

Já Fernando Capez, definiu prova da seguinte forma:

Do latim probatio, é o conjunto de atos praticados pelas partes, pelo juiz (CPP, arts. 156, 2ª parte, 209 e 234) e por terceiros (por exemplo, peritos), destinados a levar ao magistrado a convicção acerca da existência ou inexistência de um fato, da falsidade ou veracidade de uma afirmação. Ou seja, as provas visam a estabelecer, dentro do processo, a existência de certos fatos. [45]

Todavia, não é qualquer prova que poderá ser levada ao crivo do judiciário, mas apenas as que não são vedadas pela Constituição Federal ou Legislação infraconstitucional, tendo-se em vista que, o direito à prova é um direito fundamental assegurado constitucionalmente por meio do direito de ação, defesa e contraditório, mas, como todos os demais direitos fundamentais, não é um direito absoluto.

4.2 LIMITES AO DIREITO À PROVA

Ante o exposto acima, posto que a busca da verdade real seja o escopo primordial do processo penal, a produção probatória deverá observar alguns limites.

Nas palavras de César Dario Mariano da Silva:

(…) mesmo sendo necessário chegar à verdade real dos fatos no âmbito do processo penal, não se pode sacrificar direitos e garantias constitucionais para que seja alcançado o fim almejado. Existem certas limitações previstas no Código de Processo Penal e na própria Constituição Federal que devem ser observadas, sob pena de ser ferido o próprio regime democrático de direito." [46]

A fim de corroborar aludido entendimento:

É que os direitos do homem, segundo a moderna doutrina constitucional, não podem ser entendidos em sentido absoluto, em face da natural restrição resultante do princípio da convivência das liberdades, pelo que não se permite que qualquer delas seja exercida de modo danoso à ordem pública e às liberdades alheias. As grandes linhas evolutivas dos direitos fundamentais, após o liberalismo, acentuaram a transformação dos direitos individuais em direitos do homem inserido na sociedade. De tal modo que não é mais exclusivamente com relação ao indivíduo, mas no enfoque de sua inserção na sociedade, que se justificam, no Estado social de direito, tanto os direitos como as suas limitações. [47]

É no processo penal que se percebe coma maior clareza a necessidade de se impor limites a atividade probatória, vez que é neste âmbito que se discute acerca da liberdade dos indivíduos, que per si já obriga que o Estado sacrifique o menos possível os direitos do acusado.

Portanto, mesmo o processo penal tendo o escopo de encontrar a verdade real dos fatos, não se pode sacrificar direitos e garantias constitucionais. E para assegurar que tal violação não ocorra, é que a própria Constituição Federal, bem como o Código de Processo Penal, impõem certas limitações.

A principal limitação no concernente às provas está insculpida no artigo 5º, inciso LVI, da Constituição Federal:

"São inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos". [48]

Cumpre salientar que, aludido dispositivo constitucional veda a utilização de provas ilícitas em todo âmbito processual, contudo, referindo-se o presente trabalho apenas as provas ilícitas no processo penal.

Com a afirmativa acima expendida chega-se ao tema específico proposto para este trabalho, a problemática da utilização, ou não, das provas ilícitas no processo penal. Contudo, para tanto, deve-se anteriormente tecer alguma breves considerações, bem como estabelecer alguns conceitos.

4.3 PROVAS OBTIDAS POR MEIOS ILÍCITOS: DEFINIÇÃO E GENERALIDADES

A primeira distinção que se deve traçar ao versar sobre o tema provas ilícitas é exatamente estabelecer a diferença entre prova ilegítima e prova ilícita. Consoante GRINOVER et al:

(…) diz-se que a prova é ilegal toda vez que sua obtenção caracterize violação de normas legais ou de princípios gerais do ordenamento, de natureza processual ou material. Quando a proibição for colocada por uma lei processual, a prova será ilegítima (ou ilegitimamente produzida); quando, pelo contrário, a proibição for de natureza material, a prova será ilicitamente obtida. [49]

Embora a terminologia utilizada no concernente á provas ilícitas não seja uniforme, utilizar-se-á neste trabalho a proposta adotada por GRINOVER et al acima transcrita, tendo – se em vista ser a que melhor se enquadra, bem como transcreve o pensamento da doutrina majoritária.

Assim, quando a prova violar norma processual será considerada prova ilegítima, tendo por sanção a declaração de sua nulidade, o que a impedirá de produzir qualquer efeito. Porém, sendo a nulidade gritante, tem-se que a prova inadmissível nem ao menos se caracteriza como prova, sendo inexistente. Aludida prova, por ser inadmissível, jamais poderia ter sido juntada no processo. Todavia, se foi juntada, no momento em que for constatada sua ilegalidade, a mesma deve ser desentranhada por ser inexistente. E todos os atos motivados por esta prova inexistente devem ser desconsiderados.

No concernente ao momento em que ocorre a ilegalidade cumpre transcrever os ensinamentos de Luiz Francisco Torquato Avolio:

"(…) enquanto na prova ilegítima a ilegalidade ocorre no momento de sua produção no processo, a prova ilícita pressupõe uma violação no momento da colheita da prova, anterior ou concomitante ao processo, mas sempre externamente a este". [50]

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No entanto, não é este o ponto que gera maiores celeumas. O problema de difícil conclusão é o concernente as provas ilícitas, ou seja, aquelas cuja obtenção constitui violação a preceito material, entendendo-se por estas "a prova colhida infringindo-se normas ou princípios colocados pela Constituição e pelas leis, freqüentemente para a proteção das liberdades públicas e dos direitos da personalidade e daquela sua manifestação que é o direito à intimidade". [51]

Assim, pode –se exemplificar como provas ilícitas as colhidas mediante tortura ou maus-tratos (artigo 5º, inciso III, da CF); as colhidas com desrespeito à intimidade (artigo 5º, inciso X, da CF); as colhidas com violação do domicílio (artigo 5º, inciso XI, da CF); as obtidas com violação ao sigilo das comunicações (artigo 5º, inciso XII, da CF), dentre outros.

Destarte, a nossa Constituição Federal, quando se refere à prova ilícita, quer se referir a prova ilegal, prova vedada, que compreende as provas ilícitas e as provas ilegítimas.

4.4 INADMISSIBILIDADE DAS PROVAS ILÍCITAS

A problemática das provas ilícitas em nosso ordenamento jurídico vem disciplinada na Constituição Federal, a qual, como anteriormente dito, veda expressamente a utilização de provas ilícitas no processo.

Cumpre salientar que, foi nos Estados Unidos da América a primeira decisão no sentido de inadmissibilidade de provas ilicitamente obtidas.

Todavia, o princípio da proporcionalidade possibilita entendimento diverso, "abrindo" prerrogativas para que se faça uso das provas obtidas por meios ilícitos em determinas situações concretas, quando colidentes direitos fundamentais.

A teoria, hoje dominante, da inadmissibilidade processual das provas ilícitas, colhidas com infringência a princípios ou normas constitucionais, vem, porém, atenuada por outra tendência, que visa a corrigir possíveis distorções a que a rigidez da exclusão poderia levar em casos de excepcional gravidade. Trata-se do denominado verhältnismassigkeitsprinzip, ou seja, de um critério de proporcionalidade, pelo qual os tribunais da então Alemanha Federal, sempre em caráter excepcional e em casos extremamente graves, têm admitido a prova ilícita, baseando-se no princípio do equilíbrio entre valores fundamentais contrastantes. [52]

Nesta perspectiva, cumpre-nos adiante elucidar a aplicabilidade do princípio da proporcionalidade nesta problemática causada pela utilização ou não de provas ilicitamente obtidas.

4.5 PROVAS ILÍCITAS POR DERIVAÇÃO

Outra questão concernente às provas ilícitas que merece apreço no presente trabalho são as denominadas provas ilícitas por derivação. Aludidas provas são lícitas em si mesmas, no entanto, foram extraídas de uma prova obtida por meio ilícito.

Neste caso, de uma prova lícita, ter sido obtida por meio de uma prova ilicitamente colhida, o nosso Ordenamento Jurídico adota de forma majoritária a teoria dos frutos da árvore envenenada (fruits of the poisonous tree), cunhada pela Suprema Corte Americana desde a década de 1920, e, hoje, acatada pelo Supremo Tribunal Federal do Brasil, consoante a qual o vício da planta se transmite a todos os seus frutos.

A referida teoria preleciona que a ilicitude na obtenção de uma prova transmite-se às provas derivadas, que são, da mesma forma vedadas no processo. Por exemplo, uma informação colhida mediante uma interceptação telefônica clandestina, por meio da qual as autoridades policiais descobrem o autor de um delito e o prendem em flagrante delito. A prisão em flagrante foi realizada de acordo com os ditames legais, no entanto, o fator que a ocasionou foi uma prova ilícita, o que acaba por contaminar o próprio flagrante, tornando-o ilícito da mesma forma.

A inadmissibilidade das provas ilícitas por derivação, em nosso sistema ocorre por uma imposição lógica, uma vez que, como bem elucida AVOLIO:

a sua utilização poderia servir de expediente para contornar a vedação probatória: as partes poderiam sentir-se estimuladas a recorrer a expedientes ilícitos com o objetivo de servirem-se de elementos de prova até então inatingíveis pelas vias legais. Figure-se, por exemplo, o próprio policial encorajado a torturar o acusado, na certeza de que os fatos extraídos de uma confissão extorquida, e, portanto, ilícita, propiciariam a colheita de novas provas, que poderiam ser introduzidas de modo (formalmente) lícito no processo. [53]

É certo que a teoria dos frutos da árvore envenenada possui algumas limitações impostas pelo próprio Supremo norte-americano e pela doutrina internacional, neste sentido, GRINOVER et al:

(…) excepcionam-se da vedação probatória as provas derivadas das ilícitas, quando a conexão entre umas e outra é tênue, de modo a não se colocarem a primária e a secundária como causa e efeito; ou, ainda, quando as provas derivadas da ilícita poderiam de qualquer modo ser descobertas por outra maneira. Fala-se, no primeiro caso, em independent source e, no segundo, na inevitable discovery. Isso significa que se a prova ilícita não foi absolutamente determinante para o descobrimento das derivadas, ou se estas derivam de fonte própria, não ficam contaminadas e podem ser produzidas em juízo. [54] (grifei)

Em outros termos, entende-se por independent source ("fonte independente [55]") o caso em que a conexão entre as provas lícitas e a ilícita é tênue, ou seja, a lícita não é efeito da ilícita; e verifica-se inevitable discovery ("descoberta inevitável" [56]), nos casos em que a provas derivadas da ilícita poderiam ter sido descobertas de outras maneiras. Os dois institutos são hipóteses de exclusão da contaminação da ilicitude originária às demais provas colhidas.

Na ocorrência destas situações, poder-se-ia fazer uso das provas secundárias, não se entendendo estarem estas contaminadas pelo vício da prova originária.


5 COLISÃO DE DIREITOS FUNDAMENTAIS GERADA PELA PROBLEMÁTICA DAS PROVAS ILÍCITAS

O princípio da proporcionalidade acima expendido deve ser utilizado, dentre outras situações, nos sistemas de inadmissibilidade da prova ilicitamente obtida, permitindo, em face de uma vedação probatória, que se proceda a uma escolha, no caso concreto, entre os valores constitucionalmente relevantes postos em colisão.

Sendo este o primordial desiderato deste trabalho, cumpre-nos perfazermos uma minuciosa análise da incidência da proporcionalidade nas celeumas ocasionadas pela inadmissibilidade constitucional das provas ilicitamente obtidas.

5.1 SOLUÇÃO PELO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE

Embora, para relevante parte da doutrina, as provas ilícitas sejam totalmente inadmissíveis, vez que, para estes, resta inadmissível qualquer violação de direitos individuais, sendo que, caso contrário, somente existiria proteção à direitos fundamentais em crimes de menor gravidade, "havendo uma intolerável discricionariedade, dando azo ao arbítrio policial, violando sobretudo o princípio da inocência" [57], a maioria já vislumbra a possibilidade de se admitir uma prova ilícita mediante a operacionalização do princípio da proporcionalidade e grande parte assim o faz, muitos em benefício do acusado e alguns em benefício da sociedade.

Para que se proceda a operacionalização do princípio da proporcionalidade é necessário a existência de um caso concreto, onde se verifique uma colisão de ao menos dois direitos fundamentais, para que se possa, de fato, sopesar aludidos direitos, a fim de se constatar qual deles, naquela situação, deve prevalecer.

Contudo, para fins de estudo, e tendo por escopo melhor visualizar a aplicação do referido princípio na problemática acarretada pela vedação constitucional das provas ilícitas no processo, mormente no processo penal, permite-se uma análise abstrata de hipóteses de direitos fundamentais colidentes.

5.1.1 Proporcionalidade em Benefício do Acusado – princípios em colisão

O indivíduo, perante o Estado é exacerbadamente "fraco", necessitando, indubitavelmente, que seus direitos fundamentais, constitucionalmente outorgados, sejam observados, a fim de que o Poder Estatal seja limitado.

São de suma importância a existência e o respeito aos direitos supramencionados, mormente no âmbito do procedimento criminal, onde se tem em voga o direito à liberdade, à vida, à intimidade, dentre outros considerados os mais importantes direitos de qualquer cidadão.

A vedação das provas ilícitas visa justamente o respeito a estes direitos, preservando-os e sempre impondo limites ao Estado.

É nesta acepção que a incidência do princípio da proporcionalidade pro reo apresenta menores problemas e maior número de adeptos, vez que, neste caso, utilizando-se uma prova ilícita em favor do acusado, mesmo que com infringência a direitos fundamentais seus ou de terceiros, o direito do particular restaria protegido diante do poder do Estado.

Afirmando os argumentos acima expandidos, César Dario Mariano Silva:

"Portanto, se for possível ao acusado demonstrar sua inocência através de uma prova obtida ilicitamente, certamente ela poderá ser utilizada no processo, haja vista a preponderância do direito à liberdade sobre a inadmissibilidade da prova ilícita no âmbito processual". [58]

O eminente doutrinador GOMES FILHO, entende da mesma forma, e assim exemplifica:

No confronto entre uma proibição de prova, ainda que ditada pelo interesse de proteção a um direito fundamental e o direito à prova da inocência parece claro que deva este último prevalecer, não só porque a liberdade e a dignidade da pessoa humana constituem valores insuperáveis, na ótica da sociedade democrática, mas também porque ao próprio Estado não pode interessar a punição de um Inocente, o que poderia significar a impunidade do verdadeiro culpado; é nesse sentido, aliás, que a moderna jurisprudência norte-americana tem afirmado que o direito à prova de defesa é superior. [59]

Outro entendimento que propicia a utilização das provas ilícitas em prol do acusado é o que enquadra esta atitude no rol das excludentes de ilicitude, tais como legitima defesa e estado de necessidade.

Tal entendimento é defendido primordialmente por Ada Pellegrine Grinover, Antônio Scarance Fernandes, Antônio Magalhães Gomes Filho, Luiz Francisco Torquato Avolio, dentre outros sob o argumento de que a Constituição Federal garante o direito de defesa no processo penal de forma primordial, abrangendo o princípio do favor rei.

Aludida corrente e de aceitação majoritária, possibilitando, portanto, que o acusado utilize em sua defesa, provas colhidas em desacordo com normas de direito material.

Na verdade, ambos posicionamentos convergem com a realidade do nosso ordenamento sendo amplamente aceitos, contudo deve-se, resumidamente expor quais os princípios passíveis de colisão nesta situação.

O acusado que faz uso de provas ilícitas para se defender conta a seu favor com os princípios constitucionais da liberdade, da ampla defesa e do contraditório, princípio da busca da verdade real, bem como com o princípio da presunção de inocência. Todavia, nestes casos (prova ilícita em favor do acusado), os princípios mencionados podem colidir com os também princípios constitucionais das liberdades individuais, direito à intimidade, direito ao sigilo das comunicações, direito a inviolabilidade do domicílio, direito à integridade, direito á dignidade, direito ao devido processo legal, direito à propriedade e, por fim, o princípio da vedação das provas ilícitas.

Nesta esteira, havendo um caso concreto de colisão, deverá se proceder da forma explicitada no tópico 3.6, o qual versa acerca do modo de operacionalização do princípio em tela.

Primeiramente, far-se-á os testes prévios, analisando-se, primeiramente, se efetivamente existe uma colisão de direitos fundamentais, isto é, direitos constitucionalmente outorgados em atrito.

Posteriormente, deve-se vislumbrar a situação de conflito, tendo por escopo primordial identificar todas as circunstâncias relevantes a serem abordadas.

Caracterizados estes, deve-se prosseguir para a aplicação do princípio da proporcionalidade propriamente dito.

Num terceiro momento, procede-se o exame do conflito sob a ótica do princípio da proporcionalidade, por meio da análise sucessiva de seus três subprincípios na seguinte ordem: princípio da adequação, princípio da necessidade e princípio da proporcionalidade em sentido estrito, visto que há entre os três subprincípios uma progressão do tipo lógico como anteriormente exposto.

Pelo princípio da adequação se buscará averiguar se no caso concreto a decisão normativa restritiva (meio) do direito fundamental viabiliza o alcance da finalidade almejada, inquirindo-se se a medida é apta, útil e apropriada para atingir à finalidade perseguida, mediante a resposta da seguinte pergunta: a medida a ser tomada é útil para atingir o fim perseguido?

Se a resposta for sim, ou seja, a utilização da prova ilícita é apta para a absolvição de um inocente, então, preceder-se-á a análise do próximo subprincípio, o da necessidade.

Por meio da análise deste subprincípio busca-se verificar se a utilização da prova ilícita causará o menor prejuízo possível, ou seja, se buscará a menor restrição aos direitos fundamentais apreciados.

Nesta fase, o escopo é decidir da forma que oferece menos desvantagem, por meio da resposta a seguinte pergunta: existe um meio fático menos gravoso, que não este ilicitamente utilizado, que possibilite, a partir dele, a obtenção da prova da inocência do acusado?

Não havendo outro meio menos gravoso, verifica-se que este é necessário, e passa-se a análise do último subprincípio, o da proporcionalidade em sentido estrito.

Este terceiro subprincípio da proporcionalidade exige uma reciprocidade razoável entre a relação meio-fim, perfazendo a idéia de justa medida. Em outros termos, para se alcançar o fim perquirido, deve-se sopesar as desvantagens dos meios em relação às vantagens dos fins.

Portanto, o subprincípio da proporcionalidade em sentido estrito revela a ponderação de bens já explicitada, e deve ser verificado por meio do seguinte questionamento: do cotejamento entre todos os princípios acima elencados, poder-se-ia, concluir pela possibilidade da utilização das provas decorrentes de atividade ilícita?

Sendo positiva a resposta, resta claramente viável a utilização de uma prova ilicitamente obtida para absolver um inocente com respaldo na aplicabilidade do princípio da proporcionalidade, no entanto, tendo-se em vista o caráter principal dos direitos fundamentais e as circunstâncias do caso concreto, será necessário sempre fundamentar racionalmente o resultado da ponderação de bens.

5.1.2 Proporcionalidade em Benefício da Sociedade e em Desfavor do Acusado – princípios em colisão

Diferentemente ocorre quando o Estado faz uso de provas ilícitas para impor a condenação de um indivíduo. Realmente, está hipótese desencadeia uma exacerbada celeuma entre os doutrinadores e juristas renomados.

Embora esmagadora maioria repudie aludida possibilidade, pequena parte da doutrina e alguns magistrados e membros do Ministério Público entendem pela possibilidade, em determinados casos de grande relevância, da utilização do princípio da proporcionalidade para pacificar o conflito entre direitos fundamentais em prol da sociedade.

Os mencionados operadores do direito, propõe a mesma forma de operacionalização do princípio em tela.

Em um primeiro momento, far-se-á os testes prévios, analisando-se, se efetivamente existe uma colisão de direitos fundamentais, bem como se identificando as circunstâncias relevantes a serem abordadas.

Caracterizados estes se prossegue para a aplicação do princípio da proporcionalidade.

Num terceiro momento, procede-se o exame do conflito sob o prisma do princípio da proporcionalidade, por meio da análise sucessiva de seus três elementos estruturadores na seguinte ordem: princípio da adequação, princípio da necessidade e princípio da proporcionalidade em sentido estrito.

Pelo princípio da adequação se buscará averiguar se no caso concreto a decisão normativa restritiva (meio) do direito fundamental viabiliza o alcance da finalidade almejada, inquirindo-se se a medida é apta, útil e apropriada para atingir à finalidade perseguida, mediante a resposta da seguinte pergunta: a medida a ser tomada é útil para atingir o fim perseguido?

Se a resposta for sim, ou seja, a utilização da prova ilícita é adequada para, a partir dela, chegar-se à prova da materialidade e da autoria do delito, preceder-se-á a análise do próximo subprincípio, o da necessidade.

Por meio da análise deste subprincípio busca-se verificar se a utilização da prova ilícita causará o menor prejuízo possível, ou seja, buscar-se-á a menor restrição aos direitos fundamentais do indivíduo.

Nesta fase, o escopo é decidir da forma que oferece menos desvantagem, por meio da resposta a seguinte pergunta: existe um meio fático menos gravoso, que não a prova ilícita, que possibilite, a partir dele, a obtenção da prova da autoria e materialidade de um determinado delito?

Não havendo outro meio menos gravoso, verifica-se que este é necessário, e passa-se a análise do último subprincípio, o da proporcionalidade em sentido estrito.

Este terceiro subprincípio da proporcionalidade exige uma reciprocidade razoável entre a relação meio-fim, perfazendo a idéia de justa medida. Em outros termos, para se alcançar o fim perquirido, deve-se sopesar as desvantagens dos meios em relação às vantagens dos fins.

Portanto, o subprincípio da proporcionalidade em sentido estrito revela a ponderação de bens já explicitada, e deve ser verificado por meio do seguinte questionamento: do cotejamento entre o princípio da vedação da utilização de prova ilícita em processo e o bem jurídico constitucionalmente relevante consubstanciado na persecução penal, pode-se concluir pela possibilidade da utilização das provas ilícitas em um processo criminal?

Sendo positiva a resposta, entende esta parte minoritária da doutrina ser totalmente possível uma condenação com fundamento em prova ilícita, haja vista a aplicabilidade do princípio da proporcionalidade em prol da sociedade.

Todavia, este trabalho crítica este posicionamento, uma vez que os motivos que autorizam a operacionalização do princípio da proporcionalidade em defesa do acusado não se encontram presentes na hipótese de se favorecer a sociedade em detrimento do indivíduo (acusado).

Embora já se tenha ressalvado que o princípio da proporcionalidade necessita de um conflito concreto para a sua operacionalização, para fins de estudo se permite sua verificação de forma hipotética e, abstratamente falando, vislumbra-se difícil a preponderância dos direitos fundamentais da sociedade em detrimento do indivíduo, até mesmo porque estes existem para proteger este em face do Estado, instituto com maior força e que necessita de limites.

De fato, os princípios da verdade real, do direito à prova, e o direito à segurança são bastante fortes, mas dificilmente, mediante a utilização da proporcionalidade, eles iriam, em um caso concreto, se sobrepor ao direito à intimidade, à integridade, à dignidade, ao devido processo legal, à propriedade, e o próprio princípio constitucional que veda a utilização das provas ilícitas.

Nesta perspectiva, à princípio restaria impossível a utilização da proporcionalidade para acusar, processar e condenar um individuo, tendo-se em vista que o cidadão precisa desta segurança em face do Estado, vez que a norma que não protege os delinqüentes, mesmo os mais abomináveis, também não protege os cidadãos.

Todavia, as hipóteses de direitos colidentes são múltiplas e inimagináveis, não se podendo olvidar, que em determinado caso, procedendo-se a análise acima expendida e consoante os ditames legais, se verifique possível à aplicabilidade do princípio da proporcionalidade em detrimento do réu.

5.2 PROPORCIONALIDADE E PROVAS ILÍCITAS POR DERIVAÇÃO

Na garantia fundamental da vedação à utilização de provas ilícitas no processo (artigo 5º, inciso LVI, da CRFB) encontra-se também, a vedação à utilização das provas derivadas da prova ilicitamente colhidas, uma vez que, aludido garantia além de visar a proteção da esfera jurídica daquele contra quem a prova é produzida, visa, também, forçar a persecução penal a que, para a obtenção de provas, aja, sempre, dentro da licitude.

Não se aceitando como presente no conteúdo do inciso LVI da CRFB, a vedação à utilização da prova derivada da prova ilícita, estar-se-ia a esvaziar completamente o alcance normativo da própria garantia fundamental, isto porque, ao final, permitir-se-ia à persecução penal que viesse a burlar a vedação constitucional em comento utilizando-se, de maneira reflexa, justamente as prova ilícita a que estava impedida de obter, já que dela (da prova ilícita) é que decorreriam as provas em que se fundaria para requerer a condenação de alguém.

No que tange a aplicabilidade do princípio da proporcionalidade para solucionar conflitos entre direitos fundamentais no âmbito das provas ilícitas por derivação percebe-se que a partir do momento em que se considera a prova derivada viciada da mesma forma que a originária, a aplicabilidade do princípio da proporcionalidade deve seguir a mesma idéia desta.

Dessa forma, sendo a decisão em benefício do acusado a proporcionalidade deve ser aplicada indubitavelmente nos termos expendidos no tópico 5.1.1, todavia, sendo para incriminar o cidadão, deve-se afastar esta prerrogativa e, portanto, inviável a utilização da prova ilicitamente obtida, consoante o tópico 5.1.2.

Sobre a autora
Roberta Pacheco Antunes

advogada, pós-graduada pela Escola da Magistratura do Paraná

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ANTUNES, Roberta Pacheco. O princípio da proporcionalidade e sua aplicabilidade na problemática das provas ilícitas em matéria criminal. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 11, n. 999, 27 mar. 2006. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/8153. Acesso em: 11 mai. 2024.

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